Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
05P4132
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: CARMONA DA MOTA
Descritores: CONCURSO DE INFRACÇÕES
PENA ÚNICA
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
Nº do Documento: SJ200602090041325
Data do Acordão: 02/09/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL.
Decisão: ORDENADO O REENVIO DO PROCESSO PARA NOVO JULGAMENTO.
Sumário : I - Em caso de concurso de crimes, deverá ter-se em conta que «a pena que vai ser efectivamente aplicada não é a pena parcelar, mas a pena conjunta» e que, por isso, «as penas parcelares de prisão não devem, em princípio, ser substituídas por penas não detentivas».

II - «Determinada a pena conjunta e sendo esta de prisão, então sim, o tribunal decidirá se ela pode legalmente e deve político-criminalmente ser substituída por pena não detentiva» (Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, § 409 e 419).

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Arguida/recorrente: AA (1)

 

1. OS FACTOS (2)

 

Os arguidos viviam juntos na data da prática dos factos. Congeminaram um plano para se locupletarem indevidamente à custa do património de terceiros. Tal plano consistia em aproveitarem os anúncios publicados em diversos jornais por pessoas que tinham perdido animais de estimação e que ofereciam recompensa a quem os tivesse encontrado. Os arguidos, utilizando telemóveis, ligavam para os números de telefone constantes dos anúncios, diziam que tinham encontrado o animal e pediam uma dada quantia para o devolver, como recompensa ou afirmando que a tinham gasto com tratamentos e vacinas. E indicavam um número de conta bancária para o qual devia ser feita a transferência. Convencidos pela actuação dos arguidos que de facto estes tinham encontrado o animal perdido e na expectativa, por aqueles criada, de o recuperar, os contactados faziam a transferência da quantia pedida. Sendo certo que os arguidos nada sabiam sobre o respectivo animal que não podiam por isso devolver como não devolveram. Tudo não passando de um estratagema para determinar aqueles a efectuarem as transferências solicitadas com as quais os arguidos se locupletavam. No âmbito de tal plano os arguidos utilizaram pelo menos as seguintes contas bancárias: conta nº 00379910038114, NIB 003600379910038114654, do Empresa-A, agência de Aveiro, titulada pela arguida AA; conta nº 102.10.001381-6 do Empresa-A, Viseu, titulada pelo arguido BB; conta com o NIB 00210005080118100135 do CPP, titulada pela arguida AA; conta nº 646032990002 do Empresa-B, Régua, titulada pela arguida AA; conta nº 08080006732200 da Empresa-C, Mirandela, titulada pelo arguido BB. Assim, na execução desse plano previamente traçado, no dia 7.11.02, utilizando o telemóvel nº ..., o arguido BB, dizendo chamar-se “...”, contactou CC, que colocara um anúncio no jornal “Correio da Manhã”, pelo desaparecimento do seu papagaio. O arguido disse ter encontrado o papagaio e solicitou-lhe a transferência de 150 €, fornecendo-lhe o NIB da conta supra referida da agência de Viseu da Empresa-A, titulada pelo arguido, transferência que CC fez. No dia 15.03.03, utilizando o telemóvel nº ...., os arguidos contactaram DD que colocara um anúncio no jornal “Diário de Notícias”, pelo desaparecimento do seu cão. Os arguidos disseram ter encontrado o mesmo e solicitaram-lhe a título de gratificação, a transferência de 125 €, fornecendo-lhe o NIB da conta do Empresa-B, agência da Régua supra referida, titulada pela arguida. Transferência essa que a DD fez. No dia 23.3.03, utilizando o telemóvel nº ...., o arguido BB, dizendo chamar-se “...” contactou EE que colocara um anúncio no jornal “Diário de Notícias” e “Correio da Manhã”, pelo desaparecimento do cão de uns tios. O arguido disse ter encontrado o mesmo e solicitou-lhe a título de ressarcimento por gastos com veterinário, a transferência de 90 €, fornecendo-lhe o NIB da conta do Empresa-B, agência da Régua supra referida, titulada pela arguida. Transferência essa que a EE fez no valor de 99,90 €. Depois foi contactada pela arguida AA, através do telemóvel ..... que lhe exigia mais dinheiro como recompensa, o que EE, porém, não acatou. No dia 3.11.03, utilizando o telemóvel nº ...., os arguidos contactaram FF que colocara um anúncio no jornal “Ocasião” pelo desaparecimento da sua gata. Os arguidos disseram ter encontrado a mesma e solicitaram-lhe a título de gratificação a transferência de 75 €, fornecendo-lhe o NIB da conta da Empresa-C, agência de Mirandela supra referida, titulada pelo arguido. Transferência essa que a FF fez no dia 5.11.03. No dia 6.11.03, utilizando o telemóvel nº 967173444, o arguido BB, dizendo chamar-se “....” contactou GG que colocara um anúncio no jornal “Ocasião”, pelo desaparecimento do seu cão. O arguido disse ter encontrado o mesmo e solicitou-lhe a título de ressarcimento por gastos com veterinário, a transferência de 90 €, fornecendo-lhe o NIB da conta do Empresa-C, agência de Mirandela supra referida, titulada pelo arguido, mas que este disse pertencer a um filho. Transferência essa que o GG fez no valor de 100 €. O arguido ainda contactou novamente o ofendido, pedindo mais 100 € para devolver o animal, o que GG, porém, não acatou. Nenhum dos ofendidos recuperou o seu animal de estimação através dos arguidos que nunca os tiveram na sua posse. Os arguidos fizeram suas as quantias supra referidas, no valor de 549.90 €, que gastaram em proveito próprio, bem sabendo que não lhes eram devidas, sendo certo que tal apenas foi possível uma vez que os arguidos com a sua actuação criaram nos ofendidos a convicção de que estavam na posse dos referidos animais e que lhos podiam pois devolver, o que os arguidos bem sabiam não corresponder à verdade. E, no entanto, assim agiram com o propósito de alcançarem para si como alcançaram, benefícios económicos que sabiam indevidos e prejudicar os ofendidos, como prejudicaram. Agiram sempre deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era punida por lei. Em conjunto e de comum acordo, para melhor consumarem os seus intentos. Os arguidos não têm antecedentes criminais. (...) A arguida AA tem contumácia declarada no proc. 340/01.1PBCVL da 1ª secção do 3º Juízo da Covilhã, por crime de condução sem habilitação legal. Os arguidos não têm paradeiro certo. Os demandantes tinham grande afeição pelos animais que desapareceram e ficaram emocionalmente perturbados com a actuação dos arguidos.

2. A CONDENAÇÃO

Com base nestes factos, a 7.ª Vara Criminal de Lisboa ([3]), em 30Jun04, condenou, na sua ausência ([4]), AA (-25Jan77, fls. 920), como co-autora de cinco crimes de burla (art. 217.1 CP), na pena parcelar de 10 meses por cada um deles e, em cúmulo, na pena única de 2 anos de prisão:

“Quem, com intenção de obter para si ou para terceiro enriquecimento ilegítimo, por meio de erro ou engano sobre factos que astuciosamente provocou, determinar outrem à prática de actos que lhe causem, ou causem a outra pessoa, prejuízo patrimonial” comete o crime de burla. Na jurisprudência, os elementos deste crime são quase uniformemente tratados. Com interesse para a decisão nestes autos veja-se que: “O crime de burla traduz-se numa actuação pela qual o agente, mediante artifícios enganosos e sem o propósito de proceder a uma restituição ou de cumprir uma adequada contraprestação, consegue que outrem lhe entregue bens ou valores, pelo que tal crime tem como elementos a conduta enganosa do agente, o propósito de obtenção de um proveito ilegítimo, a produção, no ofendido, de um falso convencimento da obtenção de futuras vantagens e a entrega dos bens ou valores” (Relação de Évora 15.1.91, publicado a ps. 310 do Tomo 1, do Ano 1991, da Colectânea de Jurisprudência); “No crime de burla é necessário que o elemento «agir astuciosamente» se junte limitativamente ao dolo específico, de tal forma que, mesmo havendo a intenção de enriquecimento ilegítimo, o modo pelo qual se realiza essa intenção se revele engenhoso, enganoso, criando a aparência de realidades que não existem, ou falseando directamente a realidade” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19.5.94, publicado a ps. 216 do Tomo 2, do Ano 1994, da Colectânea de Jurisprudência (STJ); “Para a verificação do crime de burla há a considerar, num primeiro momento, a verificação de uma conduta astuciosa que induza directamente ou mantenha em erro ou engano o lesado e, num segundo momento, deverá verificar-se um enriquecimento ilegítimo de que resulte um prejuízo patrimonial do sujeito passivo ou de terceiro. Por outro lado, deverá existir uma sucessiva relação de causa-efeito entre os meios empregues e o erro ou engano e entre estes e os actos que vão directamente defraudar o património do terceiro ou do lesado. Por isso, apenas são punidos os casos em que o erro ou engano é astuciosamente provocado (burla activa), excluindo-se aqueles em que é simplesmente «aproveitado»” (STJ 08.02.96, publicado a ps. 209 do Tomo 1, do Ano IV, da Colectânea de Jurisprudência (STJ); em sentido contrário, o Acórdão da Relação de Lisboa de 10.01.96, publicado a ps. 138 do Tomo 1, do Ano XXI, da Colectânea de Jurisprudência sustenta a possibilidade do crime omissivo, provocado “por um comportamento passivo”; de qualquer forma, “há uma analogia substancial entre induzir outrem em erro e o silêncio doloso sobre um erro preexistente. No primeiro caso, a vítima ao ser induzida em erro, toma uma coisa por outra, pertencendo ao agente a iniciativa de causar o erro. No segundo caso, na manutenção do erro, a vítima desconhece a realidade; o agente, perante um erro já existente, causa a sua persistência, prolongando-o, ao impedir, com a sua conduta astuciosa ou omissiva do dever de informar, que a vítima se liberte dele” (Leal-Henriques e Simas Santos, “Código Penal Anotado, 1996, 2º vol., p. 539); como sustentou o autor do Anteprojecto, na 1ª Comissão Revisora do texto de 1982, não se deve afastar a punição da burla por omissão, acrescentando que “o tipo não se alarga demasiado, pois sempre fica limitado, por um lado, pela exigência de o aproveitamento ter sido astucioso e, por outro lado, pelo facto de haver um dever de informar e de esclarecer. Isto é, no domínio da burla por omissão o «aproveitamento astucioso» só se realiza quando havia um dever de informação que não foi cumprido” (BMJ 287º, p. 42). Por outro lado, “apenas existe dúvida ou erro da vítima, quando ela foi enganada após dúvida concreta, e não quando sente uma dúvida difusa, adequada ao tráfego normal comercial. Nesse caso, a ofendida não procedeu com a diligência que lhe era exigível e correu os riscos normais inerentes ao contrato celebrado” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1.7.98, publicado a ps. 223 do Tomo 2, do Ano VI, da Colectânea de Jurisprudência (STJ). Sobre a distinção entre erro e engano a 1ª Comissão Revisora salientou a dificuldade na formulação deste tipo de crime, sobretudo nos meios por que se realiza a burla. Assim, ao lado do erro coloca-se o engano. Mas também não basta qualquer erro; é necessário que ele tenha sido provocado ou aproveitado astuciosamente (BMJ 287º, p. 41). Por erro deve entender-se a falsa ou nenhuma representação da realidade concreta, que funcione como vício do consentimento da vítima. Marques Borges, “Crimes Contra o Património em Geral”, p. 22) afirma que o engano equivale à simples mentira: “a não ser assim, dificilmente aparece discernível a distinção entre erro e engano. Não são tanto o erro como o engano, falsas representações da realidade? O burlado nas hipóteses de erro, como de engano, só age contra o seu património ou de terceiro porque tem um falso convencimento da realidade. Simplesmente esse seu falso convencimento nasce, no caso do mero engano, da mentira que lhe é dada a conhecer pelo burlão; no caso do erro exige-se, ainda, que o burlão tenha agido de forma a provocar (usando artifícios, ardis ou astúcia) o erro em que o burlado acaba por cair”. Assim, a construção do tipo legal de burla, descrito no artigo 217º, nº 1, do Código Penal, supõe a concorrência de vários elementos, todos constituindo os seus elementos típicos: a indução em erro ou engano de uma pessoa (o lesado), fazendo com que esta pratique actos que lhe causem (ou a terceiro) prejuízos de carácter patrimonial. O erro ou engano provocado com astúcia; a prática pelo lesado de actos que lhe causem prejuízo; e o prejuízo de carácter patrimonial causado por aqueles actos do próprio lesado induzido em erro ou enganado, são, assim, os elementos do tipo objectivo do crime de burla, que, em consequência, se preencherá e consumará quando todos estes elementos se tiverem verificado (cfr., v. g., MARIA FERNANDA PALMA e RUI CARLOS PEREIRA, "O crime de burla no Código Penal de 1982-95", na Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, vol. XXXV, 1994, págs. 321, ss.). O bem jurídico protegido no crime de burla é o património, constituindo a burla um «crime de dano, que se consuma com a ocorrência de um prejuízo efectivo no património do sujeito passivo da infracção ou de terceiro», como decorre directamente da própria descrição do artigo 217º, nº 1, do Código Penal. A burla constitui, também, «um crime material ou de resultado, que se consuma com a saída das coisas ou valores da esfera da "disponibilidade fáctica" do sujeito passivo ou da vítima; sendo um "crime com participação da vítima", onde o resultado, ou seja, a saída das coisas ou valores da esfera de disponibilidade fáctica do legítimo titular resulta de um comportamento do próprio sujeito passivo, a consumação ocorre quando este resultado se verificar, isto é, quando ocorrer o empobrecimento patrimonial de lesado. Embora se exija a intenção do agente de obter para si (ou para outrem) um enriquecimento, a burla constitui um crime de resultado parcial ou cortado, já que elemento relevante para a consumação não é a concretização de tal enriquecimento, bastando para o efeito, ao nível do tipo objectivo, que se observe o empobrecimento (= dano) da vítima. A consideração deste elemento subjectivo permite, como se salientou, qualificar a burla como um crime de resultado cortado ou parcial, não havendo «coincidência na extensão dos elementos objectivos e subjectivos do tipo: no plano objectivo basta o prejuízo patrimonial da vítima (ou de terceiro); ao nível subjectivo requer-se uma intenção de enriquecimento que não carece de concretização objectiva» (cfr. FERNANDA PALMA e RUI CARLOS PEREIRA, op. cit, p. 323). A consumação do crime exige, pois, o resultado consistente na saída dos bens ou valores da disponibilidade fáctica do legítimo titular, com a verificação de um efectivo prejuízo patrimonial do burlado ou de terceiro» (cfr. A. M. ALMEIDA COSTA, op. cit., págs. 276-277). Analisemos, então a verificação de todos os elementos do crime de burla. Ao invocarem convincentemente a posse dos animais de estimação dos ofendidos, os arguidos criaram naqueles a convicção de que tinham os animais consigo e que dispondo de uma pequena quantia conseguiriam um bem maior: o regresso ou devolução do animal por quem sentiam afeição. Assim os determinaram a fazer a transferência de dinheiro. Obtiveram assim um enriquecimento à custa dos ofendidos. Verificam-se, pois, todos os elementos dos crimes de burla, tendo os arguidos cometido cinco crimes em co-autoria e concurso real. Aos crimes de burla consumada p. p. art. 217º nº 1 do Código Penal, corresponde pena de prisão até três anos ou pena de multa. medida da pena. “A medida da pena há-de ser dada pela medida e necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto... Quando se afirma que é função do Direito Penal tutelar bens jurídicos não se tem em vista só o momento da ameaça da pena, mas também –e de maneira igualmente essencial– o momento da sua aplicação. Aqui pois, a protecção de bens jurídicos assume um significado prospectivo, que se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção (ou mesmo no reforço) da vigência da norma infringida” (Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, ed. Aequitas, 1993, p. 227; cfr. igualmente, Claus Roxin, “Derecho Penal –Parte General– Tomo I”, ed. Civitas, 1997, p. 89 e Choclán Montalvo “Individualización Judicial de La Pena”; Colex ed. 1997, p. 51 e ss.). Existem tantas formas de burla e de enganar os incautos quanto é fértil a imaginação humana e o espírito inventivo, infelizmente também com fins eticamente reprováveis. Estamos habituados a ouvir falar do “conto do vigário” em que o burlão explora também a ganância e a ausência de princípios éticos do burlado; nas numerosas fraudes sob a capa dos bons negócios, explorando o deslumbramento com lucros fáceis... A marca distintiva do caso dos autos é a exploração do amor pelos animais, dos bons sentimentos da vítima, emocionalmente abalada pela perda do animal de estimação, receptivo a qualquer esperança de recuperar o objecto do seu amor. Revela pois baixeza de carácter. Assim, considerando as circunstâncias concretas do caso entende o tribunal que a aplicação de pena não privativa de liberdade se mostra inadequada e insuficiente para assegurar a realização das finalidades da punição, atendendo a razões de prevenção geral e de prevenção especial tendo em atenção a gravidade da conduta dos arguidos, explorando, em elevado grau, os melhores sentimentos das vítimas. Na determinação da medida da pena, nos termos dos art.s 70º e 71º, por referência ao art. 40º do Código Penal, face às circunstâncias do caso, em função da culpa dos arguidos, tendo em conta as especiais necessidades de prevenção de futuros crimes, ponderar-se-á: o modo de execução dos factos (considerando a forma elaborada como o “esquema” foi montado, com constantes mudanças de telemóvel e de contas bancárias, com a criteriosa escolha de uma quantia a pedir que dificilmente um dono de um animal perdido se recusa e... por outro lado, também depois se escusa a dar seguimento à queixa por causa de quantia de tão diminuto valor); a gravidade das consequências (sem reparação dos prejuízos causados); a forte intensidade do dolo; a ausência de antecedentes criminais que só se pode considerar como normal e a ausência de paradeiro certo; todos os factos descritos e o comportamento processual dos arguidos, a gravidade das circunstâncias agravantes e a pouca relevância das atenuantes, justificam a condenação em pena de prisão que se ajuste à gravidade relativa dos crimes e que, sem ultrapassar a medida da culpa, de forma adequada, assuma a protecção dos bens jurídicos e a reintegração dos arguidos na sociedade ­– essa reinserção afigura-se neste momento problemática: os arguidos adoptaram um comportamento que os factos provados salientam e a conduta processual ressalta dificilmente coadunável com medidas de excessiva tolerância. Assim, justifica-se a condenação da arguida em pena de prisão por dez meses por cada um dos cinco crimes de burla. cúmulo jurídico - não suspensão das penas. Os crimes estão em relação de concurso importando, por isso, realizar o cúmulo jurídico (art. 77º do Código Penal). “A pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes... e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes” (art. 77º nº 2) e, na determinação da pena única a aplicar “são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente” (art. 77º nº 1). A pena única de prisão tem, como limite mínimo, dez meses de prisão e, como limite máximo, quatro anos e dois meses de prisão (soma aritmética). Ponderar-se-á a personalidade dos arguidos naquilo que os factos revelam quanto à continuidade da conduta delinquente e aos valores preferencialmente violados, as idades e perspectivas fracas de reinserção social supra apontadas. Mostra-se adequada a condenação dos arguidos na pena única de dois anos de prisão cada. A suspensão da execução da pena de prisão depende da ponderação da existência de circunstâncias – personalidade, condições de vida, conduta anterior e posterior, circunstâncias dos crimes – que permitam concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão bastem para realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (art. 50º nº 1 do Código Penal). Recordando que as finalidades da punição são a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (art. 40º nº 1 do Código Penal), não se mostra razoável no caso dos autos a suspensão da execução da pena de prisão já que esse juízo de prognose não se mostra coadunável com o comportamento processual relapso dos arguidos, pendência de processos em que foram declarados contumazes, ausência de paradeiro certo ou modo de vida lícito conhecido, tipologia e reiteração das condutas criminosas em apreço nos autos não se vislumbrando que por essa via menos gravosa seja possível obter a reinserção social dos arguidos, nem garantir a protecção dos bens jurídicos (especialmente). Assim, toda a conduta dos arguidos desaconselha a suspensão da execução da pena e nada de relevante se descortina na personalidade, nas condições de vida, na conduta posterior ou nas circunstâncias dos crimes que justifiquem uma opção fundada pela dita suspensão. Pedido cível. Consideramos, como o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2.4.98, publicado a ps. 179 do Tomo 2, do Ano VI, da Colectânea de Jurisprudência (STJ) que “o pedido de indemnização civil deduzido em processo penal tem sempre de ser fundamentado na prática de um crime. Se o arguido for absolvido desse crime, haverá que considerar o pedido cível formulado se existir ilícito ou responsabilidade fundada no risco, ou seja, responsabilidade extracontratual. O que nunca se pode é julgar procedente o pedido com base em responsabilidade civil contratual”. No caso dos autos os arguidos condenados pela prática de crimes de burla são obrigados a indemnizar os demandantes já que a sua conduta ilícita e culposa (dolosa mesmo) é geradora de responsabilidade civil extracontratual, por factos ilícitos. A conduta dos arguidos e demandados foi causa adequada de todos os prejuízos materiais invocados, in casu, os montantes transferidos para as contas dos arguidos. Questão diversa é a dos danos morais sofridos. Ficou assente que os demandantes tinham grande afeição pelos animais que desapareceram e ficaram emocionalmente perturbados com a actuação dos arguidos. Nos termos do art. 496º do Código Civil, só os danos não patrimoniais a que se possa conferir gravidade bastante merecem a tutela do direito, sendo o montante indemnizatório fixado por recurso à equidade. Ao alimentarem nos demandantes a falsa esperança da recuperação do animal de estimação perdido para assim lhes conseguirem sacar quantias monetárias não restam dúvidas que os arguidos afectaram psicologicamente os demandantes, já que não merece contestação a possibilidade de estabelecimento de grande ligação afectiva entre os animais e aqueles que os possuem e deles cuidam, tratam e com eles convivem. Porém, não são os arguidos os responsáveis pelo desaparecimento dos animais e não podem assim ser responsabilizados como se o fossem. Considera-se por isso adequada a limitação dos danos morais ao montante dos danos patrimoniais, sendo por isso arbitrada aos demandantes uma quantia a título de indemnização por danos não patrimoniais igual ao prejuízo material sofrido por cada um dos demandantes.

3. O RECURSO

3.1. Notificada no dia 09Out05, a arguida (5), inconformada com a decisão, recorreu dela ao STJ no dia 24, pedindo a substituição da «pena de prisão aplicada por uma pena não privativa da liberdade»:

A pena aplicada à arguida não é a adequada às circunstâncias do caso concreto. Fazendo a aplicação do preceituado no art. 71º do Código Penal ao caso concreto o tribunal "a quo" deveria ter tido em consideração determinados factos que poderiam depor a favor da arguida, nomeadamente o facto de, à data dos factos, a arguida ser primária; o facto de a arguida, no interrogatório perante a autoridade policial, ter confessado os factos de que era indiciada, esclarecendo os termos da sua participação nos mesmos e esclarecendo que só o fazia por necessidades económicas; o facto de ter actuado num contexto de convivência matrimonial e dependência emocional relativamente ao co-arguido, que mantinha sobre ela um forte ascendente; e ainda o facto de a arguida ter tido um papel perfeitamente secundário em todo o "esquema", não sendo ela quem fazia a abordagem das vítimas e não mantendo, a maior parte das vezes, qualquer contacto com elas. Entendeu o tribunal "a quo" que "a marca distintiva do caso sub judice era a exploração do amor pelos animais e dos bons sentimentos da vítima, emocionalmente abalada pela perda do animal de estimação e receptiva a qualquer esperança de recuperar o objecto do seu amor", o que, também segundo aquele tribunal, "revelava baixeza de carácter". No entanto, o nosso entendimento é diverso. Assim, a forma de burla praticada nos presentes autos é uma das mais simples de que estamos habituados a ouvir falar ou de que temos conhecimento, o que revela desconhecimento dos meandros do crime e falta de prática. Os arguidos aproveitaram-se do comportamento, de certa forma um pouco negligente, das vítimas que, tendo sido contactadas telefonicamente por alguém que desconheciam, fizeram depósitos (no total de € 549,90) em contas bancárias cujo número também lhes foi fornecido telefonicamente, sem sequer se terem assegurado de que a pessoa que os contactava tinha efectivamente na sua posse o animal de estimação perdido. Assim, as vítimas não tentaram obter pormenores de identificação do animal em questão, não exigiram ver antecipadamente o animal, nem entregaram a "recompensa" após a entrega dos animais. As quantias envolvidas foram quantias relativamente baixas e, quanto ao crime de burla praticado na pessoa de FF, o prejuízo patrimonial sofrido foi, inclusivamente, de valor diminuto, ou seja, € 75. Face aos elementos supra expostos, parece inquestionável que o caso dos autos, tanto do ponto de vista da culpa da arguida como do da necessidade da pena, apresenta uma gravidade menor que o caso "normal" de burla. Nos termos do disposto no art. 70º do Código Penal e à luz do princípio basilar do nosso ordenamento jurídico-penal de que a pena de prisão constitui a ultima ratio da política criminal, o tribunal deve preferir à pena privativa de liberdade uma pena alternativa ou de substituição, sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena alternativa ou de substituição realizar, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição. Esta opinião é também perfilhada por Figueiredo Dias (Direito Penal Português, Parte Geral II - As consequências jurídicas do crime) e Anabela Rodrigues ("Critério da escolha das penas de substituição do direito penal português”). Ora, a recorrente questiona se o cumprimento de dois anos de prisão efectiva satisfaz, no caso sub judice, as exigências de prevenção geral e especial. O entendimento da recorrente é no sentido de que a aplicação de pena de prisão efectiva, tendo em conta o seu registo criminal e a ausência de quaisquer antecedentes criminais, não satisfaz, no caso concreto, as finalidades da pena, tendo o Tribunal "a quo" violado os art.s 40, 50, 70 e 71, todos do Código Penal conforme se encontram especificadas no art. 40 do Código Penal. Assim, a aplicação à arguida de uma pena de substituição é suficiente não só para evitar que ela reincida, como também para realizar aquele limiar mínimo de prevenção geral de integração, indispensável à defesa da ordem jurídica. Em face do supra exposto, deveria o tribunal "a quo" ter optado pela aplicação à arguida, ora recorrente, de uma pena inferior e não privativa da liberdade. Além disso não foram respeitados os art.s 50 a 53 do Código Penal em que se consagram quatro diferentes modalidades de suspensão da execução da pena de prisão: simples, subordinada ao cumprimento de deveres, com imposição de regras de conduta ou acompanhada de regime de prova. Ora, o tribunal "a quo" deveria ter tomado em consideração a possibilidade de aplicação destas normas e só o não terá feito por desconhecer a situação pessoal da arguida, à data dos factos e bem assim a sua situação actual. De facto, encontram-se preenchidos os pressupostos para aplicação de uma pena não privativa da liberdade, devendo o tribunal concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Contudo, dado o comportamento processual da arguida, ora recorrente, o tribunal sempre poderia subordinar a suspensão da execução da pena de prisão ao cumprimento de deveres, à imposição de regras de conduta ou ao regime de prova. Antes de ser detida, a arguida vivia em Aveiro com mãe, a irmã, o cunhado e a sobrinha, em casa destes. Em Aveiro, a arguida encontrou o afecto e o apoio familiar que lhe permitiram romper com o passado e manter, no decurso do último ano, uma vida pessoal, familiar e social estável. É também em Aveiro que se encontra sedeada a sua família mais próxima, a mãe, as irmãs, os cunhados, a sobrinha. A arguida nunca mais teve qualquer contacto, escrito ou telefónico, com o co-arguido desde a data dos factos. Actualmente, a arguida não estava a trabalhar por se encontrar grávida de cerca de seis meses, mas antes de engravidar trabalhou com empregada doméstica em diversas casas. A arguida encontrava-se inserida socialmente e tinha uma vida considerada normal. Assim, tem todo o apoio da sua família e da comunidade em que se integra; factos que serão facilmente comprovados se o tribunal ordenar a realização de um relatório social, uma vez que tal ainda não foi feito nos autos. Assim, ponderadas todas estas circunstâncias e bem assim todas as que foram supra descritas, parece-nos que dúvidas não restam de que a aplicação à arguida de uma pena de prisão efectiva não irá satisfazer as exigências de prevenção geral e especial.

3.2. O Ministério Público ([6]), na sua resposta de 22Nov05, pronunciou-se pelo improvimento do recurso:

AA Almeida recorre da pena escolhida e da respectiva medida, alegando, em síntese, que a pena aplicada não é a adequada, que o tribunal devia ter tido em consideração factos que depunham a seu favor, que a gravidade da sua conduta é reduzida, que as vítimas foram negligentes, que as quantias em que estas ficaram lesadas são relativamente baixas, que o objectivo do tribunal pode ser prosseguido por pena alternativa à de prisão e que se encontra familiar e socialmente inserida e, conclui, requerendo a substituição da pena de prisão por uma não privativa da liberdade. (...) Dos argumentos invocados pela arguida, os que eram do conhecimento do tribunal foram devidamente ponderados no acórdão na escolha da pena e fixação da respectiva medida e os demais só na motivação do recurso e sem comprovação foram trazidos ao seu conhecimento, pelo que não podem ser considerados quer pelo tribunal a quo (por se haver esgotado o seu poder jurisdicional) quer pelo tribunal ad quem (por lhe estar vedado conhecer de factos novos em sede de recurso ordinário). Tanto os motivos que determinaram o tribunal a optar convictamente pela pena de prisão como os que o levaram a afastar decididamente a suspensão da sua execução constam pormenorizadamente explicitados na parte decisória do acórdão recorrido, não merecendo a decisão qualquer censura por ser a que se adequa à gravidade da sua conduta, ao seu grau de culpa, ao seu comportamento processual e a não se mostrar este coadunável com um juízo de prognose favorável. Logo, deve negar-se provimento ao recurso interposto já que a decisão tomada pelo tribunal é a adequada e justa, atendendo aos elementos de que dispunha sobre a arguida, e só estes podem ser considerados em sede de recurso ordinário.

4. A SUSPENSÃO DA PENA

4.1. Perante uma pena de prisão – como esta – «aplicada em medida não superior a 3 anos», o tribunal haveria de suspendê-la «se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição» (art. 50.1 do CP).

4.2. No caso, o tribunal a quo entendeu – e, por isso, a negou - que «toda a conduta dos arguidos desaconselha[va] a suspensão da execução da pena e nada de relevante se descortina[va] na personalidade, nas condições de vida, na conduta posterior ou nas circunstâncias dos crimes que justifi[cass]em uma opção fundada pela suspensão»:

«Recordando que as finalidades da punição são a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (art. 40º nº 1 do Código Penal), não se mostra razoável no caso dos autos a suspensão da execução da pena de prisão já que esse juízo de prognose não se mostra coadunável com o comportamento processual relapso dos arguidos, pendência de processos em que foram declarados contumazes, ausência de paradeiro certo ou modo de vida lícito conhecido, tipologia e reiteração das condutas criminosas em apreço nos autos não se vislumbrando que por essa via menos gravosa seja possível obter a reinserção social dos arguidos, nem garantir a protecção dos bens jurídicos»

4.3. Acontece, porém, que o tribunal a quo - tendo julgado a arguida na sua ausência e não dispondo de um relatório social que o auxiliasse na «correcta determinação da sanção» (e que, suprindo o contributo da própria, lhe permitisse clarificar – tanto mais que a arguida não tinha antecedentes criminais – a sua «personalidade», as «condições da sua vida», a sua «conduta anterior e posterior ao crime» e a sua eventual dependência emocional e económica relativamente ao co-arguido)[7] - se decidiu pela não substituição da prisão por suspensão em função, simplesmente, do «comportamento processual relapso dos arguidos», da «pendência de [outros] processos» e da «ausência de paradeiro certo ou modo de vida lícito conhecido».

4.4. No entanto – e a crer no que alega agora a arguida – esta, por essa altura, já estaria separada do co-arguido (com quem «nunca mais [teria tido] qualquer contacto, escrito ou telefónico, desde a data dos factos) e a viver, «com a mãe, a irmã, o cunhado e a sobrinha, em casa destes», em Aveiro, onde terá encontrado «o afecto e o apoio familiar que lhe [teriam] permiti[do] romper com o passado e manter, no decurso do último ano, uma vida pessoal, familiar e social estável». Também aí terá «trabalhado com empregada doméstica em diversas casas» e, entretanto, «engravidado». E, se em Out05 estava – como alegou na motivação do seu recurso - «grávida de 6 meses», já será agora mãe de uma criança de um mês de idade.

4.5. Por outro lado, a arguida escreveu em 06Jan06, por intermédio da sua advogada, às vítimas, propondo-lhes o pagamento do devido «em duas ou três prestações». Em relação a uma delas (DD) – que logo correspondeu à sua proposta –, remeteu-lhe, em 11Jan, três cheques, com datas de 31Jan, 28Fev e 31Mar06, de € 125 + 62,5 + 62,5. Relativamente a CC, remeteu-lhe dois cheques de € 75, um com data de 31Jan06 e outro com data de 28Fev06. Quanto ao Eng.º GG, a arguida depositou € 100 euros na sua conta em 23Jan06 e remeteu-lhe um cheque de igual montante com data de 25Fev06. E, a respeito de FF, a arguida remeteu-lhe um cheque de € 75 datado de 28Fev06.

4.6. Quanto aos outros processos contra ela pendentes, nada se sabe – nestes autos – do estado ou resultado dos inquéritos 2577/03.0PFLRS de Loures, 2372/03.6PFLRS da 1.ª secção do MP de Loures e 444/02.3P6PRT da 2.ª secção do DIAP do Porto. Mas sabe-se que o inquérito 466/03.7GBMFR de Mafra terminou entretanto por desistência da queixa e o inquérito 986/03.3GBPNF de Penafiel por arquivamento e que nos inquéritos 971/02.2PBSTB da 2.ª secção B de Setúbal (fls. 1082) e 1023/03.3POLSB da 3.ª secção (04) do DIAP de Lisboa «ainda não foi proferido despacho final» (fls. 1197 e 1212). E sabe-se também que o comum singular 340/01.1PBCVL da 1ª secção do 3º Juízo da Covilhã, por condução sem carta, tinha «julgamento marcado para 03Fev06» (fls. 1196).

4.7. É certo que, no que à «substituição» diz respeito, deverá ter-se em conta, em caso de concurso de crimes, que «a pena que vai ser efectivamente aplicada não é a pena parcelar, mas a pena conjunta», donde que «só relativamente a esta tenha sentido pôr a questão da substituição» e que «quanto à penas parcelares, a pena de prisão não deva, em princípio, ser substituída por uma pena não detentiva»: «Determinada a pena conjunta, e sendo de prisão, então sim, o tribunal decidirá se ela pode legalmente e deve político-criminalmente ser substituída por pena não detentiva» (Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, §§ 409 e 419).

4.8. No entanto, ainda não é certo, no estádio de evolução dos demais processos pendentes contra a arguida, que o crime ora ajuizado integre um concurso de crimes.

4.9. De qualquer modo, e mesmo que o crime ora ajuizado se deva considerar isoladamente, a matéria de facto a seu tempo coligida pela 1.ª instância não se mostrava nem mostra suficiente para a boa decisão da questão da substituição da respectiva pena. Com efeito, já então havia necessidade (tanto mais que a arguida havia sido julgada na sua ausência) de «produção de prova suplementar para determinação da espécie e da medida da sanção a aplicar» (art. 369.2 CPP), nomeadamente da «elaboração de relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social» (art. 370.1). Necessidade essa que entretanto se adensou com o tempo entretanto decorrido (mais de um ano e meio) e com as vicissitudes interdecorrentes (nomeadamente a localização da arguida, a sua separação do co-arguido [que sobre ela teria algum nefasto ascendente], as novas condições da sua vida, a sua recente maternidade, as diligências que entretanto fez e vem fazendo para ressarcimento das vítimas e a evolução – em função da sua localização – dos demais processos contra ele pendentes).

5. CONCLUSÃO

A insuficiência (para a decisão da concreta questão de direito suscitada no recurso) da matéria de facto provada – se, como aqui, inviabilizar a boa decisão do recurso – implica o reenvio do processo para novo julgamento (a partir do momento processual definido pelos art.s 369.º e 370.º do CPP) da questão da substituição da pena de prisão por pena de suspensão.

6. DECISÃO

Tudo visto, o Supremo Tribunal de Justiça, reunido em audiência para apreciar o recurso, de 24Out05, da cidadã AA, reenvia o processo para novo julgamento (a partir do momento processual definido pelos art.s 360.2 e 370.1 do CPP) da questão da substituição - por suspensão - da pena de prisão a ela oportunamente aplicada, pela Vara Criminal de Lisboa, à excepção da 7.ª, a que os autos vierem a serem redistribuídos.

Lisboa, 9 de Fevereiro de 2006

Carmona da Mota - relator

Pereira Madeira

Simas Santos

Santos Carvalho


(1) Preventivamente presa entre 09 e 24Out05 e em apresentações semanais desde então (TIR a fls. 1115: «R. São Francisco Xavier, 169, 2.º Esq. H, 3830-620 Gafanha da Nazaré»).

(2) «Não se provou que os arguidos (...) actuassem por terem dificuldades económicas»

(3) Juízes Jorge Raposo, João Ramos de Sousa e Fernando Vaz Ventura.

(4) «Realizou-se julgamento com observância do formalismo legal: os arguidos prestaram termo de identidade e residência nos termos do art. 196º do Código de Processo Penal na redacção do Decreto-Lei 320-C/2000 de 20/12 e não compareceram na data designada, tendo o tribunal determinado o início da audiência nos termos do art. 333º nº 2 do Código de Processo Penal, na redacção do aludido Decreto-Lei 320-C/2000»

(5) Adv. AA.

(6) Proc. Luís Varela.

(7) «Não foi realizado relatório social para julgamento por os arguidos terem paradeiro desconhecido (fls. 935 e 936).