Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | VASQUES DINIS | ||
Descritores: | CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES PENSÃO RETRIBUIÇÃO ADMINISTRADOR PT | ||
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Nº do Documento: | SJ20080910002384 | ||
Data do Acordão: | 09/10/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA REVISTA | ||
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Sumário : | I - Mostra-se correcta a comunicação efectuada pela ré PT à Caixa Geral de Aposentações de que, para efeitos da aposentação do trabalhador, a sua remuneração base mensal é de € 7.615,41, se à data da aposentação o trabalhador tinha categoria profissional de Consultor Superior, à qual correspondia aquela remuneração, ainda que então o trabalhador auferisse a remuneração de € 14.040,11, correspondente ao cargo de Administrador. II - O exercício do cargo de administrador noutras sociedades participadas da ré não pode caracterizar-se como prestação de trabalho subordinado, embora se mantenha o vínculo contratual com a ré (artigo 398.º do Código das Sociedades Comerciais). III - Não têm relevo para estes efeitos os pagamentos efectuados, após a cessação das funções de administrador, pelo valor que o autor auferia anteriormente, quando estes pagamentos decorrem da obrigação assumida pelas participadas da ré de garantir a “manutenção do modelo e valor da remuneração”, como condição da celebração do acordo que conduziu à cessação, inserindo-se na prática anterior, que consistia em a ré pagar e ser, depois, reembolsada, o que significa que, também esses pagamentos, ao menos no que respeita à diferença entre as duas remunerações em confronto, não integram o conceito de retribuição dado pelo n.º 1 do artigo 82.º da LCT (designação abreviada do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969), mostrando-se, por conseguinte, ilidida a presunção estabelecida no n.º 3 do mesmo artigo. IV - A comunicação efectuada pela ré à CGA, inserindo-se nos mecanismos tendentes à efectivação de uma relação de natureza previdencial, não pode ser encarado na perspectiva do princípio da irredutibilidade da retribuição consignado no artigo 21.º, n.º 1, alínea c), da LCT. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA instaurou, em 2 de Maio de 2003 no Tribunal do Trabalho de Lisboa, a presente acção emergente de contrato de trabalho contra “PT Comunicações, S.A,”, pedindo: – se declare que o Despacho com a referência DE 02712002 PE, de 24 de Maio de 2002, que, para efeitos da sua aposentação, fixou a remuneração base mensal em € 7.615,41, é ilegal e, por isso, nulo e de nenhum efeito; – se declare que a retribuição auferida pelo Autor em 4 de Outubro de 2002, data da sua aposentação, era de € 14.040,11; – se condene a Ré a reconhecê-lo e a comunicar, de imediato, à Caixa Geral de Aposentações que a retribuição por ele auferida, à data da aposentação, era do último valor referido; – se condene a Ré a indemnizá-lo de todos os prejuízos que lhe está a causar com a sua conduta ilícita, em montante a liquidar em execução de sentença; – se condene a Ré a pagar-lhe, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de € 250,00 por cada dia de atraso no cumprimento da condenação que lhe vier a ser imposta relativamente à aludida comunicação à Caixa Geral de Aposentações (CGA). Alegou, em síntese, que: – Foi trabalhador subordinado da Ré desde 1 Abril de 1957 até 4 de Outubro de 2002, data em que atingiu a reforma. Na contestação, a Ré invocou a excepção da incompetência, em razão da matéria, do tribunal do trabalho, alegando que os pedidos do Autor emergem de uma relação previdencial, em que os sujeitos são o Autor e a CGA. E, impugnando os fundamentos da acção, disse, em resumo, que: – A remuneração correspondente à categoria de Consultor Superior, que o Autor detinha, era do valor que foi comunicado à CGA, para efeitos de aposentação; O Autor respondeu à excepção. 2. Por despacho lavrado a 91, foi declarado incompetente, em razão da matéria, o “Tribunal do Trabalho de Lisboa” e, em consequência, a Ré absolvida da instância, mas a Relação de Lisboa, por acórdão lavrado a fls. 134/141, revogou tal despacho, declarando competente o tribunal do trabalho e ordenando o prosseguimento dos autos, decisão que veio a ser confirmada por este Supremo Tribunal. Efectuado o julgamento, foi proferida sentença, julgando a acção improcedente e absolvendo a Ré do pedido. Inconformado com tal decisão, o Autor apelou para o Tribunal da Relação de Lisboa, arguindo a nulidade da sentença e impugnando a decisão proferida sobre a matéria de facto, Tendo sido negado provimento ao recurso, veio pedir revista do acórdão daquele tribunal superior, terminando a respectiva alegação com as conclusões assim redigidas: a) Por força do que se estabelece nas disposições conjugadas do n.º 6 do art. 712.º e n.º 2 do art. 722.º do C.P.C. a matéria de facto fixada nas instâncias deve ter-se por definitivamente assente. b) Porém, este Venerando Tribunal não está adstrito à interpretação ali efectuada, devendo apreciar a matéria de facto de forma crítica, aplicando-lhe o direito. c) Ora, de acordo com a matéria de facto fixada, o A. deixou de ser Administrador a partir de Julho de 2002. Pelo que, d) salvo o devido respeito, a retribuição auferida a partir daí nunca pode ser a daquele cargo, como, erroneamente, se decidiu no Acórdão recorrido. e) E a tal não obsta o teor do documento de fls. 239 a que lançou mão o Acórdão recorrido, uma vez que daí não resulta, de forma directa, nem indirecta, que a remuneração auferida a partir do momento em que cessaram as funções de Administrador, tenha continuado a ser paga a este título, dado que só se refere à manutenção do valor e do modelo. f) E também não obsta o que se encontra fixado no ponto 24 da matéria de facto – o Acórdão recorrido refere, por lapso, o ponto 22 – “A Ré sempre foi reembolsada das remunerações de gerência que pagou ao A pelas sociedades do grupo em que este era administrador”. g) Na verdade, esta matéria de facto não autoriza a concluir que a Ré foi reembolsada pelas retribuições pagas ao Autor, após a cessação das suas funções de Administrador. Pelo contrário. h) E era à Ré que competia provar este facto. i) A leitura daquele ponto da matéria de facto aponta inequivocamente para que a Ré só foi reembolsada enquanto o Autor/recorrente foi administrador daquelas empresas, como é bom de ver. Por outro lado e sem prescindir: j) Apesar de ter deixado de ser Administrador em Julho de 2002, o A. manteve-se vinculado à Ré, dela tendo recebido a retribuição de € 14.040,11, até ao momento da aposentação – 04.10.2002 (Cf. pontos 5,12,13 e 15 da matéria de facto assente). k) Ora, tal montante só pode ser entendido como pagamento da retribuição do seu trabalho, sendo que tal até se presume, por força do disposto no n.º 3 do art. 82.º da LCT (aplicável à data dos factos). I) Sendo que era à Ré que competia provar o contrário, o que não logrou fazer. Pelo que, m) o montante fixado pelo despacho ajuizado (doc. 10 da p.i. reproduzido no ponto 19 da matéria de facto) é totalmente arbitrário, injustificado e ilegal. Efectivamente, n) a entidade patronal não pode pagar ao trabalhador uma determinada retribuição regular e fazer sobre ela incidir a respectiva quotização para o sistema de previdência e depois, unilateralmente, alterar tal valor, reduzindo-o, com o propósito exclusivo de influenciar o montante da aposentação. Isto é, o) a Ré não poderia ter comunicado outro montante senão o de € 14.040,11 que era o correspondente à retribuição efectivamente auferida pelo A no momento da sua aposentação, sob pena de violar, como violou, os direitos deste a ver comunicada à CGA a sua retribuição efectiva relevante para o cálculo do montante da sua pensão, bem como princípio da irredutibilidade da retribuição, estabelecido na al. c) do n.º 1 do art. 21.º da LCT. Por outro lado, ainda, também sem prescindir: p) mas mesmo que se entendesse que a retribuição auferida pelo do A no momento da aposentação era a de Administrador – o que se não aceita e só por necessidade de raciocínio se refere – mesmo assim o Acórdão recorrido careceria de razão, uma vez que, como resulta da matéria de facto provada e, em especial, da consignada nos pontos 7) e 8) da sentença, o A exerceu sempre as suas funções como trabalhador subordinado da Ré. q) Aliás, se assim não fosse, nem a Ré poderia efectuar descontos sobre as retribuições para a CGA, nem esta os aceitaria. r) O Acórdão recorrido violou, pois, a lei, em especial os art.s 659.º, n.º 3, art.s 21.º, n.º 1, al. c) e n.º 3 do 82.º da LCT. Pelo que, s) deve ser revogado, com as legais consequências [...] Contra-alegou a Ré para sustentar a confirmação do acórdão impugnado. Neste Supremo Tribunal, a Exma. Magistrada do Ministério Público pronunciou-se, em douto parecer que não suscitou reacção das partes, no sentido de ser negada a revista. Corridos os vistos, cumpre decidir. II 1. O acórdão recorrido fixou, sem censura das partes, os factos materiais da causa nos seguintes termos: 1. A R. é uma sociedade anónima que resultou de um complexo processo de transformações, cisões e fusões, que teve a sua origem remota na Administração-Geral dos C..., T... e T... . 2. O A. foi admitido para trabalhar por conta e sob a autoridade, direcção e fiscalização daquela Administração-Geral, mediante retribuição, em 1 de Abril de 1957, por contrato de trabalho verbal e sem prazo. 3. Tal contrato de trabalho acompanhou aquela evolução da R., sendo que, no momento da sua cessação por aposentação do A., com efeitos a partir de 04.10.2002, este trabalhava por conta e sob a autoridade, direcção e fiscalização da R. 4. Com a categoria profissional de Consultor Superior. 5. Em Julho, Agosto e Setembro de 2002 o A. auferiu a remuneração base mensal de € 13.860,35, acrescida de 6 diuturnidades no montante global de € 179,76 e de um subsídio de refeição de € 7,77 por cada dia de trabalho efectivo. 6. Desde a sua admissão até à cessação da relação laboral o A. sempre foi subscritor da Caixa Geral de Aposentações. 7. Desde Maio de 1996 a Julho de 2002 o A. foi Administrador da TV Cabo Portugal e de outras empresas suas participadas, por proposta da R. que o A. aceitou. 8. Apesar disso o A. sempre se manteve vinculado à R. por força do contrato de trabalho com esta celebrado, sempre tendo sido a R. a pagar-lhe a sua retribuição como Administrador e sempre tendo mantido a sua qualidade de subscritor da Caixa Geral de Aposentações. 9. A quota para esta entidade incidia sobre a sua remuneração base de Administrador acrescida do montante auferido a título de diuturnidades. 10. Por despacho de 27.08.1998 do Administrador da R. Dr. Eduardo Martins, foi aprovado, quanto aos Administradores de empresas participadas, fazer incidir a quota para a Caixa Geral de Aposentações sobre a remuneração base de Administrador. 11. Em 23.04.2002 o A. requereu a sua aposentação. 12. Em Julho de 2002 o A. cessou as suas funções de Administrador da TV Cabo Portugal, S.A.; TV Cabo Douro, S.A.; TV Cabo Porto, S.A. e da TV Cabo Mondego, S.A. 13. Apesar disso, até à aposentação, sempre manteve o seu vínculo à R., dela recebendo o respectivo vencimento. 14. O A. recebeu um ofício da Caixa Geral de Aposentações, datado de 04.10.2002, em que lhe era comunicado ter sido reconhecido o seu direito à aposentação por despacho da mesma data e que o valor da pensão unificada para o ano de 2002 era de € 7.902,96, calculada tendo por base uma remuneração base e uma remuneração total de € 7.795,17. 15. Na data da aposentação o A. auferia uma remuneração de € 14.040,11, constituída por uma remuneração base de € 13.860,35 e por diuturnidades de € 179,76. 16. O A. dirigiu à R. a carta junta a fls. 15, pedindo que fossem ordenadas as diligências necessárias à correcção do valor da sua pensão e consequente comunicação à Caixa Geral de Aposentações. 17. A tal carta veio a R. a responder por ofício de 29.11.2002 onde comunicava ao A. que tinha “... sido informada a CGA do valor da remuneração base mensal que lhe foi atribuída por DE 2712002 PE de 24 de Maio”. 18. O A. dirigiu à R. uma carta, datada de 16 de Dezembro de 2002, solicitando o envio do mesmo despacho, que a R. veio a enviar-lhe por carta de 21.01.2003. 19. Tal despacho, da autoria do Presidente Executivo da R., é do seguinte teor: “Atribuo a remuneração base mensal de € 7.615,41 (1.526.753$00) ao TSL AA (232254) colocado TV Cabo Portugal, S.A. Este despacho produz efeitos no dia 1 do mês anterior à aposentação.” 20. Em 21 de Outubro de 2002 a R. pagou ao A. a remuneração base de € 13.860,35, acrescida de € 179,76 a título de diuturnidades, o que foi corrigido em Novembro de 2002, tendo sido descontada ao A. no recibo de vencimento deste mês (onde é processada a sua pensão de desligação) a quantia de € 7.600,84 correspondente à parte proporcional da remuneração de Administrador que lhe havia sido paga por inteiro no mês de Outubro. 21. A remuneração correspondente à categoria de Consultor Superior era, em 2002, de € 7.615,41. 22. Foi esta a remuneração que a R. comunicou à Caixa Geral de Aposentações para efeitos de aposentação do A., pois era este o cargo de origem deste último, correspondente à categoria emergente do seu contrato de trabalho, e pelo qual estava inscrito na Caixa Geral de Aposentações. 23. A remuneração de € 14.040,11 auferida pelo A. era a de Administrador. 24. A R. foi sempre reembolsada das remunerações de gerência que pagou ao A. pelas sociedades do grupo em que este era Administrador. 25. Antes de 1998, a R. tinha o entendimento de que relativamente aos seus trabalhadores subscritores da CGA, em exercício de funções de Administrador da empresa ou de outra sociedade do grupo, a quota para a CGA devia incidir sobre a remuneração correspondente ao cargo pelo qual o trabalhador estava inscrito naquela, ou seja, ao seu cargo/função emergente do contrato de trabalho. 26. A Administração da R. em funções em 1998, dadas certas dúvidas suscitadas na empresa, resolveu solicitar um parecer a um consultor externo que se pronunciou contrariamente ao acima exposto, no sentido de que a quota devia incidir sobre a remuneração de Administrador. 27. A Caixa Geral de Aposentações manifestou à R. a sua posição sobre este assunto, pelo ofício que lhe dirigiu em 18.06.1995, com o seguinte teor: “... se um trabalhador da Telecom Portugal, subscritor desta Caixa, for destacado para exercer funções de gestão na empresa, mantém o regime de previdência da função pública, mas por referência ao cargo pelo qual lhe é aplicável tal regime, dado que as referidas funções de gestão não conferem direito de inscrição na Caixa Geral de Aposentações. Tal significa que, no caso em apreço, o interessado deverá efectuar descontos para esta Caixa sobre a remuneração do cargo que lhe corresponder à data em que for nomeado Administrador, nos termos do n.º 3 do artigo 11.º do Estatuto da Aposentação.” 2. A questão fundamental a resolver é, como resulta das conclusões da alegação da revista, a de saber qual o valor que a Ré estava obrigada a comunicar à CGA, como retribuição auferida pelo Autor, para efeito do cálculo da pensão de aposentação. 2. 1. As instâncias convergiram no sentido de considerar que a Ré agiu correctamente, ao comunicar o valor de € 7.614,41 – e não de € 14.040,11, como pretende o Autor –, correspondente à retribuição da categoria profissional de Consultor Superior. Observou-se na sentença da 1.ª instância: [...] Perante os factos provados constata-se que nessa data [dia anterior ao da aposentação] o A. trabalhava por conta e sob a autoridade, direcção e fiscalização da R., com a categoria profissional de Consultor Superior (factos n.os 3 e 4). Auferia a remuneração mensal de € 14.040,11 mas a mesma corresponde à retribuição de Administrador e não à de Consultor Superior, a qual era de € 7.615.41 (factos n.os 15, 21 e 23). Ora, ao serviço da R., o A. desempenhava as funções inerentes à categoria profissional de Consultor Superior e não as de Administrador, tendo este cargo de gerência sido exercido na TV Cabo Portugal e em outras empresas suas participadas (factos n.os 7 e 12). O A. nunca foi Administrador da R. no regime de trabalho subordinado, não executando por isso por conta desta tarefas a que cabia a retribuição mensal de € 14.040,11. Apesar de o A. ter cessado as funções de Administrador em Julho de 2002 e de a R. ter continuado a pagar-lhe a remuneração de € 14.040,11 até à aposentação em Outubro desse ano, o certo é que, sob a autoridade e direcção desta, o A. era Consultor Superior e a respectiva retribuição era a de € 7.615,41, pelo que aquele pagamento de € 14.040,11 não pode ser entendido como um dever decorrente do contrato de trabalho existente entre as partes. Nem a circunstância de ter sido sempre a R. a pagar-lhe a remuneração de Administrador a torna uma obrigação sua pois a R. era reembolsada desse pagamento pelas sociedades do grupo em que o A. era Administrador (facto n.º 24). Assim, à data da aposentação, como contrapartida do trabalho subordinado que o A. se vinculou a prestar à R., aquele tinha direito à retribuição de € 7.615,41 e não à de € 14.040,11. Em conformidade a R. agiu correctamente ao comunicar à Caixa Geral de Aposentações, para efeitos de reforma do A., a primeira dessas quantias (facto n.º 22), não havendo qualquer ilegalidade na sua conduta. [...] O Tribunal da Relação corroborou este juízo, considerando que, enquanto exerceu as funções de administrador ao serviço da TV Cabo e nas suas empresas participadas, sempre manteve o seu vínculo laboral com a Ré, detendo as funções de Consultor Superior, a que correspondia o vencimento de € 7.614,41, e, se sempre foi a Ré a pagar-lhe a remuneração correspondente à categoria de administrador, que nunca exerceu ao serviço dela, mas sim das empresas da TV Cabo, o que é certo é que ficou provado que a Ré era reembolsada, por tais empresas, dessas remunerações de gerência. E, acrescenta a Relação, se a Ré pagou ao Autor, até à data da reforma, o vencimento de administrador, tal resultou de um acordo de cessação antecipada de funções do Autor no Conselho de Administração da TV Cabo Portugal, SA, TV Cabo Douro, SA, da TV Cabo Porto, SA e TV Cabo Mondego, SA – corporizado no documento junto a fls. 239, citado na fundamentação da decisão que fixou a matéria de facto, nos termos do qual ficou assegurada ao Autor “a manutenção do modelo e valor da actual remuneração (…), bem como todas as regalias que lhe estão actualmente atribuídas, até à data da passagem à situação de aposentação prevista que deverá ocorrer até Outubro de 2002” –, não deixou, certamente, de ser reembolsada, sendo que o facto n.º 22 refere que a “R. sempre foi reembolsada”. Disto concluiu o acórdão impugnado, contrariamente ao sustentado pelo Autor, achar-se ilidida a presunção do n.º 3 do artigo 82.º da LCT (designação abreviada do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969), no que respeita à diferença entre o montante efectivamente auferido pelo Autor até à data da aposentação e aquele que lhe era devido pela categoria profissional que detinha ao serviço da Ré. O recorrente discorda deste entendimento, sustentando, em resumo, que; – Perante os factos provados, o valor de € 14.040,11, que a Ré pagou ao Autor, a partir de Julho de 2002, isto é, depois de ter cessado as funções de administrador noutras empresas, não pode ser entendido como correspondendo àquelas funções, mas sim como pagamento da retribuição do trabalho prestado à Ré, em face do disposto no n.º 3 do artigo 82.º da LCT; 2. 2. De acordo com o disposto no artigo 82.º da LCT, “[s]ó se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho” (n.º 1); “[a] retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie” (n.º 2); e “[a]té prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador” (n.º 3). No caso que nos ocupa, está demonstrado que: – O Autor detinha, enquanto vinculado por contrato de trabalho à Ré, a categoria profissional de Consultor Superior, à qual correspondia, em 2002, a remuneração de € 7.614,41 (factos n.os 3, 4 e 21) e que, à data da aposentação, o Autor auferia a remuneração de € 14.040,11, que correspondia ao cargo de Administrador (factos n.os 15 e 23); Perante estes factos, é mister concluir que a retribuição devida ao Autor, por força do contrato que o ligava à Ré, em função da categoria que lhe estava atribuída, era do valor de € 7.614,41, conclusão que não é afectada pelo facto de ter sido sempre a Ré a pagar-lhe a remuneração de € 14.040,11, pelo exercício do cargo de administrador noutras sociedades participadas da Ré, porquanto esse exercício não pode caracterizar-se como prestação de trabalho subordinado, já porque não resulta dos factos provados, ao contrário do que pretende o recorrente, que ele “sempre exerceu as suas funções como trabalhador subordinado da Ré”, mas sim e apenas que sempre manteve o seu vínculo contratual, já porque aquela asserção é, juridicamente, incompatível com a execução do contrato de trabalho. Na verdade, como salienta a Ré na contra-alegação, decorre dos n.os 1 e 2 do artigo 398.º do Código das Sociedades Comerciais, na parte aqui relevante, que, quando for designada administrador de uma sociedade, ou de sociedades que com ela estejam em relação de domínio ou de grupo, uma pessoa que exerça, em qualquer delas, funções ao abrigo de contrato de trabalho, estas suspendem-se, durante o período de exercício das funções de administração, caso o contrato tenha sido celebrado há mais de um ano. Não pode, assim, a remuneração correspondente ao cargo de administrador ter-se, para efeito do disposto no n.º 1 do artigo 82.º da LCT, como contrapartida da prestação de trabalho subordinado, daí que se compreenda que a Ré tenha sido sempre reembolsada dos montantes pagos. Relativamente aos pagamentos efectuados, após a cessação das funções de administrador, pelo valor que o Autor auferia anteriormente, não pode deixar de considerar-se que eles decorrem da obrigação assumida pelas participadas da Ré de garantir a “manutenção do modelo e valor da remuneração”, em vigor até à data daquela cessação, como condição da celebração do acordo que a ela conduziu, inserindo-se na prática anterior, que consistia, como se viu, em a Ré pagar e ser, depois, reembolsada, o que significa que, também esses pagamentos, ao menos no que respeita à diferença entre as duas remunerações em confronto, não integram o conceito de retribuição dado pelo referido n.º 1 do citado artigo 82.º, mostrando-se, por conseguinte, ilidida, como, bem, ajuizou o acórdão impugnado, a presunção estabelecida no n.º 3 do mesmo artigo. Por consequência, não há que convocar o princípio da irredutibilidade da retribuição, consignado no artigo 21.º, n.º 1, alínea c), da LCT. Nesta conformidade, mostra-se correcta a comunicação efectuada pela Ré à CGA, que, inserindo-se nos mecanismos tendentes à efectivação de uma relação de natureza previdencial, não pode ser encarado na perspectiva de redução da retribuição, sabido que o princípio da irredutibilidade, consignado no artigo 21.º, n.º 1, alínea c), da LCT, se reporta ao período de vigência do contrato. Irrelevante se apresenta, para o efeito pretendido pelo Autor, o eventualmente incorrecto cálculo das quotizações, pois, se este teve por base valores superiores aos devidos (remuneração de administrador, em vez de retribuição da categoria de trabalhador subordinado), tal não determina o reconhecimento do direito a um valor de retribuição, que não corresponda à noção legal supra referida. Improcedem, assim, as conclusões e pretensão formuladas no presente recurso, não merecendo censura o douto acórdão impugnado. III Por tudo o exposto, decide-se negar a revista. Custas a cargo do recorrente.
Lisboa, 10 de Setembro de 2008
Adelino César Vasques Dinis José Manuel de Sepúlveda Bravo Serra Mário Manuel Pereira |