Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00038308 | ||
Relator: | VIRGÍLIO OLIVEIRA | ||
Descritores: | ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA CONTRADIÇÃO INSANÁVEL DA FUNDAMENTAÇÃO PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA PODERES DE COGNIÇÃO PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PRINCÍPIO DA VERDADE MATERIAL PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO FALTA DE MOTIVAÇÃO OBJECTO DO PROCESSO | ||
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Nº do Documento: | SJ199906300002853 | ||
Data do Acordão: | 06/30/1999 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Referência de Publicação: | BMJ N488 ANO1999 PAG272 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC PENAL. | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
Área Temática: | DIR PROC PENAL. | ||
Legislação Nacional: | CPP98 ARTIGO 127 ARTIGO 340 ARTIGO 365 ARTIGO 374 N2 ARTIGO 379 A ARTIGO 410 N2 B C. CONST97 ARTIGO 32 N2. | ||
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Sumário : | I - A motivação da decisão de facto não é, ela própria, uma decisão de facto que se imponha e possa servir, sem mais, para detectar vícios de contradição ou de erro, a não ser que toda a prova produzida estivesse substanciada na motivação (o que, aliás, não seria lícito) ou que o ponto de facto estivesse abrangido por prova vinculada. II - O tribunal do julgamento tem poderes investigatórios pertinentes à descoberta da verdade material (artigo 340, do C.P.Penal) mas não pode suprir a descoberta de elementos relevantes que o não foram no momento próprio e pelas autoridades próprias. Nem se pode partir, no sentido da demonstração dos factos, da culpa do arguido, procurando, a todo o custo, encontrar os elementos probatórios que a sustentem. O princípio é de funcionamento inverso ("todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação") - artigo 32, n. 2, da Constituição. III - A motivação da decisão de facto (que não tem que ver com os motivos da decisão de direito), seja qual for o conteúdo que se lhe dê, não pode ser um substituto do princípio da oralidade e da imediação no que tange à actividade de produção da prova, transformando-se em documentação da oralidade da audiência, nem se propõe reflectir, nela, exaustivamente, todos os factores probatórios, argumentos, intuições, etc., que fundamentam a convicção ou resultado probatório. IV - A lei não exige que em relação a cada facto se autonomize e substancie a razão de decidir, como também não exige que, em relação a cada fonte de prova, se descreva como a sua dinamização se desenvolveu em audiência. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. No Tribunal de Círculo de Paredes, perante o tribunal colectivo, foram submetidos a julgamento os arguidos A, casado, industrial, nascido em 13 de Fevereiro de 1965, em Ermesinde, Valongo e residente em Águas Santas, Maia, e B, casado, industrial, nascido em 5 de Janeiro de 1962, residente em Ermesinde. Imputava-lhes a acusação, a prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado previsto e punido pelos artigos 131 e 132, ns. 1 e 2, alíneas a), b), c) e g), em concurso real com outro crime de homicídio qualificado previsto e punido pelos artigos 131 e 132, ns. 1 e 2, alíneas b), c) e g) do Código Penal. Os assistentes C e D deduziram contra os arguidos pedido de indemnização civil, reclamando destes o pagamento da quantia de 6309028 escudos, acrescida dos juros legais desde a notificação aos arguidos do demandado cível, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos. Os arguidos contestaram as acusações do Ministério Público e dos assistentes, negando a prática dos crimes e pedindo a improcedência do pedido cível contra eles deduzido. 2. Após julgamento decidiu o tribunal colectivo: Julgar improcedentes as acusações do Ministério Público e dos assistentes, absolvendo, os arguidos A e B dos crimes de homicídio acusados; Julgar improcedente o pedido de indemnização deduzido pelos requerentes C e D contra os arguidos, absolvendo-os do pedido. Do respectivo acórdão recorreram para este Supremo Tribunal de Justiça os assistentes e o Ministério Público. 3. Na sua motivação concluíram os assistentes: 3.1. Há contradição insanável da fundamentação, quando se verifique contradição entre a matéria de facto dada como provada ou como provada e não provada, pois pode existir contradição insanável entre os factos dados como provados, mas também entre os dados como provados e não provados, como entre a fundamentação probatória da matéria de facto (veja-se, Germano Marques da Silva, in "Curso de Processo Penal", volume III, página 325 e, entre outros, Acórdão do S.T.J. de 14 de Dezembro de 1995, C.J., Tomo III, página 264); Por seu turno, o erro notório na apreciação da prova, "é o erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem de formação média facilmente se dá conta" - obra citada, página 326 e, entre outros, Acórdão do S.T.J. de 31 de Janeiro de 1991, C.J., 1991, Tomo I, página 24 e Acórdão do S.T.J., de 3 de Maio de 1991, B.M.J. 405, página 314). 3.2. Em lado nenhum da fundamentação do acórdão, v.g. da exposição sucinta dos depoimentos das testemunhas ........, ......., ......, e .......,, bem como das testemunhas ...... e ......, sobrevém o que vem dado como provado nos pontos 20 e 35 dos factos provados; Não constando do processo lógico e racional utilizado pelo tribunal acerca das provas que serviram para formar a sua convicção e a razão de ser da valoração delas, ou seja, não constando da fundamentação da decisão em crise, o que resulta provado nos pontos 20 e 35 dos factos provados, verifica-se, pois: - a existência de erro na apreciação das provas, no conceito acima referido e pacificamente aceite - pois que o que resulta é que não poderia dar-se como provados tais factos e que partindo do mesmo critério tanto poderia o tribunal dar estes como provados como quaisquer outros; - contradição insanável da fundamentação - porquanto o que ali se deu como provado esta em oposição e contradição com a fundamentação da prova; Ou dito de outra forma: existe clara oposição entre o que serviu de substrato (fundamentação) e o que constitui o ponto de chegada (factos obtidos ou provados - pontos 20 e 35, "in casu"); 3.3. Vem dado como provado que os agentes da G.N.R. chegaram ao local "ainda antes da meia noite"; Quer do que resultou demonstrado em audiência de julgamento, quer dos elementos que constam da decisão recorrida, tal facto deveria e poderia ter sido melhor precisado no tempo, porquanto facilmente se demonstra que os referidos agentes da G.N.R. chegaram ao local quando muito antes das 23 horas e 30 minutos; Com efeito, consta da fundamentação do acórdão recorrido, a dado passo, o seguinte: " ....... e seu marido, ...... (...) por volta das 23 horas, ouviram os pedidos de socorro e dor provindos da Quinta, tendo sido ele quem ligou para o 115 e para a G.N.R. de Alfena; .... que também ouviu os gritos; ..., filha da ....., que por esta foi chamada cerca das 23 horas e 10 minutos...". " ,... Quando já estava em sua casa foi chamado pela testemunha ..... Ainda ouviu um grito aflitivo de uma voz masculina. Saiu e esteve cerca de 5 minutos no exterior. Voltou a entrar em sua casa e divisou, através (...). Essas duas pessoas... onde permaneceram cerca de 5 minutos. Depois voltaram a descer e instantes após desligarem as luzes da "Totocarnes". Entretanto chegou o jeep da G.N.R...." (vide páginas 34 a 36 da decisão). Decorre de toda esta cronologia que, mesmo contabilizando os 10 minutos (5+5) contados das 23 horas e 10 minutos, o jeep da G.N.R. chegou ao local, o mais tardar cerca das 22 horas e 30 minutos. Do que antecede, conclui-se que tendo os agentes da autoridade (G.N.R.) chegado ao local a essa hora - 22 horas e 30 minutos - e no mesmo instante (a expressão entretanto no contexto utilizada é elucidativa da quase simultaneidade de acções - entrada da G.N.R. e saída dos arguidos) tendo saído os arguidos do mesmo local em direcção à "Casa Costa", os arguidos saíram das instalações da "Totocarnes" cerca das 23 horas e 30 minutos; Vem provado que os arguidos no percurso que efectuaram da "Casa Costa" até à "Totocarnes" depois do jantar, por volta das 22 horas, demoraram 15 minutos - vide ponto 20 dos factos provados; Vem igualmente dado como provado que os arguidos após saírem do matadouro... se dirigiram para o restaurante "Costa", onde o arguido Fernando havia deixado a sua viatura (vide ponto 35 dos factos provados); Por seu turno, consta da fundamentação (vide página 36 do acórdão) que por volta das 0 horas e 45 minutos a viatura do arguido A fora vista pelas testemunhas ...... e ..... no parque de estacionamento do mencionado restaurante; Ora, verifica-se erro notório na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação quando por um lado se dá como provado que os arguidos após saírem do matadouro se dirigiram para a "Casa Costa" para irem buscar a viatura do arguido Fernando que aí se encontrava estacionada, se do mesmo saíram cerca das 23 horas e 30 minutos, e por outro, se refere na fundamentação que a mesma viatura fora vista por duas testemunhas estacionadas no parque daquele restaurante por volta das 0 horas e 45 minutos; Tais erro na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação, advém, além do mais, das regras comuns da experiência, por quanto, como é sabido, quanto mais o adiantado da hora, menor é o tráfego de veículos nas vias públicas, até porque coincidente com as horas normais de descanso dos cidadãos. Daí até que a mesma distância possa ser percorrida mais rapidamente durante o princípio da madrugada que ao princípio da noite. No caso dos autos não se encontra demonstrado que qualquer facto interruptivo no percurso tivesse existido, por forma a que os arguidos, num trajecto que antes fizeram em 15 minutos, tivessem depois que demorar pelo menos 1 hora e 15 minutos; Mesmo o que por bondade de raciocínio se admita que os arguidos apenas saíram das instalações da "Totocarnes" cerca das 24 horas, pelas mesmas razões existe erro na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação, tal como resulta do texto da decisão recorrida e com apelo ainda às regras da experiência comum, pois que não poderiam os arguidos (sem que nada o justificasse) demorar pelo menos 45 minutos (às zero horas) para a realização de um percurso que cerca das 22 horas haviam demorado 15 minutos. Ainda mais que apenas se refere que a viatura fora vista no parque estacionada por volta das 6 horas, digo, das 0 horas e 45 minutos, e não que os arguidos a foram buscar a essa hora; A hora de chegada ao local da G. N. R. e o momento de saída dos arguidos da "Totocarnes" - assume particular relevância para a descoberta da verdade nos presentes autos, seja porque toda (ou quase toda) a prova é indirecta, seja porque o momento de chegada ao local destes agentes de autoridade praticamente coincidiu com a saída dos arguidos do mesmo local; Acresce a tudo isto que os arguidos - segundo a versão que apresentaram na sua defesa escrita - após abandonarem as instalações da "Totocarnes" dirigiram-se de imediato para o "restaurante Costa" na viatura VW Golf Van, azul escuro, então conduzida como de costume pelo Domingos, para irem buscar o carro do Fernando que aí, na zona destinada a aparcamento automóvel, permanecera estacionado e a cujo local, segundo os mesmos arguidos chegaram ainda antes das 24 horas; Ora, se os arguidos quando saíram das instalações da "Totocarnes" não se dirigiram para o restaurante "Costa", para onde foram? E o que foram fazer? E então qual a necessidade dos arguidos em mentir?; Sobre isto deveria o tribunal, ao menos, se ter interrogado em lugar de ficar com as certezas de não terem sido os arguidos a cometerem os crimes, como facilmente se conclui do ponto 20 dos factos provados; 3.4. Existe ainda contradição insanável da fundamentação entre, por um lado, os seguintes factos não provados; - que os arguidos não tenham ouvido, em momento algum, qualquer grito, som ou voz, que se ligasse ao pedido de socorro; - que os arguidos não tenham ouvido a entrada nas instalações de qualquer viatura, nomeadamente policial; - que os arguidos não se tenham apercebido da luz emanada de forma constante e intermitente, quer através dos faróis de qualquer viatura, quer através do sinal de emergência (pirilampo) emanado de qualquer viatura policial; e a matéria do ponto 20 dos factos provados, onde vem dado como assente que o arguido Domingos "(...) após acender as luzes, quando entrou, dirigiu-se às zonas dos tambores..., seguidamente o arguido Domingos procedeu à verificação do funcionamento de um tambor do fabrico de fiambre (...). O arguido A acompanhou-o sempre, e enquanto aguardavam pela operação iniciada pelo B, dirigiram-se até ao escritório... onde o arguido A com a ajuda do computador, analisou os dados e conversou com o seu irmão sobre a vantagem de importarem produtos de Espanha. Depois, e antes de saírem, voltaram a passar pela zona onde o tambor de fiambre prosseguia a massagem de carne, fazendo o B a última regulação do maquinismo". Como resulta das regras comuns da experiência, quem, com atenção que é necessária à execução de tais operações (os que ali vêm descritas como tendo sido executadas pelos arguidos) as realizou efectivamente, com quase total probabilidade não poderia: - Ter ouvido qualquer grito, som ou voz, que se ligasse a pedido de socorro; - Ter ouvido a entrada nas instalações de qualquer viatura, nomeadamente policial; - Ter-se apercebido da luz emanada de forma constante e intermitente, quer através dos faróis de qualquer viatura, quer através do sinal de emergência (pirilampo) emanado de qualquer viatura policial; Se os arguidos tivessem ouvido os gritos de socorro e aflição, ou a entrada de viaturas, ou caso se tivessem apercebido de luzes intermitentes de viatura de emergência a entrar nas instalações, a atitude normal e natural dos arguidos (ou de quem quer que fosse) seria a de saírem para o exterior do edifício a fim de se inteirarem do que se estava a passar; e até porque o que estivesse a ocorrer passava-se nas próprias instalações; Acresce que, como se provou, os arguidos sabiam dos hábitos do pai e de que este saia da casa da Quinta por volta das 23 horas (vide ponto 9 dos factos provados) pelo que tinham razões de sobra para se preocuparem, em face dos gritos e das movimentações ocorridas na sua propriedade, sendo, para mais, como era de presumir, que algo estivesse a suceder com o pai deles; O tribunal deveria, pois, ter dado como provados aqueles factos negativos - dando como (não) provado, em relação aos arguidos, o seguinte: - que não ouviram os gritos, som ou voz que se ligasse a pedidos de socorro; - que não tivessem ouvido a entrada nas instalações de qualquer viatura, nomeadamente policial; - que não se tivessem apercebido da luz emanada de forma constante ou intermitente, quer através dos faróis de qualquer viatura, quer através do sinal de emergência (pirilampo) emanado de qualquer viatura policial, e não, dar como não provados factos negativos - tornando inconclusivos esses mesmos factos e tornado-os contraditórios com os descritos em 20 (vinte) dos factos provados; 3.5. Verifica-se ainda erro notório na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação quando, por um lado se dá como provado que "o Fiat Punto estava com as chaves na ignição..." - vide ponto 30 dos factos provados, e por outro se dá como não provado "... que, aproveitando o momento de saída das vítimas da Casa da Quinta, por volta das 23 horas (...) quando esta já se encontrava no interior do mesmo, com a chave na ignição..." - cfr. página 26 do acórdão; Pois que fica-se sem se saber se as chaves se encontravam ou não na ignição, sendo certo que os dois factos se reportam à mesma viatura, como decorre do ponto 8 dos factos provados. 3.6. Os supra referidos vícios da decisão - erro notório da apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação, na medida em que resultantes do texto da própria decisão recorrida, por si ou conjugados com as regras comuns da experiência, constituem fundamento de anulação do julgamento e implicam o reenvio do processo para novo julgamento, nos termos dos artigos 410, n. 2, alíneas b) e c) e 443 do Código de Processo Penal; 3.7. A decisão recorrida não contém, no que concerne às declarações dos arguidos, dos assistentes e da grande maioria das testemunhas em que se estribou, os motivos de facto decisivos que concorreram para a formação da sua convicção, não contendo, desse modo, o substrato racional e lógico que utilizou determinante para o facto de ter valorado todas as provas em que se refere ter apoiado para a decisão - o que faz inquinar o acórdão recorrido do vício da nulidade previsto no artigo 379, alínea a) do Código de Processo Penal, por inobservância do requisito plasmado no artigo 374, n. 2 do mesmo diploma. 3.8. Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se o acórdão recorrido, julgando-se verificado que a decisão incorre nos apontados vícios do artigo 410, n. 2 alíneas b) e c) do Código de Processo Penal, devendo, por via disso, anular-se o julgamento e proceder-se ao reenvio, digo, ao reenvio dos autos para novo julgamento ou, caso assim se não entenda, julgar-se verificada a invocada nulidade do acórdão recorrido, nos termos dos artigos 379 ex vi do artigo 374, ambos do Código de Processo Penal, com a consequente anulação do mesmo, e remetendo-se os autos ao tribunal de julgamento da 1. instância para proceder a nova decisão onde supra tal nulidade. 4. O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público, por sua vez, conclui na sua motivação de recurso: 4.1. O acórdão recorrido padece dos vícios da contradição insanável na fundamentação - artigo 410, n. 2 alínea b), do Código de Processo Penal - e do erro notório na apreciação da prova - artigo 410, n. 2, alínea c) do Código de Processo Penal; 4.2. Com referência ao ponto em que deu como assente que os arguidos, no veículo do B, se dirigiram directamente das instalações da firma "Totocarnes" para o restaurante "Costa - onde o A foi buscar a sua viatura - e que daí logo seguiram, cada um no seu carro, para junto da casa do último - n. 35 da rubrica "factos provados"; Com efeito, aquelas afirmações, para lá de contrariarem frontalmente o que ficou exarado na "indicação probatória" e na "motivação de facto" (374, n. 2 do Código de Processo Penal) a propósito das testemunhas ..... e ...... - contradição insanável -, jamais poderiam ter resultado dos depoimentos que no texto da "indicação probatória" aparecem a sustentá-las - a saber, os das testemunhas ......................................... -, e isso em função do que o próprio acórdão certifica que elas disseram ("motivação de facto") e da conjugação com as regras da experiência comum; Desse modo, a incongruência apontada seguramente que resultou de deficiente apreciação daqueles elementos - erro notório - que, patentemente impunham conclusão divversa daquela em que o Tribunal assentou ou seja, impunham qualquer outra que não a daquele encaminhamento imediato para o restaurante e para junto da casa do arguido A; E assim, eivadas dos vícios da contradição insanável e, ou, do erro notório referenciados, não podem tais afirmações subsistir e, por via disso, não será possível decidir a causa, isso pois que, na economia do examinado em audiência, assumiram aqueles factos primacial importância em vista da (ir)responsabilidade dos arguidos; Por isso que deve ser decretada a anulação do julgamento e o reenvio do processo quanto à totalidade do objecto - artigos 426 e 436 do Código de Processo Penal; 4.2. Mas mesmo que assim se não entenda, então o douto acórdão terá que ser anulado por padecer de várias nulidades; 4.2.1. Na verdade, em boa parte do segmento "convicção do tribunal", os Excelentíssimos Julgadores limitaram-se à "indicação probatória" e omitiram por completo a imprescindível "motivação de facto": estamo-nos a referir, especialmente, à lista telegramática em que, secamente, se mencionam as declarações dos arguidos, dos assistentes ....., das testemunhas ......., a inspecção ao local e a reconstituição dos factos, mas também aqui se têm em vista as menções, de idêntico juiz, relativas aos depoimentos de ......; Tal maneira de fundamentar a deliberação de facto claramente que não satisfaz as exigências do artigo 374, n. 2 do Código de Processo Penal, já que não permite aos sujeitos processuais, ao Tribunal Superior e à comunidade em geral vislumbrar que tenha sido o raciocínio probatório dos Meritíssimos Juizes recorridos e, assim, avaliar o seu substrato lógico e racional ou o respeito pelos princípios da legalidade, independência e imparcialidade dos tribunais; E tanto basta para que se tenha cometido a nulidade de falta de fundamentação prevista no artigo 374, n. 2 e 379, alínea a) do Código de Processo Penal; 4.2.2. Acresce que o douto acórdão recorrido patenteia mais duas nulidades por falta de fundamentação, desta feita atinentes à "enumeração dos factos provados e não provados" (omissão de pronúncia"; Com efeito, omitiu-se qualquer referência - entre o "provado" ou o "não provado" - a dois grupos de factos de fundamental importância para o exame e decisão da causa, um, relacionado com os instrumentos fotografados a folhas 73 a 74 dos autos e sua compatibilidade com as lesões produzidas nas vítimas - o que foi alegado na acusação pública ("Tais lesões são compatíveis com o tipo de instrumentos utilizados naquelas instalações industriais, nomeadamente os fotografados a folhas 73 e 74") -, o outro, com um exame às instalações industriais da firma "Totocarnes" eventualmente efectuado nas horas imediatamente seguintes à ocorrência dos eventos letais - o que constara da contestação ("E duas horas mais tarde, sempre os contestantes estivessem no local, foram "dois agentes da G.N.R." às instalações e nada de anormal encontraram"). Tais omissões demonstram que o tribunal a quo não examinou tais factos, nem os sopresou na decisão do processo; daí que, por mais duas vezes, tenha incorrido na nulidade de falta de fundamentação prevista nos artigos 374, n. 2 e 379, alínea a) citados; As invalidades apontadas acarretam a anulação do acórdão recorrido e a sua reedição pelo mesmo Tribunal, reedição essa precedida da repetição do julgamento, quer por ter de se suprir o que, oportunamente, não foi examinado, quer por respeito ao disposto no artigo 328, n. 6 do Código de Processo Penal. 4.3. Termos em que se requer a anulação do julgamento e o reenvio do processo quanto à totalidade do seu objecto com fundamento no disposto nos artigos 410, n. 2, alíneas b) e c), 426 e 436 do Código de Processo Penal ou, assim se não entendendo, se decrete a anulação do acórdão recorrido e se ordene a sua reedição com prévia repetição do julgamento com fundamento no disposto nos artigos 374, n. 2, 379 alínea a) e 328, n. 6 do Código de Processo Penal. 5. Os arguidos responderam a ambas as motivações, concluindo quanto à motivação dos assistentes: 5.1. Os recorrentes limitam-se a pôr em crise o julgamento da matéria fáctica, o que não constitui motivo de recurso, pelo que não deve ser apreciada; Com base no princípio da livre apreciação da prova, tendo em consideração as regras da experiência comum e a sua livre convicção, o douto Colectivo conseguiu apurar de entre as provas produzidas os factos essenciais e bastantes para concluir da irresponsabilidade dos arguidos quanto à autoria dos crimes; Não resulta da decisão recorrida qualquer dos vícios apontados pelos recorrentes e referidos no artigo 410, n. 2 do Código de Processo Penal; O erro na apreciação da prova para ser válido terá de revestir notoriedade ou seja quando contra o que resulta de elementos que constem dos autos e cuja força probatória não haja sido infirmada ou de dados de conhecimento público generalizado se emite um juízo sobre a verificação ou não de certa matéria de facto e se tome inconfortável tal erro de julgamento sobre a prova produzida; O erro notório só pode resultar do texto da própria decisão recorrida, em virtude de o conhecimento da prova oralmente produzida em audiência se encontrar subtraído pela sua intrínseca natureza a qualquer reapreciação pelo tribunal de recurso; Daí que quando tal erro seja invocado e a sua invocação se baseie em contradição destes depoimentos orais prestados em audiência ou no resultado de diligências efectuadas perante o tribunal colectivo, seja em regra manifesta a sua improcedência, em virtude de não se tratar de situação em que seja possível o recurso às regras da experiência comum e de o vício não resultar do próprio texto da decisão que se pretende impugnar; O que se encontra dado como provado em 20 e 35 dos factos provados da decisão teve como fundamento nos elementos de prova de que lançou mão o Colectivo e constam da convicção do tribunal; Não se vislumbra do texto recorrido qualquer erro notório na apreciação da prova nem contradição insanável da fundamentação; O que os recorrentes contestam é a matéria fáctica dada como provada, esquecendo que o tribunal a quo aprecia livremente a prova, atento o que dispõe o artigo 127 do Código de Processo penal; Os elementos probatórios que levaram à convicção do Tribunal constituem um conjunto, composto de prova testemunhal, documental, relatórios, inspecção do local e reconstituição de alguns factos; É irrelevante que os recorrentes venham exigir que o tribunal devia precisar as horas de chegada da G.N.R., pois que não sabe nem interessa saber ao Supremo se o tribunal recorrido dispunha de elementos probatórios bastantes e indubitáveis para estabelecer rigorosamente um limite temporal; Toda a matéria fáctica constante do acórdão, e bem assim a que os recorrentes invocam nas suas motivações, é já insindicável estando os poderes de cognição do Supremo Tribunal restritas à matéria de direito; Importam aqui apenas as condutas dos arguidos, nas circunstâncias dadas como provadas na sentença recorrida, e não os factos a que os recorrentes se reportam nas suas conclusões e que são diversos dos que comprovadamente pretendem estes; Os recorrentes socorrem-se de elementos externos à decisão para invocarem erro notório na apreciação da prova, como seja, fazem contas, somam minutos, tiram conclusões e formam convicções, que nada é detectado na própria decisão por si ou conjugado com as regras da experiência comum; O que se infere das conclusões atinentes dos recorrentes é que perante as mesmas provas validaria os factos diferentemente. Mas isso mais não é do que a sua valoração pessoal; Não resulta da experiência comum de que alguém que esteja a fazer uma operação de verificação dos tambores onde era massajada a carne para confecção de fiambre, onde o barulho é intenso, e exige conhecimentos técnicos, não possa até ouvir gritos ou aperceber-se de uma viatura policial com pirilampos ligados; Os arguidos poderiam ter ouvido gritos do exterior da Totocarnes mas sem saberem a sua proveniência já que ali próximo existem várias habitações e não lhes chamarem a atenção ou não deram relevo. Mas ficou o tribunal sem saber se os arguidos ouviram ou não gritos, se se aperceberam de uma viatura com os pirilampos ligados, sendo irrelevantes e despidos de sentido as conclusões que a este propósito retiram os recorrentes; Querem os recorrentes confundir o Tribunal Supremo a propósito das chaves do Fiat Punto se estavam ou não na ignição. Provou-se que num momento temporal as chaves estavam na ignição, como referiram os agentes da Judiciária; e não se provou que os arguidos se abeiraram do carro da Angelina quando este se encontrava com a chave na ignição. Não há qualquer erro ou contradição nesta parte, o que os recorrentes fazem é uma interpretação com base na parte final do facto não provado, ignorando o contexto em que este assenta. A fundamentação exige-a a lei, mas esta nos termos do artigo 374, n. 2 consta da enumeração dos factos, duma exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal. O colectivo fundamentou a decisão da matéria de facto, indicando os meios de prova que serviram para formar a convicção sobre tal matéria e justificou a razão dessa convicção, fazendo-o em termos perfeitamente adequados e lógicos, nada mais sendo exigível; Sem qualquer relevância para este recurso, os recorrentes põem na oralidade de algumas testemunhas aquilo que não disseram, fazendo relatos de factos que só parcialmente correspondem à verdade; O acórdão recorrido não incorreu em nenhum dos vícios do artigo 410, n. 2, alíneas b) e c) do Código de Processo Penal e não violou o disposto no artigo 374 do Código de Processo Penal. 5.2. Os arguidos na resposta à motivação do Ministério Público concluíram: Incumbia à acusação provar os factos que levaram à autoria dos ilícitos, prova que não foi conseguida; E não pode pedir-se, como pretende o Digno recorrente, que os hiatos da prova sejam substituídos por meras conjecturas ou especulações que as supram, com vista à condenação dos arguidos; O acórdão em apreço contém a enumeração exaustiva dos factos provados e não provados e a respectiva fundamentação, de facto e de direito; Lamenta-se que a incúria e a errónea investigação tivessem levado à detenção bastante alongada dos arguidos, com irreparáveis prejuízos para as suas vidas pessoais e familiares; Termina a pedir a confirmação da decisão recorrida. No Supremo Tribunal de Justiça, em visto prévio, o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser designado dia para a audiência. Com os vistos legais, realizada que foi a audiência, cumpre decidir. 6. A matéria de facto provada e não provada tal como vem do tribunal da 1. instância é a seguinte: FACTOS PROVADOS a) da parte criminal 1. Os arguidos A e B são irmãos, e filhos da vítima ....., que era casado com ...... 2. Em tempos o arguido A fundara a "Totocarnes", indústria de transformação de carnes de porco, sita em Portela Alta, Água Longa, Santo Tirso. 3. Com o passar dos anos o A deixou de gerir essa unidade industrial, entregando-a aos seus filhos A e B. Ultimamente eram estes que geriam de facto tal empresa e se encarregavam do seu funcionamento, estando o B mais ligado ao sector da produção e o A à contabilidade e relações comerciais. 4. Na zona do matadouro da "Totocarnes" estão depositados, em local próprio, os instrumentos de trabalho destinados ao abate e desmanche de suínos, tais como facas, cutelos e machados. 5. O A, além de outros negócios, possuía nas traseiras da "Totocarnes", em terreno situado nas traseiras e num plano superior e numa zona encoberta parcialmente por arvoredo, uma quinta com uma residência apetrechada para o serviço remunerado de festas e acontecimentos. Era aí que o A passava a maior parte do dia e se dedicava aos seus afazeres profissionais. 6. O acesso à "Totocarnes" e à quinta faz-se por dois portões colocados na margem direita da estrada Porto - Santo-Tirso, considerando este mesmo sentido. Um desses portões situa-se mais próximo das instalações do matadouro (Totocarnes) e do respectivo parque de estacionamento, e o outro localiza-se mais próximo do caminho de acesso à casa da quinta. Contudo, o interior é comunicante. 7. Há pelo menos oito anos que o referido A mantinha uma relação de amantismo com a vítima Angelina da Conceição Marques Teixeira de Sousa, que era sua prima e afilhada, e que no decurso dessa mesma relação se divorciara de seu marido. Por ocasião da partilha posterior ao divórcio deste, o A cedeu 12000 contos à Angelina para o pagamento de tornas devidas ao seu ex-marido. 8. Todas as noites, por volta das 20 horas ou 20 horas e 30 minutos, a Angelina levava à casa da quinta o jantar ao A, com quem jantava, lá permanecendo até cerca das 23 horas ou 23 horas e 30 minutos. Deslocava-se normalmente no veículo Fiat Punto, de cor vermelha, com a matrícula, 50-85-DI, que o A oferecera à assistente Blandina, em nome de quem estava registada a respectiva. Depois de sair o A ainda lá ficava uns minutos para fechar tudo, designadamente o portão de acesso à quinta, e para ligar o alarme. Tais hábitos eram do conhecimento dos arguidos. 9. A relação amorosa entre o A e a Angelina era conhecida no meio, bem como dos respectivos familiares, sendo que a mulher do A e a filha deste, por um lado, e o filho da Angelina, por outro, não viam com bons olhos essa ligação. 10. No dia 7 de Setembro de 1996, na casa da quinta, teve lugar a boda de casamento da filha da Angelina, a ora assistente Blandina. Esse facto foi muito contestado pela mulher do A e por sua filha . 11. Durante a boda o A permaneceu no 1. andar da casa da quinta, tendo-se apenas dirigido à parte de baixo para ser fotografado com os noivos. 12. Como a casa da quinta é referenciada como um lugar de bem servir, alguns dos convidados fizeram notar que a "mesa de frios" estava mal servida, o que originou que a Angelina se tivesse dirigido ao A, reclamando esse facto. Este logo procurou resolver o problema fazendo alguns telefonemas para o responsável pelo serviço. 13. Metade da despesa da boda foi suportada pelo falecido A - que fez questão de arcar com a parte correspondente à noiva Blandina - e a outra metade pelo noivo. 14. No fim de semana seguinte deu-se, na mesma casa da quinta, o casamento de um cunhado do arguido A. Durante a boda o A conviveu com seus filhos A e B, ausentando-se cerca das 2 horas da madrugada e encarregando os seus filhos de activarem o alarme. 15. No dia 17 de Setembro de 1996, como de costume, a Angelina levou o jantar ao A, cerca das 20 horas. Este já lá estava, tendo-se transportado na sua viatura de marca Mercedes Benz, com a matrícula JQ-78-04. Ela chegara ao local ao volante do Fiat Punto, acima aludido. Os respectivos veículos ficaram numa zona ajardinada em frente à casa da quinta. 16. Nessa mesma altura os arguidos iniciavam um jantar no restaurante Costa, sito em Ardegães, Maia, acompanhados de um tio materno, ....... e de um fornecedor da "Totocarnes", chamado António dos Santos Pestana, de Alcobaça. Tal jantar ocorria todas as terças-feiras, nele participando os dois irmãos, o tio materno e o tal António dos Santos Pestana. 17. Após o jantar, cerca das 22 horas, os arguidos A e B abandonaram o restaurante sem dar qualquer explicação aos outros dois comensais e dirigiram-se à "Totocarnes" para fazerem o controle e regulação manual do funcionamento de um tambor com carne destinada ao fabrico de fiambre. Tal acompanhamento do funcionamento do tambor é necessário para evitar a deterioração de toda a carne que lá se encontra. 18. Era frequente os arguidos realizarem, à noite, essas deslocações à empresa para esse fim, em dias diversificados. 19. Nesse dia 17 deslocaram-se para a "Totocarnes" no veículo "VolKswagen", modelo "Golf Van", de dois lugares e de cor azul metalizada, pertencente a uma sociedade de locação financeira e locada à "Totocarnes", com a matrícula 09-40-FT, que era conduzida, como habitualmente pelo arguido B. À porta do restaurante "Costa" ficou o veículo da mesma marca e modelo, e de cor branca, na qual o arguido A se fazia transportar habitualmente. 20. Chegaram à "Totocarnes", cerca de 15 minutos depois, entrando pelo portão que fica mais próximo do matadouro. Tanto este portão como o outro, acima referido, estavam abertos e o alarme desligado. Estacionaram a viatura na parte lateral sul, junto à porta de acesso ao matadouro. Entraram no matadouro por essa porta e o B após acender as luzes, dirigiu-se à zona dos tambores, sendo seguido pelo seu irmão. Ali o B procedeu à verificação do funcionamento de um tambor do fabrico de fiambre e à regulação manual do movimento desse tambor, por forma a que a carne de porco massajada nesse tambor pudesse ser devidamente tratada na manhã do dia seguinte. O arguido A acompanhou-o sempre e, enquanto aguardavam pelo desenrolar da operação iniciada pelo arguido B, dirigiram-se até ao escritório, sito no lado oposto e no 1. andar do edifício da "Totocarnes", onde o arguido A, com a ajuda do computador, analisou dados e conversou com o seu irmão sobre a vantagem de importarem produtos de Espanha. Depois, e antes de saírem, voltaram a passar pela zona onde o tambor de fiambre prosseguia a massagem da carne, fazendo o B a última regulação do maquinismo. 21. O funcionamento desse tambor e o de um outro que se encontrava ao lado, cheio só com água e numa rotação inferior, provoca um forte ruído tornando quase imperceptível uma conversa entre dois indivíduos que se encontrem na zona dos tambores. 22. Os arguidos saíram, finalmente, do matadouro pela mesma porta por onde haviam entrado, tendo desligado as luzes do interior do matadouro. Entraram no veículo em que haviam transportado e saíram pelo outro portão, ou seja, o localizado no enfiamento da rampa que dá acesso à casa da quinta. O portão que fica mais próximo do matadouro já havia sido fechado por Luís da Cunha Pereira, logo após a chegado dos arguidos à "Totocarnes". 23. Instantes atrás passara por esse portão e subira essa rampa, com os pirilampos ligados, o jeep da G.N.R de Alfena. Essa força policial fora chamada ao local em virtude de alguns vizinhos, residentes muito próximo do local, terem ouvido gritos masculinos de socorro e de dor provindos da casa da quinta. A preceder um desses gritos ouvira-se também a expressão de incitamento "Dá-lhe! Dá-lhe!", produzida por voz igualmente masculina. 24. Estava uma noite escura e chuvosa. 25. Chegados ao local, ainda antes da meia-noite, os dois agentes da G.N.R. depararam com dois corpos vitimados no chão da zona fronteira à entrada dessa casa : um deles era o de A, em posição de decúbito lateral direito, prostrado a cerca de 1,5 metros do Fiat Punto DI, e outro o de Angelina Sousa, que estava ligeiramente tombado de lado, a cerca de 8 metros do referido veículo, e com sangue à sua volta. 26. As vítimas haviam sido atingidas por pancadas vibradas por instrumentos cortantes e corto-contundentes, ou actuando como tal. 27. O A sofreu golpes em várias zonas do seu corpo, vindo logo a falecer em consequência das lesões traumáticas e raquimedulares descritas no relatório de autópsia de folhas 53 a 55, cujo teor se dá aqui por reproduzido, lesões essas que foram causa directa e necessária da sua morte. 28. A Angelina Sousa sofreu golpes na mão direita, no braço esquerdo, na cabeça, no rosto e pescoço, no tórax e nas costas, ao nível, designadamente, da coluna vertebral à direita, e da face lateral do lobo inferior esquerdo e do pescoço (face posterior da raiz do pescoço na linha média). Faleceu em consequência das lesões traumáticas, cranianas e toráxicas descritas no relatório de autópsia de folhas 43 a 46, cujo conteúdo se dá aqui por transcrito. 29. A vítima Angelina, no intuito de se defender das agressões, ainda usou um "spray", do tipo irritante, melhor descrito a folha 165 dos autos, cujo cheiro era ainda notório aquando da chegada da G.N.R. 30. No carro do A, que se encontrava com as portas fechadas, mas não trancadas, não foi causado qualquer dano. Pelo contrário o Fiat Punto estava com as chaves na ignição e com os quatro pneus furados, com golpes laterais produzidos por um instrumento com características cortantes. O vidro da porta do lado da condutora estava partido, sendo visíveis sinais de sangue no interior da viatura, designadamente no volante, nos bancos e na porta. 31. Tanto o A como a Angelina foram encontrados na posse dos objectos que traziam consigo. 32. É impossível a visibilidade de viaturas estacionadas em frente à casa da quinta, quer por parte de quem se encontra no portão da entrada, quer por parte de quem se encontra nos escritórios do Matadouro, sendo que estes ficam voltados para o lado contrário àquele em que se situa o pavilhão de festas da casa da quinta. 33. A estrada de acesso do portão à casa da quinta é constituída, a cerca de 25 a 30 metros da entrada, por uma curva bastante pronunciada, que forma um ângulo de aproximadamente 90 graus. O local onde ocorreram os factos situa-se no cimo de uma rampa, com cerca de 20 metros, que parte dessa estrada e finaliza num pequeno parque com frondosas árvores que tapam completamente a visibilidade. 34. A estrada, nesse local, tem pouca largura e muito trânsito. 35. Após saírem do matadouro, tomando essa estrada, os arguidos dirigiram-se ao restaurante "Costa", onde o A havia deixado a sua viatura. Aí chegados, o A saiu do "Golf" do seu irmão e entrou no seu, de cor branca, tomando o rumo de sua casa. No trajecto, foi seguido à distância pelo seu irmão B, que lhe deu sinal de luzes quando aquele se aproximava da sua residência. Pararam os respectivos veículos e, após ligeira troca de ideias, resolveram deslocar-se até ao bar "Paganini", sito na cidade do Porto, tendo-se para aí deslocado no "Golf" do B. O veículo do arguido A, da mesma marca e modelo, ficou aparcado junto à residência deste. 36. Quando regressaram do bar o arguido A foi para casa tendo tomado aí conhecimento, por sua mulher, de que o seu pai e a Angelina haviam sido assassinados na casa da quinta. Entretanto, a mulher do A já telefonara para o Dr. Carlos Melo, que é advogado da "Totocarnes" e amigo da família, pedindo-lhe que se deslocasse a sua casa. O arguido B foi também avisado, através de ligação feita pelo A, a partir de sua casa, para o telemóvel daquele seu irmão, quando este já se dirigia para o seu apartamento em Vila Nova de Famalicão. Acabaram por se encontrar todos na casa do A, donde partiram para a quinta. Chegaram aí por volta das 4 horas da madrugada do dia 18 de Setembro, numa altura em que o cadáver do A estava a dar entrada na ambulância. O arguido B, comovido e algo consternado, ainda se tentou aproximar do corpo de seu pai, dizendo que o queria ver, tendo sido, porém, impedido de o fazer pelos presentes. O arguido A não exteriorizou qualquer sentimento pelo falecimento do seu pai. Em relação ao cadáver da Angelina nenhum dos arguidos evidenciou qualquer sentimento. 37. Os arguidos A e B mantinham uma boa relação com seu pai, A, não só em termos pessoais mas também profissionais. 38. Sem aprovarem a sua ligação com a Angelina, não falavam com ele sobre esse assunto por saberem que seu pai não lhes admitia que se intrometessem na sua vida íntima. 39. Quase todos os dias o A falava com estes dois filhos, principalmente com o B, aconselhando-se sobre o tipo de obras que idealizava fazer na casa da quinta e sobre negócios em geral. Essas conversas ocorriam ora na "Totocarnes", quando o A aí se dirigia (o que acontecia frequentemente), ou na casa da quinta, quando o B aí se deslocava ou quando era chamado por seu pai. 40. Cerca de 8 anos antes, quando a família do A soube do envolvimento amoroso deste com a Angelina, a filha daquele, de nome Isabel, foi tirar satisfações à casa da Angelina, tendo sido acompanhada pelos seus irmãos - aqui arguidos - que, à distância, presenciaram a discussão mantida pela sua irmã com a Angelina. Depois desse facto a Angelina começou a receber vários telefonemas anónimos na sua residência, com voz de mulher, sendo-lhe dirigidas as seguintes expressões : "Puta" e "A mama vai acabar!". 41. Tal situação foi-se tornando insuportável ao ponto de, há cerca de 3 ou 4 anos, a Angelina ter requisitado um número de telefone confidencial para não mais ser incomodada. 42. Os arguidos, porém, desde que tomaram conhecimento do envolvimento amoroso de seu pai com a Angelina, nunca mais a contactaram ou com ela conversaram nem nunca lhe telefonaram. 43. O A havia pedido ao Banco Borges & Irmão financiamentos no valor aproximado de 25000000 escudos. 44. Três ou quatro meses antes dos factos, o A cedera as instalações da casa da quinta à Polícia Judiciária do Porto para que agentes seus, de uma zona ajardinada e arborizada dessa quinta, vigiassem eventuais condutas ilícitas de falsificadores de moeda. Tais operações, que duraram cerca de 15 dias, acabariam por resultar no desmantelamento de uma rede de falsificação de moeda que operava numa oficina tipográfica localizada a cerca de 100 metros da quinta. 45. A utilização pela Polícia Judiciária durante alguns dias para vigilância do local e dos suspeitos, foi autorizada pelo A porque o seu afilhado Alcino Tavares, que fazia parte da brigada dessa polícia destacada para o local, lho solicitou. 46. Nos meses que precederam a prática dos crimes a casa da quinta foi assaltada duas vezes, sem que os seus autores tivessem sido descobertos, uma das quais já depois de o pai dos arguidos ter dispensado as instalações da casa da quinta à P.J., o que levou a que o A tivesse introduzido um sistema electrónico de segurança para funcionar durante a noite. 47. Do certificado de registo criminal do arguido A nada consta. Do do arguido B consta uma condenação em multa, datada de 15 de Abril de 1995, do Tribunal de Pequena Instância do Porto, por condução de veículos automóveis sob o efeito do álcool. 48. Os arguidos gozam de bom comportamento posterior aos factos. 49. Os arguidos são bem formados e educados. 50. São estimados e respeitados por todos os que com eles se relacionam. 51. Os arguidos são pessoas normalmente pacíficas. 52. Os arguidos são casados, sendo a mulher do arguido A licenciada em Físico-Química e professora do ensino secundário. 53. Ambos os arguidos têm dois filhos menores de tenra idade. 54. Os arguidos gozam de boa situação sócio-económica. b) da parte civil 55. Os assistentes Humberto e Blandina são filhos da falecida Angelina e seus únicos e universais herdeiros. 56. A Angelina pressentiu o terror e a angústia da morte ao ser agredida do modo como o foi, percebendo que não mais sairia dali com vida. 57. Nos momentos que precederam a sua morte a Angelina viveu indescritíveis momentos de pânico, terror, dor e sofrimento. 58. O conhecimento da morte da mãe colocou os assistentes no mais absoluto e profundo estado de choque. 59. Divorciada que estava, há já alguns anos, do seu marido e pai dos assistentes, com quem mais nenhuma ligação estabelecera, a Angelina nutria por seus filhos o maior dos carinhos e amor, no que era retribuída por estes. 60. A adolescência dos assistentes foi passada com sua mãe, que sempre os acompanhou, educou e incentivou, no alento, na verticalidade dos princípios no sentido de responsabilidade e do trabalho. 61. À data do falecimento da Angelina, o assistente Humberto vivia com ela, partilhando com sua avó materna, a mesma casa. 62. A assistente Blandina havia casado há precisamente 10 dias e, apesar de viver noutra casa, partilhava ainda os momentos livres (designadamente os que precediam o jantar) com sua mãe, avó e irmão, visitando-os diariamente. 63. Constituíam uma família unida e de feliz convivência. 64. A notícia da morte da mãe, a quem tanto amavam, fez mergulhar os assistentes na mais profunda consternação e incontido estado de dor e revolta, e de que ainda padecem. 65. O facto de a Angelina ter sido assassinada ainda mais agravou os estados de alma dos assistentes, que reviveram a morte de sua mãe sempre que tinham de depor em inquérito. 66. Nos dias imediatos ao falecimento de sua mãe, os assistentes tiveram que ser permanentemente assistidos pela família e amigos, e de suportar a mágoa com o auxílio de sedativos. 67. Ainda hoje, a qualquer hora, os assistentes recordam os momentos vividos com sua mãe, revivendo as brincadeiras que tinham, as lamúrias e os hábitos, chorando amarguradamente sempre que o fazem. 68. Os assistentes, após a morte da sua mãe, passaram a vestir de luto. 69. Com a realização do funeral de sua mãe, incluindo trasladação do féretro, anúncio em jornal diário, encargos com a igreja, entrada do jazigo e com a Junta de Freguesia, respectiva legalização e agência, os assistentes gastaram 242148 escudos. 70. Com uma lápide, com letras de alumínio e esmalte, que tiveram de colocar na campa de sua mãe dispenderam os assistente a quantia de 31000 escudos. 71. Com a escritura de habilitação de herdeiros que outorgaram e apresentaram para efeitos da constituição de assistentes neste processo, os assistente gastaram 9800 escudos. 72. Em despesas com o luto os assistentes dispenderam, em conjunto, a quantia de 70000 escudos. 73. Em sufrágios por alma de sua mãe, que encomendaram por um período de um ano, com a periodicidade de uma vez por mês, gastaram os assistentes a quantia de 12000 escudos. 74. Com a remoção do veículo em que se fazia transportar a Angelina, quando do ocorrido crime e posteriormente, bem como com a reparação a que foi necessário proceder-se em consequência dos forros manchados com sangue, substituição do vidro partido e dos quatro pneus furados, dispenderam os requerentes a quantia de 236908 escudos. FACTOS NÃO PROVADOS a) da parte criminal Não ficou provado: - que aquando da situação referida em ... a Angelina tenha sido física e verbalmente agredida, bem como sua mãe, quer pelos arguidos, quer pela irmã deles, de nome Isabel; - que os arguidos tivessem manifestado forte contestação à realização da boda de casamento da assistente Blandina na casa da quinta; - que durante essa boda, e perante as reclamações feitas ao modo como estava guarnecida a mesa de frios, o A tivesse feito do seu telemóvel mais de 50 chamadas para o encarregado do serviço de hotelaria e que acabasse por desabafar que tal circunstância só poderia dever-se a "boicote" dos seus dois filhos, aqui arguidos; - que os arguidos tenham saído apressados do restaurante "Costa"; - que fosse costume os arguidos dirigirem-se às instalações da "Totocarnes" todas as terças-feiras; - que, após saírem do restaurante "Costa" e já chegados às instalações da "Totocarnes", os arguidos pusessem em prática um plano previamente gizado para tirarem a vida ao seu pai A e à sua amante, Angelina, tendo para o efeito desligado o alarme das instalações e as luzes da casa da quinta; - que na origem dessa intenção estivesse o facto de o casamento da Blandina se ter realizado, contra a vontade dos arguidos, nas instalações da casa da quinta e também o facto de a empresa sentir acrescidas dificuldades financeiras, com um aumento de dívidas à banca por parte do pai de ambos; - que para conseguirem os seus intentos, os dois arguidos aproveitassem o momento da saída das vítimas daquele local, que teria ocorrido por volta das 23 horas; - que os arguidos, antes de abordarem as vítimas, tivessem furado os quatro pneus da viatura Fiat Punto, de modo a impedir que a Angelina a usasse e se lhes escapasse; - que, aproveitando o momento da saída das vítimas da casa da quinta, por volta das 23 horas, os arguidos se abeirassem do carro da Angelina, quando esta já se encontrava no interior do mesmo, com a chave na ignição e pronto para arrancar; - que, de imediato, os arguidos tivessem partido o vidro da porta do lado do condutor, a fim de melhor surpreenderem a Angelina, aproveitando a escuridão da noite e a chuva intensa que se fazia sentir; - que, logo após a fractura do vidro, e como se apercebesse que estava a ser atacada pelos filhos do A, a Angelina, já em desespero, tivesse premido o spray de tipo irritante, que retirara do porta-luvas da sua viatura, contra os arguidos, para se defender; - que, mercê da acção rápida e decidida dos arguidos, só conseguisse direccionar o produto de tal spray para o pára-brisas da sua viatura, não os atingindo; - que, como não conseguisse atingir os arguidos com o produto do spray, estes tivessem desferido vários golpes no corpo da Angelina, primeiramente na zona da mão direita, no braço esquerdo, na cabeça, no rosto e no pescoço, com a intenção de lhe tirar a vida, usando para o efeito facas do matadouro; - que, em seguida, os arguidos tivessem aberto a porta do lado condutor, onde a Angelina ainda se encontrava ao volante, desferindo-lhe mais golpes profundos na zona do tórax, nas costas, ao nível, designadamente da coluna vertebral à direita, e da face lateral do lobo inferior esquerdo e do pescoço (face posterior da raiz do pescoço na linha média); - que, ante a fúria dos arguidos e a violência com que os golpes eram desferidos, a Angelina, perante a dor e o terror da morte, tivesse gritado por socorro percebendo que não mais sairia dali viva; - que o A viesse em seu auxílio; - que, dando um dos arguidos o alerta para a presença dele ali, tivesse clamado para o outro "Dá-lhe! Dá-lhe!", investindo então os dois para o A com os mesmos utensílios já utilizados contra a vítima Angelina; - que os arguidos e as vítimas se tivessem envolvido em lutas corporais; - que, posteriormente, tivessem os arguidos arrastado pelo solo a Angelina para local mais distante do veículo, e que, dando expressão à raiva como actuavam, tivessem desferido um último golpe no rosto da Angelina, há depois desta estar morta; - que os gritos de aflição da Angelina tivessem sido ouvidos a mais de 100 metros de distância; - que a vítima Angelina tivesse pedido socorro, com apelos angustiantes e gritos de aflição e desespero ouvidos nas casas que se encontram próximo do local dos crimes, e claramente percebidos pelos seus proprietários e até por populares, a mais de 100 metros de distância do local dos crimes cerca das 23 horas; - que os arguidos tivessem abandonado o local a alta velocidade e que tivessem embatido com a roda da viatura em que se transportavam no passeio que se situa do outro lado da rua; - que o arguido B, quando compareceu no local cerca das 4 horas da madrugada do dia 18 de Setembro, não tivesse manifestado qualquer sentimento para com seu pai; - que, nessa ocasião, os arguidos trajassem a mesma roupa com que haviam jantado; - que a Angelina andasse com o referido spray por se encontrar receosa e pressentida de que um dia iria ser alvo de violenta agressão pelos filhos do A; - que as relações entre os arguidos e seu pai já há muito não fossem as melhores, receando este que, por força dos telefonemas anónimos para a Angelina, o mesmo pudesse acontecer-lhe; - que fosse por essa razão que também este trazia habitualmente um idêntico "spray" no interior do seu automóvel; - que os arguidos tivessem agido de livre vontade, deliberada e conscientemente, dando execução a um plano que há muito haviam concertado entre si no sentido de tirarem a vida ao seu pai e à Angelina; - que a investigação referida em tenha o n. de inquérito 4918/96.5 JAPRT, já distribuído ao Tribunal de Círculo de Santo Tirso, e aí se encontrem detidos o sócio-gerente da firma "Vilar Gráfica, Sociedade de Artigos Gráficos", onde a moeda se fabricava, ...... em Folgosa, Ermesinde, bem como dois co-arguidos, encontrando-se em liberdade um filho daquele; - que as referidas detenções tenham ocorrido em 15 de Maio de 1996 e, a partir daquela data, tenham existido ameaças de morte dirigidas ao A; - que os assaltos referidos em tenham ocorrido após as detenções mencionadas em ... - que o A andasse com medo e que o tenha demonstrado inúmeras vezes a familiares, clientes e fornecedores; - que os arguidos não tenham ouvido, em momento algum, qualquer grito, som ou voz, que se ligasse a pedido de socorro; - que os arguidos não tenham ouvido a entrada nas instalações de qualquer viatura, nomeadamente policial; - que os arguidos não se tenham apercebido da luz emanada de forma constante e intermitente, quer através dos faróis de qualquer viatura, quer através do sinal de emergência (pirilampo) emanado de qualquer viatura policial; - que entre o pedido de socorro e a chegada da G.N.R. tivessem decorrido 10 minutos; - que , quando os arguidos saíram das instalações da "Totocarnes" não tivessem visto pessoas no passeio contrário, ou seja, no que se situa em frente à fábrica; - que o veículo Mercedes do falecido A estivesse fechado à chave; - que os arguidos tenham chegado ao restaurante "Costa", para buscar a viatura do arguido A, antes das 24 horas; - que os arguidos tenham permanecido no bar "Paganini" até cerca das 2 horas; - que, uma vez ou outra, o alarme fosse ligado à noite pelos arguidos ou pelo filho do porteiro, sendo para o efeito avisados pelo seu falecido pai; - que a ligação do A à Angelina fosse tolerada por todos os familiares daquele, não sendo fundamento para discussões, ameaças ou agressões; - que os arguidos tivessem ficado estupefactos e sem poder de reacção face à brutalidade do crime cometido na pessoa de seu pai; - que o arguido A tenha ficado emocionado e que ambos tenham ficado incomensuravelmente chocados; - que os arguidos sentissem grande amizade pelo seu pai e que este retribuísse do mesmo modo tal amizade; - que os arguidos tenham ficado chocados com o sucedido à Angelina; - que o A tivesse tido vários problemas com alguns vizinhos - sendo alguns testemunhas ou a estes ligados - por virtude da instalação da fábrica de carne e por força dos cheiros por esta emanados, de quando em vez; - que tal situação tivesse determinado várias querelas a nível camarário e sanitário; - que os arguidos tenham recebido educação aprimorada dos seus pais; - que nunca tenham tido quaisquer conflitos com alguém; - que seja média a condição sócio-económica dos arguidos. b) da parte civil Não ficou provado: - que, à medida que foi sendo alvo das facadas, a Angelina tivesse gritado com apleso angustiantes de auxílio; - que os assistentes tivessem estado presentes no local do crime para verificação do cadáver de sua mãe; - que ainda agora os assistentes recorram a sedativos; 7. Exposta a matéria de facto tal como vem da decisão do tribunal colectivo, apreciaremos agora as conclusões levadas à motivação pelos recorrentes-assistentes, tendo presente a aplicação do Código de Processo Penal antes das alterações introduzidas pela Lei 59/98, de 25 de Agosto. 7.1. - Segundo esses recorrentes, os pontos 20 e 35 dos factos provados não encontram na motivação da decisão de facto qualquer suporte probatório, donde o erro notório na apreciação da prova e a contradição insanável da fundamentação (410, n. 2, alíneas b) e c)). O ponto 20 reporta-se aos factos falados com os arguidos na "Totocarnes" e ponto 35 acompanha os arguidos após a saída. Tem-se por evidente, perante os conceitos de erro notório e de contradição insanável, que não é possível subsumir neles a situação que os recorrente apontam. A invocação de tais vícios em tal contexto, como em invocações subsequentes da motivação, mais não representa que uma tentativa injustificada de alargamento do objecto de conhecimento por parte do Supremo Tribunal de Justiça através da manipulação de conceitos. Quando muito, na visão que os recorrentes têm da situação, poder-se-ia qualificar o vício como importando a defeito da motivação da decisão de facto por desconforme com a última parte do n. 2 do artigo 374 do Código de Processo Penal. Nem esse vício se verifica. Sem necessidade de grandes procuras nas fontes da prova enunciadas como motivadoras, por manifesto se tem que os factos desses pontos 20 e 35 se reconduzem essencialmente às declarações dos arguidos, factor legítimo de convicção probatória, e não só, relevando também o conjunto da prova produzida como suporte da credibilidade de tais declarações. Tendo sido levados à fundamentação os factores probatórios desses dois pontos, não tinha o tribunal que repetir, em sede de motivação da decisão de facto, o que já antes enunciara com o seu convencimento com a respectiva base probatória de tal convencimento. 7.2. - Dizem depois os recorrentes que vem dado como provado que os agentes da G.N.R. chegaram ao local "ainda antes da meia noite". Ora, quer do que resultou demonstrado em audiência, quer dos elementos que constam da decisão recorrida, tal facto deveria e poderia ter sido melhor precisado no tempo, porquanto facilmente se demonstra que os referidos agentes da G.N.R. chegaram ao local quando muito ainda antes das 23 horas e 30 minutos os arguidos saíram das instalações do "Totocarnes" cerca das 23 horas e 30 minutos. Não lhes assiste razão. Se o tribunal podia ou não concretizar melhor a hora de chegada da G.N.R. é matéria que escapa aos poderes de cognição do Supremo por estar implicada com a produção da prova e a sua avaliação, tarefa que compete apenas ao tribunal do "facto". Não releva o convencimento dos recorrentes, mas tão-só o convencimento dos julgadores, não havendo neste questionado ponto nada que objective de o virtuamento do que se dispõe no artigo 327 do Código de Processo Penal, expresso por forma patente, ostensiva, notória na própria decisão susceptível de ser reconduzido a qualquer dos vícios do n. 2 do artigo 410 do mesmo Código. 7.3. - Argumentam também os mesmos recorrentes com a situação de os arguidos no percurso que efectuaram da "Casa Costa" até à "Totocarnes", depois do jantar, por volta das 22 horas, terem demorado 15 minutos (ponto 20 da matéria de facto), vindo também provado que os arguidos após saírem do matadouro se dirigiram para o restaurante "Costa" onde o A deixara a viatura (ponto 35 da matéria de facto). Por seu turno - continuaram os recorrentes - consta da fundamentação (da decisão de facto) que por volta das 0 horas e 45 minutos a viatura do arguido Fernando fora vista pelas testemunhas Joaquim Moreira e Mário Mandim no parque de estacionamento. Daí que se verifique erro notório e contradição insanável quando se dá como provado que os arguidos após saírem do matadouro se dirigiram para a "Casa Costa" para irem buscar a viatura do A, se do mesmo saíram cerca das 23 horas e 30 minutos e por outro se refere na fundamentação que a mesma fora vista estacionada no parque de estacionamento por volta das 0 horas e 45 minutos, tudo em confronto com os 15 minutos gastos quando foram para o Totocarnes, mesmo que depois daqui saíssem pelas 24 horas. Trata-se de censura sem justificação para a existência dos vícios invocados. Na matéria de facto provada não se refere a hora a que os arguidos chegaram ao restaurante para levarem a viatura, nem lá se diz que se tenham dirigido de imediato ao local de estacionamento. O tribunal deu como provado apenas aquilo que podia segundo a livre apreciação da prova, não havendo aparência de que, na apreciação do material probatório, não tenha feito uso das regras pertinentes à descoberta da verdade. A cronometragem que os recorrentes fazem dos tempos assenta essencialmente no seu próprio juízo, que não nos juízos do tribunal. E a referência que na fundamentação da decisão de facto se faz ao conteúdo de determinados depoimentos não transforma o que daí consta em conclusão probatória vinculativa. Esse factor probatório entra tão somente como um dos motivos no conjunto dos motivos probatórios resultantes de toda a prova produzida e é da análise desse todo que o tribunal, valorando-o, se convence ou não dos factos, sejam eles instrumentais, meramente probatórios ou principais. A motivação da decisão de facto não é, ela própria, uma decisão de facto que se imponha e possa servir, sem mais, para detectar vícios de contradição ou de erro, a não ser que toda a prova produzida estivesse substanciada na motivação da decisão de facto, o que não é o caso, nem poderia ser, ou então que o ponto de facto estivesse abrangido por prova vinculada, o que também não acontece. E também, aliás, do facto de os arguidos não terem ido logo buscar o carro, não pode inferir-se uma base de prescrição que pudesse levar à conclusão de que os arguidos mataram e depois, antes de irem ao parque do restaurante, tenham apagado qualquer vestígio do crime, como pretendem sugerir os recorrentes e o próprio Ministério Público, no que já vai implícito, em tal raciocínio, que não há quaisquer vestígios que liguem os arguidos ao crime praticado. O tribunal do julgamento tem poderes investigatórios pertinentes à descoberta da verdade material (340 do Código de Processo Penal), mas não pode suprir a descoberta de elementos relevantes que o não foram no momento próprio e pelas autoridades próprias. Nem se pode partir, no sentido da documentação dos factos, da culpa dos arguidos procurando a todo o custo encontrar os elementos probatórios que a sustentem. O princípio é de funcionamento inverso ("todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação (...)" - artigo 32, n. 2 da Constituição). 7.4. - Ainda segundo os mesmos recorrentes e dentro do tipo de censura antes analisado, os arguidos - segundo versão que apresentaram na sua defesa escrita - após, abandonarem as instalações da "Totocarnes" dirigiram-se de imediato para o "restaurante Costa, para irem buscar o carro do A (...), segundo os mesmos arguidos chegaram ainda antes das 24 horas. Trata-se, porém, da matéria exterior à decisão. O que se afirma numa contestação tem de passar pelo crivo da prova e sua apreciação e só depois é que o tribunal pode dizer ou não que o que aí se disse se tem ou não como demonstrado. Nem é legítimo lançar mão do que se refere numa contestação escrita para na sua base se construir uma situação de desaformidade com determinada realidade, ao arrepio de toda a prova produzida em audiência, incluindo as próprias declarações dos arguidos. Aliás, o tribunal considerou no rol dos factos não provados "que os arguidos tenham chegado ao restaurante "Costa", para buscar a viatura do arguido A, antes das 24 horas", como também não ficou provado" que entre o pedido de socorro e a chegada da G.N.R. tivessem decorrido 10 minutos". 7.5. - Continuando na análise das conclusões do recurso dos assistentes, encontramos depois a invocação do vício da contradição insanável da fundamentação entre factos provados e não provados. Do rol dos factos julgados como não provados consta: - que os arguidos não tenham ouvido, em momento algum, qualquer grito, som ou voz, que se ligasse a pedido de socorro; - que os arguidos não tenham ouvido a entrada nas instalações de qualquer viatura, nomeadamente policial; - que os arguidos não se tenham apercebido da luz emanada de forma constante e intermitente, quer através dos faróis de qualquer viatura, quer através do sinal de emergência (pirilampo) emanado de qualquer viatura policial. Entendem os recorrentes que esses "factos não provados" estão em manifesta oposição com a matéria do ponto 20 dos factos provados, por que "resulta das mais elementares regras da experiência comum quer, com a atenção que é necessária à execução de tais operações (as que vêm descritas como tendo sido executadas pelos arguidos enquanto permaneceram no "Totocarnes"), as realizou, dificilmente poderia: ter ouvido qualquer grito, som ou voz (...); ter-se apercebido da luz emanada (...)". Daí que o tribunal tivesse de dar "como provado (...), em relação aos arguidos: que não ouviram gritos (...); que não tivessem ouvido a entrada (...); que os arguidos não se tivessem apercebido da luz emanada (...)". Para além de não se descortinar qual a relevância de tal precisão do "ouvir" e "ver" dos arguidos, certo é que da matéria de facto não constam elementos que possam fundar uma regra da experiência comum com o conteúdo pressuposto nas considerações dos recorrentes, ou seja que das circunstâncias concretas do funcionamento dos motores e da atenção dos arguidos, elevadas à categoria da abstracção, se houvesse de inferir a regra de que uma pessoa média não pudesse "ouvir" ou "ver" o que se passava fora, deduzindo daí que também os arguidos não podiam "ouvir" ou "ver". Está implicada, na formulação de tal regra e nas considerações dos recorrentes, matéria de facto que escapa à cognição deste Supremo Tribunal. 7.6. - Ainda segundo os recorrentes - assistentes, existe erro notório na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação quando, por um lado, se dá como prova de que "o Fiat Punto estava com as chaves na ignição (...)" - ponto 30 dos factos provados - e por outro se dá como não provado "(...) que, aproveitando o momento da saída das vítimas da casa da quinta, por volta das 23 horas (...), quando esta já se encontrava no interior do mesmo, com a chave na ignição (...)". Também aqui se não vê da relevância de tal circunstância para a demonstração de que os arguidos mataram barbaramente o pai e a companheira. Apesar disso, ver-se-á que não assiste razão aos recorrentes. Ficou provado no ponto 30: "No carro do A, que se encontrava com as portas fechadas, mas não trancadas, não foi causado qualquer dano. Pelo contrário o Fiat Punto estava com as chaves na ignição e com os quatro pneus furados, com golpes laterais produzidos por um instrumento com características cortantes (...)". Não ficou provado (folha 1344): "que os arguidos, antes de abandonarem as vítimas, tivessem furado os quatro pneus da viatura Fiat Punto, de modo a impedir que a Angelina a usasse e se lhe escapasse; que, aproveitando o momento da saída das vítimas da casa da quinta, por volta das 23 horas, os arguidos se abeirassem do carro da Angelina, quando esta já se encontrava no interior do mesmo, com a chave na ignição e pronto para arrancar (...)". Não há qualquer vício. Dos factos acusados, o tribunal apenas se convenceu dos que declarou como provados, entre os quais o estar o Fiat Punto "com as chaves na ignição", mas não conseguiu obter elementos de convencimento quanto aos restantes, ou seja em relação aos que imputaram aos arguidos determinados comportamentos. Na formulação dos factos não provados não está em causa o problema de o veículo ter ou não as chaves na ignição. O ponto dúbio não se encontra na circunstância da existência das chaves e da sua colocação na ignição, mas sim no comportamento dos arguidos e da Angelina. À existência das chaves estava admitida como um pressuposto que já vinha da matéria de facto provada, não estando, por isso, em causa nos factos não provados. 7.6. - Segundo os recorrentes-assistentes também o acórdão recorrido está ferido da nulidade prevista no artigo 379, alínea a), por inobservância de requisito do artigo 374, n. 2, ambos do Código de Processo Penal. Sem razão invocam os recorrentes tal defeito do acórdão recorrido. O artigo 374, n. 2 do Código de Processo Penal, trata da estrutura e conteúdo da fundamentação da sentença, aparecendo dividido em três momentos: enumeração dos factos provados e não provados; exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão; indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal. Ora, o acórdão contém a enumeração dos factos provados e não provados, bem como a indicação dos motivos que fundamentaram a decisão de direito, motivos esses que não têm que ver com os motivos da convicção sobre a decisão de facto, estes integrados no terceiro momento relativo à indicação das provas, requisito também observado. É em relação a esse terceiro momento que os recorrentes censuram o acórdão. O terceiro momento de sentença aparece no n. 2 do artigo 374 com a exigência do requisito de "indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal", requisito que na sentença concreta há-se aparecer após serem descritos os factos provados e não provados. Consta agora, o respeito desse requisito do n. 2 do artigo 374 (versão da Lei 59/98, a expressão verbal: "com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal" (requisito, pois, na formulação legislativa actual, pelo menos na sua literalidade, mais exigente que na formulação anterior). A motivação da decisão de facto, seja qual for o conteúdo que se lhe dá, não pode ser um substituto do princípio da oralidade e da imediação no que tange a actividade de produção da prova, transformando-a em documentação da oralidade da audiência, nem se propõe reflectir nela exaustivamente todos o factores probatórios, argumentos, intenções, etc, que fundamentam a convicção ou resultado probatório. É certo que no nosso sistema processual as decisões de facto não assentam puramente no íntimo convencimento do julgador, num mero intuicionismo, antes se exigindo um convencimento por pretensão racional, devendo, pois, o juiz pesar com justo critério lógico o valor das provas produzidas, o que está em conexão com o também neste aspecto chamado princípio da publicidade, definido em Castro Mendes, Do Conceito da prova, página 302, "como sendo aquele seguindo o qual o processo - e portanto a actividade probatória e demonstrativa - deve ser conduzido de modo a permitir que qualquer pessoa seja o juízo, e presumivelmente se convença como o julgador (...)", o que, o entanto, não exclui a intenção ou conhecimento por outros sentidos. Na motivação agora em causa, trata-se de explicitar, publicitar, por forma suficiente, o próprio processo probatório. No presente caso, é preciso ter presente, para avaliar dessa suficiência, quer a quase totalidade dos factos provados são já eles próprios factos instrumentais, portanto material probatório para o convencimento e sua objectivação. Os factos principais, conteúdo do thema decidendum ou objecto do processo, restringem-se aos elementos essenciais e acidentais do crime, neles incluída a própria responsabilidade penal. Esses factos principais são o terminus do processo probatório, sendo os secundários ou probatórios momentos da prova daqueles, livremente averiguáveis pelo tribunal do facto no âmbito do princípio da investigação ou da verdade material (340 do Código de Processo Penal), e dando já eles quando expressos na própria fundamentação em que se incluem os factos provados e não provados, o sentido racional do processo probatório. É o que acontece na situação presente, sendo aí tais factos ou factores probatórios facilmente reconduzíveis às fontes de prova enunciadas na motivação da decisão de facto, fechando o círculo argumentativo da razão de decidir sobre os factos principais ou objecto do processo, este sujeito à vinculação temática, e sendo em relação a tais factos e objecto que essencialmente se tem de explicitar a racionalidade da actividade probatória. Tendo sido levados à fundamentação esses factos probatórios, não tinha o tribunal que repetir, em sede de motivação da decisão de facto, o que já antes enunciara na própria decisão, resultado do seu convencimento sobre eles. Quer dizer, da conjugação da indicação das fontes de prova e dos aludidos factos probatórios, alcançam-se os motivos de decidir quer sobre os factos principais, quer sobre aqueles factos probatórios, ligados como estão pelas máximas da experiência. E nem a lei exige que em relação a cada facto se autonomize e substancie a razão de decidir, como também não exige que em relação a cada fonte de prova se descreva como a sua dinamização se desenvolveu em audiência, transformando assim o acto de decidir numa tarefa impossível, devendo também não ser esquecido que o convencimento é o de cada um dos juizes que constituem o colectivo ou o júri ("Cada juiz e cada jurado enunciam as razões da sua opinião, indicando, sempre que possível, os meios de prova que serviram para formar a sua convicção (...)" - 365, n. 3 do Código de Processo Penal). Concretizando o que antes se disse, a título exemplificativo indicam-se as ligações entre os factos probatórios e respectivas fontes: No ponto 16 da matéria de facto estão expressas as fontes de prova, para além dos arguidos - o tio materno Fernando da Silva e António Pestana; O ponto 17 está baseado nas declarações dos arguidos e daquelas testemunhas; O ponto 19 é reconduzível às declarações dos arguidos, testemunhas Fernando da Silva, António Pestana e Luís da Cunha Pereira (que viu entrar, passando junto a ele, o veículo conduzido pelo B); O ponto 20 assenta nas declarações dos arguidos e testemunha Luís da Cunha (pouco depois das 22 horas (...) deu entrada na "Totocarnes", passando junto a si, o veículo conduzido pelo B. Depois deste passar fechou o portão, como era habitual (...). Divisou, através dos estores da vitrina do matadouro (...) duas figuras masculinas, ou conhecendo uma delas como sendo o B. Essas duas pessoas dirigiram-se do interior do matadouro para a zona do escritório, sita no 1. andar, onde permaneceram cerca de 5 minutos. Depois voltaram a descer e instantes após desligaram as luzes da Totocarnes); O ponto 22 encontra a sua base nas declarações dos arguidos, nos testemunhos de Luís Cunha, Maria Albertina, Joaquim Ferreira, Maria de Jesus, Maria de Fátima; também o ponto 23 encontra apoio nessas testemunhas; O ponto 25 encontra o seu apoio essencial no depoimento dos guardas, como se diz na motivação, sendo a hora o resultado da convicção do tribunal na síntese de todos os testemunhos e declarações; Os pontos 26, 27 e 28 têm a sua justificação primeira no resultado da autópsia; O ponto 29 assenta nos depoimentos dos guardas e auto de apreensão, como se infere dele próprio. O ponto 32 é reconduzível à infracção ao local e testemunhas que moram perto; Os pontos 33 e 34 têm a sua base na inspecção ao local; O ponto 35 é o resultado da convicção do tribunal assente, essencialmente, nas declarações dos arguidos; O ponto 36 dá ele próprio as fontes de convencimento. Não vale a pena continuar a exemplificação para se ver que o tribunal não julgou arbitrariamente, com violação das regras da prova e da finalidade processual da descoberta da verdade. O tribunal indicou as fontes de prova (declarantes, testemunhas, inspecção ao local, reconstituição de factos, fotografias, documentos, auto de apreensão, relatório de exame laboratorial); as ligações das fontes com as vítimas, os arguidos e os locais; logo em sede da motivação da decisão de facto nos dá a conhecer os factores probatórios mais relevantes; em sede da fundamentação pertinente aos factos provados e não provados enuncia com desenvolvimento os factos instrumentais conexos com o objecto do processo e por forma a poderem ser reconduzidos, mesmo por quem esteja fora do acto de julgar, as respectivas fontes. Quer tudo significar que o tribunal cumpriu com suficiência bastante o requisito da sentença que o obrigava a indicar as provas em que assentara a sua convicção. 8. - Vejamos agora o recurso do Ministério Público. 8.1. - Esse recorrente expressa logo a abrir a sua motivação as seguintes considerações: "(...) À segunda consideração respeita à especificidade da prova de que o tribunal a quo pode dispor, ou seja de prova circunstancial, de prova não presencial, isso ao menos no que respeitou aos actos causais da morte do A e da Angelina, já que os arguidos, obviamente, não admitiram a sua autoria e ninguém apareceu a referir tê-los percepcionado. Daí que, como decorre de algumas das actas respectivas (...) - e do próprio acórdão - (...) se tenha tratado de um julgamento de "pormenores", de um julgamento de pequenas questões, actos, episódios, afirmações ou contradições, tudo em ordem a tentar-se reconstituir a realidade dos factos com apelo aqui e ali às prescrições judiciais". 8.2. - Começa o recorrente por referir a "grande objecção" ao acórdão e que se prende com o que já antes se deixou analisado no que diz respeito ao recurso dos assistentes, ou seja a factualidade relativa à saída dos arguidos da Totocarnes para o restaurante "Costa". Já dissemos o bastante sobre tal ponto quando procedemos à análise da motivação dos assistentes, mantendo por isso aqui a mesma solução. Importa, porém, sublinhar determinado passo da motivação do Ministério Público e que reforça a decisão final do colectivo. Argumenta: "É que, como já se assinalou, num julgamento em que a prova produzida foi predominantemente circunstancial, praticamente que todos os pormenores assumem importância decisiva na fixação dos factos. Para lá disso, aquele que foi, digo, aquele (o da ida para o restaurante) foi um dos aspectos mais debatidos em audiência de julgamento, facilmente se alinhando porquê: havendo fortes suspeitas de os arguidos terem sido os autores dos homicídios e não se tendo detectado nenhum dos vestígios materiais que comumente andam associados à prática daqueles actos violentos - por exemplo, instrumentos de agressão com manchas de sangue, indumentárias das suspeitas com razões evidenciadoras de luta ou mesmo suja de sangue, pegadas ensanguentadas quer no trajecto pedestre efectuado pelos arguidos quer no interior do veículo que utilizaram, etc, etc, etc (...)". Como o próprio recorrente destaca, não há nada de objectivo que ligue os crimes aos arguidos. Não se vê como é que "pormenores" do tipo dos invocados podem justificar que o tribunal deles retire uma conclusão racional de que os arguidos praticaram os factos essenciais e com a soma de especificações que lhe são imputados. Também se não percebe a afirmação de haver "fortes suspeitas" de os arguidos terem praticado os crimes. 8.3. - Também o Ministério Público invoca a nulidade por insuficiência da fundamentação de convicção probatória (374, n. 2 do Código de Processo Penal - indicação das provas). Esta conclusão encontra resposta em que já antes se expôs a propósito do recurso dos assistentes, nada mais sendo necessário acrescentar. 8.4. - O acórdão seria ainda nulo por o tribunal não ter alinhado no "provado" ou "não provado", dois grupos de factos, um alegado na acusação pública, outro na contestação. 8.4.1. - O primeiro respeita à afirmação de que "... as lesões..." descritas nos relatórios de autópsia das vítimas eram "... compatíveis com o tipo de instrumentos utilizados..." nas instalações industriais da firma "Totocarnes", "nomeadamente os fotografados a folhas 73 e 74 do Inq. da P.J.". Ora, no acórdão apenas se detecta como provado que" na zona do matadouro da "Totocarnes" estão depositados, em local próprio, os instrumentos de trabalho destinados ao abate e desmanche de suínos, tais como facas, cutelos e machados". Não se alcança a relevância de tal censura. É manifesto que, dado a natureza das lesões sofridas pelas vítimas, instrumentos utilizados na "Totocarnes", como facas, cutelos, machados e outros semelhantes, eram adequados a produzir aquelas lesões, não havendo necessidade de que o tribunal o dissesse expressamente em relação aos fotografados. 8.4.2. - O segundo motivo de nulidade prende-se com o alegado no artigo 24 da Contestação. Deferindo-se às testemunhas Fernando Augusto e José de Oliveira, soldados da G.N.R. de Alfena, dizem os arguidos que "...duas horas ..." após a chegada daqueles ao local e "... sem que os contestantes lá estivessem, foram às instalações..." da Totocarnes "e nada de anormal lá encontraram...", nomeadamente pegadas, roupas ou instrumentos de agressão ensanguentados, ali produzidos ou deixados pelos arguidos, isso suposto que tivessem sido eles os autores dos actos criminosos. "Porém, a verdade é que os Meritíssimos juizes não fazem qualquer referência a tal episódio nem entre o "provado", nem entre o "não provado", não ficando assim demonstrado que o tenham examinado como deviam". Salvo o devido respeito, a crítica antes exposta acaba por ser ofensiva da honestidade intelectual dos Senhores juizes e mesmo dos assistentes e do próprio Ministério Público, pois que, por evidente se tem, que a ausência de vestígios detectados esteve sempre presente na actividade probatória e é mesmo o Ministério que na sua motivação realça a sua ausência. 9. - Pelo exposto, julgam improcedente o recurso e mantêm a decisão recorrida. Custas pelos recorrentes com taxa de justiça que fixam em seis unidades de conta, não as devendo o Ministério Público por estar isento. Lisboa, 30 de Junho de 1999. Virgílio Oliveira, Mariano Pereira, Flores Ribeiro, Brito Câmara. Tribunal de Círculo de Paredes 14/98 - 5. Secção |