Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
12/05.8IDBJA.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: ARMINDO MONTEIRO
Descritores: ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CÚMULO JURÍDICO
CONHECIMENTO SUPERVENIENTE
CONDIÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PENA ÚNICA
PREVENÇÃO GERAL
PREVENÇÃO ESPECIAL
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
Data do Acordão: 05/09/2012
Votação: VOTO DE VENCIDO E VOTO DE DESEMPATE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO AO RECURSO
Área Temática: DIREITO PENAL - PENAS/ SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO - ESCOLHA E MEDIDA DA PENA/ PUNIÇÃO DO CONCURSO DE CRIMES
DIREITO PROCESSUAL PENAL - SENTENÇA - RECURSOS
Doutrina: - André Lamas Leite, in A Suspensão da Execução da Pena Privativa de Liberdade Sob Pretexto da Revisão de 2007 do Código Penal, BFDUC, Estudos de Homenagem ao Professor Figueiredo Dias, Vol. II, 2009, págs. 608 e 609 e ss. .
- Casalta Nabais, O Dever Fundamental de Pagar Impostos, de, págs. 102.
- Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 292, 335, 338.
- Figueiredo Dias e Costa Andrade, “ O Crime de Fraude Fiscal no Novo Direito Penal Tributário Português ”, in RPCC, Ano 6.º, Janeiro-Março 1996, 76 .
- Lobo Moutinho, in Da Unidade à Pluralidade dos Crimes no Direito Penal Português, ed. Da Faculdade de Direito da UC, 2005, 1324.
- Susana Aires de Sousa, in Estudos de Homenagem ao Professor Figueiredo Dias , BFDUC , 2009 , I , págs. 76 e 77 , nota 174.
Legislação Nacional: CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 2.º, 30.º, 50.º, 56.º, 77.º, 78.º.
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 371.º-A, 471.º N.ºS 1 E 472.º, NºS 1 E 2.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 103.º, N.º1, 104.º, N.º3.
RGIT: - ARTIGO 14.º, 105.º N.º1 E N.º 5, 107º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 5.12.1974, IN BMJ 232, 43;
-DE 2.6.2004, CJ, STJ, II, 221;
-DE 9.3. 2005, PROCESSO N.º 346/05, DESTA 3.ª SECÇÃO.
Sumário :

I - A suspensão da execução da pena de prisão imposta nos crimes tributários obedece a regras específicas decorrentes do art. 14.º do RGIT, sendo aquela sempre condicionada ao pagamento das prestações tributárias e legais acréscimos, do montante dos benefícios indevidamente recebidos e, caso o juiz o entenda, ao pagamento das quantias até ao limite máximo estabelecido para a pena de multa – n.º 1, mas o preceito não afasta a aplicação, complementar, do art. 56.º do CP, regulamentando as condições em que a revogação da suspensão pode ter lugar, em última ratio, por via do incumprimento grosseiro e culposo, das obrigações impostas ao condenado.
II - Uma particularidade deste regime está, ainda, em que na falta de pagamento, o tribunal pode exigir garantias de pagamento, prorrogar o período de suspensão até metade do inicialmente previsto, mas sem exceder o prazo máximo de suspensão admissível ou revogar a suspensão da execução da pena – n.º 2, als. a), b), e c). E por força desse regime especial, que não é derrogado pela lei geral, o período de duração da pena suspensa não tem que coincidir com a duração da pena.
III - Em caso de cúmulo jurídico é assente que o tribunal pode manter a suspensão em relação a qualquer das penas, a todas, ou aplicar o respectivo regime, suposto que a valoração global dos factos e a personalidade do agente o justifiquem e convirjam os inabdicáveis pressupostos enunciados no art. 50.º do CP, à pena única.
IV -No concurso superveniente de infracções tudo se passa como se, por pura ficção, o tribunal apreciasse, contemporaneamente com a sentença, todos os crimes praticados pelo arguido, formando um juízo censório único, projectando-o retroactivamente.
V - Na fixação da medida concreta da pena de concurso atender-se-á ao efeito que a nível de prevenção geral vai repercutir, efeito que, sendo de contenção dos demais potenciais delinquentes, é também o de crença na validade da norma e da sua eficácia, do vigor da lei e dos seus órgãos aplicadores, para confiança nos tribunais, efeito muito sentido, atento o flagelo do não pagamento dos impostos no nosso país, mas algo diluído, atento o lapso de tempo já decorrido sobre a constituição em mora fiscal e o interesse manifestado em solver a dívida.
VI -A nível da prevenção especial, que é o da interiorização dos maus resultados do crime, o arguido denota consciência disso, não se demitindo desse dever, sente que está adstrito a essa obrigação, revela “raciocínio crítico”, mas ainda aguarda que seja apurado o exacto montante a pagar, sendo certo que não resulta dos autos que seja detentor de um estatuto económico-financeiro, que sem o mais leve esforço, e só por aversão tributária, incúria ou alcance para si, deixe de cumprir, dando-se como provado, ainda, que não é proprietário de bens imóveis. Foi uma questão de opção de gestão, atendendo à salvaguarda que sempre procurou efectuar em relação à manutenção de remunerações aos colaboradores.
VII - O arguido é descrito como voluntarioso, ambicioso, trabalhador desde jovem, que subiu a pulso na vida, desempenhando várias profissões até chegar a sócio gerente único da actual empresa, e amante e crente no que faz, pelo que se lhe credita um juízo favorável, capaz de regularizar a dívida, atentas as suas qualidades profissionais, descredenciando-se os contra factos negativos na sentença, por insuficientemente caracterizados ao nível factual, nada lucrando a comunidade e o tecido social – era mais um espectro de despedimento no ar –, e nem o Estado, na prisão efectiva aplicada em 1.ª instância, que faria experimentar ainda mais dificuldades de encaixe fiscal.
VIII - Assim, justifica-se a condenação, em cúmulo, vistas as penas parcelares em apreço (4 anos e 5 meses de prisão por um crime continuado de abuso de confiança fiscal agravado, 3 meses de prisão por um crime de abuso de confiança fiscal, tendo sido, em cúmulo jurídico dessas penas, condenado na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo, mediante a obrigação de o arguido, no período de 3 anos, proceder ao pagamento ao fisco da importância de € 3 025 990,91, e 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período, subordinada à condição de pagamento das contribuições em dívida e acréscimos legais a ocorrer no mesmo período, por um crime continuado de abuso de confiança contra a segurança social), na pena única de 5 anos de prisão, suspensa por igual tempo, mas com a condição de regularização, ou seja, o pagamento de, pelo menos, 20% em cada ano, incluindo o corrente, das dívidas fiscal e à Segurança Social.

Decisão Texto Integral:

Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça :


Em processo comum com intervenção do tribunal colectivo  de Beja sob o n.º 12/05.8I DBJA , foi submetido a julgamento, para fins de cúmulo jurídico,  AA, antes condenado por acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 6-9-2011, transitado em julgado em 3-10-2011, no âmbito do presente processo comum colectivo n. 12/05.8IDBJA, por factos praticados entre Janeiro de 2002 e Dezembro de 2007, pela prática, e em concurso efectivo, de um crime de abuso de confiança fiscal agravado, na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 30.º, n.º 2 do Código Penal e 105.º, n.º 1 e n.º 5 do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de quatro (4) anos e cinco (5) meses de prisão e um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.º 1 do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de três (3) meses de prisão e em cúmulo destas, na pena única de quatro (4) anos e seis (6) meses de prisão a qual foi suspensa pelo mesmo período mediante a obrigação do mesmo, no período de três anos, proceder ao pagamento ao fisco da importância de € 3 025 990,91, fazendo prova nos autos desse pagamento e  por acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido em 24-06-2010, no âmbito do P.º . n. 647/08.7 TABJA, transitado em julgado em 13-9-2010, por factos praticados entre Abril de 2006 e Novembro de 2007 pela prática de um crime de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, na forma continuada, previsto no artigo 107º, n. 1 e punido pelo artigo 105.º, n.º 1, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias, com referência ao artigo 30º, n. 2, do Código Penal, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão suspensa na sua execução pelo mesmo período, subordinada à condição de pagamento das contribuições em dívida e acréscimos legais a ocorrer no mesmo período.


Em cúmulo jurídico destas penas por acórdão proferido neste processo foi condenado  na pena única de 5 (cinco) anos e 5 (cinco) meses de prisão, revogando-se a suspensão antes imposta .

O arguido , inconformado com o decidido , interpõs recurso directamente para este STJ , apresentando na motivação as seguintes conclusões :


1ª As penas parcelares aplicadas aos crimes foram as seguintes (i) quatro (4) anos e cinco (5) meses de prisão pelo crime de abuso de confiança fiscal agravado e três (3) meses de prisão pelo crime de abuso de confiança fiscal condenando-o em cúmulo destas, na pena única de quatro (4) anos e seis (6) meses de prisão a qual foi suspensa na sua execução pelo mesmo período mediante a obrigação de no período de três anos proceder ao pagamento ao fisco (ii) um (1) ano e seis (6) meses de prisão pelo crime de abuso de confiança contra a segurança social suspensa na sua execução pelo mesmo período subordinada à condição de pagamento das contribuições em dívida e acréscimos legais;

2ª Ao ter formado o cúmulo jurídico, por força do artigo 77º, n.º 2 do Código Penal, o tribunal tinha ante si uma pena variável entre 4 anos e 5 meses e 6 anos e 2 meses, sendo o máximo a soma das penas que entravam no cúmulo, e o mínimo a mais grave das penas em presença.

3ª Foi determinada como pena única, por efeito do cúmulo jurídico, cinco (5) anos e cinco (5) meses de prisão.

4ª A decisão enferma de nulidade (artigo 379 n.º 1 alínea a) do CPP, por violação do dever de fundamentação das razões de direito da decisão, a que se refere o art. 374.º, n.º 2 do CPP.
 
5ª Ao ter encontrado a pena concreta, em cúmulo jurídico, e ao tê-la situada em 5 e 5 meses, o tribunal violou o artigo 77º, n. º 1 e 2 do Código Penal

6ª A pena aplicada que deveria sê-lo em medida não superior ao limite mínimo e nunca em medida superior a 5 anos, a qual deveria ter sido suspensa na sua execução.

7ª Nos termos do artigo 77º, nº 1, do Código Penal, «quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles» é condenado numa única pena, em cuja medida «são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente».

8ª A pena única do concurso, formada no sistema de pena conjunta e que parte das várias penas parcelares aplicadas pelos vários crimes (princípio da acumulação), deve ser, pois, fixada, dentro da moldura do cúmulo estabelecido pelo artigo 78º do Código Penal, tendo em conta os factos e a personalidade do agente.

9ª Na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está, pois, ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, que deve ter em conta as conexões e o tipo de conexão entre os factos em concurso.

10ª Fundamental na formação da pena do concurso é a visão de conjunta dos factos, cuja determinação haverá que ter por objecto a «ilicitude global» - encontrada através da avaliação da conexão e do tipo de conexão, que se verifique entre os factos concorrentes.

11ª Não foi isso que o Tribunal fez nos presentes autos.

12ª Os factos não são objecto de análise conjunta, não há qualquer avaliação da conexão entre eles e do tipo de conexão, limitando-se a decisão recorrida na fundamentação dos factos à referência vaga e tabelar «como se tem demonstrado, e foi sobejamente repetido nas sentenças, os factos são graves».

13ª Não é indiferente, para o efeito de determinação da pena única a aplicar, nomeadamente, o facto de se tratarem de crimes da mesma natureza (crimes de abuso de confiança fiscal seja fiscal ou contra a segurança social).

14ª Ou que, na ponderação do lapso de temporal, (tratam-se de factos que ocorreram entre 2002 e 2007 inclusive), se (i) releve que ficou provado o conhecimento pela autoridade fiscal da prática dos factos sem que a mesma haja agido no sentido de impedir a reiteração dos mesmos (ii) atenda ao circunstancialismo em que os mesmos foram praticados.
15ª Ou que, os ilícitos em apreço se tratem de crimes de verificação muito frequente, conforme resulta das estatísticas da Justiça disponíveis no site da internet do Governo, www.gov.mj.pt.

16ª Ou a ponderação dos factos provados em sede da audiência de cúmulo jurídico sob os n.º 4 e 6 factos, relativamente aos quais nem sequer é feita qualquer menção, muito menos uma apreciação crítica.

17ª Factos estes que tinham sido dados como não provados aquando da realização da audiência de julgamento no processo 12/05.8IDBJA [cfr. factos dados como não provados sob as alíneas i) e j).

18ª E que demonstram, afinal que a sociedade arguida não recebeu os valores de IVA liquidados aos seus clientes, integrando-o no seu património - ao contrário do que havia ficado provado sob o n.º 27 em sede de condenação em primeira instância e na alínea c) dos factos transcritos em sede de cúmulo jurídico.

19ª Pois que, penhorados créditos em 2006, os quais correspondem às verbas facturadas aos clientes, a sociedade arguida não pode ter recebido a quantia referente ao IVA.

20ª A decisão recorrida, não levando em linha de conta, clara e concretamente, os factos ilícitos cometidos pelo arguido e a sua personalidade, sem dúvida que não encerra em si todos aqueles elementos exigidos pelo n.º 2, do art. 374 do CPP, atinentes à fundamentação, e que o art. 77, nº 1, do C. Penal impõe que sejam tidos em consideração na medida da pena.

21ª No que se refere à consideração da personalidade (da personalidade, dir-se-ia estrutural, que se manifesta e tal como se manifesta na totalidade dos factos) em sede de cúmulo jurídico deve ser ponderado «o modo como a personalidade se projecta nos factos ou é por estes revelada, ou seja, aferir se os factos traduzem uma tendência desvaliosa, ou antes se se reconduzem apenas a uma pluriocasionalidade que não tem raízes na personalidade do agente, tudo em ordem a demonstrar a adequação. Justeza e sobretudo a proporcionalidade entre a pena conjunta a aplicar e a avaliação conjunta daqueles dois factores» Só no primeiro caso, e já não no segundo será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta.

22ª Sempre considerando, conforme ensina o Prof. Figueiredo Dias (in Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, págs. 290 a 291), «as exigências de prevenção, e especialmente na pena do concurso os efeitos previsíveis da pena única sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).»

23ª A matéria de facto dada como provada no que se refere à inserção social e familiar do arguido, à sua personalidade, o relatório social do arguido evidencia o seguinte quadro:

- O arguido vive em união de facto, tendo, duas filhas de 8 e de 5 anos de idade respectivamente, conjunto familiar onde se destacam vínculos de estabilidade afectiva;

- O cônjuge demonstra um apoio consistente, o que suporta o controlo emocional que o caracteriza;

- Comparticipa nas despesas de um dos filhos, estudante universitário, fruto da primeira união conjugal que manteve;

- Não apresenta dificuldades de integração comunitária no meio sócio-residencial em que se movimenta…

- Aparenta ser um indivíduo detentor de competências pessoais ao nível da capacidade de comunicação e de argumentação e laborais face à capacidade empreendedora que o tem caracterizado e aos esforços que tem envidado no sentido de se manter activo;

- O arguido salienta ainda reconhecer o dano causado, evidenciando algum raciocínio crítico e aceita a importância da reparação de danos, desde que em condições de cumprimento realistas;

24ª No que se refere às suas condições profissionais, resultou ainda provado em audiência de cúmulo jurídico [sob o n.º 7] que «actualmente o arguido trabalha como Director de Segurança para a sociedade BB II – Unipessoal Lda. auferindo o vencimento ilíquido mensal de 731,83€. (setecentos e trinta e um euros e oitenta e três cêntimos).

25ª Além disso, como relevo para a avaliação da personalidade do arguido, resulta o seguinte da matéria dada como provada nos processos a cujas penas se procede a cúmulo:

- O grosso da clientela da sociedade BB era constituída por entidades públicas, nomeadamente estabelecimentos de ensino superior, municípios, empresas públicas, hospitais;

- Ao tempo dos factos, boa parte dos clientes da sociedade arguida, nomeadamente entes públicos, atrasavam-se no cumprimento das suas obrigações para com a sociedade arguida, nomeadamente no pagamento dos serviços que a sociedade arguida prestada – sendo em média 6 meses quando estava previsto serem a 30/60 dias;

- Ao nível do IVA a sociedade BB enquadra-se desde 01 de Janeiro de 2002 no regime normal de periodicidade mensal, enquadramento que se manteve nos anos seguintes até, pelo menos, Dezembro de 2007, encontrando-se obrigada à entrega de cada declaração periódica até ao dia 10 do mês subsequente ao termo daquele em que ocorrera a venda ou prestação de serviços;

- A sociedade arguida e o arguido ora recorrente apresentaram propostas para proceder ao pagamento em prestações das dívidas fiscais que tinham;

- Apesar das dívidas fiscais, a sociedade arguida sempre pagou os salários aos trabalhadores que manteve ao seu serviço;

- A sociedade arguida era uma das maiores empresas provadas empregadoras no Alentejo;

- Em face das dificuldades financeiras da sociedade arguida esta viu-se impossibilitada de desenvolver a sua actividade, o que ocorre, pelo menos, desde 2008.

-  Não se provou que os arguidos tivessem feito suas as quantias que não entregaram à segurança social;

26ª A decisão recorrida, fazendo tábua rasa de tudo isto, limita-se a considerar sem qualquer fundamento (i) que os crimes revelam uma personalidade pouco interessada na vida em sociedade (ii) que a personalidade do arguido é demonstrada pela total inação no que respeita aos pagamentos a que esteve e está obrigado (iii) que o arguido ciente das dívidas fiscais foi transferindo responsabilidades e proventos para outras entidades e foi alterando a sua participação e intervenção nas sociedades ao mesmo tempo que mantinha o seu nível de vida.

27ª O Tribunal não sustenta a afirmação em qualquer facto concreto.

28ª Dos factos provados atrás transcritos, os quais referem o contexto de dificuldade em que os factos ocorreram, decorrentes de atrasos nos pagamentos por parte dos clientes, o esforço reiterado no cumprimento das responsabilidades sociais seja perante os trabalhadores, cujos salários foram sempre liquidados seja junto da própria administração tributária, através da celebração de acordos de pagamento faseado das dívidas, resulta precisamente o contrário do afirmado pelo Tribunal.

29ª A decisão recorrida, aponta ainda que a personalidade do arguido é demonstrada pela total inação no que respeita aos pagamentos a que esteve e está obrigado.

30ª. A decisão recorrida labora em duplo erro.

31ª Primeiro, porque pretende antecipar um evento futuro.

32ª Estando estipulado um prazo ao arguido para liquidar determinada verba, nada o impede de efectuar o pagamento integral da mesma no último dia do prazo fixado para o efeito.

33ª Só decorrido o prazo, haverá que comprovar o pagamento ou indagar quanto aos motivos pelos quais possa não ter sido efectuada a liquidação da verba.

34ª. Segundo, porque a avaliação do esforço feito pelo ora arguido para proceder ao pagamento sempre teria que ter por fundamento a avaliação da sua situação económico-financeira.

35ª Ora conforme foi dado como provado, actualmente, o arguido aufere, a título de rendimento, a quantia ilíquida de 731, 32€ por mês.

36ª. Mensalmente, comparticipa nas despesas com a universidade do filho do seu anterior casamento.

37ª Além disso, o agregado familiar do arguido é composto ainda por uma companheira e duas filhas menores, sendo que o arguido faz face ao sustento da família com o seu rendimento e o da sua companheira.

38ª Em face do exposto, e ao contrário do que é sustentado pelo acórdão recorrido, não pode dizer-se que inexistiu qualquer esforço do arguido para efectuar o pagamento.

39ª. O arguido e a sociedade BB Lda., foram condenados solidariamente a proceder ao pagamento da quantia em causa, não se tendo dado como provado em qualquer dos processos a cuja penas se procede ao cúmulo nos presentes autos, que o arguido tenha desviado quaisquer verbas para proveito pessoal.

40ª O esforço feito pelo arguido para a resolução da pendência dos processos junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, que se repete pendem naquele Tribunal há quase 6 anos, no sentido de conseguir obter a liquidação da verba a que foram condenados a pagar, não pode deixar de ser valorado.

41ª O resumo efectuado pela decisão recorrida, referindo que o arguido «ciente das dívidas fiscais, foi transferindo responsabilidades e proventos para outras entidades e foi alterando a sua participação e intervenção nas sociedades ao mesmo tempo que matinha o seu nível de vida», não só é manifestamente falso por não corresponder à verdade, como não tem por fundamento factos objectivos, limitando-se a meras valorações de cunho “popular”, inaceitáveis e incompreensíveis quando formuladas por uma Tribunal Judicial.

42ª Desde logo a referência feita quanto ao facto de a companheira do arguido ser proprietária de 3 moradias, e ao facto arguido residir num bairro Quinta D’El Rei, zona na qual vivem agregados familiares de estrato-social elevado e com posses.

43ª Se ao homem médio não é exigível que conheça os princípios jurídicos, nomeadamente o princípio de que a responsabilidade penal é pessoal e intransmissível, o mesmo não se pode aplicar a um Tribunal judicial.

44ª A titularidade pela companheira do arguido de propriedades apenas assumiria relevo para a ponderação nos presentes autos caso se tivesse verificado, o que não sucedeu, que as mesmas lhe haviam sido transmitidas pelo arguido para se furtar ao cumprimento das suas responsabilidades, ou houvessem sido adquiridas com quantias do arguido ou da sociedade arguida.

45ª Além disso, e quanto à localização dos imóveis da propriedade da companheira do arguido, sempre se dirá que o facto de nessa mesma área residirem pessoas com elevados estrato sócio-económico, nada importa para a valoração da condição económica do arguido e do seu agregado familiar.

46ª Uma pessoa pode não ter posses mas viver na mesma área residirem pessoas com elevados estrato sócio-económico, e uma pessoa com elevado estrato sócio-económico pode viver numa área onde residem pessoas sem posses.

47ª No que à sociedade BB II se refere a decisão recorrida consigna que entre Março e Maio de 2007 o arguido cedeu a sua quota, mas omite o facto dado como provado no processo n.º 647/08.7TABJA, transcrito para a decisão recorrida sob a alínea l), de que «em Dezembro de 2008 o arguido procedeu à regularização dos montantes em dívida, pagando a quantia de 55.541,37€ e posteriormente à dedução do pedido de indemnização civil o arguido procedeu a mais pagamentos.»

48ª Aponta-se ainda na decisão recorrida, que a referida sociedade tinha no dia 12 de Julho de 2010 dívidas fiscais que tiveram origem no não pagamento de IVA, consignando-se igualmente que a referida sociedade se encontrava a proceder ao pagamento em prestações mas não se indicando a que período temporal as mesmas se referiam.

50ª No que se refere à afirmação imputada ao arguido de que «não o preocupava o montante que está em dívida» a mesma não pode ser analisada de forma descontextualizada.

51ª. Na sequência da mesma, o arguido explicitou e foi igualmente dada como provada a afirmação por este proferida de que assim entendia por «considerar que no processo tributário acabaria por alcançar os créditos que tem a receber e que está provado eram muito superiores ao valor em dívida.»

52ª No que se refere à afirmação do arguido de que «a lei está mal feita», e sem prejuízo de o Tribunal ter compreendido perfeitamente o que o arguido quis transmitir com essa afirmação, sempre se dirá que, é manifesto que a formulação da lei nos termos em que existe, é geradora de situações de injustiça.

53ª Está em discussão precisamente a alteração da lei no que se refere à exigibilidade do IVA, nomeadamente, por antecipação ao pagamento das quantias facturadas.

54ª Atendendo a todo o exposto, a pena aplicada em cúmulo jurídico afigura-se algo excessiva.

55ª Com a fixação da pena conjunta não se visa «re-sancionar o agente pelos factos de per si considerados isoladamente, mas antes procurar uma sanção de síntese, na perspectiva da conduta total, na sua dimensão, gravidade e sentido global, da sua inserção no pleno da conformação das circunstâncias reais, concretas, vivenciadas e específicas de determinado ciclo de vida do arguido em que foram cometidos vários crimes em determinado espaço temporal.»

56ª Como se refere no Acórdão de 10-09-2009 «a pena conjunta situar-se-á até onde empurrar o efeito “expansivo” sobre a parcelar mais grave das outras penas, e um efeito “repulsivo” que se faz sentir a partir do limite da soma aritmética de todas as penas. Ora esse efeito repulsivo prende-se necessariamente com um preocupação de proporcionalidade, que surge como variante com alguma autonomia, em relação aos critérios da “imagem global do ilícito” e da personalidade do arguido. Proporcionalidade entre o peso relativo de cada parcelar, em relação ao conjunto de todas elas.»

57ª A facticidade provada não permite formular um juízo específico sobre a personalidade do arguido que ultrapasse a avaliação que se manifesta pela própria natureza dos factos praticados e mesmo concatenada com a condenação anterior, atenta a natureza, e grau das infracções por que respondeu, não se mostrando provada personalidade por tendência, ou seja, que o ilícito global seja produto da tendência criminosa do agente.

58ª A pena fixada deveria ter-se situado devendo no seu limite mínimo, ou em medida nunca superior a 5 anos e poderia ser suspensa na sua execução, pois que tal era permitido e se impunha ante o artigo 50º do Código Penal actual pois que a personalidade dos arguidos e a sua conduta anterior e posterior aos factos era de molde a concluir que uma mera censura de pena era suficiente para garantir a prossecução das finalidades do Direito Penal.

59ª Em ambos os processos objecto do presente cúmulo jurídico, as penas aplicadas ao arguido terem sido suspensas na sua execução.

60ª Tendo entendido o Tribunal em ambos os processos que a suspensão da execução da pena era suficiente para realizar as exigências do processo penal:

«No caso em apreço, o arguido AA é delinquente primário, sendo pessoa inserida social e familiarmente.

Revela-se uma pessoa capaz de angariar meios para solver os seus compromissos.

Este processo certamente terá contribuído para a sua interiorização do desvalor social da sua conduta que adoptou.

A censura do facto e a ameaça da prisão contribuirão certamente para o afastar de futuros actos delituosos, mormente os desta natureza.»

61ª Inexistem quaisquer factos supervenientes que de alguma forma venham pôr em causa o acima afirmado.

62ª Ao efectuar o cúmulo em termos diversos do propugnado sempre o mesmo se afiguraria estar a subverter o espírito do legislador que pensou na realização do cúmulo jurídico, em primeira linha, em benefício do arguido.

63ª Os artigos 77º, 78º, 81º do Código Penal quando prevêem que, em sede de cúmulo jurídico superveniente, sejam desconsideradas duas penas suspensas na sua execução e alcançada em cúmulo jurídico prévio e nomeadamente por repristinação jurídica das penas parcelares que integraram essas penas são materialmente inconstitucionais por violação dos artigos 27º, n.º 1, 29º, n.º 4 e n.º 5, 32º, n.º 1 da Constituição.

Nestes termos, deve ser declarada a nulidade do acórdão recorrido por violação do artigo 374º n.º 2 do CPP determinando-se a sua substituição por outro formulado após nova audiência ou caso assim se não entenda deve ser revogado o acórdão recorrido e substituído por um outro que encontre como pena única uma pena de prisão de limite concreto inferior a cinco anos de duração e decrete a suspensão dessa pena de prisão.

3- Factos provados nas referidas condenações:

Presente processo comum colectivo n. 12/05.8IDBJA):

A- A sociedade arguida “BB – , Limitada” (que, por facilidade de exposição, passaremos a tratar apenas por “BB”) tem por objecto a “s de pessoas e bens e formação de pessoal” e sede na Praceta Professor ............, Lote............, em Beja;

A partir de 4 de Fevereiro de 1999, o arguido AA passou a ser o único gerente da arguida “BB”, que passou a obrigar-se apenas com a sua assinatura, sendo ele quem tomava todas as decisões relativas a compras, vendas, organização e gestão da sociedade, pagamento de preços, dos salários e das dívidas;

Em 2004, a sócia CC dividiu a sua quota no valor de Euros 37.409,89 e, por cessão, transmitiu parte ao arguido AA, no valor de € 36 162.85, reservando para si a quota de € 1 246,99;

Assim, para além de ser o único gerente da arguida “BB”, o arguido AA reforçou o seu papel de sócio maioritário;

A arguida “BB” tem o NIP000000000 e, em termos fiscais, a sua actividade integra-se na CAE 00000: “Outras actividades de serviços prestados principalmente a empresas, N.E.”;

Relativamente ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (doravante apenas IRC), enquadra-se no regime geral, sendo o período de tributação coincidente com o ano civil;

Entre Janeiro de 2002 e Dezembro de 2007, a arguida “BB” dedicou-se efectivamente ao exercício da sua actividade de segurança e vigilância de pessoas e bens e à formação de pessoal, desenvolvendo-a essencialmente no centro e sul do país, através de contratos com empresas privadas, empresas e outras entidades públicas;

O número de pessoal ao serviço da arguida “BB” aumentou ao longo dos anos, sendo, em 2002, cerca de 200 pessoas;

B- A arguida BB encontra-se enquadrada no Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (doravante apenas IRS), procedendo à retenção na fonte do IRS nos salários e retribuições de trabalho dos seus trabalhadores e prestadores de serviços relativos, respectivamente, ao trabalho dependente (rendimentos da categoria A) e ao trabalho independente (rendimentos da categoria B);

Em Dezembro de 2007, a sociedade arguida decidiu, na qualidade de empregadora, fazer suas e não entregar nos cofres do Estado as quantias em dinheiro provenientes das deduções nos rendimentos dos seus trabalhadores dependentes e dos trabalhadores independentes, não entregando nos Cofres do Estado, como podia e devia, o montante global de IRS que se cifra em € 9 929,73;

Assim, em obediência ao desígnio referido, no aludido mês de Dezembro de 2007, a sociedade arguida efectuou deduções:

            – nos rendimentos dos trabalhadores dependentes no montante de € 9 929,73; e

            – nos rendimentos dos trabalhadores independentes no montante de € 100;

C- Ao nível do Imposto Sobre o Valor Acrescentado (doravante apenas IVA), enquadra-se, desde 1 de Janeiro de 2002, no regime normal (de sujeição/não isento) de periodicidade mensal, enquadramento que manteve nos anos seguintes até, pelo menos, Dezembro de 2007, encontrando-se obrigada à entrega de cada declaração periódica até ao dia 10 do segundo mês subsequente ao termo daquele em ocorrera a venda ou prestação de serviços;

A arguida “BB” possui contabilidade organizada e, no período compreendido entre os anos de 2002 e 2007, não efectuou transacções intracomunitárias, nem formulou pedidos de reembolso de IVA;

Do referido enquadramento em sede de IVA, advinha para a arguida “BB” a obrigação de liquidar o imposto sobre as operações tributáveis efectuadas, emitir facturas ou documentos equivalentes, declarar o imposto recebido, autoliquidar o imposto e efectuar o seu pagamento;

Nos negócios efectuados entre os anos 2002 a 2007, a arguida BB incluiu sempre no preço a cobrar dos bens vendidos e dos serviços prestados aos seus clientes o valor correspondente às taxas legais de 17%, 19% ou 21% de IVA, por estes devido nos termos da Lei;

Consequentemente, nas facturas que emitiu entre 01.01.2002 e 31.12.2007 inscreveu o preço dos bens vendidos e dos serviços prestados, autonomizando o valor correspondente ao IVA liquidado;

Ora, em data concretamente não apurada, mas seguramente anterior a 1 de Janeiro de 2002, os arguidos decidiram fazer suas e não entregar nos cofres do Estado as quantias em dinheiro provenientes de IVA por transacções ou prestação de serviços que a arguida BB efectuou;

Em cumprimento de tal determinação, os arguidos, entre Janeiro de 2002 e Dezembro de 2007, fizeram suas e integraram no seu património as quantias que cobraram a título de IVA àqueles com quem manteve relações comerciais, não entregando nos cofres do Estado o imposto liquidado, a título de IVA, no montante de € 2 609 702,16;

A sociedade arguida não entregou os montantes de IVA acima descritos em momento algum, nomeadamente nem sequer depois de ter sido notificada, em 12.02.2007 e em data próxima de 18.12.2009, para proceder ao pagamento das prestações em dívida, dos juros respectivos e do valor da coima aplicável;

Os montantes de IVA foram efectivamente recebidos pela arguida sociedade, sendo pagos quer pelos seus clientes, quer pela sociedade BCP – Factoring, S.A. em substituição deles;

D- Os arguidos agiram livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, actuando com o propósito, conseguido, de se apropriar, em benefício da sociedade arguida e do arguido AA, dos montantes que foram facturados aos clientes, quantias que sabiam dever entregar nos cofres da Administração Fiscal, actuando, ao invés, com o propósito, conseguido, de não entregar o montante de imposto arrecadado;

Os arguidos bem sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei;

E- Para cobrança dos tributos descritos, acrescidos dos juros compensatórios e respectivos acréscimos legais, foram instaurados processos de execução fiscais, designadamente:

            i) processo n.º 0248200401015192, relativo ao IVA não pago referente aos anos de 2002 e 2003, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 523 891,07, estando ainda em dívida a quantia de € 290 793;

            ii) processo n.º 024800601013971, relativo ao IVA não pago referente aos períodos de Janeiro de 2004 a Março de 2005, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 28 803,56, estando integralmente paga a dívida fiscal relativa a tal processo;

            iii) processo n.º 0248200601027158, relativo ao IVA não pago referente aos períodos de Janeiro de 2004 a Agosto de 2005, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 58 000, estando ainda em dívida a quantia de € 958 515,38;

            iv) processo n.º 0248200701004530, relativo ao IVA não pago referente aos períodos de Setembro de 2005 a Agosto de 2006, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 3 500, estando ainda em dívida a quantia de € 1 459 310,15;

            v) processo n.º 0248200801037480, relativo ao IVA não pago referente aos períodos de Julho de 2007 a Dezembro de 2007, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 1000, estando ainda em dívida a quantia de € 317 372,38;

À data de 30 de Junho de 2010, a sociedade arguida BB, Lda. era devedora de € 3 468 660,87 de impostos vários, juros, custas e coimas fiscais;

À data de 30 de Junho de 2010, o arguido AA era devedor da quantia de € 1 392 866,20 relativa a impostos vários, juros, custas e coimas fiscais;

F- Em 14 de Abril de 2003, a arguida BB celebrou com a sociedade “BCP Factoring, S.A. – Banco Comercial Português” um “contrato de factoring, para vigorar durante 154 dias, renovável por 180 dias, através do qual se obrigou a “…ceder ao BANCO a totalidade dos seus créditos [apenas os resultantes de fornecimentos ou prestação de serviços realizados]... sobre terceiros seus clientes…”, enquanto o Banco, por seu turno, se obrigou a aceitá-los, recebendo, mensalmente, da arguida BB uma listagem actualizada dos seus clientes acompanhada da correspondente facturação relativa aos fornecimentos ou serviços prestados;

Por força daquele contrato de factoring, a Sociedade “BCP Factoring, S.A.” recebia directamente desses clientes os valores em dívida (quer das facturas, quer do IVA liquidado), dando-lhes quitação por indicação expressa da arguida BB;

Em contrapartida, aquela sociedade de Factoring possibilitava à sociedade arguida o adiantamento de 85% do montante aposto nas facturas, nele se incluindo o IVA;

G- O grosso da clientela da sociedade arguida era constituída por entidades públicas, nomeadamente estabelecimentos do ensino superior, municípios, empresas públicas, hospitais;

Ao tempo dos factos, boa parte dos clientes da sociedade arguida, nomeadamente entes públicos, atrasavam-se no cumprimento das suas obrigações para com a sociedade arguida, nomeadamente no pagamento dos serviços que a sociedade arguida prestava;

Devido ao incumprimento das obrigações fiscais por parte da sociedade arguida, foram instaurados processos de execução fiscal, aí sendo penhorados bens e créditos da sociedade arguida;

Pelo menos desde 2000 que a sociedade arguida apresentavam dificuldades no cumprimento integral das suas obrigações fiscais;

O não cumprimento das obrigações fiscais por parte dos arguidos era conhecido dos responsáveis dos serviços das Finanças, existindo periodicamente reuniões com tais responsáveis, nomeadamente, em Novembro de 2006 ocorreu uma audiência com o Director da Justiça Tributária;

Em face disso, a sociedade arguida e o arguido AA seu gerente apresentaram propostas para proceder ao pagamento em prestações das dívidas fiscais que tinham;

Inclusivamente, sem qualquer fundamento legal, responsáveis da Direcção Distrital de Finanças de Beja fizeram um “acordo de cavalheiros” no sentido da sociedade arguida “ir pagando” as suas dívidas fiscais”

Não obstante isso, a sociedade arguida mantinha a conduta descrita nem procedia ao integral pagamento das quantias de IVA que ia facturando;

Apesar das dívidas fiscais, a sociedade arguida sempre pagou os salários aos trabalhadores que manteve ao seu serviço;

A sociedade arguida era uma das maiores empresas privadas empregadoras no Alentejo;

Em face das dificuldades financeiras da sociedade arguida, esta viu-se impossibilitada de desenvolver a sua actividade;

H- Em 2004, o arguido AA constituiu a “BB II – , Unipessoal, Lda.”, com sede no mesmo local onde é a sede da sociedade arguida, tendo por objecto social a comercialização e instalação de sistemas de segurança, intervenção e apoio ao disparo de alarmes;

Era o arguido AA o gerente da referida sociedade;

Entre Março e Maio de 2007, o arguido AA cedeu a sua quota à sociedade, com sede em Espanha, Audiofix, S.L. e esta, com entrada em dinheiro, procedeu ao aumento do capital social da BB II, sendo este agora de € 125 000;

Simultaneamente, alterou-se o objecto social da BB II para “segurança-vigilância de pessoas e bens; exploração e gestão de centrais de recepção e monitorização de alarmes, bem como a prestação de serviços de piquete; comercialização e instalação de sistemas de segurança;

A BB II realiza as mesmas tarefas e serviços que a sociedade arguida realizava;

A maior parte dos contratos da BB II são realizados com entidades públicas;

A BB II absorveu os trabalhadores da sociedade arguida;

A companheira do arguido AA é directora de serviços da BB II e sócia da sociedade Audiofix, S.L.;

O arguido AA exerce na BB II as mesmas funções que exercia na sociedade arguida;

A BB II tinha, no dia 12 de Julho de 2010, dívidas fiscais no montante de € 32 444,88 que tiveram origem no não pagamento de IVA, mas está a proceder ao seu pagamento em prestações;

A BB II não tem dívidas à Segurança Social;

I- O arguido AA vive em união de facto com CC, sendo pais de duas meninas de 9 e 5 anos;

O arguido AA fazia-se transportar num veículo automóvel de marca BMW, modelo X 5, topo de gama, tendo celebrado contrato de leasing onde gastou, pelo menos, € 40 000;

A companheira do arguido é proprietária de 3 moradias, incluindo aquela que constitui a casa de morada de família;

O arguido reside na morada que consta do autos no Bairro Quinta D’El Rei, zona residencial da cidade de Beja onde vivem pessoas e agregados familiares de estrato sócio-económico elevado e com posses;

O arguido AA não é proprietário de bens imóveis;

(Processo comum singular n. 647/08.7 TABJA)

J- A arguida "BB - , Lda", inscrita sob o n° 0000000 na Conservatória do Registo Comercial de Ourique, com o número de identificação da Segurança Social 000000000 e com o número de contribuinte 0000000000, é uma sociedade comercial por quotas, que tem sede na Praceta Professor ............, Lote............, CV, em Beja.

Constituiu-se em 29 de Maio de 1985 e iniciou a sua actividade de prevenção e controle de pessoas e bens, no dia 01 de Junho de 1985.

Desde a data da sua constituição, que o arguido AA é gerente da Sociedade arguida "BB, Lda".

A partir de 04 de Fevereiro de 1999, o arguido DD passou a ser o único sócio-gerente da referida Sociedade, que se obriga nos negócios com a sua assinatura.

L- Nos meses de Abril de 2006 a Novembro de 2007, a Sociedade arguida "BB, Lda" pagou salários aos trabalhadores que teve ao seu serviço e ao sócio-gerente, o arguido AA. E procedeu ao desconto, em tais salários, das contribuições devidas por força da lei à Segurança Social.

A sociedade arguida "BB, Lda" pagou salários no montante total de € 1.982.999,19 (um milhão novecentos e oitenta e dois mil novecentos e noventa e nove euros e dezanove cêntimos), descontando e retendo contribuições no valor total de € 218.067,95 (duzentos e dezoito mil sessenta e sete euros e noventa e cinco cêntimos).

A Sociedade arguida não entregou aquelas contribuições à Segurança Social, nomeadamente nos 15 dias seguintes ao mês a que cada uma respeitava, nem nos 90 dias posteriores.

Em 4-4-2008, o arguido AA foi notificado, nos termos do art. 105°, nº  4, al. b) do R.G.I.T., para pagar à Segurança Social a quantia de € 218.067,95 (duzentos e dezoito mil e sessenta e sete euros e noventa e cinco cêntimos).

Em 26 de Novembro de 2008, o arguido AA foi novamente notificado, mas nos termos do art. 105°, n.º  4, al. b) e n° 6 do R.G.I.T., para pagar a referida quantia.

Nessa sequência, em Dezembro de 2008, o arguido procedeu à regularização parcial dos montantes em dívida, pagando a quantia de € 55.541,37 (cinquenta e cinco mil quinhentos e quarenta e um euros e trinta e sete cêntimos). E posteriormente à dedução do pedido de indemnização civil, o arguido procedeu a mais pagamentos.

Estas regularizações respeitam aos meses de Abril de 2006, Maio de 2006, Outubro de 2006 e Novembro de 2006.

Ainda estão em dívida €151.346,58 (cento e cinquenta e um mil e trezentos e quarenta e seis euros e cinquenta e oito cêntimos).

O arguido AA conhecia a sua qualidade de sócio­-gerente da Sociedade arguida e que actuava em nome e a favor desta.

Tinha consciência de que a Sociedade "BB Lda" era a entidade empregadora e que deduzia nos salários pagos as contribuições e que não as entregava, em prazo, à Segurança Social.

O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, com o propósito concretizado de não liquidar, nem pagar as contribuições mencionadas, sabendo que as suas condutas eram proibidas e puníveis por lei.

M- Actualmente a sociedade arguida está sem actividade o que ocorre, pelo menos, desde 2008.

Os clientes da arguida eram, na data dos factos, essencialmente entidades estatais e municipais que começaram a fazer os pagamentos dos serviços prestados pela arguida tardiamente, sendo em média a 6 meses quando estava previsto serem a 30/60 dias.

Nessa altura, para fazer face aos pagamentos laborais, a arguida contraiu empréstimos bancários os quais se encontram actualmente regularizados. Por força de dívidas ao fisco, no montante superior a €1.400.000,00, os créditos da arguida foram penhorados.

Alguns salários de trabalhadores da sociedade continuam por pagar.

Os resultados de exercício da arguida foram sempre positivos.

Na contabilidade da arguida os créditos sobre o Estado e entidades públicas e municipais não constavam como créditos duvidosos, pelo que não eram realizadas provisões.

O arguido aufere cerca de € 2.000,00, por mês. A sua companheira aufere cerca de €1.500,00 por mês. Moram em casa própria, pagando cerca de €700/800,00, de prestação bancária. Moram com os seus dois filhos (de 7 e 4 anos de idade). O arguido paga ainda cerca de €350,00, por mês de obrigação de alimentos relativamente a outros dois filhos do seu casamento.

Os arguidos foram condenados, no processo n.º 296/99.9TABJA, que correu termos neste tribunal, por acórdão transitado a 28-10-2003, pela prática, em 1998 e 1999, de 4 crimes de abuso de confiança em relação à Segurança Social do qual foram declarados isentos de pena.

P- O arguido em audiência de julgamento afirmou que não o preocupa o montante que está em dívida e que a lei está mal feita.

O arguido afirmou ainda que não apresentou a sociedade à insolvência por considerar que no processo tributário acabará por alcançar os créditos que têm a receber e que, segundo o próprio, são superiores às dívidas que a sociedade têm para com a Fazenda e a Segurança Social.

O arguido actualmente é gerente da sociedade BB 2 a qual em parte tem a mesma actividade da sociedade arguida, candidatando-se a concursos públicos realizados para prestação de serviços de segurança e possuindo hoje em dia parte dos funcionários e parte dos clientes da sociedade arguida.

Uma vez que a sociedade arguida a certa altura não obtinha certidão de não dívida (pressuposto imprescindível),  a sociedade BB 2 passou a concorrer aos mencionados concursos públicos.

Q- Nesse mesmo processo não se provou que “Os arguidos fizeram suas as quantias que não entregaram à Segurança Social.”

            Mais se provou que:

1. 4- Pendem desde 14.11.2006, 6-2-2007, respectivamente, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja os Proc. n.º 449/06.5BEBJA com o valor processual de €558.448,67 e n.º 56/07.5BEBJA com o valor processual de € 14.963,95 no qual foram deduzidos embargos de terceiro, sendo embargante o Banco Comercial Português S.A., e respeitantes à penhora, pela Fazenda Pública de créditos da BB Lda, e que se encontra a aguardar prolação de sentença;

2. 5- Em 30 de Dezembro de 2011, o condenado procedeu ao pagamento à Segurança social do montante de €1.632,94;

3. 6- A 05 de Janeiro de 2012 e relativamente à sociedade arguida BB, constavam dos serviços de finanças de Beja os seguintes dados em virtude das penhoras efectuadas referidas nos processos 449/06.5BEBJA e 56/07.5BEBJA:

4. - montantes depositados: €459.031,23;

5. - montantes aplicados nos processos: €358.651,21;

6. - montante disponível para aplicação: €99.827,43;

7- Actualmente, o condenado trabalha como Director de Segurança para a sociedade BB II – , Lda. auferindo o vencimento ilíquido mensal de 731,83.

Da personalidade do condenado

8- AA integrou um conjunto familiar de condição socioeconómica modesta (pai-electricista, mãe-doméstica), no agregado de origem, tanto o arguido como os três irmãos vivenciaram interacções familiares gratificantes, não obstante a existência de desequilíbrios financeiros, decorrentes da presença de um agregado numeroso;

Até aos 14 anos, manteve enquadramento escolar, completando então o 6.º ano de escolaridade e, na altura, não obstante revelar competências para prosseguir estudos, imperava a necessidade de contribuir para o equilíbrio financeiro do conjunto familiar e, por isso, teve diversas actividades laborais, processo em que AA procurou sempre alcançar patamares mais estáveis e vínculos laborais mais compensadores, movendo-o a determinação de atingir padrões de vida mais elevados e condições económicas mais favoráveis;

De aprendiz de fundidor e torneiro mecânico, a empregado de escritório, assessor de administração numa empresa metalúrgica, vendedor de equipamentos e materiais de construção, o arguido AA viria a ingressar na EDP como vigilante e leitor/cobrador;

Finalmente, em 1985, AA, associado a outros colegas de profissão, veio a constituir uma empresa de Segurança e Vigilância, firma que passou a ter dimensão considerável e sucesso empresarial;

Entretanto, devido a desentendimentos no seio do agregado familiar que entretanto constituíra (cônjuge e dois filhos de, actualmente, 24 e 18 anos), divorcia-se;

Actualmente, vive em união de facto, tendo, como se disse, duas filhas de 8 e 5 anos de idade respectivamente, conjunto familiar onde se destacam vínculos de estabilidade afectiva;

Aparenta ser um indivíduo detentor de competências pessoais ao nível da capacidade de comunicação e de argumentação e laborais face à capacidade empreendedora que o tem caracterizado e aos esforços que tem envidado no sentido de se manter activo;

Presentemente, aprecia o trabalho que faz, área onde possui experiência de vários anos;

A nível pessoal, alcançou habilitações escolares equivalentes ao 12.º ano e, recentemente, recebeu formação de cerca de três meses em Direcção de Segurança, em unidade universitária, cumprindo directivas para o desempenho de actividades de gestão na área laboral em que se integra;

Comparticipa nas despesas de um dos filhos, estudante universitário, fruto da primeira união conjugal que manteve;

Economicamente, a família beneficia de equilíbrio, o que é assegurado pelos rendimentos auferidos pelo arguido e pelo cônjuge;

Não apresenta dificuldades de integração comunitária no meio sócio-residencial em que se movimenta mantendo, contudo, um estilo de vida em que opta por leque de convivências restrito, ocupando os tempos livres, quando tal lho é permitido na caça;

O cônjuge demonstra um apoio consistente, o que suporta o controlo emocional que o caracteriza;

O arguido salienta ainda reconhecer o dano causado, evidenciando algum raciocínio crítico e aceita a importância da reparação de danos, desde que em condições de cumprimento realistas;

Contudo, o arguido AA enquadra o dano causado dentro de opções de gestão, atendendo à salvaguarda que sempre procurou efectuar em relação à manutenção de remunerações aos colaboradores;

Por outro lado, sempre procurou alternativas e planos de contingência que minimizassem a situação instalada, não tendo atingido tal objectivo, mas imputando tal insucesso à irresponsabilidade de instituições estatais que não assumiram consigo a liquidação de valores monetários contratualizados, assim minimizando a situação processual em causa, atitude que evidencia fragilidade na capacidade de descentração;

9- AA é um indivíduo ambicioso e determinado que, ao longo do seu percurso vivencial tem procurado alcançar patamares de sucesso a nível pessoal e profissional, revelando competências pessoais ao nível da capacidade de argumentação e comunicação, a que se aliam características empreendedoras e de negociação em que a segurança e auto-controlo se evidenciam;

Retrata-o ainda a procura de enriquecimento da experiência de trabalho, reconhecendo-o enquanto valor e mantendo atitude positiva perante o mesmo, e o investimento em acções auto-valorativas, auto-promoção alcançada com aumento das competências escolares e valorização de conhecimentos na área de trabalho em que se enquadra;

Revela insuficiências na capacidade de avaliar e reflectir de forma cautelosa algumas das suas opções de gestão, facto que o expõe a decisões arriscadas, não identificando ou minimizando os riscos possíveis ou impacto das mesmas;

10- Ao longo do julgamento – do processo dos presentes autos), afirmou que o não pagamento tempestivo dos impostos e as dificuldades financeiras da sociedade arguida se deveram ao atraso das entidades públicas nos pagamentos dos serviços que lhe eram prestados

Colhidos os legais vistos , cumpre decidir, opondo-se o M.º P.º à pretensão do arguido  :

É uma questão , a que o acórdão recorrido não dedica qualquer reflexão , alvo de controvérsia no plano jurisprudencial e doutrinário a de indagar se as penas parcelares intervenientes na formação do cúmulo antes suspensas  na sua execução , podem ou não ser revogadas , como sucedeu no caso vertente , na formação da pena única , assentando a tese que se opõe ao englobamento numa tríplice ordem de razões avultando desde logo aquela que destaca a intocabilidade do caso julgado , a sua imodificabilidade , a sua diversa natureza , quando em concurso com a pena de prisão , por se tratar de pena substitutiva , e , por fim a violação do direito do contraditório do arguido a quem devia ser concedida a oportunidade de se pronunciar sobre a revogação .

Mas a este último argumento tem a doutrina , desde logo, apontado a sua debilidade com apelo ao facto de a pena em concurso superveniente ser aplicada em audiência de julgamento , realizando o tribunal as diligências necessárias à decisão , com a presença obrigatória de defensor , designando o juiz os casos em que é obrigatória a presença do arguido , nos termos dos art.ºs 471.º n.ºs 1 e 472.º , nºs 1 e 2 , do CPP , logo com a oportunidade de se defender , não relevando o argumento surpresa .

A razão da diferente natureza não comporta desde logo apoio legal nos art.ºs 77.º e 78 .º , do CP, que não proíbem o englobamento .

As penas substitutivas devem , segundo o Prof. Figueiredo Dias , in Direito Penal Português , As Consequências Jurídicas do Crime , pág. 335 , responder a um duplo requisito : terem carácter não institucional ou não detentivo, isto serem cumpridas em liberdade e , por outro lado , pressuporem a prévia determinabilidade da medida da pena de prisão , para esta lhe ser aplicada no caso de incumprimento , constituindo a pena de prisão suspensa na sua execução a mais importante das penas de substituição , por ser aquela que possui o mais largo âmbito , sendo uma pena de média ou curta duração . (op.cit., pág. 338) .

E sendo a “ ratio “ do instituto a luta contra as penas curtas de prisão , que não ressocializam , em regra , o condenado , e funcionando o cúmulo regra em claro favor do arguido , essas perspectivas de favor aglutinam-se, em harmonia ,  no englobamento daí não advindo prejuízo, concorrendo a operação para protecção da liberdade individual do arguido , doutrinou André Lamas Leite , in A Suspensão da Execução da Pena Privativa de Liberdade Sob Pretexto da Revisão de 2007 do Código Penal , BFDUC , Estudos de Homenagem ao Professor Figueiredo Dias ,Vol.II , 2009 , págs. 608 e 609 e segs .

Ainda segundo o mesmo autor não há lugar ao cumprimento do art.º 56.º , do CP , em vista da revogação suspensão da execução da pena, já que subjaz a este preceito o incumprimento das condições que determinaram a sua adopção pelo julgador, coisa diversa sendo a revogação em cúmulo , momento em que se coloca a questão da avaliação sobre se o condenado que praticou anteriormente à condenação transitada outro ou outro delito pode ou não beneficiar dessa reacção substitutiva .

É ,  como escreve , uma questão a tratar “ em diversos níveis analíticos “ , governados por “ específicas finalidades  dogmáticas e políticas criminais “ , relevando o cumprimento do art.º 56.º , do CP , em seu entendimento , para um momento posterior em que importa , outrossim , verificar se deve ou não aplicar-se à nova pena de concurso, que resultar do cúmulo, nova pena de substituição .

A razão que arranca da hipotética violação do caso julgado percepciona este instituto como “ um dogma “ , inultrapassável,  quando é certo que todas as legislações admitem excepções , sendo visíveis entre nós , desde logo , por ex.º , no recurso extraordinário de revisão, na aplicabilidade da lei penal nova mais favorável , nos termos do art.º 2.º , do CP ou abertura da audiência para aplicação retroactiva da lei penal mais favorável , nos termos do art.º 371.º -A , do CPP .

Desde que no paradigmático AC.deste STJ , de 5.12.74 , in BMJ 232 , 43 , se decidiu que quando uma pena suspensa se encontra em cúmulo jurídico , na formação do cúmulo , pode essa suspensão não ser mantida , sem que isso implique ofensa de caso julgado pois que este se forma sobre a medida da pena , e não já sobre a sua execução, não se pronunciando a primeira decisão sobre ela por a desconhecer.

O arguido não controverte a qualificação jurídica dos factos por que foi condenado , em pena com execução suspensa , tipificando dois crimes de abuso de confiança fiscal , um simples e outro qualificado , este em forma continuada , p . e p . pelo art.º 105.º n.º1 e n.º 5 , do RGIT e 30.º do CP  cometidos entre , por factos praticados entre Janeiro de 2002 e Dezembro de 2007 e um de abuso de confiança contra a Segurança Social , na forma continuada, previsto no artigo 107º, n..º 1 e punido pelo artigo 105.º, n.º 1, ambos do RGIT, com referência ao artigo 30º, n. 2, do Código Penal, , por factos praticados entre 2006 e 2007 .

A  suspensão da execução da pena dos dois crimes de abuso de confiança fiscal foi-o com a condição de pagar ao fisco a importância de € 3 025 990,91, em fazendo prova nos autos desse pagamento em 3 anos ; a suspensão com referência ao crime de abuso de confiança contra a Segurança Social foi subordinada à condição de pagamento das contribuições em dívida e acréscimos legais a ocorrer no período de 1 ano e 6 meses .

A divergência com o Colectivo reside essencialmente na diversa valoração que faz dos factos, não já  na obrigação de pagar impostos.  

A este respeito dessa obrigação retiram-se do estudo “ O Crime de Fraude Fiscal no Novo Direito Penal  Tributário Português “  , da autoria dos Profs . Figueiredo Dias e Costa Andrade ,in  RPCC , Ano 6.º , Janeiro-Março 1996 ,  76   , as seguintes ordens de considerações :

Desde logo ,  a de que  “ O imposto apresenta-se como o meio privilegiado ao dispõr de um Estado de direito para assegurar as prestações sociais  “ , que tornam possível  , na conhecida fórmula de Fosthoff ,  que “  o cidadão viva não só no Estado , mas também do Estado “ .

Tudo para dizer que a consciência colectiva adquiriu o sentimento de que o não pagamento de impostos é ofensivo da igualdade tributária dos cidadãos , da proporcionalidade contributiva , inviabilizando a fuga aos impostos a realização das   finalidades do Estado  , fazendo-as recair agravadamente  sobre outros ,  inscrevendo-se o direito penal fiscal  num movimento de eticização , obediente aos princípios da  legalidade , igualdade e justiça social , com apoio nos art.ºs 101  .º a  104 .º , da CRP .

O sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza  ; a tributação  do património  pessoal ou real   deve concorrer para a igualdade entre os cidadãos ( art.º s 103 .º n.º 1 e 104.º n.º 3 , da CRP ) .

Nestes termos é da maior evidência ,  quer no plano teórico quer no plano prático  , que o lançamento dos impostos  , mostrando-se  a coberto da tutela  da lei ordinária , sustentada pela lei fundamental  , reclama para sua cobrança um regime  punitivo deferido ao Estado ,   sem o qual  aquela superior e pública finalidade  se mostraria seriamente comprometida  , integrando-se , como se integra ,  o delito  de fuga aos impostos  naquilo que se apelida de “  delinquência patrimonial de astúcia  “ ( cfr. Ac. deste STJ , de 9.3. 2005 , P.º n.º  346/05 , desta 3.ª Sec. ) . 

E , assim , cobra plena aceitação a asserção de que  “ As exigências do étimo Estado – de - Direito fizeram penetrar a racionalidade  fiscal das categorias e dos valores da legalidade e da igualdade . E também por esta via as obrigações fiscais ganharam a cogência dos imperativos éticos : a partir de então não tem sentido acreditar que a honestidade fiscal  é , na expressão  de Veit , “ o equivalente da estupidez “ .

A obrigação de pagar impostos , concebidos como prestações unilaterais , pecuniárias , coactivas , definitivas ,a que são sujeitos os detentores de capacidade contributiva ( cfr. O Dever Fundamental de Pagar Impostos , de Casalta Nabais , pág. 224 ) , apresenta-se no contexto dos deveres fundamentais dos cidadãos , como um dever  fundamental clássico , enquanto verdadeiro pressuposto da existência e do fundamento da comunidade organizada num Estado democrático , que não pode deixar de ser reconhecido e exigido num Estado contemporânea ( cfr. autor e op. cit. , pág. 102 ) .

O arguido não contesta essa obrigação , reconhecendo  o dano causado, evidenciando algum raciocínio crítico e aceitação  da  importância precisa à  reparação do débito , desde que em condições de cumprimento realistas, deu-se como provado .

Desde 2000  que a empresa BB , de que era sócio gerente , apresentava dificuldades no cumprimento das suas obrigações fiscais .

Entre Janeiro de 2002 a Dezembro de 2007 a sociedade e o arguido deixaram de entregar a título de IVA a importância de 2.609.702, 16 € ao  fisco e  a que respeita a condenação nos presentes autos ; a importância que deixaram de entregar , ao nível das contribuições recebidas ( como aliás o IVA ) e devidas  à Segurança Social respeitando a dívida ao anos de 2005 a 2007 a dívida ascendeu a 218.067, 05 €, por que foi condenado no processo comum singular n. 647/08.7 TABJA.

O tipo de clientela era , em regra , constituído , por entidades públicas , nomeadamente estabelecimentos de ensino superior , municípios , empresas públicas e hospitais , que se atrasavam nos seus pagamentos , feitos a 6 meses , devendo sê-lo a 30/60 dias , uma realidade recorrente , amplamente conhecida e maléfica para a economia nacional ,que não pode deixar de comprometer o sistema de pagamentos regular de qualquer empresa .

Na evidência dessas dificuldades o arguido encetou contactos com o Fisco –Direcção Distrital de Beja , no sentido de conseguir acordo de pagamento que , em 2006 , nas palavras do acórdão recorrido se traduziu , num “ acordo de cavalheiros “ no sentido de ir pagando os débitos em causa , o que o arguido não fez , encerrando a empresa BB em 2008 , contraindo, ainda , empréstimos bancários para solver dificuldades por que atravessou .

Igualmente se deu como provado que o arguido  não  apresentou a sociedade à insolvência por considerar que no processo tributário acabará por alcançar os créditos que têm a receber e que, segundo o próprio, são superiores às dívidas que a sociedade têm para com a Fazenda e a Segurança Social.

Sobressai , ainda , da matéria de facto provada que os trabalhadores dessa empresa, uma das maiores empregadoras do Baixo Alentejo ,  foram absorvidos por outra  que depois constituiu , esforçando-se seriamente em não os lançar no desemprego e sempre  remunerar , continuando alguns créditos por satisfazer .

O único pagamento do arguido teve lugar em 30 de Dezembro de 2011, em que procedeu ao pagamento à Segurança social do montante de €1.632,94, ou seja, já após a marcação desta diligência de cúmulo.

No entanto por conta do débito aludido naquele processo comum singular  em Dezembro de 2008, o arguido procedeu à regularização parcial dos montantes em dívida, pagando a quantia de € 55.541,37 (cinquenta e cinco mil quinhentos e quarenta e um euros e trinta e sete cêntimos). E posteriormente à dedução do pedido de indemnização civil, o arguido procedeu a mais pagamentos.

Estas regularizações respeitam aos meses de Abril de 2006, Maio de 2006, Outubro de 2006 e Novembro de 2006.

Ainda estão em dívida €151.346,58 (cento e cinquenta e um mil e trezentos e quarenta e seis euros e cinquenta e oito cêntimos).

Em vista da cobrança dos tributos descritos, acrescidos dos juros compensatórios e respectivos acréscimos legais, foram instaurados processos de execução fiscais, designadamente:

            i) processo n.º 0248200401015192, relativo ao IVA não pago referente aos anos de 2002 e 2003, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 523 891,07, estando ainda em dívida a quantia de € 290 793;

            ii) processo n.º 024800601013971, relativo ao IVA não pago referente aos períodos de Janeiro de 2004 a Março de 2005, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 28 803,56, estando integralmente paga a dívida fiscal relativa a tal processo;

            iii) processo n.º 0248200601027158, relativo ao IVA não pago referente aos períodos de Janeiro de 2004 a Agosto de 2005, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 58 000, estando ainda em dívida a quantia de € 958 515,38;

            iv) processo n.º 0248200701004530, relativo ao IVA não pago referente aos períodos de Setembro de 2005 a Agosto de 2006, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 3 500, estando ainda em dívida a quantia de € 1 459 310,15;

            v) processo n.º 0248200801037480, relativo ao IVA não pago referente aos períodos de Julho de 2007 a Dezembro de 2007, tendo a sociedade arguida pago a quantia de € 1000, estando ainda em dívida a quantia de € 317 372,38;

Pendem desde 14.11.2006 e 6-2-2007, respectivamente, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja os Proc. n.º 449/06.5BEBJA com o valor processual de €558.448,67 e n.º 56/07.5BEBJA com o valor processual de € 14.963,95 no qual foram deduzidos embargos de terceiro, sendo embargante o Banco Comercial Português S.A., e respeitantes à penhora, pela Fazenda Pública de créditos da BB – , Lda, e que se encontra a aguardar prolação de sentença;

6- A 05 de Janeiro de 2012 e relativamente à sociedade arguida BB, constavam dos serviços de finanças de Beja os seguintes dados em virtude das penhoras efectuadas referidas nos processos449/06.5BEBJA e 56/07.5BEBJA:

- montantes depositados: €459.031,23;

- montantes aplicados nos processos: €358.651,21;

- montante disponível para aplicação: €99.827,43;

A empresa BB II de que o arguido é sócio gerente não tem dívidas à Segurança Social ,  mas , em  12 de Julho de 2010, apresentava dívidas fiscais no montante de € 32 444,88 que tiveram origem no não pagamento de IVA, que está a proceder à sua liquidação em prestações.

A suspensão da execução da pena de prisão impostas nos crimes tributários obedece a  regras específicas decorrentes do art.º 14.º do RGIT , sendo aquela sempre condicionada ao pagamento das prestações tributárias e legais acréscimos , do montante dos benefícios indevidamente recebidos e,  caso o juiz o entenda,  ao pagamento das quantias até ao limite máxima estabelecido para a pena de multa –n.º 1 , mas o preceito não afasta a aplicação, complementar , do art.º 56.º , do CP , regulamentando as condições em que a  revogação da suspensão pode ter lugar , em última  “ ratio “  , por via do incumprimento grosseiro e culposo, das obrigações impostas  ao condenado .

Uma particularidade deste regime está, ainda , em que na falta de pagamento , o tribunal pode exigir garantias de pagamento , prorrogar o período de suspensão até metade do inicialmente previsto , mas sem exceder o prazo máximo de suspensão admissível ou revogar a suspensão da execução da pena –n.º 2 als . a) , b) e c) .

E por força desse regime especial  ,que não é derrogado pela lei geral, o período de duração da pena suspensa não tem que coincidir com a duração da pena .

Em caso de cúmulo jurídico é assente que  o tribunal pode manter a suspensão em relação a qualquer delas , a todas,  ou aplicar o respectivo regime , suposto que a valoração global dos factos e a personalidade do agente o justifique e convirjam os inabdicáveis pressupostos  enunciados no art.º 50.º , do CP , à pena unitária .


No concurso superveniente de infracções tudo se passa como se , por pura ficção , o tribunal apreciasse , contemporâneamente com a sentença , todos os crimes praticados pelo arguido , formando um juízo censório único ,  projectando –o retroactivamente ( cfr. Ac. deste STJ , de 2.6.2004 , CJ , STJ , II , 221 ) .
A formação da pena conjunta é , assim ,  a reposição da situação que existiria  se o agente tivesse sido atempadamente condenado e punido pelos crimes à medida em que os foi praticando ( cfr. Prof. Lobo Moutinho , in  Da Unidade à Pluralidade dos Crimes no Direito Penal Português , ed. Da Faculdade de Direito da UC , 2005 , 1324  )  ; o cúmulo retrata , assim , o atraso da jurisdição penal em condenar o arguido e a atitude do próprio agente em termos de condenação pela prática do crime , tendo em vista não prejudicar o arguido por esse desconhecimento ao fixar limites  sobre a duração das penas a fixar .

No caso de cúmulo estamos perante penas dependentes da avaliação , em conjunto , dos factos e da personalidade do agente , elemento a que as teorias criminalistas dão crescente relevo na explicação criminológica , podendo definir-se como correlato do comportamento singular de cada um , relativamente duradouro e estável , enquanto particularidade pessoal do agente , segundo Mezger , citado in Estudos de Homenagem ao Professor Figueiredo Dias , BFDUC , 2009 , I , págs. 76 e 77 , nota 174 , da autoria de Susana Aires de Sousa , sendo o facto ilícito expressão inadequada da personalidade do autor do crime , que só no decurso da vida se torna no que é , segundo Exner , op. cit ., pág. 77 .

Os  factos , no seu conjunto , são considerados não numa visão simplesmente atomística , mas sustentando um novo reexame , sob pena de pura e proibida tautologia pondo a descoberto a conexão entre eles ou falta desta e bem assim se o conjunto dos factos é recondutível a uma simples acidentalidade no percurso vital ou se exprimem uma carreira criminosa , radicando em qualidades desvaliosas na pessoa do agente , numa sua tendência para o crime , caso em que exacerba a pena de conjunto , sem desprezar a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente , em termos de exigência de prevenção geral , como especial , sendo de afastar a violação do princípio da proibição da dupla valoração, já que essa valoração é uma valoração de conjunto e não aos factos singulares de cada condenação –cfr. Prof. Figueiredo Dias , op . cit , pág. 292.


Descortinar in casu uma personalidade que se harmoniza e acomoda à prática do crime por sistema é algo sem o menor fundamento; dizer , sem mais , que o arguido revela uma personalidade “  pouco interessada na vida em sociedade” , pelo facto de afirmar uma realidade de todos conhecida , qual seja a de o Estado , ele próprio ser , por vezes , um pagador em mora  colocando o outro contraente em sérias dificuldades financeiras  não passa de uma afirmação inconsequente , por ser verdadeira . Isto para não se assinalar que , por vezes , o Estado deixa acumular os montantes devidos seja por incapacidade de resposta  dos seus serviços,  seja para evitar o eco social a que a cobrança coerciva conduz e que não ignora , avolumando juros vultuosíssimos .

Assinalar-lhe que mostra inacção no pagamento dos impostos é esquecer que na empresa que fundou posteriormente à BB , a BB II ,cumpre os encargos perante a Segurança Social , e tendo entrado em débito ao fisco está a cumprir  em prestações,  além de ter pago uma “ tranche “ significativa da dívida à Segurança Social no processo singular em que foi condenado , embora só uma pequena importância tenha sido satisfeita no outro processo .
É de ponderar quanto à possibilidade de pagamento  o vencimento que aufere como gerente da Prevecol II , de 731, 83€  , com o qual tem de fazer , com a companheira ao sustento de 2 filhos de ambos  5 e 8 anos e de um filho nascido do seu anterior casamento , em frequência universitária , isto para além de outros encargos .
Insinuar que o arguido distraiu para proveito próprio dinheiros da empresa  para satisfação do seu bem estar, seja porque a sua companheira actual tem 3 imóveis , vivendo todos numa zona residencial de  moradores de elevado substrato social e circulando num  BMW X D , topo de gama , não é concludente quanto àquele juízo, algo precipitado , com o respeito devido ,  sem qualquer base factual,  opondo-se-lhe que não vem demonstrado que aquela sua companheira não tenha fortuna pessoal, não sendo a residência naquela zona facto –índice desse desvio e nem mesmo o uso de carro daquela categoria , que está pagar mediante uma renda , em sistema de “ leasing “ .

Aliás no processo comum singular n. 647/08.7 TABJA.não se provou que “Os arguidos fizeram suas as quantias que não entregaram à Segurança Social.”, em contrário do que se provou no outro processo .

E se o arguido está convicto que a quantia a pagar ao fisco está dependente de apuramento em termos de lhe poder sobrevir um crédito também não choca que haja manifestado em audiência não se preocupar com o valor da dívida , ciente daquele crédito nela influente, não enraizando uma tendência para não pagar impostos , havendo uma conexão temporal entre os factos , enquadrados por razões de conjuntura   .

Na fixação da medida concreta da pena de concurso atender-se-à ao efeito que a nível de prevenção geral vai repercutir , efeito que , sendo de contenção dos demais potenciais delinquentes , é também o de crença na validade da norma e da sua eficácia,  do vigor da lei e dos seus órgãos aplicadores , para confiança nos tribunais , efeito muito sentido atento o flagelo do não pagamento dos impostos no nosso país , mas algo diluído atento o lapso de tempo já decorrido sobre a constituição em mora fiscal e o interesse manifestado em solver a dívida .

A nível da prevenção especial , que é o da interiorização dos maus resultados do crime , o arguido denota consciência disso , não se demitindo desse dever , sente que está adstrito a essa obrigação , revela “ raciocínio crítico “ , mas ainda aguarda que seja apurado o exacto montante a pagar , sendo certo que não resulta dos autos que seja detentor de um estatuto económico-financeiro, que sem o mais leve esforço , e só por aversão tributária, incúria ou alcance para si , deixe de cumprir , dando-se como provado , ainda , que não é proprietário de bens imóveis.

Foi uma questão de opção de gestão , atendendo à salvaguarda que sempre procurou efectuar em relação à manutenção de remunerações aos colaboradores, disse .


Ao nível da prevenção especial a exigência não se faz sentir em grau tão elevado .


O arguido é descrito como voluntarioso , ambicioso , trabalhador desde jovem , que subiu a pulso na vida , desempenhando várias profissões até chegar a sócio gerente único da actual empresa, e amante e crente no que faz , pelo que se lhe credita um juízo favorável , capaz de regularizar a dívida , atentas as suas qualidades profissionais  evidenciadas ao longo dos factos provados, descredenciando-se os contrafactos negativos na sentença por insuficientemente caracterizados ao nível factual , nada  lucrando a comunidade e o tecido social –era mais um espectro de despedimento no ar –e nem o Estado na prisão efectiva  aplicada em 1.ª instância , que faria  experimentar ainda mais dificuldades de encaixe fiscal .


Vale , pois , dizer que ainda se justifica a condenação , em cúmulo , vistas as penas parcelares em apreço neste e no outro processo , na pena de prisão única de 5 anos , suspensa por igual tempo, mas com a condição de regularização , ou seja o pagamento  de 20% , em cada ano , inclusive no corrente , das dívidas fiscal e à Segurança Social .


Revoga-se , pois , a decisão proferida , concedendo-se provimento ao recurso .

Sem tributação .

Lisboa, 09 de Maio de 2012

Armindo Monteiro (Relator)
Santos Cabral («com voto de vencido», porquanto «considerando os montantes em causa, o período de tempo durante o qual se prolongou o ilícito praticado e face a razões de prevenção a nível geral, confirmaria a decisão recorrida mantendo a pena de prisão efectiva»)
Pereira Madeira («com voto de desempate»)