Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06S1626
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MARIA LAURA LEONARDO
Descritores: CTT
CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES
SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
Nº do Documento: SJ200610240016264
Data do Acordão: 10/24/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA.
Sumário : I - Até à data em que a empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal (Empresa-A) foi transformada em sociedade anónima (pelo DL n.º 87/92, de 14-05), os seus trabalhadores eram subscritores obrigatórios da Caixa Geral de Aposentações, independentemente da natureza do respectivo vínculo, com excepção daqueles que prestavam a actividade em regime de prestação de serviços.

II - Por força do estatuído no art. 9.º do DL n.º 87/92, de 14-05, com a entrada em vigor deste diploma legal, e consequente transformação dos Empresa-A em sociedade anónima, os trabalhadores que se encontravam vinculados aos Empresa-A, empresa pública, não perderam aquele direito.

III - Assim, admitido um trabalhador ao serviço dos Empresa-A em 06-08-1990, por contrato de trabalho a termo, encontra-se sujeito ao regime de aposentação da Caixa Geral de Aposentações, pelo que cabe à entidade empregadora (Empresa-A) promover a inscrição do trabalhador na CGA.

IV - Face à obrigação dos Empresa-A em promover a inscrição do trabalhador na CGA, justifica-se a condenação daqueles numa sanção pecuniária compulsória de € 50,00 por cada dia de atraso no cumprimento daquela obrigação.
Decisão Texto Integral: Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça:

I - "AA", residente em Parada de Gonta, Tondela, demandou Empresa-A, com sede na Rua S. José, nº ..., em Lisboa, pedindo que esta seja condenada (i) a reconhecer a sua antiguidade (na empresa) reportada a 6.08.1990, (ii) a inscrevê-lo como subscritor da Caixa Geral de Aposentações, com efeitos desde a referida data, efectuando os descontos que lhe competirem, e (iii) a pagar-lhe, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de 100 € por cada dia de atraso no cumprimento da condenação que lhe vier a ser imposta.

Alegou para o efeito:
- foi admitido para o grupo profissional de Carteiro, para trabalhar no CDP de Santa Comba Dão, como trabalhador efectivo dos quadros da ré, conforme despacho da Direcção dos Recursos Humanos de 26.01.1993;
- todavia, já trabalhara para a ré como contratado a termo desde 6.08.1990, tendo efectuado estágio com aproveitamento, no período de 30.03.1992 a 29.04.1992;
- a antiguidade na empresa vem definida na cl.ª 25ª/3 do AE respectivo, pelo que, atenta a data de início das suas funções - e independentemente da natureza do contrato - deveria a ré tê-lo inscrito como subscritor da C.G.A. e não no Regime Geral da Segurança Social Portuguesa;

Na contestação, a ré invoca a prescrição e sustenta que o autor fez uma errada interpretação do AE/CCT. Conclui pela improcedência da acção.
Houve resposta.
Discutida a causa, foi proferida sentença que, julgando a acção procedente, condenou a ré: (i) a reconhecer ao autor o direito à contagem do seu tempo de serviço desde 6.08.1990, (ii) a promover a inscrição do autor na Caixa Geral de Aposentações, tendo em conta o referido tempo de serviço e adoptando os procedimentos necessários, e, ainda (iii), a pagar-lhe, a título de sanção pecuniária compulsória, o montante diário de 100 €, após o "trânsito em julgado da presente lide", se não promover e até que promova a dita inscrição.

A ré apelou, com sucesso, pois a Relação revogou a sentença e absolveu a ré do pedido.
Inconformado, desta vez o autor, vem pedir revista, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:
1ª) - Deve ter-se por definitivamente assente que o autor/recorrente foi admitido ao serviço da ré/ recorrida, como contratado a termo, em 06.08.90, data a que se reporta a sua antiguidade na empresa;
2ª) - Por esse facto, o mesmo tem de se considerar abrangido no universo dos trabalhadores a que se refere o n° 1 do artº 9° do D.L. nº 87/92, de 14 de Maio;
3ª) - Estava, assim, a ré obrigada a fazer a sua inscrição na CGA por força do n° 3 do citado DL n° 87/92, que manda aplicar o artº 25° do D.L. n° 36610 de 24.11.47, sendo irrelevante se o mesmo foi admitido ao serviço da ré como contratado a termo ou como contratado sem termo;
5ª) - É, igualmente, irrelevante o regime normativo estabelecido pelo DL n° 427/89, de 7 de Dezembro, já que, por força do disposto no Estatuto dos Empresa-A, constante do Anexo ao DL nº 49368, de 10.11.69, e do Regulamento Geral do Pessoal dos Empresa-A, publicado pela Portaria n° 706/71, de 18 de Dezembro, os trabalhadores dos Empresa-A não têm a qualidade de "funcionários", nem de "agentes administrativos";
6ª) - Aliás, os admitidos até 19.05.92 sempre foram inscritos como subscritores da CGA, sendo-lhes aplicável o respectivo regime [Decreto-Lei nº 498/72, de 9 de Dezembro (Estatuto da Aposentação), com a redacção introduzida pelo DL n° 191-A/79, de 25 de Junho], por força do disposto no artº 25° do DL n° 36610, de 24.11.47;
7ª) - De qualquer modo, a não ser assim, sempre ficaria posto irremediavelmente em causa o princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei estabelecido no artº 13° da CRP;
8ª) - Ao decidir como decidiu, o acórdão recorrido violou, designadamente, os n°s 1 e 3 do artº 9° do DL n° 87/92, de 14/05, o artº 25° do DL nº 36610 de 24.11.47, o artº 1° do DL n° 498/72, de 9 de Dezembro (Estatuto da Aposentação) com a redacção introduzida pelo DL n° 191-A/79, de 25 de Junho, e o artº 13° da CRP, devendo, por isso, ser revogado e consequentemente mantida na sua totalidade a sentença da 1ª instância.

Nas contra-alegações, a ré pugna pela manutenção do acórdão recorrido.
A Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de a revista ser parcialmente concedida, referindo, em nota, que a mesma questão já fora suscitada em dois outros processos (nºs 890/06 e 1621/06), pendentes neste Supremo Tribunal.

II - Questões
Fundamentalmente, saber se a ré estava obrigada a inscrever o autor na CGA.

III - Factos
1. Para trabalhar por conta e sob a sua autoridade, direcção e fiscalização, a ré admitiu o autor como trabalhador efectivo dos seus quadros de pessoal, por despacho da sua Direcção de Recursos Humanos, de 26.01.1993.
2. O autor foi admitido para o Grupo Profissional de Carteiro (CRT), com a categoria (nível salarial) "D", para trabalhar no Centro de Distribuição Postal (CDP) de Santa Comba Dão.
3. Nos termos do supra referido despacho, tal admissão teve efeitos reportados à data de início de funções.
4. O autor pertence actualmente ao grupo profissional de carteiro (CRT), desempenhando as funções de divisão e expedição de correspondência no CDP de Santa Comba Dão.
5. Tem actualmente a categoria profissional, nível salarial, "H", auferindo a retribuição mensal ilíquida de 701,10 €, a que acrescem três diuturnidades, no montante global de 82,41 € e um subsídio de alimentação no montante de 8,15 € desde que preste pelo menos três horas de trabalho efectivo em cada dia.
6. O autor é sócio do Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações (SNTCT).
7. Antes da sua admissão nos quadros de pessoal efectivo da demandada, através do mencionado despacho da DRH, o autor já para ela trabalhava, como contratado a termo, desde 6.08.90, tendo celebrado inicialmente um contrato de 100 dias, depois um contrato de 3 meses, com início em 5.08.1991 e, por último, um contrato de 6 meses, com início em 4.05.1992 - cfr. docs. de fls 8 a 10, cujo teor se dá aqui por reproduzido.
8. O autor efectuou estágio, com aproveitamento, de 30.03.1992 a 29.04.1992 - doc. de fls. 6.
9. A demandada não inscreveu o autor como subscritor da CGA, inscrevendo-o no Regime Geral da Segurança Social Portuguesa, pese embora as inúmeras reclamações, quer do autor, quer do seu Sindicato.

IV - Apreciando
Como vimos, a questão que vem colocada é a de saber se a ré estava obrigada a inscrever o autor na CGA.
As instâncias tiveram posições divergentes: a 1ª instância respondeu afirmativamente, a Relação negativamente.
Entendeu o tribunal recorrido que, face à vinculação precária do autor, no período anterior a 1993, o mesmo não podia ser considerado nem funcionário nem agente administrativo. Logo, faltando-lhe este pressuposto necessário, não tinha direito à inscrição na Caixa Geral de Aposentações. E não tendo esse direito antes da entrada em vigor do DL nº 87/92, que converteu os Empresa-A/pessoa colectiva de direito público em "SA", não poderia ficar abrangido pelo regime transitório prevenido no seu artº 9º.

O recorrente discorda deste entendimento.
Vejamos se tem razão.

4.1. Antes de mais impõe-se precisar o seguinte: uma vez que a Caixa Geral de Aposentações não é parte na causa, tal significa que, mesmo que se venha a concordar com a argumentação do autor, a decisão a proferir não poderá ir além da condenação da ré a promover a inscrição do autor naquele organismo. Isto porque a decisão, neste processo, não obriga aquela entidade a aceitar a inscrição do autor, "se considerar que não estão preenchidos os indispensáveis requisitos" (neste sentido, o acórdão do STJ de 4.07.2002, proferido na revista nº 95/2002, da 4ª secção).
Posto isto, há que ter presente que o autor foi contratado a termo, em 6.08.90, pela, então, empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal (Empresa-A), celebrando, posteriormente, mais dois contratos a termo - um com início em 5.08.91 e outro com início em 4.05.1992 - e que só foi admitido como trabalhador efectivo da ré, sociedade anónima, (Empresa-A, SA), por despacho da sua Direcção de Recursos Humanos, de 26.01.93.
Como o autor recorrente defende que devia ter sido inscrito como subscritor da CGA desde aquela data (6.08.90), há que definir o regime de inscrição (para efeitos de aposentação) a que estavam sujeitos os trabalhadores dos Empresa-A, enquanto empresa pública, e, depois, como sociedade anónima.

A estruturação da "Administração-Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones" em empresa pública do Estado, "Correios e Telecomunicações de Portugal", operou-se através do DL nº 49 368, de 10.11.69. O respectivo regime - Estatuto dos Correios e Telecomunicações - consta do anexo I àquele Decreto-Lei (artº 1º deste diploma e artº 1º do referido Estatuto).
No artº 26º-3 (do Estatuto), sobre a integração do pessoal dos Empresa-A, estabelecem-se três escalões: os servidores admitidos (até 31 de Dezembro de 1969) nos quadros permanentes ficam no I escalão; os servidores admitidos por tempo indeterminado, mas susceptíveis de despedimento, ficam no escalão II; servidores temporários, admitidos por prazo limitado, ainda que prorrogável ficam no escalão III..
No mesmo estatuto (artº 27º-4), previa-se a fixação de um novo regime de aposentação - em regulamento próprio - a partir de 1 de Janeiro de 1970. Tal regime asseguraria a transferibilidade e manutenção dos direitos à aposentação adquiridos pelos servidores admitidos nos Empresa-A a partir desta data para qualquer outro sistema nacional de aposentação, incluindo a Caixa Geral de Aposentações e vice-versa.
No preâmbulo da Portaria 706/71, de 18 de Dezembro, que aprovou o Regulamento Geral do Pessoal dos Empresa-A, consta expressamente que os nºs 1 e 2 do citado artº 26º (sobre o regime jurídico do pessoal da Empresa-A) consagra "um regime privativo de direito público para o pessoal dos Empresa-A, que constará de regulamentos especiais" e que a matéria respeitante às instituições de previdência, designadamente no que concerne à aposentação, constarão de regulamentos próprios.
Aquele regulamento estabelece que o pessoal dos Empresa-A passa a reger-se por um estatuto privativo, deixando em consequência de estar sujeito ao preceituado no estatuto do funcionalismo público (artº 1º -1). No artº 2, define as espécies de pessoal. Os servidores dos escalões I e II a que se referem as alíneas a) e b) do nº 3 do artº 26º do estatuto da empresa, abrangem os profissionais Empresa-A com carácter de permanência (nº 1). O escalão III, constituído pelos profissionais Empresa-A com carácter temporário, admitidos por tempo limitado, ainda que prorrogável, e aludido na alínea c) do nº 3 do citado artº 26º do Estatuto, abrange, designadamente: a) os artífices assalariados por certo tempo; b) os indivíduos de outras qualificações profissionais eventualmente admitidos por determinado período (nº 2). No nº 3, indicam-se outros sujeitos que, por não serem profissionais Empresa-A, não são abrangidos pelas disposições do Regulamento, mas sim pelo seu anexo. São os que prestam serviço: a) acidentalmente como assalariados; b) encarregados de postos da Empresa-A; c) em sistema de avença; d) por tarefa; e) como arrematantes de conduções de malas.
A empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal (Empresa-A) foi transformada em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, pelo DL nº 87/92, de 14.05, passando a denominar-se Empresa-A - , abreviadamente designada por Empresa-A, SA.
O regime jurídico dos trabalhadores e pensionistas ficou assim definido:
- os regimes jurídicos (vigentes) definidos na legislação aplicável ao pessoal da empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal continuavam a produzir efeitos relativamente aos trabalhadores e pensionistas da empresa pública Empresa-A, os quais mantinham todos os direitos e obrigações que tinham na data da entrada em vigor do DL nº 87/92 (artº 9º-1-2);
- as relações entre os Empresa-A, SA, e a Caixa Geral de Aposentações continuavam a ser regidas pelo artº 25º do DL nº 36 610, de 24 de Novembro de 1947, relativamente ao universo de trabalhadores previsto no nº 1" (nº 3 do mesmo preceito; aquele artº 25º estabelecia as regras a observar enquanto subsistisse o regime de aposentações do pessoal dos Empresa-A, na altura, ainda, não estruturado como empresa pública).

Para definir o regime de inscrição (para efeitos de aposentação) a que estavam sujeitos os trabalhadores dos Empresa-A, enquanto empresa pública, e depois, como sociedade anónima, há ainda que ter em conta outros diplomas, designadamente, o DL nº 36 610, acabado de citar, o DL nº 498/72, de 9 de Dezembro, na redacção dada pelo DL nº 191-A/79, de 25 de Junho, e o DL nº 427/89, de 7.12.
Comecemos pelo artº 1º do DL nº 36 610 (da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência).
Aí se preceitua que, a partir de 1 de Janeiro de 1948, serão considerados subscritores da Caixa Geral de Aposentações, com as correspondentes regalias e deveres, todos os funcionários e servidores civis do Estado e os dos corpos administrativos, qualquer que seja a forma do seu provimento ou a natureza da prestação dos seus serviços, desde que recebam vencimento ou salário pago por força das verbas inscritas expressamente para pessoal no Orçamento Geral do Estado ou nos corpos administrativos ou serviços e organismos autónomos.
No artº 3º, estabelece-se o modo como será efectuada a inscrição.
Segundo o artº 1º do Estatuto de Aposentação (DL nº 498/72) têm direito a inscrição na Caixa Geral de Aposentações os "funcionários e agentes que, vinculados a qualquer título, exerçam funções, com subordinação à direcção e disciplina dos respectivos órgãos, na Administração Central, Local e Regional, incluindo federações ou associações de municípios e serviços municipalizados, institutos públicos e outras pessoas colectivas de direito público e recebam ordenado, salário ou outra remuneração susceptível, pela sua natureza, de pagamento de quota, nos termos do artº 6º (que contempla a incidência da quota, para efeitos de desconto).
No nº 2 do mesmo artigo, veda-se esse direito: a) aos que apenas se obrigam a prestar a qualquer entidade pública certo resultado do seu trabalho desempenhado com autonomia e prévia estipulação de remuneração; b) e aos que devam ser aposentados por entidades diferentes da Caixa."
O DL nº 427/89, de 7.12, cujo objecto é a definição do "regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública" (artº 1º), apenas se aplica aos serviços e organismos da Administração Central, "aos institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos" (nº 1), "aos serviços e organismos na dependência orgânica e funcional da Presidência da República, da Assembleia da República e das instituições judiciárias" (n.º 2), "à administração regional autónoma, podendo ser-lhe introduzidas adaptações em diploma próprio" (n.º 3) e à administração local, mas relativamente a esta, mediante diploma próprio (n.º 4) - artº 2º.
No nº 1 do artº 44º, faz-se a seguinte salvaguarda:
"Ao pessoal dos institutos públicos que revistam a forma de serviços personalizados ou de fundos públicos abrangidos pelo regime aplicável às empresa públicas ou pelo contrato individual de trabalho e, bem assim, ao pessoal abrangido por regimes identificados em lei como regimes de direito público privativo aplicam-se as respectivas disposições estatutárias.»
Finalmente, refira-se que o DL nº 260/76, de 8 de Abril - que veio definir os princípios fundamentais sobre o estatuto das empresas públicas - ao estipular, no artº 33º, que o regime de previdência do pessoal das empresas públicas é o regime geral da previdência para os trabalhadores das empresas privadas, excepciona os casos de pessoal sujeito a um regime de direito administrativo ou que a ele fica sujeito nos termos do artº 30º. Este preceito salvaguarda a possibilidade de ao pessoal de empresas que explorem serviços públicos vir a ser definido, em certos aspectos, um regime de direito administrativo baseado no estatuto do Funcionalismo Público, com a natureza específica da actividade de cada empresa.

Face ao disposto no artº 2º-3 da Portaria nº 706/71, não restam dúvidas que o autor, enquanto contratado a termo (em 6.08.90) ficou na situação de assalariado (com carácter) acidental, logo sujeito ao regime que resulta do anexo a essa Portaria.
Nessa altura, os Empresa-A estavam estruturados como empresa pública.

Vejamos agora se os seus trabalhadores, incluindo os contratados a termo, tinham direito a ser inscritos na Caixa Geral de Aposentações (CGA).

A resposta não pode deixar de ser afirmativa. Neste sentido decidiu o acórdão do STJ, de 11.10.2006 (in revista nº 1621/06, da 4ª secção, relatado pelo Conselheiro Sousa Peixoto, também subscritor do presente acórdão), que se debruçou sobre a mesma questão e cujos termos iremos seguir de perto.
Aquela conclusão resulta do disposto no artº 1º (Direito de inscrição) do Estatuto da Aposentação do funcionalismo público, já citado.
Na verdade, como decorre desse preceito, "todos os funcionários e agentes dos organismos e serviços nele referidos eram subscritores obrigatórios da CGA, independentemente da natureza do respectivo vínculo. De fora, ficavam apenas, como resulta do disposto na al. a) do seu n.º 2, aqueles que prestavam a sua actividade em regime de não subordinação, ou seja, em regime de prestação de serviço".
"Aliás, se dúvidas houvesse a esse respeito, o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 191-A/79 encarregar-se-ia de as dissipar, pois aí se diz claramente que uma das inovações introduzidas pelo referido D. L. foi "[o] alargamento do âmbito pessoal em termos que praticamente só não permitirão a inscrição na Caixa Geral de Aposentações às pessoas que prestem serviços em regime de autonomia profissional".
"Como se disse no parecer n.º 41/79, de 22.11.79 da Procuradoria-Geral da República, publicado no D. R., II série, n.º 101, de 2.5.80 e no BMJ n.º 296, p. 33 e ss., as dúvidas que se poderiam pôr no domínio do Decreto-Lei n.º 498/72 quanto à inscrição na CGA do pessoal contratado a termo deixaram de ter razão de ser com a publicação do D. L. n.º 191-A/79."
"Deste modo, temos de concluir que todos os trabalhadores vinculados por contrato de trabalho à Administração Central, Local e Regional, incluindo federações ou associações de municípios e serviços municipalizados, aos institutos públicos e a outras pessoas colectivas de direito público passaram a ser subscritores obrigatórios da CGA, a partir da entrada em vigor do D. L. n.º 191-A/79."
Desse "universo de trabalhadores faziam parte os trabalhadores das empresas públicas, nomeadamente os trabalhadores da empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal que havia sido criada pelo D.L. n.º 49368, de 10 de Novembro de 1969, uma vez que as empresas públicas dotadas de personalidade jurídica de direito público (como era o caso dos Empresa-A - vide art.º 1.º, n.º 2, do D. L. 49 368) constituem uma das modalidades dos institutos públicos (Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. I, p. 190, Almedina, 10.ª edição, reimpressão)."
Esta solução não foi posta em causa com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 260/76, já citado, face à ressalva constante do seu artº 33º. Conforme resulta claramente do preâmbulo da Portaria nº 706/71 (que aprovou o citado Regulamento Geral), o pessoal dos Empresa-A estava sujeito a um regime privativo mas de direito público, por força do disposto no artº 26º do DL nº 49 368, de 10.11.69 (que transformou a Administração-Geral dos Correios e Telecomunicações de Portugal em empresa pública).
Também não afecta tal solução o disposto no nº 3 do artº 14º do DL n.º 427/89, de 7/12 (que veio definir o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública), onde expressamente se estatui que o contrato de trabalho a termo certo não confere a qualidade de agente administrativo. Aquele entendimento decorre do disposto no seu artº 2º, que delimita o âmbito de aplicação do citado diploma legal. Segundo tal preceito, este apenas se aplica: aos serviços e organismos da Administração Central, aos institutos públicos nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundos públicos (nº 1); aos serviços e organismos na dependência orgânica e funcional da Presidência da República, da Assembleia da República e das instituições judiciárias (n.º 2); à administração regional autónoma, podendo ser-lhe introduzidas adaptações em diploma próprio (n.º 3); e a administração local, mas relativamente a esta, mediante diploma próprio (n.º 4).
Deste preceito resulta claramente que as empresas públicas ficaram excluídas do âmbito de aplicação do DL nº 427/89, já que, no que concerne aos institutos públicos, apenas ficaram abrangidas as modalidades "serviços personalizados do Estado" e "fundos públicos".
De qualquer modo, ainda que o regime estabelecido naquele diploma fosse aplicável às empresas públicas, não o seria à Empresa-A, por força do disposto no seu artº 44º-1, que expressamente exclui do seu âmbito de aplicação o "pessoal abrangido por regimes identificados em lei como regimes de direito público privativo", pessoal que continuaria sujeito às respectivas disposições estatutárias.
Temos, assim, que os trabalhadores da empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal eram subscritores obrigatórios da Caixa Geral de Aposentações.
Também decorre do artº 9º do DL nº 87/92 que esses trabalhadores (os que se encontravam vinculados aos Empresa-A, empresa pública) não perderam esse direito com a transformação da empresa em sociedade anónima pelo DL nº 87/92, de 14/5.
Como se escreve no citado acórdão, resulta inequivocamente do nº 1 do referido artº 9º que "os trabalhadores da empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal mantiveram, perante os Empresa-A, S. A., todos os direitos e obrigações de que então já eram titulares e, mais do que isso, a sua relação laboral continuou a reger-se pelo regime jurídico que até aí lhes era aplicável e as relações entre os Empresa-A, S. A. e a Caixa Geral de Aposentações no que toca àqueles trabalhadores continuaram a ser reguladas pelo art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 36 610, de 24 de Novembro de 1947".
Logo, "o direito de inscrição na CGA de que os trabalhadores da empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal eram titulares não se extinguiu pelo facto de eles terem passado a trabalhar para a nova empresa. Manteve-se inalterado, por força do disposto no nº 1 do aludido artº 9º".

Dito isto, voltemos ao caso dos autos.
Relembremos que o autor começou a trabalhar para a empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal (Empresa-A) mediante contratos a termo certo - o primeiro dos quais com início em 6.08.1990 - e que foi admitido como trabalhador efectivo dos quadros de pessoal da empresa ré - após a sua constituição em sociedade anónima (Empresa-A, SA) - por despacho da sua Direcção de Recursos Humanos de 26.01.1993.
E chegamos ao cerne da questão: saber se o autor devia ter sido inscrito, "ab initio" (em 1990), como subscritor da Caixa Geral de Aposentações (CGA). Por outras palavras, se, ao tempo (antes da entrada em vigor do DL nº 87/92), o autor reunia os requisitos exigidos para a inscrição, sendo certo que, conforme resulta do citado artº 9º, só os regimes jurídicos definidos na legislação aplicável ao pessoal da empresa pública Empresa-A, vigentes ao tempo e relativos a trabalhadores e pensionistas, foram como tal assumidos pela empresa Empresa-A, S.A., regimes que, por isso, continuaram a produzir efeitos, ficando a nova sociedade obrigada a assegurar a manutenção do fundo de pensões do pessoal daquela empresa pública.
Ora face a tudo o que atrás se disse e pelas razões que se expuseram não restam dúvidas que a relação iniciada em 6.08.90, titulada por contrato de trabalho a termo certo, satisfazia os requisitos do artº 1º do Estatuto de Aposentação (DL nº 498/72, de 9 de Dezembro, na redacção dada pelo DL nº 191-A/79, de 25 de Junho). Assim sendo, o autor tinha direito à sua inscrição como subscritor da CGA.
Resultando igualmente da matéria provada que, à data da transformação da empresa pública Empresa-A em sociedade anónima, o autor se encontrava na situação de contratado a termo, isto significa que, por força do disposto no citado artº 9º-1, manteve a titularidade daquele direito.
É certo que foi dado como provado que a ré admitiu o autor como trabalhador efectivo dos seus quadros, por despacho da sua direcção de recursos Humanos, de 26.01.93, e que o anterior contrato a termo, pelo prazo de seis meses, tivera o seu início em 4.05.92. Só que não resulta da matéria de facto que a relação de trabalho tenha sido efectivamente interrompida em 4 de Novembro de 1992. Pelo contrário, o que está provado é que o autor antes da sua admissão como trabalhador efectivo, já trabalhava para a ré, como contratado a termo, desde 6.08.90, tendo celebrado inicialmente um contrato de 100 dias, depois um contrato de 3 meses, com início em 5.08.91 e, por último, um contrato de 6 meses, com início em 4.05.92. Além disso, também ficou provado que efectuou estágio, com aproveitamento, de 30.03.92 a 29.04.92.
Como se sublinha no acórdão do STJ de 18.10.2006 (na revista nº 1628/06 - 4ª secção, que se debruçou sobre idêntica questão), "não cabe ao Supremo Tribunal de Justiça extrair ilações dos factos apurados, nos termos do artº 351º do CC, mas sim aplicar definitivamente o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, como resulta do nº 2 do artº 87º do Código de Processo de Trabalho, conjugado com os artigos 721º, nº 2, 722º, nº 2, e 729º do Código Processo Civil."
Assim sendo porque não decorre da matéria provada que a situação de contratado a termo, com início em 4.05.92, tenha sido interrompida no fim do prazo de seis meses, há que concluir que o autor tem direito a que a ré promova a sua inscrição na CGA, com efeitos a partir de 6.08.90, relativamente aos períodos em que prestou trabalho subordinado efectivo em favor da empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal (Empresa-A) e dos Empresa-A, SA, competindo, ainda, à ré adoptar os procedimentos necessários a nível contributivo.
Perante esta solução, perde sentido a invocada violação do princípio da igualdade (artº 13º da CRP).

4.2 O recorrente, com a impugnação do acórdão recorrido, pretende que o mesmo seja revogado e que a sentença da 1ª instância seja mantida na totalidade. Ou seja, também relativamente ao segmento decisório, que condenou a ré a pagar a sanção pecuniária compulsória no montante de € 100, nos termos previstos no artº 829º-A do CC.
Por seu turno, a ré, nas contra-alegações, defende a manutenção do acórdão recorrido.
Já vimos que aquela sentença foi impugnada por esta e que a Relação, julgando procedente a apelação, revogou-a, absolvendo a ré do pedido.
Concluindo-se que a recorrida está obrigada a promover a inscrição do autor na CGA, impõe-se apreciar se deve ou não manter-se aquela condenação.
A resposta não pode deixar de ser afirmativa, na medida em que se verifica o pressuposto da aplicação daquela sanção - estar em causa uma obrigação de prestação de facto infungível (a obrigação da ré de promover a inscrição do autor na CGA).
E, como resulta do citado artº 829º-A, a sanção é devida desde o trânsito em julgado da decisão que a decreta.
Todavia, divergindo parcialmente da decisão da 1ª instância, considera-se mais adequado a essa sanção o montante de € 50 por cada dia de atraso da ré no cumprimento da obrigação de inscrever o autor na CGA (neste sentido, veja-se o ac. do STJ de 28.09.06, na revista nº 890/06, processo citado no parecer do MP).

V - Decidindo
Nestes termos, concedendo parcialmente a revista, acordam em revogar o acórdão recorrido e em condenar a ré a:
a) Promover a inscrição do autor na Caixa Geral de Aposentações, com efeitos a partir de 6.08.90, relativamente aos períodos em que prestou trabalho subordinado efectivo em favor da empresa pública Correios Telecomunicações de Portugal (Empresa-A) e dos Empresa-A, SA, bem como a efectuar os descontos legais que lhe competirem;
b) Pagar a quantia de € 50,00 (cinquenta euros), a título de sanção pecuniária compulsória, com o destino previsto no nº 3 do artº 829º-A/do CC, por cada dia de atraso - a contar do trânsito em julgado da presente decisão - no cumprimento da obrigação em que foi condenada (de promover a referida inscrição na CGA).
Custas, nas instâncias e na revista, a cargo de autor e ré na proporção de 1/3 e 2/3.

Lisboa, 24 de Outubro de 2006
Maria Laura Leonardo - Relator
Sousa Peixoto
Sousa Grandão
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(1) Nº143/06. Relª: Mª Laura C. S. Maia T. Leonardo. Adjºs: Conselheiros Sousa Peixoto e Sousa Grandão.