Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | OLIVEIRA MENDES | ||
Descritores: | CONCURSO DE INFRACÇÕES CÚMULO JURÍDICO PENA ÚNICA | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | SJ200810080028353 | ||
Data do Acordão: | 10/08/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | I - De acordo com o art. 77.º, n.º 2, do CP, a pena conjunta, através da qual se pune o concurso de crimes, tem a sua moldura abstracta definida entre a pena mais elevada das penas parcelares e a soma de todas as penas em concurso, não podendo ultrapassar 25 anos. II - Por outro lado, segundo preceitua o n.º 1 daquele artigo, na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que significa que o cúmulo jurídico de penas não é uma operação aritmética de adição, nem se destina, tão-só, a quantificar a pena conjunta a partir das penas parcelares cominadas. III - No âmbito do regime legal da punição do concurso de crimes, o legislador penal não adoptou o sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo), nem o sistema da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e os singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares nem o limite absoluto legalmente fixado), tendo mantido todas as opções possíveis em aberto, desde a absorção – aplicação da pena mais grave – ao cúmulo material, passando pela exasperação. IV - Por outro lado, a lei elegeu como elementos determinadores da pena conjunta os factos e a personalidade do agente, elementos que devem ser considerados em conjunto. V - Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema de acumulação material, é forçoso concluir que com a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também, e especialmente, pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente – como doutamente diz Figueiredo Dias (Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, págs. 290-292), como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado. VI - Importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, a existência ou não de qualquer relação entre uns e outros, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e a gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do seu conjunto que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso. VII - Resultando dos autos que: - os crimes em concurso [um homicídio por negligência, um furto qualificado, uma ofensa à integridade física por negligência, uma condução perigosa de veículo rodoviário e uma condução de veículo sem habilitação legal] se encontram intimamente relacionados, visto que cometidos sequencialmente, num curto espaço de tempo (entre as 20h00 do dia 24-08-2007 e a madrugada do dia 26-08-2007); - a moldura da pena conjunta varia entre o mínimo de 3 anos e 6 meses de prisão e o máximo de 10 anos e 7 meses de prisão [3 anos e 6 meses de prisão (homicídio por negligência); 3 anos e 6 meses de prisão (furto qualificado); 7 meses de prisão (ofensa à integridade física por negligência); 2 anos de prisão (condução perigosa de veículo rodoviário); e 1 ano de prisão (condução de veículo sem habilitação legal)]; - o quadro delituoso conjunto revela que o arguido é portador de uma personalidade desprovida de valores éticos, destacando-se a indiferença com que assume condutas criminosas de elevado risco; - o percurso criminoso do arguido [com 25 anos de idade, foi condenado, em 11-03-2003, pela prática de um crime de roubo, na pena de 3 anos e 10 meses prisão; em 04-03-2008, foi condenado, sem trânsito em julgado, na pena conjunta de 3 anos de prisão, com suspensão da sua execução, pelo cometimento de seis crimes de furto, um na forma tentada, por factos ocorridos em 2005; actualmente encontra-se preso preventivamente, por suspeita da prática de um crime de furto qualificado e de um crime de abuso de cartão de crédito], conquanto não evidencie, por ora, propensão para o crime, constitui, obviamente, um factor negativo; não merece qualquer censura a pena conjunta fixada pelo tribunal recorrido – 6 anos de prisão –, não sendo possível formular um juízo de prognose positivo, antes se antevendo, face à toxicodependência do arguido, um futuro problemático. | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 554/07, da 1ª Vara Criminal de Lisboa, após contraditório, AA, com os sinais dos autos, foi condenado como autor material, em concurso real, um crime de homicídio por negligência, um crime de furto qualificado, um crime de ofensa à integridade física por negligência, um crime de condução perigosa de veículo rodoviário e um crime de condução de veículo sem habilitação legal na pena conjunta de 6 anos de prisão -(1) O arguido foi ainda condenado como autor material de duas contra-ordenações, uma prevista no artigo 97º, da Lei n.º 5/06, de 23 de Fevereiro, outra prevista no artigo 89º, do Código da Estrada, nas coimas de € 700,00 e 600,00, respectivamente. O arguido interpôs recurso. É do seguinte teor a parte conclusiva da motivação - (2) a) O Tribunal a Quo entendeu ao efectuar, o Cumulo Jurídico dos crimes pelos quais o arguido, vinha acusado e que se deram como provados, condenar o arguido na pena única de 6 (seis) anos de prisão efectiva. b) O Tribunal a Quo, Errou ao não valorar devidamente a confissão integral e sem reservas do arguido. c) O qual ao assumir na plenitude a totalidade dos factos pelos quais vinha acusado, teve um papel preponderante para a descoberta da verdade material (folhas 66 do acórdão). d) O mesmo acontecendo e conforme documentalmente está provado nos presentes autos. e) Que o arguido como toxicodependente, se encontra em tratamento dos seus problemas de toxicodependência. f) Sendo totalmente nefasto para a sua recuperação o regresso do arguido ao Estabelecimento Prisional. g) O arguido nos referidos autos, já lhe foi aplicada uma pena privativa da liberdade. h) Tendo estado em prisão preventiva entre o dia 26/08/2007 e o dia 23/01/2008. i) Tendo já cumprido pena de prisão e cumprido a finalidade punitiva da pena para com a Comunidade. j) Atendendo a esta ordem de factores o Tribunal a Quo ao aplicar uma pena de seis anos de prisão, violou o disposto no art. º. 40 do Código Penal. “ A medida da pena deve ser encontrada dentro de uma moldura de prevenção geral positiva, e que deverá ser estabelecida dentro das exigências de prevenção social ou de sociabilização não podendo de forma alguma ultrapassar a medida da culpa. “ k) Assim como o entendimento dos Venerandos Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça demonstrado no Ac. S.T.J de 17.09.1997 proc. 624/97). A defesa da ordem jurídica, tal como é interiorizada pela consciência colectiva, (prevenção geral positiva ou de integração) é a finalidade primeira que se prossegue, no quadro da moldura abstracta entre um mínimo em concreto, imprescindível a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo que a culpa do agente consente, entre estes limites, satisfazem-se quanto possível, as necessidades da prevenção especial positiva assim se desenhando uma sub – moldura (Ac. S.T.J de 17.09.1997 proc. 624/97). l) Devia, assim, o Douto Colectivo "a Quo" ter condenado o arguido, na pena de Quatro anos de prisão e Suspensa na sua Execução de acordo com o disposto no art. 50º do Código Penal, e não o tendo feito, violou o disposto do artigo, do art. 40º, art. 70º e 71º do Código Penal. Na contra-motivação apresentada o Ministério Público formulou as seguintes conclusões: 1) Atento o disposto no artº 70º do C.P., se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (protecção de bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade - cfr. artº 40º, C.P.); 2) Deve o tribunal preferir à pena de prisão uma pena de multa sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, esta se mostre adequada e suficiente à realização das finalidades da punição; 3) Crimes como os de condução perigosa de veículo rodoviário e de condução de veículo sem habilitação legal são dos que na nossa sociedade maiores reflexos têm e mais exigências de prevenção suscitam, face às cifras negras dos acidentes rodoviários, devendo ser afastada a pena de multa, optando-se pela aplicação de uma pena de prisão; 4) O arguido, quanto à criminalidade com componente patrimonial, já sofreu anteriores condenações, tendo cumprido pena de prisão efectiva; 5) Nos termos do artº 40º do Código Penal, a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos (prevenção geral) e a reintegração do agente na sociedade (prevenção especial), não podendo em caso algum ultrapassar a medida da culpa; 6) A determinação da sua medida faz-se em função da culpa do agente, tendo ainda em conta as exigências de prevenção de futuros crimes e atendendo a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele (artº 71º C.P.); 7) O tribunal “ a quo” fez uma correcta interpretação da lei, não tendo violado o disposto no artº 40º, nº 1, do Código Penal; 8) Deve negar-se provimento ao recurso interposto pelo arguido AA mantendo-se o douto acórdão proferido. A Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal apôs o seu visto. Colhidos os vistos, cumpre agora decidir. Única questão que vem suscitada no recurso é a da medida da pena conjunta, entendendo o arguido AA dever ser aquela pena reduzida para 4 anos de prisão, com suspensão da sua execução. O tribunal colectivo considerou provados os seguintes factos: 1. No período compreendido entre as 20.00 horas do dia 24 de Agosto de 2007 e as dia seguinte, o arguido AA, acompanhado de outros indivíduos que não se lograram identificar, dirigiram-se à garagem do lote .. da Rua ......................., em Alverca.----- 2. Ali chegados, através da porta de incêndio lograram penetrar no seu interior, constatando que ali se encontrava estacionada a viatura automóvel de matrícula ..-..-.., Citroen C2, avaliada em 14.000,00 euros, pertencente a BB, com as chaves na ignição, retirando-o do local onde se encontrava estacionado, apoderando-se do mesmo.----- 3. Cerca das 23.00 horas do dia 25 de Agosto de 2007, DD e BB, quando procediam à busca da viatura de matrícula ZE e de outra viatura subtraída nas mesmas circunstâncias da marca Seat Ibiza, cruzaram-se na E.N. nº 10 com a viatura Citroen subtraída, movendo-lhe perseguição.----- 4. Durante a perseguição, percorrendo várias artérias de Sacavém, a viatura Citroen foi dar à Travessa do Chafariz, uma artéria sem saída, ficando a viatura de frente para a viatura conduzida pelos perseguidores.----- 5. Acto contínuo, o DD e BB dirigiram-se junto daquela viatura.----- 6. Nesse momento, o arguido, colocou a mão de fora do carro e, munido de uma arma de alarme, efectuou dois disparos.----- 7. Seguidamente, o Citroen arranca a alta velocidade, embatendo na porta da viatura perseguidora.----- 8. Cerca das 00h40m do dia seguinte, uma viatura policial, alertada do disparo e de se tratar de viatura furtada, ao avistar o Citroen de matrícula ..-..-.. no sentido Avenida Severiano Falcão, no Prior Velho, em direcção à Segunda circular (Av. Marechal Craveiro Lopes), sentido Norte/Sul, move-lhe perseguição.----- 9. Já na 2a Circular, o passageiro BB, apercebendo-se da proximidade de uma viatura Fiat Punto, alerta o arguido de que estavam a ser perseguidos pela Policia.----- 10. Conduzindo a viatura ZE, o arguido circulou na 2a Circular na direcção Norte/Sul, imprimindo uma velocidade não inferior a 150km/h, sendo a velocidade máxima permitida de 80 km/h, ultrapassando viaturas pela direita, quase embatendo em duas viaturas que ali circulavam.----- 11. Noutra ocasião, muito próximo do Campo Grande, apercebendo-se da ocupação das três faixas de rodagem, o arguido logrou ultrapassar esses veículos intrometendo-se no meio das viaturas que seguiam na faixa central e na faixa da esquerda.-- 12. Nesse momento, apercebendo-se que seguia outra viatura na faixa central e outra na faixa da direita, guinou repentinamente para a saída do Campo Grande, imprimindo uma velocidade não inferior a 100 Km/h.----- 13. Circulando na faixa mais à esquerda, o arguido, desobedecendo ao sinal semafórico vermelho colocado no final da saída, embateu com a viatura ZE na viatura automóvel ligeiro de matrícula ..-..-.., VW Golf, que circulava na Alameda do Campo Grande no sentido Sul/Norte.----- 14. No veículo .. seguia o condutor EE e FF, à frente no lugar de passageiro.----- 15. Como consequência directa e necessária do embate do automóvel de matrícula ZE e o de matrícula .., a passageira FF sofreu infiltração sanguínea de quase todo o pericrânio, infiltração sanguínea das leptomenínges de quase todo o encéfalo, edema encefálico, luxação occipíto-atloideia com amolecimento medular, hemotórax bilateral, fracturas de todas as costelas direitas e esquerdas, a vários lacerações e atelectasias de todos os lobos pulmonares, hemorragias sub-endocárdicas, fractura do fígado, fractura do baço, que foram causa directa e necessária da sua morte, que veio a ocorrer nesse dia pelas 04h15mn, no Hospital de Santa Maria, para onde foi transportada.----- 16. A morte da ofendida GG foi devida às graves lesões traumáticas raqui-medulares, torácicas e abdominais sofridas.----- 17. Também, como consequência directa e necessária do embate do automóvel de matrícula .. e o de matrícula .., o condutor EE sofreu fractura da apófise transversas esquerda ..-.., fractura do isqueo púbico à direita e à esquerda, fractura da coluna anterior à esquerda.----- 18. Tais lesões determinaram um período de doença de 90 dias, sendo 60 dias com afectação da capacidade para o trabalho geral e 90 dias para o trabalho profissional.----- 19. O veículo .., devido à velocidade com que estava animado, ainda embateu na retaguarda do veículo ligeiro de matrícula ..-..-.., Ford Fiesta, com o valor de € 4000,00, que nesse instante havia iniciado a marcha após a obediência de paragem do sinal semafórico junto ao restaurante Churrasqueira do Campo Grande, no Campo Grande.----- 20. No veículo MQ seguia o condutor CC.---- 21. No momento do embate não chovia, estando noite escura.----- 22. A velocidade máxima permitida no local do embate é de 50 km/h.----- 23. Devido à força do embate, o veículo .. ficou dividido em duas partes.----- 24. Após o acidente, o arguido colocou-se em fuga, não aguardando pela chegada das autoridades policiais.----- 25. O acidente ocorreu por desrespeito pelo arguido da sinalização semafórica.----- 26. O arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula ..-..-.., de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que devia cumprir as normas estradais no exercício da condução em via pública.-- 27. Momentos antes de iniciar a marcha na noite de 25 de Agosto de 2007, o arguido consumiu cocaína em quantidade não apurada.----- 28. Ao proceder como o descrito, o arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a viatura de que se apropriou, não lhe pertencia e que agia contra a vontade do seu legítimo dono e, não obstante, quis integrá-la no seu património.--- 29. O arguido não possui licença de uso e porte de arma de alarme.----- 30. O arguido agiu livre e conscientemente, bem sabendo que não lhe era permitida a sua detenção e uso.----- 31. Sendo a sua conduta proibida por lei e, como tal, punida.----- 32. O arguido não estava legalmente habilitado para conduzir veículos automóveis na via pública.----- 33. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que o exercício da condução de veículos automóveis na via pública sem para tal estar habilitado é proibido por lei.----- 34. Ao iniciar a condução do referido veículo bem sabia o arguido que ao conduzir em desrespeito da sinalização semafórica e aos ziguezagues entre os outros veículos que circulavam, em velocidade superior à permitida no local, violava os mais elementares deveres de condução e colocava em causa as condições de segurança da circulação rodoviária e em perigo a integridade física das pessoas e os veículos automóveis que se encontrassem na via pública.----- 35. De facto, não ignorava o arguido que a condução que levava a cabo naquelas circunstâncias e local tinha aptidão para provocar colisões com outros veículos que se encontravam na respectiva via pública, e que punha em causa bens patrimoniais alheios com um valor com avultada expressão pecuniária, como o são os veículos automóveis, assim como a integridade física dos demais utentes de tal via pública.--- 36. O arguido ao agir como se descreveu, omitiu voluntariamente os deveres de cuidado e diligência que, segundo as circunstâncias descritas e as suas capacidades pessoais, sobre si recaiam, designadamente ao circular a velocidade superior à permitida aos condutores de automóveis ligeiros no interior de localidade e em desrespeito à sinalização semafórica.----- 37. O arguido agiu de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.----- 38. O arguido confessou, integralmente e sem reservas, os factos de que vinha acusado, relevando-se arrependido dos mesmos.----- 39. Elaborado relatório social relativamente à pessoa do arguido, nele se refere que o mesmo é o segundo mais velho de dois irmãos nascidos no seio de uma família de modesto estatuto sócio económico.----- 40. Durante a infância, e após a separação dos progenitores, foi viver junto do agregado da avó materna.----- 41. Situação que se manteve até aos oito/nove anos de idade, altura em que foi colocado, pela mãe, numa instituição de ensino religioso “Obra de Maria Imaculada”, sita em Canecas.----- 42. Aos onze anos de idade, saiu da instituição e reintegrou o agregado da avó materna, onde também residia a sua mãe.----- 43. Porém, nunca mais conheceu estabilidade em termos logísticos, permanecendo alternadamente em casa de uma tia e da mãe, a qual, entretanto encetou nova relação afectiva.----- 44. Em relação ao progenitor, refere ter apenas contactos pontuais, encontrando-se inicialmente no Brasil e actualmente em Espanha.----- 45. O seu percurso escolar foi marcado pelo insucesso, apenas terminou o 5° ano de escolaridade, por desmotivação e dificuldades de aprendizagem.----- 46. No âmbito laboral, tem mantido um percurso irregular e instável.----- 47. É de salientar, ainda, que o seu primeiro contacto com a justiça ocorreu quando ainda tinha dezasseis anos de idade, tendo sido condenado em pena de prisão, da qual, saiu em Liberdade Condicional que terminou em 26.05.2004, que decorreu com a mesma instabilidade dada a ausência de apoio familiar e o consumo de estupefacientes, que diz ter iniciado durante o período de reclusão.----- 48. Saído em liberdade integrou inicialmente o agregado familiar da progenitora.----- 49. Contudo, e uma vez que não cumpria com as regras impostas, dada a grande vinculação ao consumo de estupefacientes, surgiram grandes conflitos familiares, principalmente, com o padrasto, passando a pernoitar em casa de familiares e mesmo na rua, na zona do Intendente, em Lisboa.----- 50. Em 2003, iniciou uma relação de namoro com HH, uma jovem estudante oriunda de um estrato social diferenciado.----- 51. Porém, e na sequência de uma gravidez não programada, passaram a viver em união de facto, residindo numa pensão, na zona do Cacém.----- 52. Esta, relação foi muito mal aceite pelos pais de HH, os quais tudo fizeram para terminar a mesma.----- 53. Porém, aquando da gravidez da filha tudo fizeram para a ajudar, mas, sem nunca aceitarem o seu companheiro e a família deste.---- 54. O filho do casal, nascido no início de 2007. foi retirado aos progenitores, tendo sido entregue na Ajuda de Berço, estando actualmente aos cuidados da avó materna.----- 55. Segundo HH a Regulação do Poder Paternal será decidida no dia 9 de Maio.----- 56. À data dos factos que constam na acusação, residia com a companheira numa casa arrendada, sita no Largo ............, n° .., ...E – 2780 – 012 Paço de Arcos, onde pagavam, € 450 mensais, sobrevivendo do vencimento do arguido de € 755 mensais, como servente da construção civil.----- 57. A companheira optou por abandonar os estudos apesar, do pai, desta se ter disponibilizado para lhos continuar a pagar, uma vez que, se encontrava a frequentar o 1° ano do curso de Serviço Social, na Universidade Lusófona de Lisboa.----- 58. Em 26.08.2007, o arguido foi detido, tendo saído em liberdade em 23.01.2008.----- 59. Desde essa altura, ......... reside junto do progenitor (os progenitores encontram-se separados) e trabalha como Segurança numa das repartições da Segurança Social.----- 60. Já no que diz respeito ao arguido este reside num quarto alugado, não dando a morada a ninguém.----- 61. O arguido tem presentemente 24 anos de idade.----- 62. Procurou ajuda para a sua situação de toxicodependência, frequentando consultas no CAT.----- 63. Do certificado de registo criminal do arguido consta a seguinte condenação:----- a) em 6 de Abril de 2001, pela prática em 11 de Março de 2003, de um crime de roubo, na pena de 3 anos e 10 meses de prisão, já declarada extinta – processo nº 143/00.0 DSNT da 1ª Vara de Competência Mista de Sintra.----- 64. O arguido foi, ainda, condenado no âmbito do processo comum colectivo nº 833/05.1 PCOER do 1º Juízo de Competência Criminal de Oeiras, por acórdão proferido em 4 de Março de 2008, ainda não transitado em julgado, pela prática, entre 22 de Julho de 2005 e 24 de Julho de 2005, como reincidente, de cinco crimes de furto, na forma consumada, previstos e puníveis pelo artigo 203º do Código Penal, nas penas parcelares de 10 meses de prisão por cada um dos crimes, de um crime de furto, na forma tentada, previsto e punível pelos artigos 22º, 23º, 73º e 75º do Código Penal, na pena de 7 meses de prisão, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, sob a condição de o arguido se sujeitar a acompanhamento com regime de prova pelos Serviços de Reinserção Social.----- O arguido AA pretende se opere uma redução na pena conjunta para 4 anos de prisão, com subsequente aplicação de pena de substituição, concretamente de pena de suspensão de execução da prisão, sob a alegação de que o tribunal recorrido não valorou devidamente as circunstâncias atenuantes de que beneficia, bem como as suas condições pessoais, designadamente a confissão integral e sem reservas e o arrependimento demonstrado, a sua toxicodependência, da qual vem sendo tratado, a clausura a que já esteve sujeito no processo por via de aplicação da medida de coacção de prisão preventiva, bem como a vontade de arranjar emprego e de refazer a vida na companhia da mulher e do filho menor. Do exame do processo decorre que: - O arguido AA, com 25 anos de idade, foi condenado em 11 de Março de 2003, pela prática de um crime de roubo, na pena de 3 anos e 10 meses de prisão, já cumprida; - Em 4 de Março de 2008, no 1º Juízo Criminal de Oeiras, foi condenado, sem trânsito em julgado, na pena conjunta de 3 anos de prisão, com suspensão da sua execução, pelo cometimento de seis crimes de furto, um na forma tentada, por factos ocorridos em 2005; - Actualmente encontra-se preso preventivamente à ordem do Tribunal Judicial da comarca de Portimão, por suspeita da prática de um crime de furto qualificado e de um crime de abuso de cartão de crédito; - À data dos factos objecto do processo vivia com a companheira, HH, em casa arrendada, da qual tem um filho com um ano de idade. Exercia a actividade de servente da construção civil, auferindo vencimento no montante mensal de € 775,00; - É consumidor de estupefacientes, tendo procurado ajuda para a sua toxicodependência; - Confessou integralmente e sem reservas os factos pelos quais foi condenado nos autos; - Convocado em meados do ano em curso, por várias vezes, pelos serviços de reinserção social, tendo em vista a elaboração de relatório social para determinação da sanção a aplicar nos presentes autos, não compareceu; De acordo com o artigo 77º, n.º 2, do Código Penal, a pena conjunta, através da qual se pune o concurso de crimes, tem a sua moldura abstracta definida entre a pena mais elevada das penas parcelares e a soma de todas as penas em concurso, não podendo ultrapassar 25 anos, o que equivale por dizer que no caso vertente a respectiva moldura varia entre o mínimo de 3 anos e 6 meses de prisão e o máximo de 10 anos e 7 meses de prisão. Por outro lado, segundo preceitua o n.º 1 daquele artigo, na medida da pena são considerados em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que significa que o cúmulo jurídico de penas não é uma operação aritmética de adição, nem se destina, tão só, a quantificar a pena conjunta a partir das penas parcelares cominadas. Primeira observação a fazer face ao regime legal da punição do concurso de crimes é a de que o nosso legislador penal não adoptou o sistema de acumulação material (soma das penas com mera limitação do limite máximo), nem o sistema da exasperação ou agravação da pena mais grave (elevação da pena mais grave, através da avaliação conjunta da pessoa do agente e os singulares factos puníveis, elevação que não pode atingir a soma das penas singulares nem o limite absoluto legalmente fixado), tendo mantido todas as opções possíveis em aberto, desde a absorção – aplicação da pena mais grave – ao cúmulo material, passando pela exasperação. Segunda observação a fazer é a de que a lei elegeu como elementos determinadores da pena conjunta os factos e a personalidade do agente, elementos que devem ser considerados em conjunto. Não tendo o legislador nacional optado pelo sistema de acumulação material é forçoso concluir que com a fixação da pena conjunta pretende-se sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respectivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto, (e não unitariamente) os factos e a personalidade do agente. Como doutamente diz Figueiredo Dias (3), como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado. Importante na determinação concreta da pena conjunta será, pois, a averiguação sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos em concurso, a existência ou não de qualquer relação entre uns e outros, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada aos factos, tendo em vista a obtenção de uma visão unitária do conjunto dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura penal do concurso. Analisando os factos verifica-se que os crimes em concurso se encontram intimamente relacionados, visto que cometidos sequencialmente, num curto espaço de tempo. O quadro delituoso conjunto revela que o arguido é portador de uma personalidade desprovida de valores éticos, destacando-se a indiferença com que assume condutas criminosas de elevado risco. O percurso criminoso do arguido, conquanto não evidencie, por ora, propensão para o crime, constitui, obviamente, um factor negativo, não possibilitando a formulação de um juízo de prognose positivo, deixando antever, ao invés, face à toxicodependência daquele, um futuro problemático. Tudo ponderado, tendo presente a gravidade dos crimes perpetrados e o quantum das penas singulares aplicadas, não merece qualquer censura a pena conjunta fixada pelo tribunal recorrido. Termos em que se acorda negar provimento ao recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se em 6 UCs. a taxa de justiça. Lisboa, 08 de Outubro de 2008 Oliveira Mendes (relator) Maia Costa ___________________________ (1) - As penas singulares cominadas são as seguintes: - homicídio por negligência, 3 anos e 6 meses de prisão; - furto qualificado, 3 anos e 6 meses de prisão; - ofensa à integridade física por negligência, 7 meses de prisão; - Condução perigosa de veículo rodoviário, 2 anos de prisão; - condução de veículo sem habilitação legal, 1 ano de prisão. (2) - O texto que a seguir se transcreve, tal como os que mais à frente se irão transcrever, correspondem integramente aos que constam dos autos. (3) - Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 290/292. |