Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | SOUSA PEIXOTO | ||
Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO A TERMO SUBSTITUIÇÃO DE TRABALHADORES EM FÉRIAS ÓNUS DA PROVA | ||
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Nº do Documento: | SJ20070517005374 | ||
Data do Acordão: | 05/17/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA | ||
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Sumário : | 1. Alegando o trabalhador que o motivo indicado no contrato para justificar a estipulação do termo é falso e tendo o contrato de trabalho em questão sido celebrado antes da publicação da Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, é sobre ele que recai o ónus de provar a alegada falsidade, nos termos do art.º 342.º, n.º 1, do C.C.. 2. Constando do documento escrito que titula a celebração do contrato a termo que o trabalhador foi contratado para desempenhar as funções de “carteiro”, em substituição de trabalhadores “carteiros” em gozo de férias e estando provado que desempenhou efectivamente aquelas funções, provada está a veracidade do motivo invocado para justificar a estipulação do termo. 3. A tal não obsta o facto de ter sido dado como provado que o trabalhador contratado a termo não tinha realizado os mesmos “giros” (percursos) que eram efectuados pelos trabalhadores substituídos.. 4. Na verdade, o que realmente interessa, para efeitos da substituição prevista na alínea a) do n.º 1 do art.º 41.º da LCCT, é que o trabalhador contratado vá exercer as mesmas funções que o trabalhador substituído vinha prestando, uma vez que a determinação das concretas tarefas que, no dia a dia, terá de realizar, no respeito pelo quadro funcional da respectiva categoria profissional, é da exclusiva competência do empregador, nos termos do poder de direcção que a lei lhe confere. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam Supremo Tribunal da Justiça: 1. AA intentou a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, em 24.10.2002, contra BB, S. A., pedindo que a ré fosse condenada a reintegrá-la ao seu serviço como carteiro, com efeitos desde 2 de Abril de 2001 e a pagar-lhe a quantia de 139.630$00 de retribuições já vencidas, com juros de mora desde a citação, bem como as retribuições vincendas até à data da sentença, acrescidas de juros de mora. E pediu, ainda, ao abrigo do disposto no art.º 829.º-A do C. C., que a ré fosse condenada a pagar 100 euros por cada dia de atraso na reintegração, a partir do trânsito em julgado da sentença. E, para fundamentar o pedido, a autora alegou, resumo, que foi admitida ao serviço da ré em 2 de Abril de 2001, mediante contrato de trabalho a termo, pelo prazo de 213 dias, para exercer as funções de carteiro, no Centro de Distribuição Postal da Chamusca, em substituição de determinados trabalhadores e durante os respectivos períodos de férias, mas que o motivo justificativo referido era falso, uma vez que foi colocada a fazer “giros” que não correspondiam àqueles que eram realizados pelos referidos trabalhadores, devendo, por isso, o contrato ser considerado sem termo e a sua cessação por parte da ré, no final do prazo estipulado, ser considerada como despedimento ilícito, por não ter sido precedida de processo disciplinar. A ré contestou sustentando a validade formal e material do motivo justificativo do termo, alegando que os “giros” não eram fixos, mas sim determinados por escala. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção inteiramente, procedente, condenou a ré a reintegrar a autora e a pagar-lhe a quantia correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à da sentença, acrescida de juros de mora contados desde a data do vencimentos de cada uma das prestações. Perante o insucesso da apelação, a ré interpôs o presente recurso de revista, tendo concluído a respectiva alegação da seguinte forma: 1.ª - A estipulação do termo invocado no contrato celebrado em 2.4.2001 é válida, bem como o motivo nele aposto. 2.ª - Foram juntos aos autos documentos de “pedido de justificação de ausências” dos trabalhadores em férias, para demonstrar a veracidade do motivo aposto no mesmo. 3.ª - A recorrida foi contratada para suprir necessidades transitórias por carteiros em férias, conforme ficou demonstrado pela junção dos documentos acima referidos. 4.ª - O facto de a autora ter desempenhado funções de carteiro fazendo “giros” que não correspondiam aos dos trabalhadores substituídos e constantes do contrato (8 dos factos provados) ou o facto de alguns desses trabalhadores fazerem “giros” que a autora não executou (9 dos factos provados) em nada colide com o motivo da sua contratação. 5.ª - Até porque os “giros” não são fixos, antes, pelo contrário, há rotatividade nos “giros” (11 dos factos provados). 6.ª - No contrato celebrado em 2.4.2001 não há uma mera remissão para a alínea a) do n.º 1 do art.º 41.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27/2, sendo mencionado o circunstancialismo concreto susceptível de integrar os casos em que a celebração do contrato a termo é admissível. 7.ª - Não houve conversão do contrato em contrato sem termo, porque o mesmo foi denunciado de forma válida e eficaz, de forma a produzir os seus efeitos legais. 8.ª - A recorrente cumpriu inteiramente o preceituado na alínea a) do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, no art.º 42.º do mesmo diploma, no n.º 1 do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 34/96, de 18/4, o Decreto-Lei n.º 132/99, de 21/4. A recorrida contra-alegou sustentando a confirmação do julgado e a mesma posição foi assumia pelo Ex.mo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal, em “parecer” a que as partes não responderam. Colhidos os vistos dos juízes adjuntos, cumpre apreciar e decidir. 2. Os factos Os factos que, sem qualquer impugnação, vêm dados como provados são os seguintes: 1 - A 2/4/2001, entre autora e ré foi celebrado o acordo epigrafado de "contrato de trabalho a termo certo" cuja cópia consta de fls. 11, com início em 2/4/2001 e pelo prazo de 213 dias, nos termos do qual a autora se comprometeu a prestar à ré a sua actividade profissional, desempenhando as funções de carteiro, na EC/CDP de Chamusca, para substituir diariamente alguns carteiros que se encontram de férias. 2 - Com data de 15/10/2001, a ré enviou à autora, que a recebeu a 15/10/2001, a comunicação cuja cópia consta de fls. 13, ali constando, nomeadamente, que o acordo supra referido em 1 não seria renovado, terminando a 31/10/01. 3 - A partir de 31/10/01, a autora deixou de prestar serviço à ré. 4 - Ultimamente, a remuneração de base mensal da autora era de 106.300$00, acrescida de subsídio de refeição no montante de 1.515$00 por cada dia útil de trabalho prestado. 5 - A autora é sócia do Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações. 6 - A ré não instaurou à autora processo disciplinar. 7 - A 15/10/01, entre autora e ré foi celebrada a adenda ao acordo referido em 1, cuja cópia consta de fls. 12. 8 - A autora desempenhou funções de carteiro fazendo "giros" que não correspondiam aos dos trabalhadores substituídos e constantes do acordo referido em 1. 9 - E alguns desses trabalhadores faziam "giros" que a autora nunca executou. 10 - Os acordos referidos em 1 e 7 supra, também se destinavam a eventual substituição, por parte da autora, de alguns dos trabalhadores naqueles referidos, nos respectivos períodos de gozo de férias. 11 - Os “giros” funcionavam normalmente por escala de serviço e normalmente não eram fixos. 3. O direito Como resulta das conclusões formuladas pela recorrente, o objecto do recurso restringe-se à questão de saber se a estipulação do termo aposta no contrato de trabalho que entre as partes foi celebrado em 2 de Abril de 2001 é válida, ou não. Nas instâncias entendeu-se que não e o entendimento perfilhado na decisão ora recorrida, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de fls. 179-188, assentou na seguinte argumentação: «Da leitura do referido contrato, principalmente do cabeçalho e da sua cláusula 4.ª, resulta que a contratação da apelada se destinou a substituir diariamente os trabalhadores que identifica e que se encontram de férias nos dias mencionados na mesma cláusula. Estando de férias nos referidos dias, esses trabalhadores estão impedidos de prestar serviço pelo que é admissível a contratação a termo para a sua substituição, conforme estabelece o referido art.º 41.º, n.º 1, al. a) do DL 64-A/89 de 27.2. Nada, pois, a objectar ao fundamento expresso no mencionado contrato para a contratação a termo – o contrato a termo está formalmente justificado nos termos legais. Resta, pois, analisar se a apelante logrou provar, como lhe competia, que o fundamento para a contratação a termo exposto no referido contrato era real, ou seja, se a apelada foi efectivamente substituir os referidos trabalhadores – substituição directa (designação legal introduzida no art.º 129.º, n.º 2, als. a), b) e c) do actual Código do Trabalho), como parece exigir o elemento literal extraído do art.º 41.º, m.º 1, al. a) da LCCT. Sabemos já que a autora, ora apelada, foi contratada pelo período de 213 dias com início em 02.04.2001, para exercer as funções de carteiro na EC(CDP de Chamusca, a fim de substituir diariamente os seguintes trabalhadores: [...] Sendo contratada para substituir os indicados trabalhadores, a autora deve efectuar o serviço de cada um dos trabalhadores indicados e no período em que estes estão impedidos de prestar serviço Se a lei permite, excepcionalmente, a contratação a termo para substituição temporária de trabalhadores, exigindo que se mencionem quais os trabalhadores que vão ser substituídos pela contratada a termo, o serviço desempenhado pela pessoa contratada tem de ser aquele que o trabalhador substituído deveria efectuar – e não qualquer outro serviço, embora da mesma categoria, sob pena de se tornar impossível sindicar a veracidade da fundamentação. A permitir-se, sem mais, a prestação do trabalho pelo contratado a termo que não correspondesse ao trabalho a efectuar pelo trabalhador substituído, ter-se-ia de ter como válida a contratação a termo para substituição de trabalhadores de forma genérica, por exemplo, contratação justificada apenas com a invocação de “substituição de trabalhadores em férias”, desde que se provasse que existiam trabalhadores de férias. Ora a lei não se basta com a menção de generalidade para fundamentar a aposição de um termo no contrato de trabalho. O contrato a termo tem de mencionar “concretamente os factos e circunstâncias que integram esse motivo” e esse factos e circunstâncias têm de corresponder à realidade, sob pena de nulidade do termo aposto no contrato. Não se quer com isto afastar a possibilidade de “substituição indirecta (designação legal introduzida no art.º 129.º, n.º 2, als. a), b) e c) do actual Código do Trabalho) [...]. Mas, nesse caso, cumpriria à entidade empregadora fazer prova dos factos que determinaram a “substituição indirecta”. Ora, no caso dos autos, a autora desempenhou funções de carteiro fazendo “giros” que não correspondiam aos dos trabalhadores substituídos e constantes do contrato celebrado entre as partes (facto n.º 8). E alguns dos trabalhadores indicados como tendo sido substituídos pela autora faziam “giros” que a autora nunca executou (facto sob 9). Daqui resulta que a ré, ora apelante, não logrou provar a veracidade da fundamentação exposta no contrato. E nem o facto de se ter provado que os “giros” dos trabalhadores funcionavam normalmente por escala de serviço e normalmente não são fixos (facto sob 11) levará a outra conclusão, pois ficou assente que a autora nunca executou “giros” de alguns dos trabalhadores indicados como tendo sido substituídos e fez “giros” que não correspondia aos dos trabalhadores substituídos. Nestes casos é evidente que não houve correspondência entre a justificação aposta no contrato para a celebração a termo e a realidade, ou seja, existe falsidade do fundamento indicado no contrato.» (fim de transcrição) A ré, ora recorrente, discorda do entendimento seguido pela Relação, continuando a defender a validade do termo e a consequente licitude da cessação do contrato, alegando que: - o motivo justificativo do termo está devidamente explicitado e concretizado no documento que titula o contrato, pois dele constam os nomes dos trabalhadores que a autora ia substituir e as datas em que cada um deles iria gozar férias; - o contrato satisfaz todos os requisitos de forma previstos no art.º 42.º da LCCT, uma vez que foi reduzido a escrito, assinado por ambas as partes e contém todas as indicações referidas nas alíneas a) e f) do n.º 1 daquele normativo legal; - fez prova, através dos documentos de fls. [34 a 44], de que os trabalhadores indicados no contrato tinham estado efectivamente de férias nos períodos nele indicados; - o facto da autora ter desempenhado funções de carteiro fazendo “giros” que não correspondiam aos dos trabalhadores substituídos e que o facto de alguns deles fazerem “giros” que a autora nunca fez em nada colide com o motivo da sua contratação, pois, tendo a ré ao seu serviço menos trabalhadores do que era habitual, porque estavam de férias, era natural que se socorresse da trabalhadora que os foi substituir, para assegurar o normal funcionamento do Centro de Distribuição Postal da Chamusca, uma vez que são os trabalhadores que não estão de férias, bem como os carteiros contratados a termo que asseguram os “giros” dos outros trabalhadores que estão de férias; - o facto da autora ter substituído alguns carteiros em férias, e não todos, não quer dizer que tenha havido extrapolação do objecto do seu contrato de trabalho, uma vez que havia menos trabalhadores ao serviço e que a autora foi contratada para os substituir, até porque os “giros” não eram fixos, estando antes sujeitos a rotatividade. Vejamos de que lado está a razão. E, antes de mais, importa referir que a situação em apreço terá de ser ajuizada à luz do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 28/2 (abreviada e vulgarmente designada por LCCT), mas na versão anterior à que lhe foi dada pela Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, uma vez que o contrato sub judice foi celebrado em 2.4.2001, ou seja, antes da publicação da Lei n.º 18/2001. Será, pois, essa a versão que levaremos em conta na nossa exposição. Ora, e como é sabido, a LCCT só permitia a celebração de contratos de trabalho a termo nos casos taxativamente previstos nas alíneas do n.º 1 do seu art.º 41.º e estabelecia que celebração daquele tipo de contrato fora desses casos importava a nulidade da estipulação do termo (n.º 2 do art.º 41.º), o que significava que o contrato passava a ser sem termo. E, sendo o contrato sem termo, o trabalhador passava a ser considerado trabalhador por tempo indeterminado, ou seja, usando a linguagem corrente, passava a ser trabalhador efectivo, permanente, da empresa. A lei não o dizia expressamente, uma vez que o n.º 2 do art.º 41.º se limitava a dizer que “[a] celebração de contratos a termo fora dos casos previstos no número anterior importa a nulidade da estipulação do termo”, mas esse era o efeito jurídico que necessariamente decorria da nulidade do termo, uma vez que esta não determinava a nulidade do próprio contrato, que assim continuava a ser válido, mas sem termo, ou seja, por tempo indeterminado, como pacificamente sempre foi entendido pela jurisprudência e pela doutrina, entendimento esse que, depois, a Lei n.º 18/2001 veio expressamente reconhecer, ao dar ao n.º 2 do art.º 41.º a seguinte redacção: “2. A celebração de contratos a termo fora dos casos previstos no número anterior importa a nulidade da estipulação do termo, adquirindo o trabalhador o direito à qualidade de trabalhador permanente da empresa.” Para além disso, a celebração de contratos a termo tinha de revestir a forma escrita e o contrato devia ser assinado por ambas as partes e conter as seguinte indicações: a) nome ou denominação e residência ou sede dos contraentes; b) categoria profissional ou funções ajustadas e a retribuição do trabalhador; c) local e horário de trabalho; d) data de início do trabalho; e) prazo estipulado com indicação do motivo justificativo ou, no caso de contratos a termo incerto, a indicação da actividade, tarefa ou obra cuja execução justifique a respectiva celebração ou o nome do trabalhador substituído - (1); f) data da celebração (art.º 42.º, n.º 1, na redacção anterior à que foi dada pela Lei n.º 18/2001). E, nos termos do n.º 3 do art.º 42.º da LCCT, considerava-se contrato sem termo aquele em que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, bem como as referências exigidas na alínea e) ou, simultaneamente, nas alíneas d) e f). Como da factualidade dada como provada decorre, em 2.4.2001, a autora e a ré celebraram, entre si, um contrato de trabalho a termo certo, pelo prazo de 213 dias, com início naquela mesma data. E, como consta do documento que o titula, o contrato foi celebrado ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 41.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 28/2 (abreviada e vulgarmente designada por LCCT) e a autora foi contratada para substituir os trabalhadores nele identificados (com a rectificação constante da “adenda” de que o mesmo veio a ser alvo - (2).), durante os períodos de férias que cada um deles iria gozar e que no contrato também foram devidamente especificados. E, como dos factos provados também consta, a ré fez cessar o contrato em questão no final do prazo nele acordado, ou seja, em 31 de Outubro de 2001, através de carta que o autor recebeu no dia 15 daquele mês e ano. Na presente acção, a autora veio pôr em causa a licitude daquela cessação, invocando, para tal, a nulidade da estipulação do termo, mas unicamente por entender que o motivo justificativo indicado era falso, uma vez que ela não tinha ido realmente substituir os trabalhadores identificados no contrato, pois tinha sido colocada a fazer “giros” que não correspondiam àqueles que eram efectuados pelos “trabalhadores substituídos”. Na verdade, a autora não pôs em causa a validade formal do contrato, nem havia razões para que o fizesse, uma vez que o mesmo se encontra datado e assinado e contém todas as indicações referidas nas alíneas do n.º 1 do art.º 42.º. E também não pôs em dúvida que o motivo indicado no contrato faz parte do elenco das situações previstas no n.º 1 do art.º 41.º da LCCT em que a celebração de contratos de trabalho é permitida, como efectivamente acontece, uma vez que a “[s]ubstituição temporária de trabalhador que, por qualquer razão se encontre impedido de prestar serviço” está expressamente prevista na alínea a) do n.º 1 do mencionado normativo. Por outro lado, a autora também nunca questionou o exercício das funções de carteiro por parte dos trabalhadores que ia substituir, o mesmo acontecendo relativamente ao gozo de férias, por cada um deles, nos períodos referidos no contrato. E também não alegou que tivesse ido desempenhar funções diferentes daquelas para que foi contratada, ou seja, funções de carteiro. Limitou-se a alegar, como já foi referido, que não tinha havido uma verdadeira substituição, por ter sido colocada a fazer “giros” diferentes daqueles que os trabalhadores em causa realizavam e essa foi a única causa de pedir por ela invocada. Como é evidente, para que o termo aposto num contrato de trabalho seja válido não basta que formalmente esteja correcto, isto é, não basta que do contrato conste um motivo e que esse motivo faça parte do elenco de situações previstas nas alíneas do n.º 1 do art.º 41.º. É indispensável, ainda, que esse motivo exista de verdade e que, de facto, as funções que o trabalhador contratado foi exercer entronquem realmente nesse motivo. Assim, e por exemplo, se um trabalhador é contratado a termo com o fundamento de ir substituir um determinado trabalhador da empresa durante o seu período de férias, não basta (embora também seja indispensável) que do contrato, necessariamente reduzido a escrito, fique a constar isso mesmo. É necessário ainda que o trabalhador identificado no contrato e alegadamente em férias esteja realmente em gozo de férias e que o trabalhador contratado vá exercer as mesmas funções que por ele eram normalmente executadas. Por outras palavras, a verdade formal expressa no contrato tem de corresponder à verdade material da real situação e é certamente por isso que a lei exige que do contrato fique a constar “o nome do trabalhador substituído” (art.º 42.º, n.º 1, al. e), da LCCT). Contudo, a lei não exige que o trabalhador contratado vá desempenhar exactamente as mesmas concretas tarefas que aquele vinha realizando. Aliás, uma tal exigência seria absolutamente descabida, uma vez que a mesma colocaria em causa o poder de direcção que a lei confere ao empregador, ao atribuir-lhe a competência para fixar os termos em que trabalho deve ser prestado, dentro dos limites decorrentes do mesmo e das normas que o regem (art.º 39.º, n.º 1, da LCT - (3). Na verdade, cabendo à entidade empregadora definir, a cada momento, as tarefas que o trabalhador temporariamente impedido devia realizar (dentro, naturalmente, dos limites decorrentes do contrato e das normas que o regem), não faria sentido que o não pudesse fazer em relação ao trabalhador que o veio substituir. O que realmente interessa é que o trabalhador contratado vá exercer as mesmas funções que o trabalhador substituído vinha prestando. A determinação das concretas tarefas que, no dia a dia, terá de realizar, no respeito pelo quadro funcional da respectiva categoria profissional, é da exclusiva competência do empregador, nos termos do poder de direcção já referido. Nem poderia ser de outro jeito, uma vez que o trabalhador tem de “[o]bedecer à entidade patronal em tudo o que respeite à execução e disciplina do trabalho, salvo e na medida em que as ordens e instruções se mostrem contrárias aos seus direitos e garantias” (art.º 20.º, n.º 1, al. c), da LCT, aqui também aplicável). A necessidade de organização e os interesses do empregador assim o exigem Por outras palavras, para efeitos da substituição prevista na alínea a) do n.º 1 do art.º 41.º da LCCT, basta que as tarefas de que o trabalhador contratado a termo foi incumbido de realizar façam parte do conteúdo funcional da categoria profissional do trabalhador que foi substituir. A chamada substituição directa basta-se com isso. Posto isto, vejamos então se a autora foi, ou não, substituir realmente os trabalhadores identificados no contrato. Como já foi dito, na decisão recorrida entendeu-se que não, com o fundamento de que ela tinha feito “giros” diferentes daqueles que eram realizados pelos trabalhadores que foi contratada para substituir e acrescentou-se que competia à ré provar a veracidade do motivo invocado para justificar a estipulação do termo, o que não fez. E, como se depreende da argumentação produzida no acórdão recorrido, a Relação entendeu, ainda, que a realização pela autora de “giros” diferentes daqueles que eram efectuados pelos trabalhadores substituídos configura um caso de substituição indirecta e, sem afastar a legalidade desta forma de substituição (que o Código do Trabalho expressamente contempla no seu art.º 129.º), entendeu que também cabia à ré alegar e provar os factos que tinham determinado essa substituição indirecta, o que também não teria feito. Porém, como das considerações que atrás oram expostas emerge, é óbvio que não podemos subscrever a argumentação produzida pela Relação. Por duas razões. Em primeiro lugar, porque a situação em apreço configura um caso de substituição directa e não indirecta, uma vez que a autora foi desempenhar as mesmas funções que eram prestadas pelos trabalhadores que foi substituir. O facto de ela não ter realizado os mesmos “giros” que aqueles faziam não configura um caso de substituição indirecta, por entendermos que esta só ocorre quando o trabalhador temporariamente impedido é substituído por outro trabalhador da empresa, que, por sua vez, é substituído pelo trabalhador contratado a termo, o que não está provado que tenha sucedido. A situação seria diferente se os substituídos tivessem sido contratados expressamente para realizar determinados “giros”, mas isso nem sequer foi alegado. Em segundo lugar, por entendermos que não era sobre a ré que impendia o ónus de provar a veracidade do motivo justificativo da estipulação do termo. Assim seria, de facto, se o contrato tivesse sido celebrado depois da entrada em vigor da Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, uma vez que esta Lei fez recair inequivocamente sobre a entidade empregadora (a exemplo do que a LCCT já dispunha no n.º 4 do seu art.º 12.º, relativamente à justa causa de despedimento) o ónus de provar os factos e circunstâncias que fundamentaram a celebração do contrato de trabalho a termo, ao ter aditado ao art.º 41.º da LCCT o n.o 3 e o n.º 4, o último dos quais com a seguinte redacção: “Cabe ao empregador o ónus da prova dos factos e circunstâncias que fundamentam a celebração de um contrato a termo, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto.” Todavia, e como já foi dito, a Lei n.º 18/2001 foi publicada depois da celebração do contrato de trabalho agora em apreço e, anteriormente à sua publicação, a LCCT não continha qualquer norma relativamente ao ónus da prova dos factos justificativos do motivo do termo, o que vale por dizer que se aplicavam, então, as normas reguladoras do ónus da prova estabelecidas no C. C., ou seja, no seu art.º 342.º e seguintes. Ora, dispondo o n.º 1 do citado art.º 342.º que “[à]quele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado” e não havendo dúvidas que a falsidade do motivo alegado pela autora constituía um facto constitutivo do direito por si invocado, dúvidas não há também de que era sobre ela que recaía o ónus de provar os factos integradores da referida falsidade. E essa prova não foi feita, pois, como já dissemos, o facto da autora ter sido colocada a fazer “giros” diferentes daqueles que eram efectuados pelos trabalhadores que foi substituir não releva para concluir pela inexistência da substituição. Pelo contrário, da factualidade dada como provada resulta que houve uma efectiva substituição, dado que a autora foi desempenhar as mesmas funções que por aqueles vinham a ser executadas e, mais do que isso, também ficou provado que ela foi prestar as mesmas tarefas que por aqueles eram realizadas, as quais consistiam na distribuição domiciliária do correio, embora não fizesse os mesmos percursos (“giros”) que aqueles habitualmente faziam e que nem sequer eram fixos, como provado também ficou. 4. Decisão Nos termos expostos, decide-se conceder a revista, revogar a decisão recorrida e absolver a ré totalmente do pedido. Custas pela autora. LISBOA, 17 de Maio de 2007 Relator: Sousa Peixoto (R.º 185) Adjuntos: Sousa Grandão Pinto Hespanhol ______________________________ (1)- Nos termos do n.º 1 do art.º 3.º da Lei n.º 38/96, de 31/8, na redacção original, ou seja, na redacção anterior à que lhe foi dada pela Lei n.º 18/2001, a indicação do motivo “só é atendível se mencionar concretamente os factos e circunstâncias que integram esse motivo”. (2)- A “adenda” só teve como objectivo a rectificação do nome de um dos trabalhadores referidos no contrato (3)- Forma abreviada de designar o regime jurídico do contrato individual de trabalho aprovado pelo D. L. n.º 49.408, de 24.11.69. |