Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
54/03.8TBPSR.E1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
DESCARACTERIZAÇÃO DE ACIDENTE DE TRABALHO
VIOLAÇÃO DE REGRAS DE SEGURANÇA
NEGLIGÊNCIA GROSSEIRA DO SINISTRADO
Data do Acordão: 10/03/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática: DIREITO DO TRABALHO - ACIDENTES DE TRABALHO
Doutrina: - Cruz de Carvalho, Acidentes de Trabalho, pp.40/41.
- Romano Martinez, Direito do Trabalho, II volume, 2º tomo, pgº 248, 3ª edição, 1999.
- Tomás de Resende, Acidentes de Trabalho, páginas 21 e 22, anotações 1 e 4.
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 342.º, N.º2.
CÓDIGO DO PROCESSO DE TRABALHO (DL Nº 272-A/81, DE 30-9): - ARTIGO 69.º
DECRETO N.º 360/71, DE 21-8. – ARTIGO 50.º.
LEI N°2127 (LAT), DE 03.08 DE 1965: - BASES VI, N.º1 ALS. A) E B), IX, XVI, N.º1 AL. D), XVIII, XLI.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 20/9/88, BMJ 379/527; DE 19/5/89, BMJ 387/415; DE 29/4/91, BMJ 406/489; DE 8/10/91, BMJ 410/565; DE 13/1/93, CJ 2281; DE 12/5/99, BMJ 487/208; DE 23/6/04, CJS, 285/2.
Sumário :
I - Nos termos da alínea a) do n.º 1 da Base VI da Lei n.º 2127, não dá direito a reparação o acidente provocado por conduta intencional e deliberada do sinistrado e que desta forma pratica não só o acto determinante do acidente mas também deseja ou se conforma com todas as suas consequências (1.ª parte) e o acidente que provier de acto ou omissão do sinistrado que importe, sem causa justificativa, violação das regras de segurança estabelecidas pelo empregador (2.ª parte).

II - No entanto, a violação de regras de segurança resultantes da lei ou regulamentos relativos a trabalhos industriais, só será apta a descaracterizar o acidente quando seja enquadrável na alínea b), impondo-se assim que a violação destas normas de segurança assuma a natureza dum comportamento temerário do sinistrado, inútil para o trabalho, indesculpável e reprovado pelo mais elementar sentido de prudência.

III - Não estando demonstradas as circunstâncias concretas em que ocorreu a descarga eléctrica que atingiu o sinistrado, nomeadamente a distância a que o mesmo se encontrava dos cabos eléctricos e as condições atmosféricas na altura do acidente, não se pode concluir que o acidente de que o A. foi vítima, resultou dum comportamento temerário ou absolutamente indesculpável do mesmo, pelo que é de afirmar o seu direito à reparação.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1---

AA intentou, em 15.01.2003, uma acção contra

BB, Companhia de Seguros, S.A. pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe:

-uma indemnização por ITA referente a 158 dias no montante de € 1.262,76;

-uma pensão anual e vitalícia no montante de € 2.575,00, vencida desde 6 de Agosto de 1994, que deverá ser actualizada nos termos do n°1 do Decreto-Lei n° 668/75, de 24 de Novembro, na redacção dada pelos Decretos-Lei n°s 39/81, de 7 de Março, e 159/99, de 11 de Maio;

-uma prestação suplementar devida pela assistência permanente de terceira pessoa no valor de € 643,76, vencida desde 6 de Agosto de 1994 e actualizável nos termos supra referidos;

-juros de mora, à taxa legal, devidos desde a data da citação até integral pagamento.

Alegou para tanto que, como trabalhador por conta própria, celebrou com a ré um contrato de seguro do ramo de acidentes de trabalho, nos termos do qual esta se responsabilizou pelo pagamento das indemnizações devidas por incapacidades temporárias e pelo pagamento de uma pensão anual e vitalícia no caso de incapacidade permanente para o trabalho resultantes de acidente no exercício da sua actividade profissional, direitos a calcular nos termos da lei de acidentes de trabalho.

Acontece que no dia 1 de Março de 1994, foi vítima de um acidente no exercício da sua actividade laboral, que consistiu em ter sido vítima de uma descarga eléctrica por uma grua ter tocado em cabos de alta tensão, quando procedia à montagem de uma cobertura metálica de um edifício, tendo sofrido queimaduras graves que lhe provocaram diversas lesões, em virtude das quais foi sujeito a vários internamentos, tratamentos médicos e cirurgias.

Em resultado disso, ficou com uma incapacidade permanente parcial de 89,5%, com um importante dano estético e uma incapacidade para o exercício de qualquer profissão, tendo ficado ainda dependente de terceira pessoa para se vestir, lavar e calçar, pelo que, e de acordo com o contrato celebrado, tem direito a receber da ré as indemnizações peticionadas.

Devidamente citada, veio a R contestar por excepção, invocando a prescrição dos créditos reclamados pelo A, em virtude de terem decorrido mais de 3 anos desde a data do acidente até à efectivação da notificação judicial efectuada em 21.01.1998, invocando ainda que a apólice se encontrava suspensa desde 19.02.1994, por falta de pagamento do respectivo prémio.

Alegou ainda ser do autor a responsabilidade pela produção do acidente, em virtude de ter violado as normas de segurança referentes ao tipo de trabalho que efectuava, dado não ter solicitado o corte da energia eléctrica nos cabos de alta tensão, bem como o desvio ou isolamento dos mesmos.

Mais alegou que, assim se não entendendo, a responsabilidade pelo acidente sempre seria da sociedade CC, contratada pelo dono da obra para o fornecimento e colocação da cobertura da nave em construção, que, por sua vez, subcontratou o autor para a realização dos trabalhos de colocação dos apoios e assentamento das placas, concluindo portanto pela improcedência da acção.

Respondeu o autor, pugnando pela falta de verificação da invocada excepção de prescrição, tanto mais que o respectivo prazo foi interrompido por notificação judicial avulsa da R, voltando desde então a correr novo prazo. Alegou ainda que não ocorreu qualquer suspensão do contrato de seguro por sempre ter pago, tempestivamente, o respectivo prémio até à data do acidente. Por outro lado, e assim se não entendendo, sempre a sua suspensão dependeria de sua notificação por carta registada com aviso de recepção, a que a R não procedeu. Além disso, veio defender não ser responsável pela produção do acidente, uma vez que respeitou todas as normas de segurança exigíveis pelo trabalho que estava a efectuar.

Foi proferido despacho saneador, que relegou para momento posterior o conhecimento das excepções relativas à prescrição e à suspensão do contrato de seguro. E seleccionados os factos assentes e organizada a base instrutória, foi instruído o processo, após o que se realizou a audiência de discussão e julgamento.

Seguidamente foi proferida sentença, nos termos da qual:

-           se julgaram improcedentes as excepções relativas à prescrição e à suspensão do contrato de seguro;

-           e se julgou improcedente a acção, absolvendo-se a ré do pedido.

Inconformado apelou o A, mas o Tribunal da Relação de Évora julgou a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Novamente irresignado, traz-nos o A revista, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:

1.            Atenta a matéria de fato dada como provada, a 1.03.1994, o A encontrava-se na Zona Industrial de Ponte de Sôr, a trabalhar em cima de um pavilhão industrial (cfr. n°. 6);

2.            No qual, com o seu empregado, se propunha fazer a montagem da cobertura metálica (cfr. n°. 7);

3.            A grua que transportava as peças da referida cobertura pelo menos aproximou-se de uns cabos de média tensão que passavam no local, provocando uma descarga eléctrica que atingiu o A. e o seu empregado (cfr. n°. 8, 9 e 10);

4.            O A. não procedeu ao corte de energia eléctrica nos cabos de média tensão, nem ao seu desvio ou isolamento (cfr. n°. 34);

5.            Não se apurou a distância dos cabos eléctricos relativamente ao pavilhão, local onde se encontrava o A;

6.            Ou, se essa distância, ainda que desconhecida, constituía algum perigo para a execução do trabalho do A;

7.            E se, por conseguinte, violou o A. alguma regra de condição de segurança ou faltou com algum dever geral de cuidado;

8.            Não se apurou também a que distância se encontravam os cabos eléctricos da grua;

9.            Assim como não se apurou que, a existir a obrigação de corte, desvio ou isolamento dos cabos de média tensão, tal obrigação caberia ao A.

10.          Sobre tal obrigação dispõe a Portaria n° 101/96, de 3/2 (que regulamenta as prescrições mínimas de segurança e de saúde nos locais e postos de trabalho dos estaleiros temporários ou móveis), no seu art. 4º, n° 5, os cabos eléctricos existentes devem ser desviados para fora da área do estaleiro ou colocados fora de tensão (...)

11.          O acidente sucedeu em 1.03.1994, sendo que, à data e sobre esta matéria, dispunha, o Decreto Regulamentar n°. 1/92, de 18/2 (Regulamento de Segurança de linhas eléctricas da alta tensão) e o Dec. Lei n°. 441/91, de 14/11 (relativo aos princípios que visam promover a segurança, higiene e saúde no trabalho).

12.          Dispõe o art. 4º, n°. 1 do Dec. Lei n°. 441/91, aplicável ao Recorrente enquanto trabalhador independente, que todos os trabalhadores têm direito à prestação de trabalho em condições de segurança, higiene e protecção da saúde, consagrando depois o art. 8º as obrigações gerais do empregador, relativas às condições de segurança em todos os aspectos relacionados com o trabalho.

13.          Por sua vez determina o art. 29° do Decreto Regulamentar n° 1/92, que a distância dos cabos de alta tensão em relação, nomeadamente, à cobertura de edifícios, não deve ser inferior a 4 metros (por maioria de razão não se poderá considerar outra de valor superior para o caso de linhas de média tensão, dada a sua inferior voltagem e, portanto, a menor extensão do seu campo eléctrico).

14.          Por conseguinte não resulta provado que o A. tenha violado qualquer regra elementar de segurança, prescrita ora pelo Decreto Regulamentar n° 1/92 (nomeadamente no seu art. 29°) ou pelo Dec. Lei n° 441/91, aplicáveis em sede desta matéria na altura;

15.          Ou que tenha omitido qualquer dever geral de cuidado;

16.          Não tendo sido, desta forma, temerário;

17.          Não se pode olvidar que o acidente ocorreu em 1994, época em que a informação e a prevenção de sinistros não tinha o desenvolvimento que tem actualmente, nomeadamente no que se refere ao estabelecimento de normas reguladoras em matéria de segurança, higiene e saúde no trabalho;

18.          Não era previsível na execução da obra do A. qualquer risco de acidente;

19.          Não sendo razoável exigir ao A. que tivesse previsto que a grua viesse a aproximar-se de tal forma dos cabos de média tensão, e assim provocar-lhe a descarga eléctrica;

20.          O acidente deu-se devido à acção do manobrador da grua;

21.          O operador da grua não estava sob a autoridade, direcção e fiscalização do A, contrariamente ao alegado pelo Venerando Tribunal da Relação;

22.          Não está assim preenchida e verificada a previsão da Base VI, n°. 1, alínea b) da Lei 2127, uma vez que o acidente não proveio de falta grave e indesculpável do A;

23.          Mas, ainda que por mera hipótese de raciocínio, se admita a falta grave e indesculpável do A., é evidente que o acidente não foi resultado de sua culpa exclusiva;

24.          Pelo que não é possível descaracterizar o acidente e excluir o sinistro do âmbito da apólice, devendo, por consequência, ser a R. condenada no pedido.

Pede-se assim a revogação da decisão da Relação, proferindo-se acórdão que julgue procedente a acção, com a consequente condenação da R.

A R também alegou, tendo terminado a sua alegação com as seguintes conclusões:0

A)           Da decisão impugnada ficou provado que o Recorrente violou as regras de segurança de forma grave e indesculpável e de forma manifestamente temerária, pelo que não tem direito a ser indemnizado pelo acidente que sofreu.

B)           O Recorrente estava obrigado a cumprir com medidas preventivas de âmbito geral, nos termos do disposto na alínea c), do n.º1, do art. 2°, do Decreto-Lei n.9 441/91, de 14 de Novembro, diploma que estabeleceu os princípios gerais de promoção da segurança, higiene e saúde no trabalho.

C)           Por sua vez, a alínea a), do nº 1, do art. 29º do Dec. Regulamentar n.º 1/92, de 18 de Dezembro, veio dispor que as linhas eléctricas devem estar distanciadas a 4 metros da cobertura do edifício ou dos trabalhos a efectuar.

D)           Mesmo que assim não fosse, o Recorrente podia e devia até, para total segurança, ter requerido à EDP o corte da corrente daquelas linhas eléctricas, o que não o fez.

E)            Pelo que ao não ter tomado qualquer providência para evitar o acidente, o Recorrente violou as normas de segurança no trabalho que resultam directamente da lei ou das condições gerais que permitissem realizar o trabalho sem o risco de descarga eléctrica, violando mesmo um dever geral de cuidado, acabando por ser sempre o Recorrente o responsável pelo lamentável acidente.

F)            Assim sendo, face às circunstâncias em que o acidente ocorreu, ou seja, por provir de falta grave e indesculpável do próprio sinistrado, deverá ser considerado como descaracterização do acidente, nos termos da alínea b), do n.º 1, da Base VI, da Lei n.º 2127/65.

           

            Subidos os autos a este Supremo Tribunal, foram os mesmos distribuídos inicialmente à Secção Cível que, tendo-se julgado materialmente incompetente por estar em causa um acidente de trabalho, remeteu o processo à Secção Social, decisão que não suscitou qualquer oposição das partes.

Recebido o recurso, deu-se cumprimento ao disposto no artigo 87º/3 do CPT, tendo o Senhor Procurador-Geral Adjunto elaborado proficiente parecer em que concluiu pela não descaracterização do acidente sofrido pelo recorrente, o qual não suscitou também qualquer reacção das partes.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

2----

            Para tanto, as instâncias tiveram em consideração a seguinte factualidade:

1)         A ré é uma sociedade seguradora (al. A) dos factos assentes).

2)         No âmbito da sua actividade, a ré acordou com o autor na transferência, deste para si, da responsabilidade emergente dos acidentes que o autor poderia vir a ter no seu trabalho por conta própria (al. B) dos factos assentes).

3)         A apólice n° ... refere-se ao acordo referido em 2 (al. C).

4)         O acordo referido em 2) incidia sobre uma remuneração anual de Esc. 720.000S00 (setecentos e vinte mil escudos) em 1990 e de Esc. 933.646$00 (novecentos trinta e três mil seiscentos quarenta e seis escudos) em 1994 e 1995 (resposta ao quesito 29° da base instrutória).

5)         No acordo referido em 2) autor e ré acordaram que, em caso de ocorrência de acidente aí referido, aquele tem direito a receber desta "todas as prestações em espécie e em dinheiro previstas na legislação sobre acidentes de trabalho" (resposta aos quesitos 30° a 32° da base instrutória).

6)         A 1 de Março de 1994, cerca das 11 horas, o autor encontrava-se na Zona Industrial de Ponte de Sôr, em Ponte de Sôr, a trabalhar em cima de um pavilhão industrial (resposta ao quesito 1º da base instrutória).

7)         No qual, com o seu empregado, se propunha fazer a montagem da cobertura metálica (resposta ao quesito 2º da base instrutória).

8)         A grua que transportava as peças da referida cobertura pelo menos aproximou-se de uns cabos de média tensão que passavam no local (resposta ao quesito 3º da base instrutória).

9)         Provocando uma descarga eléctrica de média tensão (resposta ao quesito 4° da base instrutória).

10)       Que atingiu o autor e o seu empregado (resposta ao quesito 5º da base instrutória).

11)       Provocando-lhes queimaduras, sendo ao autor de terceiro grau, e queda de cerca de cinco metros (resposta ao quesito 6° da base instrutória).

12)       O autor foi transportado para os serviços de urgência do Hospital de Ponte de Sôr (resposta ao quesito 7º da base instrutória).

13)       Onde lhe prestaram primeiros socorros (resposta ao quesito 8º da base instrutória).

14)       Sendo depois conduzido para o Hospital de Abrantes (resposta ao quesito 9º da base instrutória).

15)       E de seguida para o Hospital de Santa Maria (resposta ao quesito 10° da base instrutória).

16)       Aí foi submetido a primeira cirurgia em 9 de Março de 1994 (resposta ao quesito 11° da base instrutória).

17)       O autor esteve internado no Hospital de Santa Maria durante cinco meses e cinco dias, sendo quarenta e cinco deles na Unidade de Queimados (resposta ao quesito 12° da base instrutória).

18)       O autor foi sujeito a nove intervenções cirúrgicas, tendo pelo menos cinco sido com anestesia geral (resposta ao quesito 13 ° da base instrutória).

19)       A 5 de Agosto de 1994, o autor teve alta hospitalar e iniciou tratamentos de medicina física e reabilitação na clínica de S. Francisco, em Leiria, durante pelo menos dois meses (resposta ao quesito 14° da base instrutória).

20)       Nesse período o A. foi sujeito a consultas no Hospital de Santa Maria (resposta ao quesito 15° da base instrutória).

21)       O autor foi internado a 27 de Junho de 1995 para ser sujeito a nova intervenção cirúrgica (resposta ao quesito 7° da base instrutória).

22)       A 6 de Setembro de 1995, o autor foi novamente internado para intervenção cirúrgica de reimplantação do primeiro dedo da mão direita (resposta ao quesito 18° da base instrutória).

23)       O autor ainda hoje apresenta as seguintes sequelas: rigidez na anteflexão do punho direito; sequelas de esfacelo da mão direita, com cicatrizes irregulares e retrácteis extensas; paralisia total do primeiro dedo da mão direita, implantado em posição viciosa; anquilose do segundo metacarpo falângico; rigidez do 3º metacarpo falângico; esfacelo grave por queimaduras de 3º grau na face anterior do antebraço esquerdo; anquilose do primeiro metacarpo falângico da mão esquerda; desarticulação do segundo dedo da mão esquerda; amputação da segunda falange do quarto dedo da mão esquerda; amputação do primeiro terço médio da perna esquerda; cicatriz de queimadura de 3º grau no antepé direito; cicatriz irregular e deformada na região frontal; lesões dos nervos medianos bilaterais (resposta ao quesito 19° da base instrutória).

24)       O autor queixa-se de perda de sensibilidade da mão direita, da mão direita em garra permitindo apenas escrita imperfeita, de perda de sensibilidade da mão esquerda com impotência funcional e da prótese da perna esquerda bem adaptada, mas necessitando de readaptação periódica (resposta ao quesito 20° da base instrutória).

25)       O dano estético sofrido pelo autor é de grau seis numa escala máxima de sete (resposta ao quesito 21° da base instrutória).

26)       Tais lesões e sequelas causaram ao autor uma incapacidade permanente parcial de 75 pontos (resposta ao quesito 22° da base instrutória).

27)       Em virtude do seu estado, o autor necessita da ajuda constante de terceira pessoa (resposta ao quesito 23° da base instrutória).

28)       E está totalmente incapacitado para o exercício da sua actividade profissional (resposta ao quesito 24° da base instrutória).

29)       Ou de qualquer outra (resposta ao quesito 25° da base instrutória).

30)       Não é capaz de desabotoar botões (resposta ao quesito 26° da base instrutória).

31)       Nem de se lavar (resposta ao quesito 27° da base instrutória).

32)       Ou caçar sozinho (resposta ao quesito 28° da base instrutória).

33)       O autor esteve afectado de uma incapacidade temporária absoluta desde 1 de Março de 1994 até, pelo menos, 5 de Agosto de 1994 (resposta ao quesito 33° da base instrutória).

34)       O autor não procedeu ao corte de energia eléctrica nos cabos referidos em 8), nem ao seu desvio, nem ao seu isolamento (resposta ao quesito 37° da base instrutória).

35)       O autor não pagou o prémio relativo à apólice referida em 3) até ao dia 19 de Fevereiro de 1994, inclusive (resposta ao quesito 34° da base instrutória).

36)       Só em 2 de Março de 1994 foi pago o prémio de seguro referente ao acordo referido em 2) que se venceu em 24 de Outubro de 1993 (resposta ao quesito 35° da base instrutória).

37)       Na participação do acidente à Ré fez-se constar que este teria ocorrido a 2 de Março de 1994 (resposta ao quesito 36° da base instrutória).

38)       A presente acção deu entrada no Tribunal a 15 de Janeiro de 2003 (al. D) dos factos assentes).

39)       O autor requereu a notificação judicial avulsa da ré a 19 de Dezembro de 1997 (resposta ao quesito 38° da base instrutória).

40)       A requerimento do autor, foi a ré notificada judicialmente no dia 21 de Janeiro de 1998 (al. E) dos factos assentes).

3---

Em face das conclusões do recorrente, enquanto delimitadoras do objecto do recurso, conforme resulta dos artigos. 684°, n°3 e 690°, n°1 do CPC[1], são as seguintes as questões de que cumpre conhecer:

Inexistência de descaracterização do acidente;

Condenação da ré nos pedidos formulados pelo autor.

           

            Assim sendo, vejamos então cada uma delas

3.1---

Quanto à descaracterização do acidente:

Tendo o acidente dos autos ocorrido em 1 de Março de 1994, é de se lhe aplicar a disciplina da Lei n°2127[2], de 03.08 de 1965, que, à data do sinistro, regulava a matéria relativa aos acidentes de trabalho.

Efectivamente, o A havia celebrado com a R um contrato de seguro, titulado pela apólice n°..., por força do qual esta acordou na transferência para si da responsabilidade emergente dos acidentes que aquele poderia vir a sofrer no seu trabalho por conta própria e resultantes do exercício da sua actividade profissional, assumindo pagar-lhe todas as prestações em espécie e em dinheiro previstas na legislação sobre acidentes de trabalho, tendo em conta a remuneração anual de 933.646$00 (novecentos trinta e três mil seiscentos quarenta e seis escudos), que era a que vigorava em 1994.

Face ao exposto, temos de dizer que não está em causa que o A sofreu um acidente no exercício da sua actividade profissional, pois foi vítima duma descarga eléctrica de média tensão, ocorrida no dia 1 de Março de 1994, cerca das 11 horas, quando se encontrava na Zona Industrial de Ponte de Sôr a trabalhar em cima de um pavilhão industrial, com vista a fazer a montagem da sua cobertura metálica, donde lhe resultou a queda de cerca de cinco metros de altura e queimaduras de terceiro grau.
Por isso, e atenta esta factualidade, temos de concluir que se verificam todos os requisitos que a Lei 2127 exige para a existência dum acidente de trabalho, pois, e conforme resulta da sua Base V, nº 1, constitui acidente de trabalho o acidente que se verifique no local e no tempo de trabalho e produza, directa ou indirectamente, lesão corporal de que resulte uma redução na capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado.

No entanto, veio a Ré invocar que o acidente deve ser descaracterizado por provir exclusivamente da violação de regras de segurança, sustentando assim que não é responsável pela reparação do acidente.
Ora, e conforme se colhe da base VI da LAT, a descaracterização do acidente de trabalho constitui um caso em que o acidente não é indemnizável, apesar de ter ocorrido no tempo e no local de trabalho, argumentando-se para tanto que, sendo a protecção resultante dum acidente de trabalho um caso de responsabilidade objectiva do empregador, que assenta basicamente no risco da autoridade, não se justifica que ela subsista quando o acidente for totalmente imputável a um comportamento intencional ou altamente culposo da vítima, ou resultar de caso de força maior não controlável pela entidade patronal, conforme se prevê naquele preceito.
Por isso, apesar do acidente ter todas as características de um acidente de trabalho, há algo resultante do comportamento da vítima ou dum acaso da natureza que faz com que o direito à reparação não funcione.

Ora, o Tribunal recorrido acabou por concluir que bem esteve assim o tribunal "a quo" ao considerar que o acidente se deveu a falta grave e indesculpável do autor, razão pela qual, com base no disposto na al. a) do n° 1 da Base VI da supra referida Lei n° 2127/65 (aplicável ao contrato de seguro em causa, nos termos ali previstos), considerou não haver direito à reparação.

E consequentemente, julgou a acção improcedente, entendimento que o recorrente põe em crise na revista.

           

Resulta com efeito, desta alínea a) da referida Base VI, que não dá direito a reparação “o acidente que for dolosamente provocado pela vítima ou provier de seu acto ou omissão, se ela tiver violado, sem causa justificativa, as condições de segurança estabelecidas pela entidade patronal”.

            Por seu turno, também não dará direito a reparação o acidente “que provier exclusivamente duma falta grave e indesculpável da vítima”, conforme estabelece a sua alínea b).

            Ora, e quanto a esta última, só assume esta natureza um comportamento temerário do sinistrado, inútil para o trabalho, indesculpável e reprovado pelo mais elementar sentido de prudência, doutrina que era seguida com foros de unanimidade no domínio da Lei 2127, vendo-se neste sentido os acórdãos do STJ de 20/9/88, BMJ 379/527 e de 12/5/99, BMJ 487/208.
Por isso, para a descaracterização do acidente de trabalho à luz desta alínea, o legislador optou claramente pela modalidade mais grave da culpa, pois só uma falta grave, indesculpável e exclusiva da vítima é que é apta a produzir tal efeito, não tendo esta virtualidade os comportamentos do sinistrado que constituam meras imprudências, inconsiderações, irreflexões ou leviandades.

Por outro lado e quanto à previsão constante da alínea a), são duas as situações aptas a descaracterizar o acidente à luz deste normativo:
Acidente provocado por conduta intencional e deliberada do sinistrado e que desta forma pratica não só o acto determinante do acidente mas também deseja ou se conforma com todas as suas consequências (1ª parte do preceito).
E o acidente que provier de acto ou omissão do sinistrado, que importe, sem causa justificativa, violação das regras de segurança estabelecidas pelo empregador (2ª parte).
Tendo o acórdão recorrido considerado que a factualidade apurada quanto à ocorrência do acidente integra a previsão da alínea a), da Base VI, temos de dizer que, já no domínio da vigência da Lei 2127 sustentava a doutrina, que a violação das regras de segurança tinha que constituir um comportamento reprovável do sinistrado, não bastando a culpa leve do trabalhador resultante de mera negligência, imprudência, distracção ou imprevidência para descaracterizar o acidente à luz desta norma, assim se pronunciando Tomás de Resende, Acidentes de Trabalho, páginas 21 e 22, anotações 1 e 4.
Também Cruz de Carvalho, Acidentes de Trabalho, pgª 41 (in fine), sustentava que, para ocorrer a descaracterização prevista na parte final da alínea a), se exige que o acto violador das regras de segurança seja voluntário, embora não intencional.
No entanto, Romano Martinez, Direito do Trabalho, II volume, 2º tomo, pgº 248, 3ª edição, 1999, e tendo já como pano de fundo a Lei 100/97 de 13/9, que sucedeu à Lei 2127 a partir de 1 de Janeiro de 2000, sustenta que o legislador se contenta com a mera violação injustificada das regras de segurança, estando fora de causa o requisito da negligência grosseira no comportamento do sinistrado, argumentando que a exigência deste requisito se refere à alínea b), impondo-se por isso uma interpretação distinta das duas normas.
Não foi esta porém, a orientação que prevaleceu no acórdão deste Supremo Tribunal de 23/6/04, CJS, 285/2, que referindo-se a um acidente de trabalho a que já foi aplicada a Lei 100/97, entendeu que a descaracterização com fundamento neste normativo exige que sejam voluntariamente violadas as regras de segurança, quer legais quer estabelecidas pela entidade patronal, só estas condutas sendo aptas a descaracterizar o acidente à luz da segunda parte da alínea a) do artigo 7º desta Lei (100/97), pois exigindo a lei que ocorra uma violação das normas de segurança sem causa justificativa, tal passa por um claro esclarecimento do trabalhador do perigo que possa resultar do seu acto ou omissão.
Por outro lado, se o nº 1 do artigo 8º do DL nº 143/99, diploma que regulamentou esta Lei, considera existir causa justificativa da violação das condições de segurança quando o acidente resulta de incumprimento de norma legal ou estabelecida pelo empregador, da qual o trabalhador, face ao seu grau de instrução ou de acesso à informação, dificilmente teria conhecimento, ou tendo-o, lhe fosse manifestamente difícil entendê-la, mais se acentua o carácter esclarecido da conduta do sinistrado como sendo essencial a provocar a descaracterização do acidente.

De qualquer forma, como ainda estamos na vigência da Lei 2127, a ela temos de retornar para apreciar a questão a decidir.
Antes de mais temos de dizer que o acórdão da Relação, ao considerar que o acidente se deveu a falta grave e indesculpável do autor, razão pela qual, com base no disposto na alínea a) do n° 1 da Base VI da Lei n°2127 se descaracterizou o acidente, tem uma fundamentação equívoca, pois uma coisa é a violação, sem causa justificativa, das regras de segurança a que se refere a alínea a) e outra a existência de falta grave e indesculpável do sinistrado, pois esta integrará a alínea b) da referida Base VI. 
Por outro lado, aquela alínea a) refere-se apenas à violação das condições de segurança estabelecidas pela entidade patronal, o que levou a doutrina a sustentar que quanto à violação de regras de segurança resultantes da lei ou regulamentos relativos a trabalhos industriais, esta só será apta a descaracterizar o acidente quando seja enquadrável na alínea b), impondo-se assim que a violação destas normas de segurança assuma a natureza dum comportamento temerário do sinistrado, inútil para o trabalho, indesculpável e reprovado pelo mais elementar sentido de prudência, conforme sustenta Cruz de Carvalho, obra citada, 40/41.

Por isso, entendemos que a situação dos autos não é integrável nesta alínea a), dado não estar em causa uma violação de regras de segurança estabelecidas pela entidade patronal, tanto mais que a própria recorrida invoca a violação pelo sinistrado do disposto na alínea c), do n.º1, do art. 2°, do Decreto-Lei n.º 441/91, de 14 de Novembro, diploma que estabeleceu os princípios gerais de promoção da segurança, higiene e saúde no trabalho e a alínea a), do nº 1, do art. 29º do Decreto Regulamentar n.º 1/92, de 18 de Fevereiro, e donde resulta que as linhas eléctricas devem estar distanciadas 4 metros (no mínimo) da cobertura dos edifícios ou dos locais onde os trabalhos se estão a efectuar.

E assim sendo, será à luz da alínea b) da Base VI da Lei 2127 que a questão da descaracterização do acidente dos autos tem de ser apreciada.  
No entanto, sempre temos de realçar que, e conforme é jurisprudência pacífica, cabe à seguradora o ónus da prova dos factos donde se possa concluir pela descaracterização do acidente, por se tratar de facto impeditivo do direito invocado, vendo-se neste sentido os acórdãos deste Supremo Tribunal de 19/5/89, BMJ 387/415; 29/4/91, BMJ 406/489; 8/X/91, BMJ 410/565; 13/1/93, CJ 2281; 12/5/99, BMJ 487/208 e artigo 342º nº 2 do CC.
Atentas estas considerações, vejamos então se os factos que as instâncias apuraram são suficientes para se concluir que ocorre a pretendida descaracterização do acidente por ter resultado de falta grave e indesculpável da vítima.


3.2----

             Resulta da factualidade apurada que, no dia 1 de Março de 1994, pelas 11 horas, o autor se encontrava na Zona Industrial de Ponte de Sôr, em Ponte de Sôr, a trabalhar em cima de um pavilhão industrial, onde, juntamente com o seu empregado, se propunha fazer a montagem da sua cobertura metálica.

            A certa altura da realização deste trabalho, a grua que transportava as peças da referida cobertura aproximou-se de uns cabos de média tensão que passavam no local, provocando uma descarga eléctrica, que atingindo o autor e o seu empregado, provocou a sua queda de cerca de cinco metros de altura e queimaduras graves.
               É certo que não se procedeu ao corte da energia eléctrica desses cabos de média tensão, nem ao seu desvio ou isolamento.
               Apesar disso, não podemos concluir que o A tenha violado as regras de segurança impostas pelo trabalho que estava a realizar, pois para tanto era fundamental que se tivesse provado que este estava a ser efectuado a menos de 4 metros dos cabos eléctricos, conforme resulta da alínea a), do nº 1, do art. 29º do Decreto Regulamentar n.º 1/92, de 18 de Fevereiro, diploma que regulamenta a instalação das linhas eléctricas de alta tensão.
               Por outro lado, também não se provou quais eram as condições atmosféricas na altura do acidente, factos que eram essenciais para se determinar se a atitude do A de não ter providenciado pelo corte da energia dos cabos eléctricos, nem pelo seu desvio ou isolamento, integra um comportamento temerário e reprovado pelo mais elementar espírito de prudência.
               Efectivamente, é muito diferente o risco de descarga eléctrica em tempo seco, húmido ou chuvoso, tanto mais que também não se apurou se esta descarga resultou da grua ter chegado a tocar nesses cabo, ou se bastou que ela se tivesse aproximado dos mesmos.        
               Por isso, e como lucidamente refere o Senhor Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, “não havendo indicação de que os tenha tocado, nem se sabendo a que distância deles se aproximou, não é de excluir que a interacção de outros factores (humidade, pressão atmosférica, temperatura do ar, etc) possa ter tido alguma influência” na origem do acidente.
   Não temos assim factos suficientes para se poder concluir que o acidente de que o A foi vítima, resultou dum comportamento temerário do sinistrado ou dum comportamento absolutamente indesculpável por ser gravemente violador das regras de segurança impostas pelo tipo de trabalho que estava a realizar, tanto mais que nem sequer se sabe se o manobrador da grua era funcionário do A.
 Como tal, e como a prova desses factos pertencia à R, não podemos descaracterizr o acidente dos autos, conforme decidiram as instâncias.
E por isso, temos de revogar o acórdão recorrido e conhecer dos direitos do sinistrado.

3.3----

               A reparação emergente dum acidente de trabalho compreende o direito a prestações em espécie e em dinheiro, conforme resulta da base IX da LAT.
               Estas últimas, que são as que estão em causa nos autos, correspondem às indemnizações por incapacidades temporárias e à indemnização em capital ou pensão vitalícia correspondente à redução na capacidade de trabalho ou de ganho, no caso de incapacidades permanentes, conforme estabelece a alínea b) daquela base.

            No caso presente, sendo a data da alta o dia 5 de Agosto de 1994, temos de considerar que o A esteve afectado duma ITA desde a data do acidente.

            E a partir daqui, temos de considerá-lo em situação de incapacidade permanente e absoluta para o trabalho habitual, com 75% de incapacidade permanente para as restantes profissões.

            Por isso, vai o A ter direito a uma indemnização devida pela incapacidade temporária absoluta entre 2 de Março (dia seguinte ao do acidente) e 5/8/94, a calcular nos termos do nº 1, alínea d) da base XVI.

            E com início em 6 de Agosto de 1994, vai ter direito a uma pensão anual e vitalícia nos termos do disposto na alínea b) da mesma base.

            Por último, e como o A, em virtude do seu estado, necessita da ajuda constante de terceira pessoa, pois não é capaz de desabotoar botões, nem de se lavar ou calçar sozinho, terá ainda direito a uma prestação suplementar calculada nos termos da base XVIII.

Procedendo ao cálculo dos valores a que o A tem direito, temos de considerar que a responsabilidade da seguradora parte da retribuição anual de 933 646$00, que era o valor pelo qual o A a transferira.

No entanto, e conforme resulta dos preceitos acima citados, tais direitos são calculados a partir da retribuição - base, cujo montante se determina da forma prevista no artigo 50º do Decreto 360/71 de 21/8.

Assim e para cálculo da indemnização por ITA, tal montante corresponderá à seguinte fórmula:

(Ra-SMN)x0,70+SMN, correspondendo “Ra” à retribuição anual real e smn ao salário mínimo nacional em vigor na data do acidente.

Por outro lado, e para o cálculo da pensão, temos de atender a uma retribuição - base anual calculada de acordo com a seguinte fórmula: 

(Ra-SMN)x0,80+SMN, sendo “Ra” a retribuição anual real e “SMN” o salário mínimo nacional anual em vigor na data da alta.

Aplicando estas fórmulas, e considerando que a retribuição anual do A era de 933 646$00 e que o salário mínimo nacional em vigor em 1994 era do montante mensal de 49 300$00[3], o que perfaz um montante anual de 591 600$00, temos os seguintes valores:

(933 646$00-591 600$00) x 0,70+591 600$00, o que dá uma retribuição-base anual de 831 032$20 para cálculo da indemnização por ITA e a que corresponde uma retribuição-base diária de 2 308$42.

Por isso, esta indemnização nos três primeiros dias e face ao disposto na base XVI, nº 1, alínea d), in fine, será do montante de 2 308$42.

Nos restantes 155 dias será do montante de 238 536$72 (2/3 de 2 308$42 x 155 dias), conforme estabelece a Base XVI, nº 1 alínea d).

O que perfaz o total de 240 845$14.

  

Por seu turno, a retribuição-base anual para o cálculo da pensão será assim calculada: (933 646$00-591 600$00)x0,80+591 600$00, o que nos dá uma retribuição-‑base anual de 865 236$80.  

Pelo exposto, situando-se a pensão por ITATH entre metade e 2/3 da retribuição anual, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível - base XVI, nº 1, alínea b), vamos graduá-la no máximo.

 Efectivamente, tendo resultado do acidente rigidez na anteflexão do punho direito; sequelas de esfacelo da mão direita com cicatrizes irregulares e retrácteis extensas; paralisia total do primeiro dedo da mão direita, implantado em posição viciosa; anquilose do segundo metacarpo falângico; rigidez do 3º metacarpo falângico; esfacelo grave por queimaduras de 3º grau na face anterior do antebraço esquerdo; anquilose do primeiro metacarpo falângico da mão esquerda; desarticulação do segundo dedo da mão esquerda; amputação da segunda falange do quarto dedo da mão esquerda; amputação do primeiro terço médio da perna esquerda; cicatriz de queimadura de 3º grau no antepé direito; cicatriz irregular e deformada na região frontal e lesões dos nervos medianos bilaterais, e que causam ao sinistrado uma incapacidade para as outras actividades que foi medida em 75% de IPP, temos de concluir que se trata de sequelas gravíssimas e que dificilmente permitirão ao A arranjar qualquer outro tipo de trabalho compatível.

 

Justifica-se assim que a pensão seja fixada em 2/3 da retribuição-base anual, o que equivale a 576 824$53 (865 236$80x2/3).

E a prestação devida pela necessidade duma terceira pessoa será do montante anual de 144 206$13, (25% da pensão acima fixada, conforme resulta da base XVIII.

E embora se trate de valores superiores ao pedido do A, tem este Tribunal que condenar em quantia superior ao pedido em virtude de estarmos perante direitos irrenunciáveis, conforme estabelece a Base XLI da LAT, e atendendo ao disposto no artigo 69º do Código do Processo de Trabalho consagrado pelo DL nº 272-A/81 de 30 de Setembro, que era o que vigorava na altura do ajuizamento desta acção, pois o CPT consagrado pelo DL nº 480/99 de 9/11 só se aplica aos processos instaurados a partir de 1 de Janeiro de 2000, conforme estabelece o artigo 3º do referido diploma legal.  

Assim sendo e em conclusão, tem a R de ser condenada nos seguintes valores:

No pagamento duma indemnização por ITA que é do montante de 240 845$14 e a que correspondem 1 201, 70 euros;

No pagamento duma pensão anual e vitalícia de 576 824$53, com início em 6 de Agosto de 1994 e a que correspondem 2 877,19 euros;

No pagamento duma prestação suplementar anual de 144 206$14 e que é devida pela necessidade duma terceira pessoa e a que correspondem 719,30 euros.

As pensões acima referidas serão actualizadas oficiosamente pela seguradora, nos termos legais.

Acrescerão ainda os juros de mora legais devidos pelas pensões e indemnizações em atraso.

4---

            Termos em que se acorda nesta Secção Social em conceder a revista, e revogando-se o acórdão recorrido, condena-se a R no pagamento das seguintes quantias:

1 201, 70 euros da indemnização por ITA;

2 877,19 euros a título de pensão anual e vitalícia que teve início em 6 de Agosto de 1994;

719,30 euros de prestação suplementar que teve início em 6 de Agosto de 1994.

Juros de mora legais sobre as indemnizações e pensões em atraso, consoante pedido pelo A.

Quer neste Supremo Tribunal, quer nas instâncias, as custas serão da responsabilidade da R.

Lisboa, 3 de Outubro de 2012.

Gonçalves Rocha (Relator)

Leones Dantas

Pinto Hespanhol

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[1] Na versão anterior à que lhe foi conferida pelo DL nº 303/2007 de 24 de Agosto, dado o processo ser anterior a 1 de Janeiro de 2008.
[2] A seguir designada por LAT
[3] Segundo resultou do DL nº 79/94 de 9/3