Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
07P3255
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SIMAS SANTOS
Descritores: IMPUTABILIDADE DIMINUIDA
TOXICODEPENDÊNCIA
TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
TRÁFICO DE MENOR GRAVIDADE
Nº do Documento: SJ200710250032555
Data do Acordão: 10/25/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :
1 – O privilegiamento do crime de tráfico de menor gravidade dá-se, não em função da considerável diminuição da culpa, mas em homenagem à considerável diminuição da ilicitude da conduta, que se pode espelhar, designadamente:

– Nos meios utilizados;

– Na modalidade ou nas circunstâncias da acção;

– Na qualidade ou na quantidade das plantas, substâncias ou preparações.

2 – Tal não acontece quando se trata de 4.201,747 grs de cannabis e de 2,730 grs de cocaína, no que se refere à qualidade e quantidade das substâncias em causa.

3 – O mesmo se diga dos meios utilizados, com quantidades que já apontam para um fornecimento intermédio e não somente de pequeno tráfico de rua: a capacidade de armazenamento, a escolha criteriosa do fornecedor, a detenção de 3 balanças destinadas a pesar os estupefacientes, todas com resíduos de cocaína, uma digital de precisão e duas de braço e ponteiro, respectivamente, com escala até 500 grs e 50 gras, o destinar a maior parte da cannabis para venda a terceiros, o que dada a quantidade detectada, seria sempre em quantidade significativa.

4 – Estando provado que o arguido foi e é seguido por médico psiquiatra, apresentando um quadro de depressão, com grande ansiedade, deficiente controlo dos impulsos e insónias muito marcadas; fez terapêutica regular com ansiolíticos, anti-depressivos e estabilizador de humor, sendo que a sua situação tem sido de difícil resolução, necessitando de continuar a terapêutica e o apoio psicoterapêutico regular; era à data dos factos consumidor de cocaína e haxixe, sendo dependente destas substâncias, iniciou os consumos de cocaína cerca de 1 ano antes de ser detido, com consumos intensos nos últimos 6 meses; mas mantém conservada a capacidade de avaliar a licitude ou ilicitude dos actos praticados com algum alheamento da realidade (mas com insight), e comportamentos que denotam desinibição, impulsividade e passagem ao acto, que afectam, sem excluir, a sua capacidade de determinação, não se deve concluir pela imputabilidade diminuída.

5 - O quadro traçado não se afasta do comum à tóxico-dependência, susceptível de diminuir o juízo de censura pelo facto concreto, mas de aumentá-lo pela condução da sua vida, pelas opções que foi tomando. Se a doença do recorrente implica que uma menor culpa, dada a menor capacidade de autodeterminação, também é maior o risco de repetição dos comportamentos, o que deve ser atendido.

Decisão Texto Integral:
1.

O Tribunal Colectivo de Leiria decidiu, por acórdão de 25.5.2007, condenar:

— os arguidos AA, BB, CC e DD, como autores de 1 crime de tráfico de estupefacientes do art. 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22 de Janeiro, respectivamente, nas penas de prisão de 4 anos e 10 meses, de 4 anos, de 5 anos e de 4 anos;
— os arguidos EE, FF e GG, como cúmplices de 1 crime de tráfico de estupefacientes do art. 21.º, n.º 1 do DL 15/93, de 22 de Janeiro, respectivamente, nas penas de prisão de 1 ano, de 10 meses e de 10 meses, suspensas na sua execução pelos períodos, respectivamente, de 2 anos, de 1 ano e de 1 ano;
— o arguido DD como autor de 1 crime do art. 6.º, n.º 1 da Lei n.º 22/97, de 27 de Junho, por força ainda do art. 2.º, n.º 4 do Código Penal, na pena de 6 meses de prisão e, em cúmulo, na pena única de 4 anos e 3 meses de prisão.
Inconformado, recorreu o arguido BB que pede a aplicação do regime previsto nos artigos 20.º n° 1 e n° 2, e 72° e 73.º do C. Penal (conclusões 1ª a 3ª) ou a sua condenação pelo crime de previsto no art. 25° do DL 15/93 de 22/1 (conclusões 4ª a 12ª) e, caso a pena se venha a situar em quantum não superior a 3 anos, que esta seja suspensa na sua execução, condicionando o arguido a um plano de readaptação social (conclusões 13ª a 24ª).

O Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu, concluindo pela improcedência do recurso.

Distribuídos os autos neste Supremo Tribunal de Justiça, teve vista o Ministério Público.

Assinalado o prazo para produção de alegações escritas, o recorrente veio dar como reproduzido o teor da sua motivação de recurso.

Por sua vez, o Ministério Público neste Tribunal alegou, concluindo pela improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, teve lugar a conferência, pelo que cumpre conhecer e decidir.

2.1.

E conhecendo.

Antes de entrar na apreciação das questões suscitadas importa reter a factualidade apurada:

Factos provados:

1) No dia 22 de Dezembro de 2005, por volta das 19:00 horas, os arguidos AA e EE, fazendo-se transportar no veículo com a matrícula ..., Peugeot 206, de cor cinzenta, saíram de Torres Novas e depois de terem percorrido o trajecto até à A1, tomaram a direcção do norte.

2) De seguida, depois de terem viajado até pelo menos à zona de Valença do Minho e terem passado a fronteira para Espanha, onde o arguido AA comprou cocaína, tomaram o caminho de regresso a Torres Novas.

3) Quando chegaram às portagens da A23, na saída de acesso a Torres Novas, por volta das 03:30 horas do dia 23 de Dezembro de 2005, o arguido AA transportava no porta-luvas da aludida viatura, na ocasião conduzida pela arguida EE, uma embalagem em plástico em cor branca contendo cocaína com o peso bruto de 97,86 gramas.

4) A arguida EE sabia, desde o início da viagem, que a mesma tinha como finalidade a aquisição da supra referida cocaína pelo arguido AA.

5) Nesse dia 23 de Dezembro de 2005, pelas 04:00 horas, o arguido AA guardava, no interior da casa onde habitava com a arguida EE, sita na Rua da Bênção do Gado, nº ..., Riachos, Torres Novas, além do mais, o seguinte: - Um “sabonete” e meio, além de diversos pedaços, de uma substância com cerca de 423,36 gramas; - Um peso metálico de cor acastanhada com a gravação 50 g; - Uma balança digital de marca “Kern”, modelo 466-41; - Uma balança digital de cor branca, marca “Skrebba”, modelo 2000I; - Uma balança metálica manual, com três pesos; - Uma balança metálica manual com nove pesos diferentes de gramas e seis pesos diferentes de miligramas; - Um resto de embrulho vazio, de cor amarelado no exterior e forrado a borracha preta no interior; e - Um resto de embrulho, vazio, de plástico, de cor transparente.

6) A embalagem em plástico de cor branca transportada no porta-luvas da aludida viatura submetida a exame revelou ser cocaína (cloridrato) com um peso líquido de 95,133 gramas.

7) O aludido “sabonete” e meio, bem assim como os diversos pedaços de uma substância, submetidos a exame, revelaram ser canabis (resina) com um peso líquido de 416,394 gramas.

8) A aludida balança digital de marca “Kern”, modelo 466-41, submetida a exame, revelou possuir vestígios de cocaína.

9) O aludido resto de embrulho vazio, de cor amarelada no exterior e forrado a borracha preta no interior, submetido a exame, revelou possuir vestígios de cocaína.

10) O aludido resto de embrulho, vazio, de plástico, de cor transparente, submetida a exame, revelou possuir vestígios de cocaína.

11) O arguido AA pretendia vender a terceiros a maior parte da cocaína que lhe foi apreendida, supra referida.

12) A balança “Kern”, modelo 466-41, destinava-se a ser utilizada pelo arguido AA na pesagem da cocaína que adquiria em bruto, designadamente, quando a dividia em porções mais pequenas a fim de a vender a quem o procurasse para tal efeito.

13) Os aludidos restos de embrulhos haviam servido para transportar cocaína.

14) Por volta do dia 19 de Dezembro de 2005, o arguido AA não possuía crédito junto do seu fornecedor de cocaína que só lhe entregava tal estupefaciente contra o seu pagamento imediato e em dinheiro vivo.

15) Além disso, simultaneamente, encontrava-se a atravessar uma acentuada falta de disponibilidades monetárias que lhe estavam a inviabilizar a continuação da sua actividade de compra e venda de cocaína.

16) Com o intuito de ultrapassar tais dificuldades o arguido AA entrou em contacto com o arguido FF e pediu-lhe 500 contos (€ 2.500,00) emprestados, a fim de ir adquirir cerca de 100 gramas de cocaína ao seu fornecedor espanhol.

17) Face a tal pedido e com o intuito de não frustrar a projectada aquisição de cocaína, o arguido FF emprestou-lhe € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros).

18) Foi com tal dinheiro que o arguido AA adquiriu os 95,133 gramas de cocaína (cloridrato) que lhe foram apreendidos no dia 23 de Dezembro de 2005.

19) Sem tal importância emprestada, o arguido AA não teria adquirido o indicado estupefaciente.

20) Tal facto era do conhecimento do arguido FF quando efectuou tal empréstimo.

21) No dia 12 de Janeiro de 2006, pelas 22:00 horas, junto à entrada da garagem do n.º ... da Avenida das Laranjeiras, Alfragide, o arguido BB trazia uma bolsa à cintura na qual, além do mais, transportava os seguintes bens:

- Uma nota de dez euros emitida pelo BCE, com o n.º de série T22867258299, dobrada, que continha no seu interior um produto em pó de cor branca com o peso aproximado de 1,00 grama, e

- Um invólucro próprio para guardar um rolo fotográfico que continha no seu interior uma embalagem em plástico com um produto em pó de cor branca, com o peso aproximado de 3,10 gramas.

22) Na mesma ocasião e local o arguido BB transportava num saco desportivo colocado no interior do veículo com a matrícula ..., de marca Ford, modelo Fiesta, sete placas, vulgo “sabonetes”, de uma substância com um peso de cerca de 1796 gramas

23) Nessa mesma altura o arguido guardava na sua casa de habitação, sita na Avenida das Laranjeiras, n.º ..., 12.º Esq., Alfragide, os seguintes bens: - Oito placas, vulgo “sabonetes”, bem assim como seis porções de uma substância, tudo com o peso de cerca de 2258 gramas; - Uma balança de precisão, de marca “Tanita”, modelo 1479V; - Uma balança de prato e ponteiro, marca “Syro”, com escala até 500 gramas; e - Uma balança de prato e ponteiro, de marca “Syro”, com escala até 50 gramas.

24) A aludida substância guardada na nota de dez euros emitida pelo BCE, com o n.º de série T22867258299, submetida a exame revelou ser cocaína (cloridrato) com um peso líquido de 0,080 gramas.

25) A aludida substância guardada na embalagem em plástico que se encontrava no interior do invólucro próprio para guarda um rolo fotográfico, submetida a exame, revelou ser cocaína (cloridrato) com um peso líquido de 2,650 gramas.

26) As aludidas 15 placas, vulgo “sabonetes”, e as seis porções de uma substância, submetidas a exame, revelaram ser canabis (resina) com um peso líquido de 4.201,747 gramas.

27) As aludidas três balanças, submetidas a exame, revelaram possuir resíduos de cocaína.

28) O arguido BB pretendia vender a terceiros a maior parte da canabis que lhe foi apreendida.

29) As aludidas balanças destinavam-se a ser utilizadas pelo arguido BB na pesagem de estupefacientes que adquiria.

30) O arguido GG apresentou ao arguido BB a pessoa que vendeu ao arguido BB os “sabonetes” de canabis referidos na al. 22) destes Factos Provados, tendo o arguido GG assegurado ao arguido BB a qualidade daquela canabis e informado o arguido BB dos preços da sua aquisição.

31) Para o arguido BB poder verificar a qualidade da canabis fornecida pela pessoa que lhe fora apresentada pelo arguido GG, pelo menos uma vez os arguidos BB e GG fumaram dessa canabis juntos, trazida pelo arguido GG – o que sucedeu no final do ano de 2005.

32) No dia 13 de Março de 2006, pelas 01.26 horas, em Peniche, quando se encontrava na viatura com a matrícula ..., o arguido CC foi abordado por agentes da Polícia Judiciária que, após revista sumária (de segurança), o conduziram às instalações da Brigada Fiscal, em Peniche, num veículo ao serviço da Polícia Judiciária.

33) Durante tal percurso, o arguido CC que se encontrava na posse de 16 pequenos embrulhos, vulgo “panfletos”, com uma substância de cor branca com o peso bruto de 13,705 gramas, colocou-os no compartimento adjacente à porta do lado direito do veículo automóvel em que seguiam.

34) No dia 13 de Março de 2006, pelas 07.30 horas, na sua casa de habitação sita na casa de habitação sita na Rua Cruz das Almas, ..., 2. º andar, em Peniche, o arguido CC guardava os seguintes bens: - Um pedaço de produto castanho, com o peso líquido de 78,144 gramas; - 850.000$00 (oitocentos e cinquenta mil escudos) em notas emitidas pelo Banco de Portugal; - € 1.500,00 (mil e quinhentos euros) em notas emitidas pelo Banco Central Europeu, e - Um pedaço de uma substância castanha com o peso líquido de 0,37 gramas, guardado no interior de uma caixa de metal.

35) A substância de cor branca encontrada nos aludidos 16 “panfletos”, submetida a exame, revelou ser cocaína (cloridrato) com um peso líquido de 11,796 gramas.

36) O aludido pedaço de produto castanho, submetida a exame, revelou ser canabis (resina) com um peso líquido de 78,144 gramas.

37) O pedaço de uma substância castanha que se encontrava guardado no interior de uma caixa de metal, submetida a exame, revelou ser canabis (resina) com um peso líquido de 0,218 gramas.

38) O arguido CC pretendia vender a terceiros pelo menos parte dos produtos estupefacientes que lhe foram apreendidos.

39) Os € 1.500,00 em notas emitidas pelo Banco Central Europeu, que foram apreendidos ao arguido CC, resultaram da venda de estupefacientes.

40) No dia 13 de Março de 2006, o arguido DD, em Peniche, encontrava-se no banco traseiro do veículo Citroën C8 referido na al. 32) destes Factos Provados, levando, no chão, junto a si, uma garrafa própria para água, com capacidade para 0,5 litros, marca “Serra da Estrela”, contendo no seu interior um “pacote” com uma substância de cor branca com o preso bruto de 0,177 gramas.

41) No dia 13 de Março de 2006, da parte da manhã, o arguido DD guardava na sua casa de habitação, sita na Rua Dom Luís Ataíde, nº ..., Peniche, os seguintes bens: - Cinco embalagens com uma substância com o peso bruto de 3,862 gramas; - Um frasco de rolo fotográfico com uma pequena “pedra” embrulhada em papel de prata; - Uma embalagem de maço de tabaco SG Ventil, com vários pedaços de papel de prata e uma “pedra”; - Uma balança de precisão, de marca KeenOptics, - Um espelho com 15 cm x 10 cm, com resíduos de uma substância; - Uma balança de precisão de marca Kern, modelo 440-47; - Uma balança de precisão; - Uma caixa de medicamento de marca REDRATE (20 carteiras), com 22 carteiras; - Dezenas de pedaços de plástico cortados em redondo, vulgarmente utilizados para acondicionar estupefaciente para venda ao consumidor; - Uma pistola de calibre 6,35 mm, com o respectivo carregador com seis munições; - € 1.900,00 em notas emitidas pelo Banco Central Europeu e - 32 embalagens de um produto de cor branca, com o peso bruto de 30,81 gramas, guardadas no interior de uma embalagem de medicamentos “Calcium-Sandoz forte”.

42) A aludida substância de cor branca que se encontrava no interior da garrafa própria para água, submetida a exame, revelou ser cocaína (cloridrato), com um peso líquido de 0,053 gramas.

43) O aludido espelho com 15 cm x 10 cm, submetido a exame, revelou conter resíduos de cocaína.

44) As aludidas cinco embalagens continham uma substância que, submetida a exame, revelou ser cocaína (cloridrato), com um peso líquido de 3,416 gramas.

45) A aludida “pedra” guardada numa embalagem de plástico própria para rolos fotográficos, submetida a exame, revelou ser canabis (resina), com um peso líquido de 2,280 gramas.

46) A aludida pedra guardada numa embalagem de maço de tabaco SG Ventil, submetida a exame, revelou ser canabis (resina), com um peso líquido de 0, 088 gramas .

47) A aludida balança de precisão, de marca KeenOptics, submetida a exame, revelou possuir vestígios de cocaína.

48) A aludida balança de precisão de marca Kern, modelo 440-47, submetida a exame, revelou possuir vestígios de cocaína.

49) O produto de cor branco que se encontrava no interior da aludida embalagem de medicamentos “Calcium-Sandoz forte”, submetido a exame revelou ser cocaína (cloridrato) com um peso líquido de 29,309 gramas.

50) As aludidas balanças destinavam-se a ser utilizadas pelo arguido DD na pesagem dos estupefacientes adquiridos em bruto a fim de os mesmos serem divididos em porções mais pequenas para venda às pessoas que para o efeito o procuravam.

51) O arguido DD pretendia utilizar os aludidos pedaços de plástico cortados em redondo para acondicionar os estupefacientes que vendia a retalho.

52) O arguido DD pretendia vender a terceiros a maior parte dos produtos estupefacientes que lhe foram apreendidos.

53) As 22 carteiras do medicamento de marca REDRATE que foram apreendidas ao arguido DD destinavam-se a servir como produto de corte da cocaína que comercializava.

54) Os € 1.900,00 em notas emitidas pelo Banco Central Europeu que foram aprendidos ao arguido DD eram produto do comércio de estupefacientes.

55) A aludida arma apreendida ao arguido DD, submetida a exame, revelou ser uma pistola semi-automática, de calibre 6,35 mm Browning (.25 ACP ou .25 Auto na designação anglo-americana) de marca FN (Fabrique Nationale), modelo “BABY”, com o n.º de série 115434, de origem belga, com o respectivo carregador com seis munições, encontrando-se tudo em boas condições de utilização e funcionamento.

56) O arguido DD não possui nem nunca possuiu licença de uso e porte da arma que lhe foi apreendida.

57) Durante o ano de 2005, HH consumiu cocaína uma a duas vezes por semana.

58) Para satisfazer tal consumo, o HH adquiria tal produto ao arguido AA na quantidade de um ou dois gramas de cada vez, pagando à razão de € 50,00 (cinquenta euros) o grama.

59) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições, o HH, usando o telemóvel com o n.º ..., ligava para o arguido AA a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da respectiva entrega.

60) Após, o HH deslocava-se ao local combinado que, em regra, era no centro da cidade de Torres Novas ou junto da casa de habitação do AA e concretizavam a transacção previamente acordada.

61) Durante os anos de 2004 e 2005, II consumiu cocaína em regra uma vez por mês.

62) Para satisfazer tal consumo, o II adquiria tal produto ao arguido AA na quantidade de meio grama ou um grama de cada vez, pagando por cada uma das aludidas quantidades, respectivamente, € 30,00 (trinta euros) ou € 55,00 (cinquenta e cinco euros).

63) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições o II, usando o telemóvel com o n.º ..., ligava para o arguido AA a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da sua entrega.

64) Após, o II deslocava-se ao local combinado que, em regra, era em Torres Novas, perto da Escola Secundária ou nas imediações do Mc.Donald’s, e concretizavam a transacção previamente acordada.

65) Até finais de 2005 e desde o ano de 2003, JJconsumiu cocaína.

66) Para satisfazer tal consumo, o JJ adquiria tal produto ao arguido AA uma a três vezes por mês, na quantidade de um grama de cada vez pagado, pagando € 55,00 (cinquenta e cinco euros) o grama.

67) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições o JJ, usando o telemóvel com o n.º ..., ligava para o arguido AA a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da sua entrega.

68) Após, o JJ deslocava-se ao local combinado que, em regra, era no centro da cidade de Torres Novas, junto ao Modelo e concretizavam a transacção previamente acordada.

69) Pelo menos desde meados de 2004 até princípios do ano de 2006, LL consumiu haxixe.

70) Para satisfazer tal consumo, o LL adquiria tal produto ao arguido CC, com a periodicidade de um mês e meio a dois meses, nas quantidades de 10 (dez) a 20 (vinte) gramas de cada vez, pagando por tais quantidades respectivamente € 25,00 (vinte e cinco euros) e € 50,00 (cinquenta euros).

71) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições, o LL usando os telemóveis com os n.os ..., ... e ... ligava para o arguido CC a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da sua entrega.

72) Após, o LL deslocava-se ao local combinado que, em regra, era em Peniche, na residência do arguido CC ou na rua ou então era o próprio CC que se deslocava a Alverca junto a umas bombas de combustíveis, e em tais locais concretizavam a transacção previamente acordada.

73) Pelo menos desde o ano 2004, MM consumiu haxixe e cocaína.

74) Para satisfazer tal consumo, o MM adquiriu ao arguido CC cocaína na quantidade de um grama de cada vez, pagando € 45,00 (quarenta e cinco euros) a € 50,00 (cinquenta euros) por cada fornecimento, e pedaços de canabis ao preço de € 10,00 (dez euros) ou € 20,00 (vinte euros) cada, conforme o tamanho.

75) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições o MM, usando o telemóvel com o n.º ..., ligava para o arguido CC a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da sua entrega.

76) Após, o MM ou aguardava junto da sua casa ou deslocava-se à casa do arguido CC e concretizavam a transacção previamente acordada.

77) Pelo menos desde finais do ano de 2004 até princípios de 2006, NN consumiu cocaína.

78) Para satisfazer tal consumo, o NN adquiria tal produto ao arguido CC na quantidade de dois a três gramas de cada vez, pagando-a à razão de € 50,00 (cinquenta euros) o grama.

79) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições, o NN, usando o telemóvel com o n.º ..., ligava para o arguido CC a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da sua entrega.

80) Após, deslocava-se ao local combinado que, em regra, era em Peniche ou no Intermarché da Lourinhã.

81) Uma dessas entregas de estupefaciente ocorreu no dia 28 de Outubro de 2005, pelas 18:35 horas, no parque de estacionamento do Intermarché da Lourinhã.

82) Pelo menos desde os princípios do ano de 2002 até princípios do ano de 2006, OO consumiu haxixe.

83) Para satisfazer tal consumo, o OO adquiria tal produto ao arguido CC à razão de uma placa todos os meses, pela qual pagava a quantia de € 25,00 (vinte e cinco euros).

84) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições, o OO, usando o telemóvel com o n.º ..., ligava para o arguido CC a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da sua entrega.

85) Após, o OO deslocava-se ao local combinado que, em regra, era na casa do próprio CC, em Peniche, e concretizavam a transacção previamente acordada.

86) Pelo menos desde os princípios do ano de 2004 até os princípios de 2006, PP consumiu haxixe.

87) Para satisfazer tal consumo, o PP adquiriu tal produto ao arguido CC entre duas a três vezes por mês, na quantidade de uma “língua” de haxixe de cada vez, pagado por cada aquisição a quantia de € 25,00 (vinte e cinco euros).

88) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições, o PP, usando o telemóvel com o n.º ..., ligava para o arguido CC a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da sua entrega.

89) Após, o PP deslocava-se ao local combinado que era sempre na zona de Peniche, designadamente em casa do arguido CC, e concretizavam a transacção previamente acordada.

90) Desde os princípios do ano de 2005 até princípios do ano de 2006, QQ consumiu cocaína.

91) Para satisfazer tal consumo, a QQ adquiria tal produto ao arguido DD na quantidade de um ou dois gramas por semana, pagando-a à razão de € 45,00 (quarenta e cinco euros) a 50,00 (cinquenta euros) o grama.

92) Em regra, para efeito de concretizar tais aquisições a QQ, usando o telemóvel com o n.º ..., ligava para o arguido DD a informá-lo da quantidade de estupefacientes que pretendia e a combinarem o local da sua entrega.

93) Após, a QQ deslocava-se ao local combinado que, em regra, era junto da casa do DD e concretizavam a transacção previamente acordada.

94) Pelo menos desde os princípios do ano de 2004 até aos princípios de 2006, RR consumiu haxixe (canabis).

95) Para satisfazer tal consumo, a RR adquiria tal produto ao arguido BB em quantidades variáveis que, em média, se situavam entre 20 a 30 gramas de cada vez, por vezes semanalmente. Numa ocasião, a RR adquiriu ao arguido BB um “sabonete” de haxixe com cerca de 250 gramas.

96) Além disso, durante o aludido período de tempo, por vezes o BB ofereceu amostras de haxixe à RR a fim de ela testar a qualidade dos produtos que ele comercializava.

97) No dia 28 de Outubro de 2005, pelas 00:40 horas, no Largo do Santuário Nossa Senhora dos Remédios, em Peniche, o arguido AA encontrou-se com o arguido CC.

98) Os estupefacientes vendidos pelo arguido DD, bem assim como aqueles em cuja posse o arguido DD foi encontrado, tinham-lhe sido fornecidos pelo arguido CC.

99) Parte das vendas de cocaína feitas pelo arguido DD eram-no por conta do arguido CC.

100) Os arguidos actuaram sempre de forma de forma livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas lhes eram proibidas por lei.

101) O arguido AA consentiu que as autoridades policiais fizessem a busca à sua residência.

102) Os arguidos AA e EE eram ambos consumidores de cocaína e haxixe.

103) O agregado familiar dos arguidos AA e EE é composto pelos mesmos e três filhos, que em Janeiro de 2006 tinham 20 anos, 16 anos e 10 meses respectivamente. Os filhos de 20 e 16 anos eram estudantes. Aquando da detenção dos arguidos neste processo, residiam em moradia com três quartos, sala, cozinha e casa de banho, arrendada.

104) Até 1994, a arguida EE dedicou-se exclusivamente a actividades domésticas e educação dos filhos. Nesse ano, juntamente com o arguido AA, constituiu uma firma no ramo comercial de artigos de equitação. Ambos os arguidos apresentaram um projecto no Ministério da Agricultura no sector da agricultura biológica.

105) Aquando da sua detenção nestes autos, os arguidos AA e EE não desenvolviam qualquer actividade profissional, perspectivando iniciar a curto prazo o projecto de agricultura biológica. As suas necessidades essenciais eram asseguradas por economias que possuíam decorrentes de vendas de imóveis.

106) Actualmente, a arguida EE vive em casa da sua mãe e trabalha num hotel em Torres Novas, em horário nocturno.

107) O arguido AA tem mantido, no Estabelecimento Prisional em que se encontra detido, uma conduta isenta de reparos desde a sua entrada naquele Estabelecimento.

108) O arguido AA é considerado como pessoa honesta nos negócios.

109) O arguido FF tem sido acompanhado por médico psiquiatra por quadro de abuso de cocaína, em relação ao qual se encontra actualmente compensado, não consumindo desde o início de 2006.

110) O arguido FF é o primeiro descendente de um grupo de quatro elementos. Os seus pais proporcionaram aos filhos uma vida material sem grandes contrariedades, enquanto que a relação de afecto foi colocada um pouco para segundo plano.

111) O arguido FF teve uma dinâmica familiar instável, mas revela desenvolver capacidades no domínio interpessoal, mantendo bons laços de amizade e de inter ajuda.

112) Iniciou o percurso escolar em idade normativa, tendo passado por diversas instituições escolares em consequência do facto de a sua família mudar de residência várias vezes. Apesar de registar momentos positivos e de forte adaptação aos novos locais de ensino, revelou alguma instabilidade emocional que se veio a reflectir no seu comportamento e, após sucessivas reprovações, decide abandonar os estudos terminando o 7.º ano complementar dos liceus.

113) O arguido FF começou a trabalhar nas vindimas, e passado algum tempo, por iniciativa do seu avô paterno, tomou para si as responsabilidades de algumas actividades rurais em quintas propriedade deste seu avô. Em 1983, foi integrado na empresa Papel Renova, sendo o seu avô paterno um dos sócios accionistas. O arguido passou a ter responsabilidades ligadas à gestão de um sector produtivo, onde ainda se mantém. Com o falecimento do avô paterno e do pai, herdou com os seus irmãos as acções daquela empresa.

114) Por volta dos 16/17 anos, o arguido FF experimentou drogas leves, passando para as anfetaminas e cocaína. Por volta dos 21/22 anos, com o objectivo de parar o consumo de drogas, iniciou um percurso de vida ligado ao álcool, mas consumindo em simultâneo estupefacientes.

115) Há dez anos atrás, com a ajuda da família e acompanhamento clínico privado, o arguido FF delineou um projecto terapêutico consistente, com grande investimento pessoal, estando abstinente de álcool desde então.

116) Quanto ao consumo de estupefacientes, o arguido FF iniciou tratamento terapêutico em 2003, acompanhamento que se traduzia pela irregularidade. Nos finais de 2005, o arguido retomou esse tratamento, com maior empenho pessoal.

117) Para comprar os estupefacientes que consumia anteriormente, o arguido FF vendeu as acções da empresa Renova e outros bens que herdou da família.

118) O arguido FF é casado e tem três filhos, decorrendo a dinâmica familiar com alguns incidentes por problemas de ordem económica fruto dos seus comportamentos aditivos. Reside com a esposa e os três filhos, de 16, 15 e 12 anos. Em Setembro de 2006, mudaram de residência para a cidade de Torres Novas, para acompanharem melhor a fase etária dos filhos. Actualmente, o quadro familiar pauta-se pela estabilidade, sendo que a esposa do arguido lhe dá todo o apoio.

119) O arguido FF aufere, como papeleiro, € 1.400,00, rendimento que é canalizado para saldar dívidas ao banco. A esposa é professora, auferindo € 1.600,00 mensais. Têm despesas mensais com renda de casa, mensalidade do colégio do filho mais novo, deslocações e consumos domésticos na ordem dos € 1.085,00.

120) A nível social, o arguido FF possui uma imagem positiva tanto na localidade de Pedrógão como na cidade de Torres Novas.

121) O arguido FF colabora nas actividades de basquetebol juvenil, praticado por um dos seus filhos, actividade que retomou, após algum abandono quando atravessava a fase mais recente de consumo de cocaína.

122) Quando consumia cocaína, o arguido FF adquiriu tal substância ao arguido AA, de quem é amigo.

123) O arguido BB autorizou a busca realizada à sua residência.

124) O arguido BB indicou às autoridades policiais onde era a residência do arguido GG.

125) O arguido BB residia, antes de ser detido, com uma companheira em casa adquirida por ambos com recurso a empréstimo bancário, pagando atempadamente € 600,00 mensais.

126) O casal vive em união de facto há cerca de 12 anos, numa relação aparentemente estável. A companheira, coadjuvada pela sua mãe e pela mãe do arguido, tem-no apoiado na actual situação de reclusão.

127) As relações familiares apresentam-se afectivas e solidárias, sendo que as figuras das progenitoras de ambos os lados do casal constituem um apoio constante a nível emocional.

128) O arguido BBconcluiu o 12.º ano e iniciou logo a sua vida profissional.

129) Desempenhou várias actividades com empenho, procurando sempre progredir e sendo considerado, quer por clientes, quer por colegas, como um profissional exemplar, honesto, bom colega e trabalhador.

130) Quando foi detido nestes autos, o arguido BB encontrava-se de baixa médica prolongada, na sequência de um acidente de viação ocorrido no Verão de 2004, recebendo subsídio de doença desde Setembro de 2004 até 16 de Abril de 2006, o qual ascendeu aos valores descritos nos documentos juntos a fls. 2779 a 2797 e 2842, cujo teor se dá aqui por reproduzido.

131) O arguido BB foi seguido por médico psiquiatra desde Julho de 2004, apresentando um quadro de depressão, com grande ansiedade, deficiente controlo dos impulsos e insónias muito marcadas. Fez terapêutica regular com ansiolíticos, anti-depressivos e estabilizador de humor, sendo que a sua situação tem sido de difícil resolução, necessitando o arguido de continuar a terapêutica e o apoio psicoterapêutico regular.

132) O arguido tem vindo a ser acompanhado pelo médico Psiquiatra Dr. M...V..., e o seu esquema de tratamento implica a tomada dos medicamentos descritos no documento de fls. 2756, cujo teor se dá aqui por reproduzido.

133) À data dos factos supra descritos, o arguido BB era consumidor de cocaína e haxixe, sendo dependente destas substâncias.

134) Entretanto, depois da sua detenção, deixou de consumir cocaína.

135) O arguido BB iniciou o consumo de estupefacientes com o haxixe aos 18 anos, sendo que aos 19 anos passou a fazer consumos diários que manteve ininterruptamente até à actualidade. Na altura da sua detenção nestes autos, consumia cerca de dois gramas por dia.

136) O arguido BB iniciou os consumos de cocaína cerca de um ano antes de ser detido, com consumos intensos nos últimos seis meses.

137) O arguido BB evidencia um padrão de uso e abuso de haxixe e cocaína, com sintomas psicóticos (englobável na rubrica F19.5.55 da 10.ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde, CID 10) , com consumo de haxixe pelo menos até Dezembro de 2006, mas mantendo conservada a capacidade de avaliar a licitude ou ilicitude dos actos supra descritos que praticou. Apresenta, entre outros sintomas, ideias deliróides (de conteúdo persecutório) e de auto referência, algum alheamento da realidade (mas com insight), e comportamentos que denotam desinibição, impulsividade e passagem ao acto, que afectam, sem excluir, a sua capacidade de determinação.

138) Em 7 de Dezembro de 2006, o arguido BB não apresentava sinais somáticos de relevo.

139) A situação clínica do arguido BB aconselha que deva ter regular e adequado acompanhamento médico-psiquiátrico (psicofarmacológico e psicoterapêutico), como forma de influenciar positivamente o prognóstico do contexto clínico em presença.

140) O arguido BB vendia haxixe a um número não concretamente apurado de pessoas.

141) Com tal venda, o arguido BB pretendia nomeadamente angariar dinheiro para poder consumir cocaína.

142) O arguido BB declarou ter motivação para não voltar a consumir estupefacientes; é regularmente visitado no Estabelecimento Prisional pela sua família.

143) O arguido GG tem infecção por VIH 1, conhecida desde 1992, sendo acompanhado regularmente na consulta de Medicina/Imunodeficiência do Hospital do Desterro desde 2000, encontrando-se sob terapêutica retroviral com provável evolução imunológica e virulógica. Tem ainda Hepatite C, estando programada reinstituição de terapêutica que já iniciou mas que teve que interromper por efeitos adversos. Tem passado de toxicodependência endovenosa (heroína e cocaína), sem consumos desde 1994.

144) Por causa do seu estado de saúde, o arguido GG não pode trabalhar regularmente.

145) O arguido GG consome haxixe, como forma de lhe abrir o apetite, em face do seu estado de saúde, ajudando-o ainda a descansar à noite.

146) O arguido GG vive com a sua companheira, auxiliando-a na empresa de contabilidade da mesma.

147) O arguido GG apresenta uma relação estável com a sua companheira, que o apoia, e círculo de amigos.

148) O arguido GG é considerado como pessoa íntegra, respeitadora e com grande força de vontade.

149) O arguido GG e a sua companheira têm um rendimento médio mensal de € 700,00. Pagam € 400,00 de prestação pela aquisição da casa que habitam. Contam com a ajuda dos seus pais.

150) O arguido CC, antes de ser detido, residia com a sua companheira, doméstica, e o filho que hoje tem 9 anos.

151) O arguido CC iniciou o consumo esporádico de haxixe aos 16-17 anos, heroína fumada aos 27 anos e cocaína ocasional desde os 36 anos, mantendo ao longo deste tempo o haxixe. Está abstinente desde a sua detenção.

152) O arguido CC, antes de ser detido, exercia a profissão de motorista num clube local, auferindo o salário mensal de cerca de €400,00.

153) O arguido CC é o primeiro de uma fratria de três irmãos, com quem mantém uma boa relação, assim como com os pais.

154) Aos 6 anos de idade, o arguido CC ingressou na escola, concluindo o ensino básico sem reprovações. Concluiu o 9.º ano após ter reprovado. Não concluiu o ensino complementar, faltando-lhe a disciplina de matemática. Deixou de estudar aos 20 anos e fez o serviço militar.

155) Aos 22 anos, o arguido CC iniciou a sua vida no mundo laboral, como nadador-salvador, durante 2 anos. Teve posteriormente outros empregos, como padeiro e professor de educação física e francês. Trabalhou 4 anos na construção civil no Canadá e 6 meses na Alemanha.

156) O arguido CC tem Coeficiente de Inteligência de tipo Médio/Bom. Não apresenta compatibilidade com o quadro de dependência de drogas, apesar de delas ser consumidor, sobretudo de haxixe.

157) A nível de personalidade, o arguido CC tem de si uma imagem tímida mas organizada e estruturada, usando frequentemente mecanismos de defesa de tipo sublimatório, não aparentando apresentar critérios de específica perturbação da personalidade.

158) O arguido CC é bem considerado pelas pessoas da localidade onde reside.

159) O arguido CC é proprietário de um prédio urbano – fracção C do art. 1699.º da freguesia de Ajuda, Peniche –, onde residia antes de ser detido, pagando por mês € 160,92 pela prestação do empréstimo para a sua aquisição.

160) A pistola apreendida ao arguido DD foi pertença do seu pai, S...P...D..., o qual faleceu em 3 de Dezembro de 1993.

161) As balanças apreendidas em casa do arguido DD eram pertença do arguido CC, e estavam na casa habitada pelo arguido DD a pedido do arguido CC, para o filho deste não ver.

162) Em compensação pela actuação descrita na al. 99) destes factos Provados, o arguido CC deixava que o arguido DD consumisse cocaína sem pagar.

163) O arguido DD é o primeiro filho de uma fratria de três irmãos, com quem mantém uma relação diversificada. Mantém uma boa relação com a sua mãe, em casa de quem vivia antes de ser detido.

164) Ingressou na escola aos 6 anos de idade, concluindo o 1.º ciclo aos 9 anos. Frequentou o 2.º ciclo, reprovou o 5.º ano de então por faltas. Frequentou o curso complementar de contabilidade, mas não o concluiu.

165) Iniciou a sua vida no mundo laboral aos 21 anos de idade, como empregado de escritório numa empresa de congelados e, desde 1993, com a falência da empresa, trabalha com a sua mãe numa casa de pasto/restaurante criada pelo pai.

166) Antes de ser detido, residia na habitação arrendada pela sua mãe, contígua ao mencionado restaurante.

167) Iniciou o consumo de drogas aos 17 anos, a fumar haxixe. Desde 2002 para cá, passou a fumar e a inalar cocaína 3 a 4 vezes por semana.

168) O arguido DD tem Coeficiente de Inteligência de tipo Médio/Bom. Não apresenta compatibilidade com o quadro de dependência de drogas. A nível de personalidade, tem de si uma imagem de pessoa respeitadora dos outros, diz-se católico praticante e acreditar em Deus, não aparentando apresentar critérios de específica perturbação da personalidade.

169) O arguido DD é bem considerado pelas pessoas da localidade onde reside, tendo sempre levado uma vida modesta.

170) Os arguidos demonstraram arrependimento.

171) Do Certificado de Registo Criminal dos arguidos nada consta.

172) Ao arguido AA foram apreendidos os objectos constantes dos autos de fls. 854, 856, 858-859.

173) Ao arguido BB foram apreendidos os bens constantes dos autos de fls. 1046, 1047, 1052-1053.

174) Ao arguido CC foram apreendidos os bens constantes dos autos de fls. 1330, 1334-1335.

175) Ao arguido DD foram apreendidos os bens constantes dos autos de fls. 348, 1349, 1352-1353.

Factos não provados.

Com pertinência para a causa não resultaram provados todos os demais factos da acusação e das contestações que não constam do rol de factos provados, e nomeadamente:

a) Que a arguida EE tenha pessoalmente intervindo na aquisição da cocaína referida nas als. 2) e 3) dos Factos Provados.

b) Que essa cocaína fosse transportada pela arguida EE.

c) Que os objectos apreendidos ao arguido AA fossem também guardados pela arguida EE.

d) Que todo o estupefaciente detido pelo arguido AA se destinasse a ser vendido a terceiros.

e) Que a arguida EE pretendesse vender a terceiros os produtos estupefacientes apreendidos ao arguido AA.

f) Que a arguida EE utilizasse as balanças apreendidas ao arguido AA na pesagem de cocaína.

g) Que a arguida EE tenha adquirido cocaína em bruto, e que a arguida tenha dividido cocaína em porções mais pequenas para serem vendidas a terceiros.

h) Que as restantes balanças apreendidas ao arguido AA, para lá da referida na als. 8) e 12) dos Factos Provados, se destinassem a ser usadas na pesagem de cocaína.

i) Que a cocaína que estava anteriormente nos restos de embrulhos apreendidos ao arguido AA tivesse sido colocada no mercado pelos arguidos AA e EE.

j) Que todo o estupefaciente detido pelo arguido BBse destinasse a ser vendido a terceiros.

k) Que após a pesagem de estupefacientes nas balanças que lhe foram apreendidas, o arguido BB os dividisse em porções mais pequenas conforme a pesagem que tivesse sido efectuada.

l) Que os 4.202,270 gramas de canabis (resina) apreendida ao arguido BBlhe tenham sido entregues pelo arguido GG.

m) Que o arguido GG tenha intervindo em algo mais, relacionado com o arguido BB, do que o que ficou descrito nas als. 30) e 31) dos Factos Provados.

n) Que a cocaína referida na al. 33) dos Factos Provados tivesse um peso bruto superior a 13,705 gramas.

o) Que todo o estupefaciente detido pelo arguido CC se destinasse a ser vendido a terceiros.

p) Que os Esc. 850.000$00 apreendidos ao arguido CC tenham resultado da venda de estupefacientes.

q) Que todo o estupefaciente detido pelo arguido DD se destinasse a ser vendido a terceiros.

r) Que quando o arguido CC se encontrava ausente de Peniche, o MM, por indicação do arguido CC, ia adquirir cocaína ao arguido DD e, para efectivar tais transacções, conforme o previamente combinado via telemóvel, ou o MM se deslocava a casa do DD ou era este que se deslocava a casa do MM.

s) Que um dos fornecimentos do arguido CC a OO tenha ocorrido no dia 31/10/2005, ao princípio da noite quando o OO se dirigiu à casa do arguido CC.

t) Que os arguidos tenham cedido estupefacientes com maior frequência, em quantidade superior, por preço superior e em local diverso daqueles que constam das als. 57) a 96) dos Factos Provados às pessoas ali indicadas.

u) Que no dia 28 de Outubro de 2005, os arguidos AA e CC se tenham encontrado em Leiria, e que nessa ocasião o arguido AA tenha entregue cocaína ao arguido CC.

v) O descrito nos arts. 111.º e 112.º da acusação.

w) Que todas as vendas de cocaína feitas pelo arguido DD tenham sido feitas por conta do arguido CC.

x) O descrito na contestação do arguido FF que não conste no rol de factos provados, nomeadamente:

- que o arguido AA tenha adiantado estupefacientes ao arguido FF sem que este lhos pagasse, pelo que este ficou a dever dinheiro ao primeiro;

- o descrito nos arts. 13.º e 15.º desta contestação;

- que o arguido FF tenha entregue ao arguido AA a referida quantia de € 2.500,00 como pagamento do que lhe devia e para o compensar pelo facto de o arguido AA o ter auxiliado em momentos difíceis;

- o descrito nos arts. 17.º, 18.º, 19.º, 20.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 29.º, 30.º, 31.º, 32.º, 33.º e 37.º desta contestação;

y) O descrito na contestação do arguido BB que não conste no rol de factos provados, nomeadamente:

- que as pessoas a quem o arguido BB vendeu haxixe fossem todas suas conhecidas e em pequeno número;

- que tenha emprego garantido quando sair em liberdade.

z) Que o arguido CC seja pobre e de humilde condição social.

aa) O descrito na contestação do arguido DD que não conste no rol de factos provados, nomeadamente:

- o alegado nos arts. 4.º e 5.º desta contestação;

- que a pistola apreendida estivesse no interior de um cofre, com as respectivas munições;

- o alegado no art. 8.º desta contestação.

2.2.

Qualificação jurídica da conduta, tráfico de menor gravidade.

Defende o recorrente que os inúmeros factores que depõem a seu favor, tanto a nível da culpa como das exigências de prevenção (idade, comportamento anterior e posterior aos actos, ilicitude diminuída, culpa atenuada por via da imputabilidade reduzida, ausência de antecedentes criminais) (conclusão 4ª), impõem uma pena no limite do mínimo da pena aplicável (conclusão 5ª), apontando para o pequeno tráfico, por se tratar de alguém que vendeu haxixe para financiar o seu consumo de cocaína (conclusão 6ª), não se provando que tivesse intenção lucrativa, ou pelo menos que fizesse daquilo o seu modo de vida (conclusão 7ª).

Está em causa haxixe, sendo que, não obstante a quantidade encontrada, esta não chegou a qualquer consumidor (conclusão 8ª) e foi identificada apenas uma compradora (que o arguido confessou na integra não obstante esta não estar a arrolada como testemunha), é possível afirmar que a difusão anterior foi restrita (conclusão 9ª).

O recorrente sempre se regeu pelas normas da sociedade. Sempre trabalhou para ganhar a vida (conclusão 10ª), cometeu um erro, mas pode ser recuperado fora da prisão (conclusão 11ª), apontando uma perspectiva global do facto para um tráfico atenuado nos termos do art.° 25° do DL 15/93 (conclusão 12ª).

Escreve-se, a propósito na decisão recorrida:

«Perante estas considerações, e os factos considerados provados, dúvidas não restam que os arguidos AA, BB, CC e DD cometeram, como autores, um crime de tráfico de estupefacientes, pois detiveram e venderam a terceiros produtos estupefacientes.

Entendemos que, sem quebra da devida vénia por entendimento diverso, a qualificação deste crime é a que consta do art. 21.º do DL 15/93, pois perante os factos provados afastada fica a aplicação do artigo 25.º do mencionado diploma legal (tráfico de menor gravidade).

Na realidade, é erigido como elemento justificativo do "privilegiamento" do crime, nos termos deste art. 25.º, a considerável diminuição da ilicitude do facto, traduzida:

— nos meios utilizados;

— na modalidade ou nas circunstâncias da acção;

— na qualidade ou na quantidade das plantas ou substâncias.

Ora, no caso, salvo melhor e fundada opinião, a ilicitude do facto não se mostra consideravelmente diminuída, não só pela quantidade de estupefacientes detidos e cedidos a terceiros pelos arguidos, que é elevada, mas também pela reiteração das suas condutas no tempo.

No que respeita ao arguido BB, se é certo que a canabis é tida como “droga leve”, porém a elevada quantidade por si detida afasta qualquer privilegiamento da sua conduta.»

Mas será de aplicar o art. 25.º do mesmo DL n.º 15/93, como sustenta o recorrente?

Dispõe aquele art. 25.º:

"Se, nos casos dos artigos 21.º e 22.º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de …".

O privilegiamento do crime dá-se, assim, não em função da considerável diminuição da culpa, mas em homenagem à considerável diminuição da ilicitude da conduta, que se pode espelhar, designadamente:

– Nos meios utilizados;

– Na modalidade ou nas circunstâncias da acção;

– Na qualidade ou na quantidade das plantas, substâncias ou preparações.

Vejamos, então, se se prefigura no caso sujeito uma destas ou outra circunstância que traduza uma considerável diminuição da ilicitude da conduta em apreciação que justifique a desgraduação da qualificação jurídica.

Em primeiro lugar, importa assinalar, quanto à qualidade das substâncias, que se trata essencialmente de cannabis portanto, na sua maior parte, uma substância que não é entendida como “droga dura” e que poderia, naquele índice ter um efeito diminuidor da ilicitude, e 2,730 grs de cocaína.

Mas as quantidades da substância em causa não constituem o índice de diminuição de ilicitude a que se reporta o falado art. 25.º. Com efeito, mesmo tratando-se de cannabis, deve reconhecer-se que a quantidade tem já expressão: 4.201,747 grs

Já os meios utilizados não são diferentes dos habituais quando se trata destas substâncias, embora as quantidades já apontem para um fornecimento intermédio e não somente de pequeno tráfico de rua: a capacidade de armazenamento, a escolha criteriosa do fornecedor, a detenção de 3 balanças destinadas a pesar os estupefacientes, todas com resíduos de cocaína, uma digital de precisão e duas de braço e ponteiro, respectivamente, com escala até 500 grs e 50 gras, o destinar a maior parte da cannabis para venda a terceiros, o que dada a quantidade detectada, seria sempre em quantidade significativa.

Ou seja, não se apuraram positivamente índices de diminuição considerável da ilicitude, e as circunstâncias provadas apontam antes para uma ilicitude normal para o tráfico simples, se se atender à qualidade da substância que o recorrente visava vender versus a sua quantidade.

Nesta linha, se situam, entre outros os acórdãos de 16/1/90, BMJ 393-250, de 20/6/90, AJ n.º 10/11, BMJ 398-298, de 26/6/91, proc. nº 41729, de 9/12/92, proc. nº 43308, 7/7/94, proc.nº 46762, de 21/2/02, proc. nº 227/02-5, de 12/12/01,proc. nº 3344/01-3, de 2/10/03, proc. nº 2401/03-5, de 16/10/03, proc. nº 3224/03-5, de 5/11/03, proc. nº 3215/03-3, de 5/11/03, proc. nº 2638/03-3, de 14/1/04, proc. nº 4037/03-3, de 15/1/04, proc. nº 4222/03-5, de 18/2/04, proc. nº 4014/03-3, de 4/2/04, proc. nº 4251/03-3, de 3/3/04, proc. nº 4409/03-3, de 14/10/04, proc. nº 2811/04-5, de 7/10/04, proc. nº 2834/04-5, de 21/10/04, proc. nº 3273/04-5, de 21-10-04, proc. nº 2940/04-5, de 25-11-04, proc. nº 3779/04-5, de 7-4-05, proc. nº 133/05 e de 12-5-05, proc. n.º 1272/05-5).

Como se refere no Ac. de 2-6-99 (proc. n.º 269/99, Relator: Conselheiro Lourenço Martins): «(2) - A disposição do art.º 25.º, do DL 15/93, de 22-01, tipo especial em relação ao art.º 21.º, n.º 1, do mesmo diploma, importada da lei italiana, é usada pelo legislador como uma espécie de válvula de segurança do sistema em ordem a evitar que situações efectivas de menor gravidade sejam tratadas com penas desproporcionadas, no propósito de uma maior maleabilidade na escolha da medida da reacção criminal a aplicar pelo tribunal. (3) - Só que a aplicação do referido art.º 25.º, visando no caso concreto avaliar se a ilicitude dos factos se mostra consideravelmente diminuída, está de certo modo parametrizada mediante a verificação das circunstâncias aí indicadas, ainda que a título meramente exemplificativo, o que aponta para a necessidade de uma valorização global dos factos imputados ao arguido e provados, não podendo deixar de se ter em conta todos os tópicos a que o preceito se refere, aditados de outros se os houver. (4) - A conclusão da diminuição considerável da ilicitude há-de resultar dessa apreciação complexiva, em que assumem relevo os "meios utilizados" - ou seja, a organização e logística demonstradas -, a "modalidade ou circunstâncias da acção" - isto é, o grau de perigosidade para a difusão da droga - a "qualidade" das substâncias ou preparações - aferida em termos de danosidade tal como é indiciada pela sua concreta colocação em cada uma das tabelas anexas ao DL 15/93 - e a "quantidade", não apenas da droga detida no momento da intervenção policial, mas que o agente tenha "manipulado" em alguma das operações enunciadas no art.º 21.º.»

Improcede, assim, a pretensão do recorrente de ver aplicado o falado art. 25.º do DL n.º 15/93.

2.3.

Imputabilidade diminuída e atenuação especial da pena

Sustenta o recorrente que, por anomalia psíquica, tinha, ao tempo do factos e para o crime que estava indiciado, diminuída a sua capacidade para de determinar de acordo com a avaliação da ilicitude (conclusão 1ª), pois o relatório pericial concluiu pela manutenção intacta da sua capacidade de avaliação, mas justificando-se plenamente, do ponto de vista psiquiátrico-forense, que se invoquem atenuantes para a sua imputabilidade (conclusão 2ª) e a diminuição da culpa do arguido, por força da diminuição da sua imputabilidade, impõe o regime da atenuação especial da pena, nos termos dos art.ºs 20°, 72° e 73.º do C.P (conclusão 3ª).

O Tribunal a quo decidiu, quanto à atenuação especial e à medida da pena, despois de se referir aos critérios legais:

«2.2. Da medida da pena (…)

Quanto ao arguido AA (…).

Quanto ao arguido BB, importa antes de mais averiguar se deve ser equacionada alguma imputabilidade diminuída e/ou atenuação especial da pena, atento o alegado na contestação e em alegações orais produzidas em audiência de julgamento, em conjunto com os factos provados.

No que respeita à questão da eventual imputabilidade diminuída, importa relembrar o art. 20.º, n.º 2 e n.º 3 do Código Penal:

“2 - Pode ser declarado inimputável quem, por força de uma anomalia psíquica grave, não acidental e cujos efeitos não domina, sem que por isso possa ser censurado, tiver, no momento da prática do facto, a capacidade para avaliar a ilicitude deste ou para se determinar de acordo com essa avaliação sensivelmente diminuída.

3 - A comprovada incapacidade do agente para ser influenciado pelas penas pode constituir índice da situação prevista no número anterior.”.

Se é certo que ficou demonstrado que o arguido sofre de doença que afecta a sua capacidade de autodeterminação, porém não ficou demonstrado que a exclua ou que a diminua de forma significativa.

Conforme refere Maria João Antunes em O Internamento de Imputáveis em Estabelecimentos destinados a Inimputáveis (Studia Iuridica, 2, Coimbra Editora, 1993, pag. 34), o problema da imputabilidade diminuída deve ser resolvido desta forma: o juiz remete o delinquente para o domínio das penas – ou seja, não o declarando inimputável – quando a anomalia psíquica não é uma tal que impeça o agente de dominar os seus efeitos ou quando concluir que esta reacção ainda responde às exigências preventivas decorrentes da perigosidade do delinquente; para o domínio das medidas de segurança – com a declaração de inimputabilidade – é remetido o delinquente cujos efeitos da anomalia psíquica não domina nem pode dominar.

Perante os factos provados, conclui-se que a doença psíquica de que sofre o arguido pode ser dominada, nomeadamente com o recurso a medicação e com a abstinência do consumo das substâncias estupefacientes que a despoletaram.

Por outro lado, não está comprovada a incapacidade do arguido BB para ser influenciado pelas penas.

Assim, não estão reunidos os requisitos que permitem a aplicação do disposto no art. 20.º, n.º 2 e n.º 3 do Código Penal.

No que respeita à eventual aplicação do art. 31.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro: dispõe esta norma que se, nos casos previstos nomeadamente no art. 21.º, o agente abandonar voluntariamente a sua actividade, afastar ou fizer diminuir por forma considerável o perigo produzido pela conduta, impedir ou se esforçar seriamente por impedir que o resultado que a lei quer evitar se verifique, ou auxiliar concretamente as autoridades na recolha de provas decisivas para a identificação ou a captura de outros responsáveis, particularmente tratando-se de grupos, organizações ou associações, pode a pena ser-lhe especialmente atenuada ou ter lugar a dispensa de pena.

Apenas se poderá equacionar o eventual auxílio às autoridades, previsto na parte final. O arguido BB indicou às autoridades policiais onde era a residência do arguido GG – mas, salvo melhor entendimento, não nos parece que tal preencha o conceito de “prova decisiva” pois a identificação do arguido GG sempre poderia ser feita de outro modo, tanto mais que decorriam escutas telefónicas em que ele intervinha – ou então, através de vigilância.

Por outro lado, da parte final do artigo 31.º parece decorrer que a lei faz depender o funcionamento do benefício da importância dos responsáveis identificados/capturados, ao referir “grupos, organizações ou associações”. Ora, no caso vertente, tal não se verifica, pois desde logo o arguido GG foi apenas um cúmplice e precisamente do arguido BB.

Pelo exposto, entendemos que não é de atenuar especialmente a pena, ou dispensar a pena, por força do art. 31.º supra referido.

Finalmente, analisando o regime geral do art. 72.º do Código Penal, entendemos que o quadro geral da conduta do arguido BB conjugada com a sua personalidade não levam a uma imagem global atenuada do facto, quer em termos de ilicitude quer em termos de culpa, que justifique a atenuação especial.

Na realidade, quanto à ilicitude, a elevada quantidade de estupefaciente apreendidos afasta a consideração de uma ilicitude baixa.

Quanto à doença do arguido, se é certo que a mesma implica que a culpa do arguido seja menor, em face da sua menor capacidade de autodeterminação, porém tal circunstância aumenta o risco de o arguido reincidir no futuro, por não conseguir resistir à sua impulsividade e passagem para o acto, risco a que a pena também tem de responder.

Por todo, entende o Tribunal não ser de aplicar qualquer atenuação especial.

Assim, atendendo à moldura penal abstracta (4 a 12 anos de prisão – art. 21.º, n.º 1 do DL 15/93); à quantidade de estupefaciente que detinha; ao número de vezes, quantidades e preços por que vendeu estupefacientes a terceiros; às suas condições pessoais e familiares; à sua situação económica; ao arrependimento demonstrado; à colaboração na descoberta da verdade, tendo confessado grande parte dos factos; e à ausência de antecedentes criminais; o Tribunal julga adequada a pena de 4 anos de prisão

Está provado que o recorrente:

– Foi seguido por médico psiquiatra desde Julho de 2004, apresentando um quadro de depressão, com grande ansiedade, deficiente controlo dos impulsos e insónias muito marcadas. Fez terapêutica regular com ansiolíticos, anti-depressivos e estabilizador de humor, sendo que a sua situação tem sido de difícil resolução, necessitando de continuar a terapêutica e o apoio psicoterapêutico regular (131) e tem vindo a ser acompanhado por médico Psiquiatra implicando o seu esquema de tratamento a tomada dos medicamentos descritos no documento de fls. 2756 (132)

– À data dos factos supra descritos, era consumidor de cocaína e haxixe, sendo dependente destas substâncias (133), mas , depois da sua detenção, deixou de consumir cocaína (134), iniciando o consumo de haxixe aos 18 anos, com consumos diários ininterruptos desde os 19 anos, consumindo na altura da detenção cerca de 2 grs por dia (135). Iniciou os consumos de cocaína cerca de 1 ano antes de ser detido, com consumos intensos nos últimos 6 meses (136)

– Evidencia um padrão de uso e abuso de haxixe e cocaína, com sintomas psicóticos (englobável na rubrica F19.5.55 da 10.ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial de Saúde, CID 10) , com consumo de haxixe pelo menos até Dezembro de 2006, mas mantendo conservada a capacidade de avaliar a licitude ou ilicitude dos actos supra descritos que praticou. Apresenta, entre outros sintomas, ideias deliróides (de conteúdo persecutório) e de auto referência, algum alheamento da realidade (mas com insight), e comportamentos que denotam desinibição, impulsividade e passagem ao acto, que afectam, sem excluir, a sua capacidade de determinação (137), não apresentando em 7.12.2006 sinais somáticos de relevo (138).

– A sua situação clínica aconselha que deva ter regular e adequado acompanhamento médico-psiquiátrico (psicofarmacológico e psicoterapêutico), como forma de influenciar positivamente o prognóstico do contexto clínico em presença (139).

O quadro traçado quanto ao recorrente não se afasta do comum à tóxico-dependência, susceptível de diminuir o juízo de censura pelo facto concreto, mas de aumentá-lo pela condução da sua vida, pelas opções que foi tomando. Conserva, como se viu, a capacidade de avaliar a licitude ou ilicitude dos actos praticados e não se mostra excluída a sua capacidade de determinação, embora esteja afectada.

Admitindo que a doença do recorrente implica que uma menor culpa, dada a menor capacidade de autodeterminação, também é maior o risco de repetição dos comportamentos, o que deve ser atendido.

Não pode assim afirmar-se que se está perante uma sensível diminuição da capacidade de avaliação ou de determinação que seja fruto de «uma anomalia psíquica grave, não acidental e cujos efeitos não domina, sem que por isso possa ser censurado», como o exige o n.º 2 do art. 20.º do C. Penal.

Como não se pode afirmar, como sublinhou a decisão recorrida, a incapacidade do recorrente para ser influenciado pelas penas (n.º 3 do art. 20.º do C. Penal), quando é certo, além do mais, que sendo consumidor de cocaína e haxixe e dependente destas substâncias à data dos factos (13), deixou de consumir cocaína depois da sua detenção (134).

Neste quadro não está, como bem decidiu o Tribunal a quo, comprometida a sua imputabilidade, tendo vindo este Supremo Tribunal a considerar que a tóxico-dependência e as suas sequelas

Depois importa ter em conta que como vem entendendo este Supremo Tribunal de Justiça a toxicodependência, só por si, como circunstância exterior ao tipo, ainda que possa contender com o domínio de liberdade requerido pela culpa, não tem um valor “naturalmente” de diminuição desta e da ilicitude ( AcSTJ de 19/04/2007, proc. n.º 449/07-5 e de 11/10/2007, proc. n.º 3171/07-5, com o mesmo relator)

Sendo certo que, além da confissão, a decisão recorrida, como se viu, valorou a colaboração circunscrita, pois que identificou o cúmplice (“abaixo “ de si na hierarquia e não “acima”), a circunstância de o arguido ter cometido os factos ilícitos também para obter dinheiro ou bens, para poder adquirir produto estupefaciente.

Aliás, só assim se compreende a pena encontrada no limite mínimo da respectiva moldura.

2.4.

Medida da pena e suspensão da execução (conclusões 13 a 24)

Pede o recorrente que a pena não superior a 3 anos de prisão seja suspensa na sua execução (conclusão 13ª), pois a pena privativa de liberdade deve ser a ultima ratio (conclusão 14ª) e confessou a prática dos factos e mostra-se arrependido (conclusão 15ª), revelou auto-censura, quando autorizou expressamente a busca à sua casa, onde tinha parte da droga e colaborou com as autoridades na identificação da residência do seu cúmplice (que veio a ser constituído arguido, julgado e condenado como cúmplice) (conclusão 16ª), goza de apoio familiar e fortes competências profissionais (conclusão 17ª).

O consumo de cocaína que precipitou a delinquência, já não se verifica (conclusão 18ª), à data do exame psiquiátrico não apresentava sinais somáticos de relevo (conclusão 19ª), tem sido tratado por médico especializado, de forma voluntária e regular (conclusão 20ª), tem emprego garantido através de contrato de trabalho (conclusão 21ª), a suspensão servirá as finalidades da punição (conclusão 22ª) e terá um sentido pedagógico e ressocializador (conclusão 23ª), com um regime de prova e a sujeição do recorrente a uma plano individual de readaptação social acompanhado pelo IR (conclusão 24ª).
A possibilidade de redução da pena ficou comprometida por força da posição assumida quanto à qualificação jurídica, uma vez que se situa no limite mínimo da respectiva moldura penal, como se disse já.
No entanto, a entrada em vigor da Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, que veio rever o Código Penal, impõe, à luz do disposto no n.º 4 do art. 2.º deste último diploma, a consideração da suspensão da execução da pena.
Com efeito, de acordo com o disposto no art. 50.º, n.º 1, na presente redacção, “o tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se …“. O que significa que deva ser agora ponderada essa possibilidade, dentro da posição deste Supremo Tribunal de Justiça de que se trata de um poder-dever (cfr. v.g., o AcSTJ de 17/05/2007, proc. n.º 1487/07-5, com o mesmo relator).
Como tem sido entendido, a suspensão da execução da pena é uma medida não institucional que, não determinando a perda da liberdade física, importa sempre uma intromissão mais ou menos profunda na condução da vida dos delinquentes, pelo que não pode ser vista como forma de clemência legislativa, pois constitui autêntica medida de tratamento bem definido, com uma variedade de regimes aptos a dar adequada resposta a problemas específicos.
E só deve ser decretada quando o tribunal concluir, em face da personalidade do agente, das condições da sua vida e outras circunstâncias indicadas nos textos transcritos, ser essa medida adequada a afastar o delinquente da criminalidade.
Exercerá então o julgador um poder-dever, ou seja um poder vinculado, e terá que decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os necessários pressupostos.
Aquele juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido, subjacente à decisão de suspender a execução da pena, pode assentar numa expectativa razoável de que a simples ameaça da pena de prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e consequentemente a ressocialização (em liberdade) do arguido.
Ora no caso concreto, os elementos disponíveis e já de alguma expressão da ponderação desta possibilidade, impõem, numa aparente contradição, o seu aprofundamento e actualização.
Com efeito, a paragem no consumo de cocaína, consumo que esteve na origem da delinquência, associada à declaração que o recorrente faz de motivação para não voltar a consumir estupefacientes, as visitas regulares da família, a inserção familiar, impõe que se solicite um actualizado relatório social que forneça um quadro detalhado e actualizado das suas condições, com vista à ponderação da suspensão da prisão, problema expressamente afastado então pelo Tribunal a quo, dada a medida da pena, então inibitória de tal possibilidade.

O Tribunal a quo, deverá, pois pedir tal relatório e eventualmente a prova complementar que entender necessária e decidir face ao novo quadro legal da suspensão ou não da execução da pena ao recorrente.
3.
Pelo exposto, acordam os juízes que compõem a (5.ª) Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida, mas determinar que o Tribunal a quo, pelos mesmos juízes, se possível, depois de pedido o relatório social actualizado e com eventual produção de prova complementar, pondere e decida da suspensão ou não da execução da pena.
Custas pelo recorrente com a taxa de Justiça de 4 Ucs.

Lisboa, 25 de Outubro de 2007

Simas Santos (Relator)
Santos Carvalho
Costa Mortágua