Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
02S697
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MÁRIO TORRES
Descritores: BANCÁRIO
PENSÃO COMPLEMENTAR DE REFORMA
Nº do Documento: SJ20020625006974
Data do Acordão: 06/25/2002
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 4306/01
Data: 10/24/2001
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE
Sumário : Tendo o autor cessado a sua actividade no sector bancário, por despedimento, em Fevereiro de 1981 e passado à situação de reforma em 30 de Setembro de 1999, data em que perfez 65 anos de idade, tem direito ao complemento da pensão de reforma previsto e regulado na cláusula 140.ª do ACT para o Sector Bancário, na redacção de 1992, mantida inalterada nas revisões de 1994 e de 1996, e não à pensão de reforma regulada na cláusula 137.ª do mesmo ACT, que apenas contempla os trabalhadores que se encontrem em serviço activo nesse sector quando passam à situação de reforma.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,

1. Relatório

A, intentou, em 3 de Março de 2000, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, acção declarativa, emergente de contrato individual de trabalho, contra o B, pedindo a condenação do réu a: (i) reconhecer que o autor tem direito ao pagamento da pensão de reforma por invalidez presumível calculada com base no nível 12 e 29 anos de antiguidade, desde Outubro de 1999; e (ii) pagar ao autor: (1) as pensões de reforma calculadas com base nas cláusulas 136.ª, 137.ª e 138.ª do ACTV de 1994 para o sector bancário e posteriores actualizações, sendo que as pensões vencidas até 29 de Fevereiro de 2000 ascendem a 1492896 escudos, bem como as vincendas; (2) a título de danos não patrimoniais, a quantia de 3100000 escudos; e (3) os juros vincendos sobre as quantias reclamadas à taxa legal de 7% ao ano a contar da citação.

Aduziu, para tanto, em suma, que: (i) foi admitido ao serviço do ex-Banco de Angola, em Luanda, em Janeiro de 1952 para sob as suas ordens, direcção e fiscalização lhe prestar a sua actividade como empregado do então chamado Pessoal Maior; (ii) em Janeiro de 1973, veio para Portugal, foi subindo na carreira profissional e atingiu a categoria de gerente; (iii) em Janeiro de 1978, os ex-Bancos de Angola, Pinto Magalhães e da Agricultura fundiram-se e criaram a União de Bancos Portugueses, EP, a qual veio posteriormente a ser absorvida pelo réu; (iv) em 1981, quando exercia as funções de gerente e estava colocado no nível 12, foi despedido com justa causa, cessando o contrato que vinculava as partes; (v) completou 65 anos de idade em 30 de Setembro de 1999, e, assim, naquele mês enviou uma carta ao réu pedindo-lhe a atribuição de uma pensão de reforma com base no ACTV para o sector bancário; (vi) não está inscrito como beneficiário da Caixa Geral de Aposentações, estando inscrito como beneficiário do Centro Nacional de Pensões, mas não auferindo qualquer pensão; (vii) os trabalhadores bancários possuem um regime de segurança social próprio; (viii) de acordo com o ACTV para o sector bancário publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 42/94, o réu está obrigado a garantir o pagamento da pensão de reforma por invalidez ou velhice aos seus trabalhadores quando estes se invalidarem ou atingirem o limite de idade, fazendo-se a regra de cálculo com base na aplicação das percentagens constantes dos anexos respectivos; (ix) a recusa do réu em pagar-lhe a pensão de reforma é ilegal e contrária à Constituição; (x) tem direito a receber do réu as pensões de reforma vencidas e vincendas (desde Outubro de 1999) calculadas com base no nível 12, acrescidas de 5 diuturnidades e 4 anuidades, considerando os 29 anos completos de antiguidade; (xi) tais pensões, no ano de 1999, eram no valor mensal de 246146 escudos, passando no ano de 2000 a ser de 254156 escudos; (xii) estava a contar com a pensão de reforma, tendo assumido compromissos nesse pressuposto, sendo que, além disso, a partir do momento em que o réu lhe pagasse a pensão, ele e a sua esposa teriam uma boa assistência médica e outras regalias sociais; (xiii) ele e sua mulher já necessitaram de assistência médica e não puderam beneficiar do regime do SAMS (Serviço de Assistência Médico-Social), gastando mais dinheiro e tendo mais incómodos; (xiv) a situação deixou-o nervoso, incomodado e triste, pelo que reclama, a título de danos não patrimoniais, a importância de 3100000 escudos.

Após audiência de partes em que a tentativa de conciliação resultou infrutífera (fls. 62), o réu contestou (fls. 63 a 79), alegando, no essencial, o seguinte: (i) à data da cessação do contrato de trabalho por despedimento com justa causa as relações entre autor e réu regulavam-se pelo CCTV para o sector bancário publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 26/80; (ii) ao abrigo desse contrato só tinham direito à reforma os trabalhadores no activo, razão pela qual entende não ter o dever de pagar ao autor a reforma que este reclama; (iii) até então os Bancos só concediam reformas aos trabalhadores que, estando no activo, a ela tivessem direito por invalidez ou velhice; (iv) ainda que viesse a ser reconhecido ao autor o direito a auferir uma pensão de reforma a ser suportada pelo réu - o que apenas admite como hipótese de raciocínio - o seu cálculo é determinado pela aplicação da cláusula 140.ª do ACTV de 1994 e não pelas cláusulas 137.ª e 138.ª; (v) o direito consagrado no artigo 63.º da Constituição é um direito social, que vincula apenas o Estado; (vi) só os preceitos constitucionais referentes a direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades privadas; (vi) não existem quaisquer danos não patrimoniais que justifiquem a indemnização que o autor peticiona; (vii) não tem o autor direito a juros de mora posto que o direito a que se arroga, mesmo que venha a ser reconhecido, constituindo a ré na obrigação de pagar a pensão, esta não se encontra fixada, sendo necessário que o seu montante ou os critérios para a sua determinação sejam definidos pela sentença.

Proferido despacho saneador e fixados os factos assentes e elaborada a base instrutória (fls. 82 a 84), realizou-se audiência de julgamento, finda a qual foram dadas aos quesitos as respostas constantes de fls. 105, que não suscitaram reclamações.

Entretanto, por força da incorporação do B, no Banco Comercial Português, SA, passou este a ser o réu na acção (fls. 87).

Por sentença de fls. 108 a 127, o Tribunal do Trabalho de Lisboa julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou o réu: (i) a reconhecer que o autor tem direito ao pagamento da pensão de reforma por invalidez presumível, calculada com base no nível 12 e 29 anos de antiguidade, desde Outubro de 1999; (ii) a pagar ao autor as pensões de reforma calculadas com base nas cláusulas 136.ª, 137.ª e 138.ª do ACTV de 1994 para o sector bancário e posteriores actualizações, vencidas e vincendas, somando as vencidas até à data da sentença, o valor de 3780300 escudos, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 7% sobre as pensões vencidas e não pagas, contando-se tais juros desde a citação sobre as pensões que então se encontrassem vencidas e desde o respectivo vencimento sobre as que se vencessem posteriormente. No mais, designadamente quanto ao pedido de indemnização por danos não patrimoniais, foi o réu absolvido do pedido.

Contra esta sentença interpôs o réu recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa (fls. 129 a 146), questionando o direito do autor a haver dele uma pensão de reforma e, na hipótese afirmativa, a aplicabilidade da cláusula 140.ª, em vez das cláusulas 137.ª e 138.º do ACTV do Sector Bancário de 1994, mas por acórdão de 24 de Outubro de 2001 (fls. 255 a 267), foi negado provimento ao recurso.

É contra este acórdão que, pelo réu, vem interposto, para este Supremo Tribunal de Justiça, o presente recurso de revista, terminando as respectivas alegações (fls. 274 a 290) com a formulação das seguintes conclusões:

"1.ª - O recorrido entrou ao serviço do ex-Banco de Angola em Luanda em 1952, a tempo inteiro, onde trabalhou sob suas ordens e direcção, tendo cessado o seu contrato de trabalho por despedimento com justa causa em 1981.

2.ª - À data da cessação do contrato de trabalho vigorava o CCT para os empregados bancários de 1980, que dispunha que «as instituições de crédito, por si ou por serviços privativos já existentes, continuarão a garantir aos trabalhadores ao seu serviço os benefícios constantes desta secção, salvo e na medida em que benefícios da mesma natureza lhe sejam atribuídos por instituições ou serviços de segurança social».

3.ª - Os benefícios sociais, nos quais se incluem o pagamento da mensalidade de reforma, eram atribuídos apenas aos trabalhadores que se encontrassem ao serviço da instituição de crédito à data de os poderem adquirir.

4.ª - O recorrido deixou, assim, de estar abrangido por aquela cláusula, e por todos os CCT do sector bancário que lhe seguiram, uma vez que deixou de ser trabalhador bancário e de ser filiado no Sindicato dos Bancários, outorgante dos instrumentos de regulamentação colectiva invocados nesta acção.

5.ª - O direito consagrado no artigo 63.° da CRP é um direito social, que vincula apenas o Estado e não os particulares, obrigando-o à realização das condições de ordem económica e social que permitam a efectivação desse direito à segurança social.

6.ª - Só os preceitos constitucionais respeitantes a direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades privadas.

7.ª - Quem tem, pois, que assegurar a efectivação do direito à segurança social dos trabalhadores que não pertencem ao sector bancário e não lhes sejam aplicados os ACTV para aquele sector, é o próprio Estado e não a recorrente.

8.ª - O recorrido não tem direito a que a ora recorrente lhe pague qualquer pensão por invalidez presumível.

9.ª - A entender-se o contrário, o que admitimos como hipótese de raciocínio, nunca deveria aquele ter o direito previsto pela cláusula 137.ª do CCT de 1994, invocada no acórdão recorrido e que serviu para os cálculos na mesma elaborados com o fim da determinação do valor a pagar pelo recorrente.

10.ª - O enunciado da cláusula 137.ª do CCT do Sector Bancário de 1994 não permite a interpretação que o acórdão recorrido dela fez, posto que apenas se aplica aos trabalhadores que, em tempo completo, tenham atingido os 65 anos ao serviço do Banco recorrente.

11.ª - A cláusula 137.ª confere a garantia dos benefícios sociais (entre eles o direito à reforma e à respectiva pensão) aos respectivos trabalhadores, o que não era claramente o caso do recorrido.

12.ª - Aliás, só assim se entende o conteúdo da cláusula 140.ª do mesmo CCT, que estabelece o direito a perceber a pensão de reforma aos trabalhadores que abandonaram o sector antes de atingirem a idade da reforma.

13.ª - A entender-se que o recorrido tem o direito a perceber uma pensão de reforma do recorrente, o que como já se reafirmou se concede como hipótese de raciocínio, a cláusula a ser aplicada para efeitos do respectivo cálculo tem de ser a cláusula 140.ª do CCT do sector bancário em vigor.

14.ª - Caso contrário, viria a conceder ao recorrido maiores direitos do que aqueles que têm os trabalhadores ao serviço da recorrente, com maior tempo de serviço prestado ao sector bancário.

15.ª - Com efeito, a cláusula 137.ª aplica-se à invalidez presumível dos trabalhadores que atingiram os 65 anos ao serviço do Banco e a cláusula 140.ª reconhece o direito a perceber a pensão de reforma aos trabalhadores que entretanto cessaram os seus contratos de trabalho.

16.ª - A cláusula 140.ª não se mostra ilegal ou inconstitucional, na medida que confere tratamento igual a todos quantos adquiriram o direito à re-forma em data em que já não eram trabalhadores bancários.

17.ª - A diferença de regimes é legítima, na medida em que a cláusula 137.ª se aplica apenas a todos os trabalhadores que trabalharam ao serviço das instituições bancárias até adquirirem o direito à reforma, o que não foi claramente o caso do recorrido.

18.ª - Decidindo em contrário, violou o acórdão recorrido, entre outras normas, o disposto na cláusula 131.ª do ACT do Sector Bancário de 1980, na cláusula 140.ª do ACT do Sector Bancário de 1994, nos artigos 7.° e 8.° do Regime Jurídico das Relações Colectivas de Trabalho (Decreto-Lei n.° 519-C1/79, de 29 de Dezembro), e nos artigos 13.° e 63.° da Constituição da República Portuguesa."

O autor, ora recorrido, contra-alegou (fls. 367 a 376), concluindo:

"A) A presente revista é inadmissível.

B) No momento da propositura da acção, o valor da causa atribuído foi de 4592896 escudos e foi este o fixado - artigo 308.°, n.° l, do Código de Processo Civil.

C) O autor decaiu no pedido de 3100000 escudos, do qual não recorreu para a Relação.

D) Ficou a acção com o valor de 1492896 escudos, o suficiente para o réu poder recorrer para a Relação - artigo 305.°, n.° 2, do Código de Processo Civil.

E) Porém, tal valor não permite ao réu recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça, por falta de valor à causa - artigo 678.º, n.° l, do Código de Processo Civil.

F) O montante condenatório constante da sentença decorre apenas da aplicação do artigo 75.° do Código de Processo do Trabalho e não alterou o valor da causa.

G) Por consequência, atendendo à regra da sucumbência estabelecida no artigo 678.°, n.° l, segundo segmento, do Código de Processo Civil, o recurso é inadmissível e, em vista do disposto nos artigos 700.°, n.° 1, alínea f), e 726.º, ambos do Código de Processo Civil, não merece conhecimento, devendo ser julgado findo.

H) Quando cessou o contrato de trabalho entre as partes, em 19 de Dezembro de 1981, o autor já havia adquirido o direito à pensão de reforma.

I) Tal direito veio o autor a exercê-lo e exigir a pensão de reforma em virtude do disposto no artigo 63.° da Constituição da República Portuguesa, versão de 1989, na Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto, e no ACTV de 1994 (cláusulas 137.ª. e 138.ª), quando o autor atingiu os 65 anos em 30 de Setembro de 1999.

J) O regime de segurança social do sector bancário constitui um subsistema estabelecido em sede de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, no artigo 69.º da Lei de Bases da Segurança Social (Lei n.° 28/84) e nas Leis que esta precederam, e, segundo o qual, compete à entidade patronal, a titulo de seguro social, assumir os encargos da segurança social (acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26 de Setembro de 1990, Acórdãos Doutrinais, n.º 349, pág. 138 e seguintes).

K) O regime previsto no ACTV do Sector Bancário é, assim, uma emanação do princípio constitucional mais amplo e imperativo,

L) Competindo ao réu pagar ao autor a pensão de reforma, como se reconhece no acórdão recorrido.

M) A pensão do autor deve ser calculada com base nas cláusulas 137.ª e 138.ª do ACTV de 1994 para o Sector Bancário, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª Série, n.º 42, de 15 de Novembro de 1994, e não com base na cláusula 140.ª do mesmo ACTV de 1994.

N) A cláusula 140.ª do mesmo ACTV é ilegal, por discriminatória, violando o disposto nos n.°s 1 e 4 do artigo 5.° da Lei n.° 28/84, de 14 de Agosto, e inconstitucional, por limitar o exercício de direitos constitucionalmente garantidos, em violação do n.º 4 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, na redacção da Lei Constitucional n.º 1/89, de 8 de Julho - cfr. alíneas a) e c) do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 519- C1/79, de 29 de Dezembro.

O) Tal cláusula 140.ª, a ser aplicada, violaria as seguintes normas e princípios:

- as constantes das cláusulas 137.ª e 138.ª do Acordo Colectivo Vertical para o Sector Bancário, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª Série, n.º 42, de 15 de Novembro de 1994;

- as constantes do n.° 1 do artigo 5.° da Lei n.° 28/84, de 28 de Agosto (princípios da universalidade e igualdade), e alíneas a) e c) do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro;

- as constantes dos artigos 9.°, 12.°, 13.°, 20.°, 63.°, n.° 4 (na redacção dada pela Lei Constitucional n.° 1/97, de 20 de Setembro), e 205.° da Constituição da República Portuguesa, que consagra os princípios da universalidade, igualdade, acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva e decisões dos tribunais.

P) Nada justifica que o réu trate diferentemente quem se reformou enquanto estava ao serviço e quem se reformou por ter atingido 65 anos de serviço (invalidez presumível), quando já se havia desvinculado do Banco.

Q) O réu não pôs em causa as cálculos da pensão apresentados na petição inicial, sufragados no acórdão recorrido, pelo que os mesmos devem subsistir.

R) O douto acórdão recorrido não violou qualquer disposição legal, contratual e constitucional e, muito menos, as invocadas nas brilhantes alegações do réu, mostrando-se correctamente interpretada e aplicada a lei aos factos."

Após o recorrente se haver pronunciado sobre a questão da inadmissibilidade do recurso (fls. 380 a 382), foi a mesma desatendida, neste Supremo Tribunal de Justiça, por despacho do relator (fls. 386), do seguinte teor:

"1. O autor, ora recorrido, suscita, nas suas contra-alegações, a questão prévia da inadmissibilidade do presente recurso, por, apesar de o valor da acção, atribuído na petição inicial e não posto em causa nem pelo réu nem pelo tribunal, seja de 4592896 escudos, o certo é que o autor decaiu no pedido indemnizatório de 3100000 escudos relativo a danos não patrimoniais, decaimento com o qual se conformou, do que resultaria que o valor do pedido inicial tenha ficado reduzido a 1492896 escudos. Não obstante o réu ter sido condenado no pagamento de pensões vencidas no valor de 3780300 escudos, condenação confirmada pelo acórdão da Relação ora recorrido, tal não afecta o valor a que a causa ficou reduzida (1492896 escudos), donde a inadmissibilidade do recurso, nos termos do artigo 678.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. É que - prossegue - se o pedido indemnizatório de 3100000 escudos determinou que o valor da causa se viesse a fixar em montante superior ao da alçada da Relação, «não menos certo é que a decisão impugnada é desfavorável para o A. (sic) em valor inferior a metade daquela alçada (1 492 896 escudos), o que, nos termos do preceito legal invocado, a torna irrecorrível», já que, «em situação inversa, o A. não podia recorrer para o STJ».

A presente acção foi instaurada em 3 de Março de 2000, pelo que, nos ternos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro, lhe é aplicável o Código de Processo do Trabalho aprovado por esse diploma.

Este Código não reproduziu a norma do n.º 4 do artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho aprovado pelo Decreto-Lei n.º 272-A/81, de 30 de Setembro, com base na qual a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça vinha entendendo não ser aplicável aos recursos laborais a «regra da sucumbência» da segunda parte do n.º 1 do artigo 678.º do Código de Processo Civil. Essa regra vale agora também nos processos laborais instaurados após 1 de Janeiro de 2000.

Porém, no presente caso, o valor da acção mostra-se fixado em 4592896 escudos, não tendo qualquer suporte legal a pretensão do autor, ora recorrido, de que esse valor foi reduzido para 1492896 escudos, por ter sido julgado improcedente o seu pedido de indemnização de 3100000 escudos por danos não patrimoniais, improcedência com a qual se conformou. O valor da causa, uma vez fixado, não aumenta nem se reduz de acordo com o maior ou menor montante da condenação relativamente ao pedido inicial. Esta eventual desconformidade tem a ver com a sucumbência, e não com o valor da causa para efeito de alçadas.

O réu, quer na contestação, quer na alegação da apelação, quer na alegação do presente recurso de revista, tem vindo sempre a sustentar que o autor não tem direito a que ele lhe pague qualquer pensão por invalidez presumível, propugnando a sua absolvição total do pedido, e só em segunda linha, para a hipótese de aquela sua tese não obter acolhimento, é que defende que, a ter de pagar alguma pensão, esta seja calculada nos termos da cláusula 140.ª, que não nos da cláusula 137.ª, do CCT para o Sector Bancário.

Significa isto que a sucumbência do réu foi total, quer na 1.ª instância, quer na Relação. Assim, tendo ele sido condenado, em ambas as instâncias, a pagar ao autor pensões de reforma no valor, até à data da sentença (8 de Novembro de 2000), de 3780300 escudos e ainda nas pensões vincendas, é óbvio que a decisão ora impugnada lhe foi desfavorável em valor superior a metade da alçada da Relação.

Improcede, assim, a questão prévia da inadmissibilidade do recurso suscitada nas contra-alegações do autor, ora recorrido."

O representante do Ministério Público emitiu o parecer de fls. 388 a 391, no sentido da concessão parcial da revista, por o autor ter direito a receber do réu, ora recorrente, uma pensão de reforma, mas calculada nos termos da cláusula 140.ª do ACTV aplicável, parecer que, notificado às partes, suscitou a resposta do autor, ora recorrido, de fls. 396.

Colhidos os vistos dos Juízes Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

2. Matéria de facto

As instâncias deram como assentes os seguintes factos, com interesse para a decisão da causa:

1) O autor foi admitido ao serviço do ex-Banco de Angola, em Luanda, em Janeiro de 1952, para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, lhe prestar a sua actividade como empregado do então chamado "Pessoal Maior", mediante retribuição.

2) Em Janeiro de 1973, o autor veio para Portugal, tendo sido colocado na Agência de Setúbal.

3) Em Janeiro de 1978, os ex-Bancos de Angola, Pinto Magalhães e da Agricultura fundiram-se e criaram a União de Bancos Portugueses, EP.

4) A União de Bancos Portugueses foi absorvida pelo B, que lhe sucedeu em todos os direitos e obrigações, designadamente os referentes a pessoal.

5) O autor foi subindo na carreira profissional e atingiu a categoria de gerente.

6) O autor exerceu funções de gerente, tendo sido colocado na Agência de Alverca.

7) O autor deixou de trabalhar para o Banco por ter sido por este despedido com justa causa.

8) O autor, à data do despedimento, em Fevereiro de 1981, exercia as funções de gerente e estava colocado no nível 12, tendo trabalhado para o Banco, exercendo actividade como bancário, durante mais de 29 anos.

9) O autor, ao chegar a Portugal, inscreveu-se no Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, sendo-lhe atribuído o n.º 23773, que manteve até à ocasião do despedimento.

10) O autor completou 65 anos de idade no dia 30 de Setembro de 1999.

11) Datada de 21 de Setembro de 1999, o autor enviou ao réu a carta documentada a fls. 12.

12) O mandatário do autor enviou ao réu, datada de 8 de Novembro de 1999, a carta documentada a fls. 15, a que o réu respondeu consoante a carta documentada a fls. 16, datada de 6 de Dezembro de 1999.

13) A partir do momento em que o Banco réu lhe pagasse a pensão - se o fizesse -, o autor passaria a beneficiar do Serviço de Assistência Médico-Social (SAMS).

14) O autor não está inscrito como beneficiário da Caixa Geral de Aposentações.

15) O autor está inscrito como beneficiário do Centro Nacional de Pensões, mas não aufere qualquer pensão.

16) O autor estava a contar com a pensão de reforma que o réu lhe pagaria.

17) Face à recusa do réu em proceder ao pagamento da pensão, o autor ficou triste.

3. Fundamentação

3.1. A questão prévia da inadmissibilidade do presente recurso, suscitada nas contra-alegações do recorrido (conclusões A) a G)), já foi desatendida pelo despacho do relator do relator atrás transcrito, que não sofreu impugnação.

3.2. As questões centrais que constituem objecto do presente recurso - saber se o autor, ora recorrido, tem direito a alguma pensão de reforma da responsabilidade do réu, ora recorrente, e, na hipótese afirmativa, se ao cálculo da pensão de reforma dos empregados bancários que cessaram a sua actividade no sector antes de atingirem a situação de reforma, por invalidez ou por atingirem 65 anos de idade, é aplicável a cláusula 137.ª ou a cláusula 140.ª do ACTV para o Sector Bancário, na redacção dada pela revisão de 1992 (Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 31, de 22 de Agosto de 1992, mantida inalterada nas revisões de 1994 e de 1996, no mesmo Boletim, n.º 42, de 15 de Novembro de 1994, e n.º 2, de 15 de Janeiro de 1996) -, tem sido objecto de numerosas decisões deste Supremo Tribunal de Justiça, que ultimamente firmou orientação no sentido de, afirmando aquele direito a pensão de reforma, a mandar calcular nos termos da cláusula 140.ª.

É essa orientação que ora se reitera, para o que passaremos a reproduzir a fundamentação desenvolvida no acórdão de 6 de Fevereiro de 2002, processo n.º 4102/01.

3.2.1. As referidas cláusulas têm a seguinte redacção (desde a revisão de 1992):

Cláusula 137.ª:

"1 - No caso de doença ou invalidez ou quando tenham atingido 65 anos de idade (invalidez presumível) os trabalhadores em tempo completo têm direito:

a) Às mensalidades que lhes competirem, de harmonia com a aplicação das percentagens do anexo V aos valores fixados no anexo VI.

b) A um subsídio de Natal de valor igual ao das mensalidades referidas na alínea a), a satisfazer no mês de Novembro;

c) A um 14.º mês de valor igual ao das mensalidades referidas na alínea a), a satisfazer no mês de Abril, sendo-lhe aplicável o princípio estabelecido no n.º 3 da cláusula 102.ª.

2 - Cada uma das prestações a que os trabalhadores têm direito, nos termos do número anterior, não poderá ser de montante inferior ao do valor ilíquido da retribuição do nível mínimo de admissão do grupo em que estavam colocados à data da sua passagem a qualquer das situações do n.º 1 desta cláusula.

3 - Os trabalhadores em regime de tempo parcial terão direito às prestações referidas nos n.ºs 1 ou 2, calculadas proporcionalmente ao período normal de trabalho.

4 - As mensalidades fixadas, para cada nível, no anexo VI serão sempre actualizadas na mesma data e pela aplicação da mesma percentagem em que o forem os correspondentes níveis do anexo II.

5 - Excepcionalmente, e por acordo de ambas as partes, poderá o trabalhador, com mais de 65 anos de idade e menos de 70, continuar ao serviço; a continuação dependerá de aprovação do trabalhador em exame médico, feito anualmente, e a instituição pode, em qualquer momento, retirar o seu acordo a essa continuação, prevenindo o trabalhador com 30 dias de antecedência.

6 - O trabalhador que completar 40 anos de serviço antes de atingir 65 anos de idade, ou o que completar 35 anos de serviço tendo mais de 60 anos de idade pode ser colocado na situação de invalidez presumível, mediante acordo com a instituição.

7 - Da aplicação do anexo V não poderá resultar diminuição das anteriores mensalidades contratuais cujo pagamento se tenha iniciado.

8 - Todos os trabalhadores abrangidos por esta cláusula têm direito à actualização das mensalidades recebidas, sempre que seja actualizado o anexo II, quer tenham sido colocados nas situações de doença, invalidez, invalidez presumível, antes ou depois de cada actualização.

9 - Os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os trabalhadores na situação de doença, invalidez ou invalidez presumível quer tenham sido colocados nessas situações antes ou depois da entrada em vigor deste Acordo."

Cláusula 140.ª:

"1 - O trabalhador de instituição de crédito ou parabancária, não inscrito em qualquer regime de segurança social e que, por qualquer razão, deixe de estar abrangido pelo regime de segurança social garantido pelo presente acordo terá direito, quando for colocado na situação de reforma por invalidez ou invalidez presumível, ao pagamento pelas instituições de crédito ou parabancárias, na proporção do tempo de serviço prestado a cada uma delas, da importância necessária para que venha a auferir uma pensão de reforma igual à que lhe caberia se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime geral da segurança social, ou outro regime nacional mais favorável que lhe seja aplicável.

2 - Para efeitos do cálculo da mensalidade prevista no n.º 1 desta cláusula, a parte da pensão de reforma a pagar pelas instituições, correspondente ao tempo de serviço prestado no sector bancário, será calculada com base na retribuição correspondente ao nível em que o trabalhador se encontrar colocado à data da saída do sector, actualizada segundo as regras do presente ACTV, se outra não for mais favorável.

3 - A verificação das situações de invalidez, fora do âmbito de qualquer regime de segurança social será apurada por junta médica constituída nos termos da cláusula 141.ª.

4 - Para efeitos da contagem do tempo de serviço prestado no sector bancário referido no n.º 1 desta cláusula, aplica-se o disposto nas cláusulas 17.ª e 143.ª.

5 - No caso de o trabalhador não chegar a adquirir direitos noutro regime nacional de segurança social, a retribuição de referência para aplicação do disposto no n.º 1 desta cláusula será a correspondente à do nível em que aquele se encontrava colocado à data em que deixou de estar abrangido pelo regime de segurança social deste acordo, actualizada segundo as regras do mesmo regime."

3.2.2. Antes de entrarmos na determinação de qual destas cláusulas é aplicável à situação do autor, interessará, para cabal compreensão do problema, recordar as vicissitudes que tem sofrido o regime de segurança social próprio dos trabalhadores do sector bancário, que ainda hoje se mantém.

Entre nós, foi só com a publicação da Constituição da República Portuguesa de 1976 que se procurou criar um sistema unificado e universal de segurança social, afirmando-se o princípio de que todos têm direito à segurança social, incumbindo ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado. Anteriormente a essa data, vigorava um sistema de origem corporativa, que se iniciou com o Estatuto do Trabalho Nacional (Decreto n.º 23048, de 23 de Setembro de 1933), onde se previa a organização das caixas e instituições de previdência, cuja iniciativa competia aos organismos corporativos - grémios e sindicatos. A Lei n.º 1884, de 16 de Maio de 1935, veio reconhecer que a iniciativa e organização destas caixas incumbia aos grémios e sindicatos nacionais, por meio de acordos ou por meio de Contratos Colectivos de Trabalho, e no seu artigo 4.º estipulava que "as caixas sindicais de previdência destinam-se a proteger o trabalhador contra os riscos da doença, da invalidez e do desemprego involuntário e bem assim a garantir-lhe pensões de reforma". Por sua vez, a Lei n.º 2115, de 18 de Junho de 1962, que revogou a Lei n.º 1884, veio estabelecer que as Caixas Sindicais de Previdência abrangiam obrigatoriamente, como beneficiários, os trabalhadores das profissões interessadas nas convenções colectivas ou definidas nos diplomas da sua criação. Essas Caixas de Previdência foram regulamentadas pelo Decreto-Lei n.º 45266, de 23 de Setembro de 1963, que no seu artigo 17.º, n.ºs 1 e 2, determinava a inscrição obrigatória dos trabalhadores, como beneficiários, e das entidades patronais abrangidas, como contribuintes.

Foi neste contexto que o CCT de 1944 para o sector bancário, publicado no Boletim do INTP, ano XI, n.º 3, de 15 de Fevereiro de 1944, veio estipular na sua cláusula 59.ª que "os outorgantes obrigam-se quando as circunstâncias o permitirem a concluir o regulamento para a constituição da Caixa Sindical dos Bancários". E logo na cláusula 60.ª prescreveram que enquanto não funcionasse essa Caixa Sindical, os estabelecimentos bancários garantiam aos seus empregados, em caso de doença ou invalidez, certas prestações que especificam.

Esta cláusula 60.ª veio a desenvolver-se nas sucessivas revisões, sendo que a partir de 1964 - com o CCT publicado no Diário do Governo, I Série, de 12 de Março de 1964, passou a ter a seguinte redacção: "Os estabelecimentos bancários garantem aos seus empregados: 1. em caso de doença ou invalidez do empregado, ou quando tenha atingido 70 anos de idade (invalidez presumível) as mensalidades que lhes competirem de acordo com o mapa n.º 6".

Em 1970, por decisão do Tribunal Arbitral, de 17 de Abril de 1970, publicada no Boletim do INTP, ano XXXVII, n.º 10, pág. 684, aquela cláusula passou a ter a seguinte redacção: "Enquanto não funcionar a Caixa de Previdência prevista na cláusula anterior, os estabelecimentos bancários, garantem aos seus empregados: 1. Em caso de doença ou invalidez do empregado ou quando atinjam 65 anos de idade (invalidez presumível) as mensalidades que lhe competirem de acordo com o mapa n.º 6".

O CCT de 1970 para o sector bancário, e os posteriores, mantiveram esta redacção da cláusula (embora com outro número). Assim sucede com os CCTVs de 1978 e de 1980, publicados no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), n.º 18, de 15 de Maio de 1978, e n.º 26, de 15 de Julho de 1980, respectivamente (cláusula 132.ª e 133.ª, também respectivamente), esclarecendo a cláusula 134.ª, n.º 6, do CCTV de 1980 que estes benefícios aplicam-se a todos os trabalhadores na situação de doença, invalidez ou invalidez presumível, quer tivessem sido colocados nessas situações antes ou depois da entrada em vigor do CCT.

E no ACT de 1982, publicado no BTE, n.º 26, de 15 de Julho de 1982, a cláusula 138.ª veio estatuir:

"No caso de doença ou invalidez, ou quando tenham atingido 65 anos de idade (invalidez presumível), os trabalhadores em tempo completo têm direito:

a) às mensalidades que lhes competirem de harmonia com a aplicação das percentagens do anexo VI às retribuições fixadas no anexo II, líquidas do valor da contribuição para o Fundo de Desemprego e do imposto profissional correspondente a 13 vezes o montante de cada uma dessas retribuições;

b) A um subsídio de Natal de valor igual ao das mensalidades a que tiverem direito.

2 - Cada uma das prestações a que os trabalhadores têm direito nos termos do número anterior não poderá ser de montante inferior ao do valor ilíquido da retribuição do nível mínimo do respectivo grupo.

3 - Os trabalhadores em regime de tempo parcial terão direito às prestações referidas nos n.ºs 1.º e 2.º calculadas proporcionalmente ao período normal de trabalho.

(...)

8 - Os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os trabalhadores na situação de doença, invalidez presumível, quer tenham sido colocados nessas situações antes ou depois da entrada em vigor deste contrato."

O ACT de 1984, publicado no BTE, n.º 28, de 29 de Julho de 1984, o ACT de 1986, publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 28, de 29 de Julho de 1986, bem como o ACT publicado no BTE, n.º 28, de 29 de Julho de 1988, mantiveram no essencial a mesma redacção da referida cláusula, que chegou ao ACT de 1992, com o n.º 137.ª, nos termos acima transcritos.

Por seu turno, o conteúdo da cláusula 140.ª do ACT de 1992 teve a sua origem na cláusula 141.ª do ACT de 1982, que, pela primeira vez, veio regulamentar a situação dos trabalhadores que saíssem do sector bancário sem terem atingido a idade da reforma, a qual estabelecia o seguinte, na parte que aqui interessa:

"3 - Enquanto não for concretizada a integração referida nos números anteriores, o trabalhador que abandonar o sector bancário, por razões que não sejam da sua iniciativa, nomeadamente o despedimento, terá direito, quando for colocado na situação de reforma por invalidez ou velhice prevista no regime de segurança social que lhe for aplicável, ao pagamento pela respectiva instituição de crédito da importância necessária a complementar a sua pensão de reforma, até ao montante que lhe corresponder se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição na segurança social.

(...)

6 - O regime estabelecido no n.º 3 desta cláusula só se aplica aos trabalhadores que abandonarem o sector bancário nas condições aí referidas a partir de 15 de Julho de 1982."

Os ACT do sector bancário de 1984 e de 1986, publicados no BTE, n.º 28, de 29 de Julho de 1984, e no BTE, 1.ª Série, n.º 28, de 29 de Julho de 1986, mantiveram o teor da cláusula 141.ª, mas agora com o n.º 142.ª.

Porém, o ACT publicado no BTE, n.º 28, de 29 de Julho de 1988, alterou a cláusula 142.ª, que passou a ter a seguinte redacção:

"1- O trabalhador ao serviço de instituição de crédito ou parabancária que não esteja inscrito no regime de segurança social e que, por qualquer razão, deixe de estar abrangido pelo regime de segurança social garantido pelo presente ACT terá direito quando for colocado na situação de reforma por invalidez ou velhice prevista no regime de segurança social que lhe for aplicável, ao pagamento pelas instituições de crédito ou parabancárias, na proporção do tempo de serviço prestado a cada uma delas, da importância necessária para complementar a sua pensão de reforma até ao montante que lhe corresponde se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime de segurança social que lhe for aplicável.

2 - Para efeitos de contagem do tempo de serviço prestado no sector bancário referido no n.º 1, é aplicável o disposto nas cláusulas 16.ª e 154.ª."

Deixou, portanto, de fazer referência que o regime dela constante só se aplicava aos trabalhadores que saíssem após 15 de Julho de 1982.

Esta cláusula transitou para o ACTV de 1992, com o n.º 140.ª, acima transcrita, e foi mantida inalterada nas revisões de 1994 e de 1996.

3.2.3. Feito este enquadramento da origem das cláusulas em questão, há que, desde já, rejeitar a tese de que não seria aplicável nem a cláusula 137.ª, porque esta só se referiria aos trabalhadores relativamente aos quais se verificasse a eventualidade (invalidez ou invalidez presumida) quando ainda se encontravam no activo, nem a cláusula 140.ª, por esta ter sido editada posteriormente à saída do autor do sector bancário e as cláusulas da convenção colectiva só disporem para o futuro. Assim, segundo esta tese, o autor não teria direito a qualquer pensão a suportar pelo sector bancário, conclusão esta que, porém, ofenderia os princípios gerais que regulam o sistema de segurança social, e, além disso, afrontaria o disposto no artigo 63.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual todos têm direito à segurança social, estabelecendo o n.º 5, acrescentado pela revisão constitucional de 1989, que "todo o tempo de trabalho contribuirá, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado", princípio este que não pode ser ignorado quer pelo sistema público de segurança social, como pelos subsistemas por este permitidos, como é o caso do sector bancário, que é um sistema substitutivo daquele. Seria extremamente injusto e discriminatório não contar para efeitos de atribuição de pensão de reforma o tempo de serviço prestado pelos trabalhadores que abandonassem o sector bancário antes da ocorrência das eventualidades que determinam a atribuição desta (invalidez ou idade), pois, por um lado, os trabalhadores deste sector estavam impedidos de descontar para o sistema de segurança social, por não estar constituída a respectiva Caixa de Previdência, e, por outro lado, as entidades patronais do sector bancário assumiram as responsabilidades que àquela Caixa competiriam, enquanto não fosse constituída, e o sistema bancário nunca chegou a constituir a referida Caixa, decisão esta a que não terão sido alheios interesses corporativos, pois isso evitou o pagamento das contribuições, tanto patronais como dos trabalhadores, para um sistema de segurança social, beneficiando as entidades patronais deste sector com esse facto.

Afastada essa tese, resta recordar que, como já se referiu, o entendimento sustentado no acórdão recorrido não tem sido sufragado pela mais recente jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, de que são exemplo os acórdãos de 3 de Outubro de 2000, processo n.º 113/00 (complementado pelo acórdão de 14 de Fevereiro de 2001, processo n.º 113/00), de 17 de Outubro de 2000, processo n.º 82/00, de 8 de Fevereiro de 2001, processo n.º 2859/00, de 14 de Fevereiro de 2001, processo n.º 2861/00 (publicado em Colectânea de Jurisprudência - Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, ano IX, 2001, tomo I, pág. 292), de 18 de Abril de 2001, processo n.º 3232/00, de 31 de Maio de 2001, processo n.º 1055/01, de 28 de Novembro de 2001, processo n.º 1663/01, de 12 de Dezembro de 2001, processos n.ºs 1607/01 e 2552/01, de 16 de Janeiro de 2002, processo n.º 1434/01, de 30 de Janeiro de 2002, processo n.º 2647/01, de 6 de Fevereiro de 2002, processo n.º 4102/01, e de 19 de Junho de 2002, processo n.º 4425/01.

Nessa jurisprudência, o encadeamento argumentativo desenvolvido tem sido o seguinte:

- no "regime transitório" instituído pelos n.ºs 3 e 6 da cláusula 141.ª do ACTV de 1982, reproduzido nos n.ºs 3 e 6 da cláusula 142.ª do ACTV de 1984 e nos n.ºs 1 e 4 da cláusula 142.ª do ACTV de 1986, o complemento de reforma previsto apenas beneficiava os trabalhadores que tivessem abandonado o sector bancário sem ser por iniciativa própria e a partir de 15 de Julho de 1982;

- porém, esta restrição temporal (a 15 de Julho de 1982), constante dos aludidos ACTV, veio a revelar-se supervenientemente inconstitucional, por incompatível com o princípio, introduzido pela revisão constitucional de 1989, ao aditar o n.º 5 ao artigo 63.º da Constituição (n.º 4 do mesmo artigo 63.º, após a revisão constitucional de 1997), de que "todo o tempo de trabalho contribuirá, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado";

- por isso, nas correspondente cláusulas dos subsequentes ACTV se omitiu qualquer referência ao momento em que o trabalhador, "por qualquer razão", deixe de estar abrangido pelo regime de segurança social do sector bancário;

- assim, as instituições bancárias que tenham tido ao seu serviço trabalhadores que venham a ser colocados na situação de reforma por invalidez ou por invalidez presumível quando já não exerciam funções nesse sector de actividade estão obrigadas ao pagamento, "na proporção do tempo de serviço prestado a cada uma delas, da importância necessária para que venha a auferir uma pensão de reforma igual à que lhe caberia se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime geral da segurança social ou outro regime nacional mais favorável que lhe seja aplicável" (n.º 1 da cláusula 140.ª do ACTV de 1992);

- este entendimento respeita os aludidos princípios constitucionais e a diferença de regimes entre as cláusulas 137.ª (só aplicável aos trabalhadores que se encontravam ao serviço da instituição bancária quando passaram para a situação de reforma) e 140.ª justifica-se por contemplarem situações diversas: a diversidade entre uma carreira homogeneamente desenvolvida até ao seu termo no sector bancário (com um regime próprio de segurança social, caracterizado, além do mais, pela inexistência de contribuições, quer dos trabalhadores, quer das entidades patronais) e uma carreira heterogénea em termos de diversificados regimes de segurança social ou até incompleta (contemplando-se mesmo as situações em que o antigo trabalhador não adquiriu direitos no âmbito de qualquer outro regime nacional de segurança social - situação prevista e regulada no n.º 5 da citada cláusula 140.ª).

Do exposto resulta que o acórdão recorrido merece ser confirmado na parte relativa à afirmação do direito do autor a uma pensão de reforma da responsabilidade do réu, mas já não pode ser mantido na parte em que determinou o cálculo dessa pensão nos termos da referida cláusula 137.ª, quando a norma convencional aplicável é a da cláusula 140.ª. Dependendo a determinação do montante dessa pensão do fornecimento, pelo autor, de elementos imprescindíveis ao seu cálculo, como a indicação da eventual percepção de outra pensão por outro sistema de segurança social e do respectivo valor, e não constando esses elementos das cartas remetidas pelo autor ao réu constantes de fls. 12 e 15, concluísse que a iliquidez do crédito reclamado é imputável ao credor, pelo que só são devidos juros, à taxa legal, após o crédito se tornar líquido (artigo 805.º, n.º 3, do Código Civil).

4. Decisão

Em face do exposto, acordam em conceder parcial provimento ao recurso do réu, alterando o acórdão recorrido no sentido de que fica o mesmo réu condenado a pagar ao autor um complemento de pensão de reforma, desde Outubro de 1999, calculado nos termos da cláusula 140.ª do CCTV para o Sector Bancário, na redacção constante da revisão de 1992, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 31, de 22 de Agosto de 1992, mantida inalterada nas revisões de 1994 e de 1996 (mesmo Boletim, n.º 42, de 15 de Novembro de 1994, e n.º 2, de 15 de Janeiro de 1996), cujos montantes serão liquidados em execução de sentença, com juros de mora, à taxa legal, a partir da liquidação.

Custas pelo recorrente e pelo recorrido, em partes iguais.

Lisboa, 25 de Junho de 2002.

Mário Torres,

Vítor Manuel Pinto Ferreira Mesquita

Pedro Silvestre Nazário Emérico Soares