Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | RODRIGUES DA COSTA | ||
Descritores: | PROCESSO PENAL ASSISTENTE EM PROCESSO PENAL RECURSO PENAL LEGITIMIDADE | ||
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Nº do Documento: | SJ200401150032885 | ||
Data do Acordão: | 01/15/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL GUIMARÃES | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 832/01 | ||
Data: | 12/20/2002 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC PENAL. | ||
Decisão: | REJEITADO O RECURSO. | ||
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Sumário : | 1 - Um dos casos em que se tem reconhecido, jurisprudencialmente, sem reservas, a legitimidade e o interesse em agir do assistente para interpor recurso desacompanhado do M.º P.º é aquele em que o arguido é absolvido ( no caso dos autos, foi absolvido, na Relação, ao contrário do que sucedeu na 1ª instância, de dois crimes de homicídio, um consumado e outro tentado, por se ter julgado verificada a causa justificativa traduzida na legítima defesa). 2- Aqui, entende-se que o assistente tem não só legitimidade como interesse em agir, para interpor recurso desacompanhado do M.º P.º, tanto mais que a absolvição do arguido acarretou um manifesto prejuízo para os seus interesses próprios - a indemnização correspondente àqueles crimes de que o arguido foi absolvido. 3 - Isto não obstante a tese de DAMIÃO CUNHA, segundo o qual é necessário manter sempre a subordinação do assistente à actuação do M.º P.º, mesmo quando recorra autonomamente. Isto, porque, em seu entender, o assistente nunca pode ser nem transformar-se num substituto do princípio da oficialidade - tese que, por agora, fica em suspenso. 4 - É que o recurso deve ser rejeitado por manifesta improcedência, já que é por demais óbvio que os recorrentes pretendem uma reavaliação da matéria de facto, uma apreciação e valoração da prova produzida em termos idênticos aos que foram efectuados na 1ª instância, de forma a excluírem-se dos factos provados os pressupostos de facto (e não apenas a alterar-se a qualificação jurídica deles, que nem sequer é minimamente equacionada) em que a Relação assentou a causa de justificação legítima defesa, para absolver o arguido de dois crimes de homicídio. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam do Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1. No 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Felgueiras, com intervenção do tribunal colectivo (proc. comum n.º 832/01.2 GAFLG), foram julgados os arguidos A e B e, no final, foi proferido acórdão em que se decidiu: a) - Absolver o arguido B da prática, em autoria material e sob a forma tentada, de um crime de homicídio voluntário cometido sobre a pessoa de A, pelo qual foi acusado e julgado; b) - Condenar o arguido B, pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de homicídio (cometido sobre a pessoa de C), previsto e punido pelo art. 131.º do Código Penal, na pena de 10 (dez) anos e 6 (seis) meses de prisão; c) - Condenar o arguido B, pela prática, em autoria material e sob a forma tentada, de um crime de homicídio (cometido sobre a pessoa de D), previsto e punido pelos arts. 131º, 22º, 23º e 73º, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; d) - Condenar o arguido B, pela prática, em autoria material e sob a forma tentada, de um crime de homicídio (cometido sobre a pessoa de E), previsto e punido pelos arts. 131º, 22º, 23º e 73º, do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão; e) - Condenar o arguido B, pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de detenção ilegal de arma de defesa, previsto e punido pelo art. 6.º do D.L. n.º 22/97, de 27.06, na pena de 10 (dez) meses de prisão; f) - Condenar o arguido B, pela prática, em autoria material e sob a forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art. 143.º n.º 1, do Cód. Penal, na pena de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 5, o que perfaz a multa global de € 450 (quatrocentos e cinquenta euros); g) - Em cúmulo jurídico das penas de prisão e de multa, foi o arguido condenado na pena única de 16 (dezasseis) anos e 6 (seis) meses de prisão e 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 5, o que perfaz a multa global de € 450 (quatrocentos e cinquenta euros). 2. Foi ainda decidido julgar procedente e provada a acusação particular formulada pelo assistente B e, consequentemente: Condenar a arguida A pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de injúrias, previsto e punido pelo art. 181º, n.º 1, do Cód. Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 5, perfazendo a multa global de € 300 (trezentos euros). 3. Na procedência parcial dos pedidos de indemnização civil, decidiu-se ainda: a) - Condenar o demandado B a pagar aos demandantes F, G, H, I, J, L, M e N a quantia de € 6.000 (seis mil euros), a cada um (num total de € 48.000 - quarenta e oito mil euros), assim como a quantia de € 20.000 (vinte mil euros), às quais acresceriam juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da prolação da decisão até efectivo e integral pagamento; e ainda a pagar aos mesmos demandantes a quantia de € 2.481,52 (dois mil quatrocentos e oitenta e um euros e cinquenta e dois cêntimos), à qual acresceriam juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação do pedido e até efectivo e integral pagamento; b) - Condenar o demandado B a pagar à demandante D a quantia de € 4.000 (quatro mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da prolação da decisão até efectivo e integral pagamento; c) - Condenar o demandado B a pagar ao demandante E a quantia de € 5.000 (cinco mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da prolação da decisão até efectivo e integral pagamento; d) - Condenar o demandado B a pagar à demandante A a quantia de € 500 (quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da prolação da decisão até efectivo e integral pagamento; e) - Condenar a demandada A a pagar ao demandante B a quantia de € 500 (quinhentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da prolação da presente decisão até efectivo e integral pagamento. 4. Inconformados, o arguido B e o Ministério Público recorreram para o Tribunal da Relação de Guimarães. No final, esta decidiu - Julgar improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público; Julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido B e, em consequência: a) - Revogar o acórdão recorrido na parte em que condenou o arguido B pela prática de um crime de homicídio consumado p. p. pelo art. 131° do CP, na pessoa da C, e pela prática de um crime de homicídio na forma tentada, p. p. pelos artigos 131.º, 22.º, 23.º e 73.º, todos do CP, na pessoa da D; b) - Revogar o acórdão recorrido na parte em que condenou o mesmo arguido na pena de 10 meses de prisão pela prática de um crime de detenção ilegal de arma p. p. pelo art. 6.º da Lei n.º 22/97 de 27/6; c) - Revogar o acórdão recorrido na parte em que condenou o arguido a pagar aos demandantes referidos em 3., alíneas a) e b) as indemnizações ali descriminadas; d) - Absolver o arguido B dos crimes de homicídio referidos em 1., alíneas b) e c) e das indemnizações atrás referidas; e) - Condenar o mesmo arguido pela prática de um crime de detenção ilegal de arma de defesa p. p. pelo art. 6.º da Lei n.º 22/97, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de 5 euros e, em cúmulo jurídico com a pena de multa de 90 (noventa) dias pela prática do crime de ofensa à integridade física simples cometido na pessoa de A, na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa à indicada taxa diária; f) - Condenar o mesmo arguido, em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (quatro) anos de prisão e 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 5 euros; 5. Irresignados com tal decisão, os assistentes e demandantes civis L e D recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo o seguinte: 1 - A decisão recorrida está viciada nos termos das alíneas a), b) e c) do n.º 2 do art. 410.º do CPP; 2 - A mesma decisão contém no seu texto todos os elementos necessários à sua apreciação e anulação pelo tribunal de recurso da decisão da matéria de facto. 3 - O tribunal de recurso deverá anular o acórdão recorrido e decidir pela confirmação do acórdão da 1ª instância, tanto na decisão da matéria de facto, como na de direito. O Ministério Público no tribunal «a quo» pugnou pela manutenção do decidido. Por seu turno, o arguido respondeu, concluindo, em síntese, o seguinte: 1 - O recurso dos assistentes ofende uma norma de interesse e ordem pública, uma vez que os mesmos entram em manifesta oposição processual à assumida pelo M.º P.º, em violação do disposto no n.º 2, alínea 11 do art. 2.º da Lei n.º 43/86, de 26/9, sendo que a posição do assistente é subordinada à do M.º P.º (Assento n.º 8/99, de 30/10/97). 2 - Os assistentes não deduziram acusação autónoma, nem acompanharam a do M.º P.º, limitando-se a deduzir pedido cível, assumindo essa posição passiva mesmo em actos posteriores, nomeadamente não respondendo aos recursos interpostos da decisão final do colectivo pelo arguido e pelo M.º P.º, pelo que não se pode dizer que a decisão tenha sido contra eles proferida, faltando-lhes legitimidade, como reconheceu o Acórdão do STJ de 9/10/97, Proc. n.º 1291/96. 3 - E não têm interesse em agir - Acórdão do STJ de 9/1/02., Proc. n.º 2751/01 - 3). 4 - O recurso deve, por isso, ser rejeitado. 5 - Também não é admissível o recurso da parte cível, por não ser admissível recurso da parte penal (Assento n.º 1/2002, de 14/3/2002). 6 - Como quer que seja tal recurso sempre seria manifestamente improcedente, face à matéria de facto provada em 7, 8, 9, 10, 11 e 16. 7 - O recorrente fundou o recurso nos vícios do art. 410.º n.º 2 do CPP, sendo que o STJ tem poderes limitados ao reexame da matéria de direito, sem prejuízo do conhecimento daqueles vícios, mas que não podem ser invocados autonomamente. 8 - Para além de que os recorrentes limitam-se a alegar tais vícios, não escorando o recurso em quaisquer fundamentos para o efeito, impondo-se, por isso, a sua rejeição. 9 - Os recorrentes tecem considerações pessoais, sem consideração pela matéria de facto dada como provada, nomeadamente nos pontos 7, 8 e 9, pondo em causa a convicção do tribunal, e tal sai fora do quadro dos vícios do art. 410.º n.º 2. 10 - O recurso tem como objecto a decisão da 1ª instância, visto que os recorrentes se fundamentam, não na matéria de facto dada como provada pela Relação, nem na respectiva fundamentação, nem na própria decisão em si, mas no que constava da decisão de 1ª instância. 11 - O recurso deve ser rejeitado, ou, quando assim se não entenda, deve improceder. 6. Neste Supremo, o Ministério Público teve vista dos autos, promovendo o julgamento. No despacho preliminar, o relator atribuiu efeito devolutivo ao recurso, em vez do efeito suspensivo que vinha fixado. Colhidos os vistos, realizou-se a audiência de julgamento, tendo o M.º P.º defendido a manutenção do decidido e os advogados dos assistentes e do arguido corroboraram as posições já expressas na motivação e respostas. Cumpre, assim, decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO 7. Factos provados (em itálico vão as alterações feitas pela Relação): 1- Entre o arguido B, sua mulher e as lesadas D e sua falecida irmã C e a A e marido E, que existia, há já algum tempo, um mau relacionamento de vizinhança, derivado de problemas de índole passional, em virtude de um falado relacionamento extra conjugal entre a mulher do arguido B e o assistente E; 2- Na sequência desse mau relacionamento, as assistentes A, D e a falecida C começaram a insultar o arguido B e sua mulher, proferindo contra estes impropérios, designadamente quando se cruzavam no caminho, tal como lhe arremessavam, com frequência, pedras para o quintal dos mesmos; 3 - No dia 28 de Novembro de 2001, entre as 15,30 e as 16,30 horas, no lugar de Santa Luzia, freguesia de Lagares, da comarca de Felgueiras, a falecida C, a D e a A, uma vez mais, atiraram com diversas pedras para dentro do quintal do arguido B, onde apenas se encontrava a sua mulher; 4 - Nesse mesmo dia, por volta das 17 horas, o arguido B encontrava-se na estrada que liga Lagares a Agueiros, parado junto de uns contentores do lixo, colocados em tal estrada a uma distância de cerca de 100 metros da sua casa, acompanhando os trabalhos que decorriam numa obra em casa de um vizinho e estando a seu lado a testemunha O, que com ele conversava; 10 - Porém, a C e a D mantiveram-se junto do arguido, continuando a agredi-lo corporalmente com os objectos de que se achavam munidas. 12 - Em consequência directa e necessária do tiro de pistola que a atingiu, dito sob o ponto 11), a C veio a sofrer os ferimentos descritos no Relatório de Autópsia de fls. 32 a 34 (cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido), mormente orifício arredondado com cerca de 4 mm de diâmetro latero-superior do pescoço à esquerda, imediatamente abaixo do lobo do pavilhão auricular, com sinais de queimadura no bordo inferior do pavilhão auricular; orifício arredondado com cerca de 7 mm de diâmetro na região lateral do 1/3 médio do pescoço à direita, sem orla de contusão; abundantes infiltrações sanguíneas nos músculos latero-flexores do pescoço à esquerda e uma solução de continuidade que apresenta um trajecto rectilíneo dirigindo-se de cima para baixo e da esquerda para a direita; ao longo do trajecto observam-se sufusões hemorrágicas e lacerações; 13- Tais lesões traumáticas no pescoço da C , produzidas pelo disparo efectuado pelo arguido, foram a causa directa e necessária da morte daquela, a qual ocorreu nesse dia 28.11.2001, tendo a mesma já chegado sem vida ao Hospital; 14- Em consequência directa e necessária do tiro que a atingiu, dito sob o ponto 11), resultaram para a ofendida D os ferimentos descritos nos boletins clínicos de fls. 230 a 248, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidos, designadamente «ferida perfurante hemitórax esquerdo» que foi causa de «contusão pulmonar», com «hemotórax» e «pneumotórax», tendo aquela ferida «2 portas -1 na face posterior e outra na face externa do hemitórax esquerdo»; tais lesões foram causa directa e necessária de cento e oitenta dias de doença com igual período de incapacidade para o trabalho. 17- Volvidos alguns momentos após os factos ditos sob o ponto 11), avistando o assistente E que, entretanto se aproximou do local, o arguido B dirigiu-se ao mesmo, entrando então os dois em confronto físico; 19- Não obstante, o arguido B e o ofendido E continuaram o seu confronto físico, tendo ambos vindo a cair ao solo; 20- Nesse entretanto, aproximou-se, destes dois homens, a mulher do E, a A, a qual, procurando ajudar o seu marido, que já estava ferido, pegou então num objecto semelhante a um tubo de gás, com cerca de metro e meio de comprimento, e desferiu uma pancada com o mesmo no corpo do arguido B, a fim de este parar com as agressões ao seu marido; 21- Ainda, no solo, o arguido B logrou tirar o aludido tubo da mão da A e com o mesmo desferiu uma pancada na cabeça da A; 22- Foi a testemunha P quem tirou a pistola ao arguido B. 23 - De seguida, o arguido retirou-se do local e foi para a sua casa; 24- A C pesava cerca de 80 Kg; 25- A D manteve-se internada no Hospital de S. João do Porto - para onde foi transportada, após assistência no hospital local de Felgueiras -, desde aquela citada data (28.11.2001) até ao dia 13 de Dezembro de 2001. 26- Como consequência directa e necessária das agressões de que foi vítima por parte do arguido, o ofendido E sofreu os ferimentos que constam dos boletins clínicos e dos autos de exames médicos, constantes de fls.249 a 284, particularmente ferida perfurante na região periauricular à esquerda, com fractura da mandíbula e atlas, tendo necessidade de internamento para ser submetido a uma intervenção cirúrgica, lesões essas que lhe causaram cento e oitenta dias de doença, com igual período de incapacidade para o trabalho; 27- Em consequência directa e necessária das agressões na cabeça de que foi vítima por parte do arguido B, a A sofreu os ferimentos que constam dos boletins clínicos e dos autos de exames médicos constantes de fls.105 a 110, particularmente traumatismo maxilar esquerdo e ferida supraciliar à esquerda, tendo necessidade de ficar internada, durante cerca de um dia no Hospital de S. João, Porto, lesões essas que lhe determinaram quinze dias de doença, com igual período de incapacidade para o trabalho; 28- Em resultado das agressões referidas em 7), 10), 17), 19) e 20), o arguido B sofreu diversas equimoses, hematomas, fractura cominativa na base do 5° metacarpio esquerdo e feridas na região temporal e occipital, as quais lhe implicaram tratamento médico, que se prolongaram no próprio estabelecimento prisional; 9 - Veio a receber tratamento nos serviços de urgência do Hospital de Felgueiras, donde posteriormente foi transferido para o Hospital de Penafiel; 30- A arguida A actuou livre, voluntária e conscientemente, com a intenção de atingir a honra e consideração do assistente B, bem sabendo que a sua conduta era ilícita; 32- Sabia e admitiu que ao efectuar os ditos dois disparos em direcção ao ofendido E, quando este se encontrava agarrado a si e a uma distância muito curta deste, mormente com aquele disparo que atingiu a cara do ofendido, os mesmos poderiam tirar a vida àquele E e, não obstante, agiu livre e voluntariamente, conformando-se com esse resultado; 33- Agiu ainda com a intenção de atingir a integridade física da ofendida A, com a pancada que lhe deu com o dito tubo de gás na cabeça; 34- Com as injúrias de que foi vítima por parte da arguida A, o assistente B sentiu-se triste e desgostoso; 35- Em consequência directa e necessária das lesões que sofreu com o tiro que a atingiu, desferido pelo arguido B, a ofendida D teve necessidade de internamento hospitalar; tendo sofrido dores e ficado, na ocasião, receosa e angustiada; 36- Em consequência directa e necessária das lesões que sofreu com os tiros que lhe atingiram, desferidos pelo arguido B, o ofendido E teve necessidade de internamento hospitalar, tendo sido submetido a uma intervenção cirúrgica; 37- Em resultado destas lesões, o ofendido E sofreu dores e ficou, na ocasião, receoso e angustiado; 38- Em consequência directa e necessária das lesões que sofreu com a agressão do arguido B, a A sofreu dores; 39 - A falecida C era casada com o requerente F e era mãe dos requerentes G, H, I, J, L, M e N; 40 - Com o falecimento da C os identificados requerentes sofreram e continuam a sofrer um profundo desgosto; 41- Com a ocorrência da morte da sua esposa e mãe, tiveram os requerentes que gastar, com a realização do funeral daquela, o montante de € 2.481,52; 42- A "C" contava com 71 anos de idade, era doméstica, sendo uma pessoa activa e trabalhadora no seio do seu agregado familiar; 43- A "D" está reformada, auferindo a reforma mensal de cerca de 190 euros e vive sozinha; 44- A "A" não sabe ler nem escrever; 45- É doméstica e o seu marido e ofendido E está reformado, auferindo a reforma mensal de cerca de 400 euros; 46- A "A" não tem antecedentes criminais; 47- O arguido B completou o 4° ano de escolaridade; 48- Possui actualmente 73 anos de idade e está reformado, auferindo de reformas mensais cerca de € 300 euros; 49- A sua mulher também esta reformada, auferindo a reforma mensal de cerca de € 190 euros; 50- O arguido B sofre de diabetes e tem dificuldades em andar, possuindo alterações degenerativas articulares generalizadas, particularmente graves ao nível da coluna cervical, lombar, ombros, ancas e joelhos, as quais lhe impõe frequentes ciclos de tratamento fisiátrico; 51- Iniciou a sua actividade profissional, com cerca de dez anos de idade, como aprendiz de alfaiate; profissão de alfaiate essa que exerceu, por conta de outrem, toda a vida até à sua aposentação que, ocorreu em 1980; 52 - Contraiu matrimónio com Q, por volta dos 21 anos de idade, com quem teve cinco filhos, todos autonomizados; 53 - O arguido demonstra boa integração no Estabelecimento Prisional, encontrando-se activo no sector da cartonagem; 54- Beneficia de total apoio por parte da família, nomeadamente da esposa e filhos, que o visitam com regularidade; 55- No meio comunitário, o arguido é referido como um indivíduo discreto, não lhe sendo associados comportamentos anti-sociais, até à data dos factos; 56- O arguido B não tem antecedentes criminais. 8. Factos não provados: - O arguido, há já algum tempo, vinha congeminando a ideia de tirar a vida à A, C e D, visando, assim, lavar a sua honra, de homem casado e a fim de se vingar, pelas suas próprias mãos, de tantas humilhações, que vinha sofrendo em público quer ele próprio, quer na pessoa de sua mulher; - O arguido presenciou perfeitamente a descrita situação das pedras arremessadas para o seu quintal, por parte das três referidas mulheres, e não teve qualquer intervenção, nessa altura; 25, 1°, 2°, 3°, 4° e 5° §§, de fls. 26, e itens 10°, 11°, 12°, 13°, 14°, 15°, 16°, 19°, 20°, 21°, 22°, 24°, 25°, 26°, 27°, 28°, todos da contestação do arguido B: provado apenas o que consta vertido nos pontos 7), 8), 9), 10), 11), 12, 14, 15, e 16). Que o arguido com alguns dos tiros que efectuou tivesse querido tirar a vida à A. amedrontado, ainda que convencido de que, o arguido, finalmente, iria terminar as suas agressões e fugir do local; - Quando se aproximou do assistente E, o arguido, repentinamente e por forma imprevista, quando apenas se encontrava a menos de meio metro do visado lesado e empunhando, de novo, a dita pistola, agora de encontro à sua pessoa, veio a desferir-lhe um primeiro tiro, na cara e, acto contínuo, um novo tiro, visando, atingi-lo, novamente e desta vez no tórax, embora apenas o tenha conseguido atingir, desta vez, no braço, com o qual o lesado, na altura, procurou proteger-se e evitar ser, de novo baleado, agora nessa parte do corpo; - Em consequência da mesma pancada, o arguido foi projectado violentamente para o chão; 8. Vejamos, em primeiro lugar, se o recorrente tem interesse em agir e legitimidade para recorrer, procurando, assim, responder à questão prévia levantada pelo arguido: O interesse em agir constitui um pressuposto processual que se traduz na necessidade de usar o processo para obter tutela jurisdicional em relação a um direito que se pretende fazer valer, seja porque foi violado, seja porque se encontra ameaçado de forma séria e grave e o seu titular recorre aos tribunais para afirmar esse direito na sua titularidade, pois não o consegue de um modo eficaz, a não ser socorrendo-se da via judiciária. A legitimidade afere-se por uma determinada posição do sujeito em face da relação material controvertida ou em litígio - posição essa que lhe confere o direito de intervir no processo, seja como autor, seja como réu, como titular da acção ou como titular da posição contraposta a quem essa acção se dirige. Em processo penal e no que toca ao recurso, a legitimidade avalia-se pelo interesse directo de determinado sujeito processual em impugnar uma decisão, porque lhe foi desfavorável, afectando-o na sua esfera jurídica ou atingindo um interesse seu digno de tutela jurisdicional. Assim é que se diz, de acordo, aliás, com a prescrição da lei (art. 401.º n.º 1, alínea b) do CPP), que o assistente, como sujeito processual, tem legitimidade para recorrer de decisões contra ele proferidas. E são contra ele proferidas aquelas decisões em que ele pode ser considerado, de um ponto de vista particular, isto é, dos seus legítimos interesses, ou dos interesses que pretende fazer valer no processo, vencido nas respectivas pretensões, por não terem obtido acolhimento na decisão proferida. Acontece que o assistente, nos crimes que não têm natureza particular, subordina a sua actividade à actuação do Ministério Público, de quem é colaborador, mas podendo agir autonomamente em casos especiais indicados na lei (art. 69.º do CPP). Um desses casos é o que respeita justamente ao recurso, podendo o assistente interpô-lo, independentemente do M.ºP.º, quando seja pessoalmente afectado. No que toca a uma decisão condenatória, já sabemos que o assistente não tem legitimidade para interpor recurso da medida da pena, quando desacompanhado do M.º P.º, a não ser que demonstre a conexão com um interesse próprio, o que não é mais do que o reflexo, a esse nível, da exigência legal de a decisão ser contra ele proferida. Esse é, justamente, o objecto do Assento (na designação actualmente consagrada: acórdão de fixação de jurisprudência) n.º 8/89, de 30/10/97 - DR 1ª S/A de 10/8/99: «o assistente não tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do M.º P.º relativamente à espécie e medida da pena aplicada, salvo quando demonstrar um concreto e próprio interesse em agir». Ora, esta doutrina tem sido afirmada em vários acórdãos deste Supremo, nas várias aplicações concretas que os casos singulares submetidos à sua apreciação reclamam (para não irmos mais longe: os Acórdãos de 9/1/02; Proc. n.º 2751/01; de 24/10/02, Proc. n.º 3183/02 - 5), fazendo-se decorrer a falta de legitimidade e de interesse em agir do assistente, não só do carácter eminentemente público dos interesses em jogo na aplicação das penas, mas da atitude por este tomada ao longo do processo, a reflectir uma falta de interesse próprio na contestação da medida da pena (não dedução de acusação autónoma, nem ao menos, adesão à acusação deduzida pelo M.º P.º, alheamento da sorte dos autos na vertente criminal, etc.). A referida doutrina tem sido estendida também a outras questões em que estão em causa sobretudo interesses públicos, em face dos quais o interesse particular do assistente não assume relevância. Por exemplo, a questão da qualificação jurídica dos factos provados (entre outros, os Acórdãos de 20/3/02, Proc. n.º 468/02; de 17/10/02, Proc. n.º 3208/02 - 5). Em matéria, porém, de culpabilidade e como assinala DAMIÃO DA CUNHA, não existe na jurisprudência, nomeadamente do Supremo, a mesma relutância em aceitar um autónomo recurso do assistente, reconhecendo-se até como «normal o recurso do assistente desacompanhado do Ministério Público» (O Caso Julgado Parcial, Universidade Católica, Porto 2002, p. 753 em nota). Ora, um dos casos em que se tem reconhecido, jurisprudencialmente, sem reservas, a legitimidade e o interesse em agir do assistente para interpor recurso desacompanhado do M.º P.º é aquele em que o arguido é absolvido (no caso dos autos, foi absolvido, na Relação, ao contrário do que sucedeu na 1ª instância, de dois crimes de homicídio, um consumado e outro tentado, por se ter julgado verificada a causa justificativa traduzida na legítima defesa). Aqui, entende-se que o assistente tem não só legitimidade como interesse em agir, para interpor recurso desacompanhado do M.º P.º, tanto mais que a absolvição do arguido acarretou um manifesto prejuízo para os seus interesses próprios - a indemnização correspondente àqueles crimes de que o arguido foi absolvido. E, para esta perspectiva, não releva a objecção formulada pelo arguido da pressuposta passividade dos assistentes. Com efeito, pode dizer-se que, se os assistentes não deduziram acusação autónoma, é porque se conformaram com a acusação deduzida pelo M.º P.º, se não de forma explícita, ao menos implicitamente, tanto mais que assentaram o pedido cível na violação dolosa do direito à vida, ou seja, nos crimes de homicídio que eram objecto da acusação pública. E, se não recorreram autonomamente da decisão condenatória da 1ª instância na parte criminal, mas só na parte cível, e nem sequer responderam aos recursos interpostos na referida parte criminal, é porque, por um lado, se conformaram com tal decisão e, por outro, confiaram na actuação do M.º P.º, que, tendo interposto recurso para a Relação, pediu a requalificação dos factos para crime de homicídio agravado, com a consequente agravação das penas. Problema curioso neste domínio é aquele que formula o já citado DAMIÃO CUNHA, segundo o qual é necessário manter sempre a subordinação do assistente à actuação do M.º P.º, mesmo quando recorra autonomamente. Isto, porque, em seu entender, o assistente nunca pode ser nem transformar-se num substituto do princípio da oficialidade. Assim, se o M.º P.º omitiu o seu dever de recorrer da decisão (em face, por exemplo, da posição que assumiu no julgamento, tendo, por hipótese, pedido a condenação do arguido e este ter sido absolvido), «tal facto poderia servir de fundamento de recurso ao assistente, mas como forma de solicitar uma apreciação ao M.º P.º de grau superior ...», que teria de pronunciar-se sobre a validade do recurso, antes de o tribunal superior se pronunciar sobre ele. E caso o M.º P.º junto do tribunal de recurso não atendesse ao recurso, quer porque o considerasse infundado, quer por entender que o mesmo podia «causar mais dano que vantagem ao exercício da acção penal» quando, por exemplo, se visasse exclusivamente a medida da pena, por forma que, mesmo fundamentadamente, contendesse com as finalidades dela, aí não haveria necessidade de julgamento do recurso. Com efeito, a não ser esta a solução, e, uma vez que (por maioria de razão), no caso contemplado se imporia sempre uma audiência de reenvio dado que o tribunal superior, na óptica deste autor, não poderia condenar o arguido depois deste ter sido absolvido, o que só se conceberia numa audiência de julgamento com todas as garantias de defesa e, daí, o reenvio do processo, então, haveria um «juízo de reenvio sem a correspondente acção penal pública» (ob. cit. , p. 755/756). Quer isto dizer que, se fôssemos a transportar esta teoria para o caso dos autos, tendo o arguido sido absolvido de dois crimes de homicídio no Tribunal da Relação e, não tendo o M.º P.º nesse Tribunal interposto recurso, por concordar com a decisão (aliás, em consonância com o seu parecer), o recurso dos assistentes teria que ter merecido a aprovação do M.º P.º neste Supremo, ainda antes de o tribunal se pronunciar, o que não aconteceu, dado que o M.º P.º se limitou a promover o julgamento. A menos que se entendesse que, com tal promoção, o M.º P.º aceitou implicitamente a justeza do recurso dos assistentes. Mas não é isso o que, de facto, resulta. O que o M.º P.º pretendeu tão-só relegar para a audiência a sua posição. E, nesse caso, a seguir-se a teoria referida, teríamos de rejeitar o recurso do assistente, por falta de legitimidade, embora a jurisprudência, como dissemos, vá no sentido de o admitir em hipóteses como esta (Cf., por exemplo, o Acórdão de 16/19/02, Proc. n.º 2536/02 - 3: As decisões absolutórias de crimes por que o assistente deduzira acusação (directamente ou por adesão à do M.º P.º) são proferidas contra ele, são decisões que o afectam, por forma a assistir-lhe, nos termos dos art.s 69.º n.º 2, alínea c) e 401.º n.º 1, alínea b) do CPP, legitimidade subjectiva para delas recorrer, mesmo que o M.º P.º o não tenha feito.) Porém, mesmo admitindo o recurso do assistente, à luz da jurisprudência que se tem produzido, sem curar, por agora, de tomar posição na questão doutrinária que acima foi esboçada, subsiste um outro motivo de rejeição - a manifesta improcedência do recurso. E é o que vamos passar a analisar. 9. Os recorrentes pretendem, como dizem, de forma incorrecta, mas que se percebe, a anulação do acórdão recorrido e a confirmação do acórdão da 1ª instância. Ou seja: pretendem que a absolvição do arguido, decretada na sequência da alteração da matéria de facto operada pela Relação, seja revogada por uma operação inversa, traduzida na recolocação da matéria de facto na situação de provada e não provada tal como vinha da decisão da 1ª instância. Ora, é por demais óbvio que uma tal operação implicaria necessariamente uma reavaliação da matéria de facto, uma apreciação e valoração da prova produzida em termos idênticos aos que foram efectuados na 1ª instância, de forma a excluírem-se dos factos provados os pressupostos de facto (e não apenas a alterar-se a qualificação jurídica deles, que nem sequer é minimamente equacionada) em que a Relação assentou a causa de justificação legítima defesa. Ora, não será preciso fazer alongadas considerações para se ver logo que um tal tipo de motivação usada no recurso não tem a mínima viabilidade, dada a natureza de tribunal de revista que este tribunal tem, não podendo imiscuir-se na matéria de facto, ao menos num sentido tão amplo, coenvolvendo notoriamente a prova produzida, a sua análise, apreciação e valoração (art. 434..º do CPP e art. 26.º da Lei n.º 3/99 de 13/1 - Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais). Percorra-se o texto da motivação de recurso dos assistentes e apenas se encontrará a discussão indevida da matéria de facto, com a constante invocação da prova produzida, a valoração dos depoimentos, a credibilidade das diversas provas testemunhais, o confronto com esses diversos meios de prova, enfim, a utilização em larga escala de critérios de apreciação e valoração do material probatório. Assim, logo no começo da apreciação dos recorrentes, a fls. 1317, estes traem as suas verdadeiras intenções, ao impugnarem a decisão recorrida: E toda a questão está em atribuir credibilidade ao depoimento da testemunha R e falta de credibilidade aos depoimentos de S e O, como fez o Tribunal de Felgueiras, ou fazer o contrário, como fez a Relação de Guimarães. Logo a seguir, dizem os recorrentes, traindo o seu objectivo relativamente aos pressupostos de legítima defesa em que assentou a decisão recorrida para absolver o arguido dos referidos crimes de homicídio: E o facto essencial que determina a condenação na 1ª instância e a absolvição na 2ª é tão só a actuação em legitima defesa, que resulta de o arguido ter disparado 4 tiros quando estava a ser agredido, para afastar a agressão, como decidiu a Relação, ou ter disparado em altura que não estava a ser agredido, para tirar desforço das agressões, como estava decidido, e quanto a nós bem, no Tribunal de Felgueiras. É sempre nesse tom, sem nunca saírem desse trilho, que os recorrentes impugnam a decisão recorrida. Ora, o recurso para o STJ tem de visar exclusivamente o reexame da matéria de direito. Mesmo em relação aos vícios do art. 410.º, tem questionado a jurisprudência dominante no STJ a adequação de um tal recurso à natureza de tribunal de revista que o Supremo é, não lhe competindo pronunciar-se sobre a questão de facto, da competência exclusiva das instâncias, integrando aqueles vícios o conceito de matéria de facto na fórmula mitigada, (Cf. Acs. de 6/6/2002, Proc. n.º 1874/02; de 14/11/2002, Proc. n.º 3225/02 - 5; de 12/12/02, Proc. n.º 3145/02 - 5 - todos tendo como relator o Cons. Simas Santos; de 18/6/2003, Proc. n.º 1536/03 - 5, - relator: Cons. Pires Salpico -,este sumariado nos SUMÁRIOS DE ACÓRDÃOS do STJ, n.º 71; de 2/5/02, Proc. n.º 627/02 - 5 e de 27/6/02, Proc. n.º 1544/02 - estes tendo como relator o Cons. Carmona da Mota -, sumariados extensamente nos SUMÁRIOS DO STJ - Secções criminais, Ed. Anual de 2002 . pgs. 162 e 231). mas, mesmo a admitir-se um recurso que tenha por substracto a alegação dos vícios do art. 410.º, o certo é que os recorrentes não se circunscrevem à alegação de tais vícios. Vão para além deles ou seguem à margem deles, discreteando sobre a produção da prova e pretendendo mesmo atacar a decisão da matéria de facto sob esse prisma, ainda que com a invocação meramente pretextual dos vícios do art. 410.º n.º 2 do CPP. Ora, a matéria de facto, já na tal forma «mitigada» dos vícios do art. 410.º n.º 2 do CPP, alegados autonomamente, e muito mais na acepção alargada de discussão das provas e do modo como as instâncias apreciaram e decidiram a referida matéria, escapa aos poderes do STJ, sem embargo de este poder conhecer daqueles vícios «ex officio», como resulta da ressalva inicial formulada no art. 434.º do mesmo diploma legal e em consonância com a jurisprudência fixada por este tribunal (Acórdão n.º 7/95 do Plenário das Secções Criminais de 19/10/95, DR 1ª/S - A de 28/12/95). Assim, o recurso para o STJ pressupõe a prévia definição pelas instâncias da matéria de facto, que fica definitivamente assente (Cf. a jurisprudência atrás citada e ainda o Acórdão de 14/11/02, Proc. n.º 3129/02 - Cons. Oliveira Guimarães -, sumariado nos referidos SUMÁRIOS, EDIÇÃO 2002, p. 366). Isto, sem embargo, como se disse, de o Supremo, ao proceder ao reexame da matéria de direito, não podendo abrir caminho para tal decisão por força de algum dos vícios do art. 410.º n.º 2, conhecer destes com a consequente sanação deles ou o reenvio (total ou parcial) do processo para novo julgamento pelas instâncias. Acontece que, no caso, não se descortina nenhum dos referidos vícios, que os recorrentes invocam de uma forma totalmente artificiosa. Senão veja-se: «Com efeito - dizem eles - ao ser analisado apenas, embora extensivamente, parte da prova, e só sobre factos donde se poderia extrair a legítima defesa (actual) há insuficiência para a decisão da matéria de facto relativa a factos anteriores, como sejam os fixados do n.º 1 a 8 ...» E mais adiante: «Com efeito, ao decidir que as ofendidas C e D nunca pararam de agredir o arguido com o fundamento de que o depoimento de R permite tal interpretação, quando o R diz que pararam e depois disto o arguido puxa da pistola, a testemunha atravessa a estrada (2,5 m.) a fugir, ouve os tiros imediatamente, olha para trás e vê a C já no chão, há evidente contradição entre a fundamentação e a decisão». E mais à frente: «Como consequência dos dois primeiros vícios apontados, e também, autonomamente, resultantes de puro erro da lógica e da valoração da prova, de acordo com as regras gerais da experiência comum, resulta da decisão recorrida e do seu texto, erro notório na apreciação da prova.» Estas passagens bastam para demonstrar que os recorrentes baptizam arbitrariamente de vícios do art. 410.º n.º 2 do CPP pressupostos erros de julgamento no tocante à matéria de facto, de que aqueles claramente se distinguem, desde logo porque, sendo vícios que inquinam a decisão de uma forma ostensiva, não é permitido o recurso à prova produzida para se detectarem os mesmos. «A manifesta improcedência constitui um fundamento de rejeição do recurso de natureza substancial (e não formal), visando os casos em que os termos do recurso não permitem a cognição do tribunal ad quem, como é o recurso para o STJ em que o recorrente discute matéria de facto e o modo como as instâncias apreciaram e decidiram sobre matéria de facto...» (Acórdão do STJ de 28/5/03 - relator: Cons. Henriques Gaspar - Proc. n.º 1666/03- 3). III. DECISÃO 9. Nestes termos, acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em rejeitar os recursos interpostos por F e D, por manifesta improcedência, nos termos do art. 420.º n.º 1 do CPP. 10. Custas pelos recorrentes com 5 Ucs. de taxa de justiça, a que acrescem 4 Ucs. nos termos do art. 420.º n.º 3 do CPP. Supremo Tribunal de Justiça, 15 de Janeiro de 2004 Rodrigues da Costa Carmona da Mota Pereira Madeira Quinta Gomes |