Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | OLIVEIRA BARROS | ||
Descritores: | AQUISIÇÃO DE NACIONALIDADE OPOSIÇÃO À AQUISIÇÃO DE NACIONALIDADE CASAMENTO | ||
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Nº do Documento: | SJ200306170017547 | ||
Data do Acordão: | 06/17/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 5384/02 | ||
Data: | 11/11/2002 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO. | ||
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Sumário : | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. "A", de nacionalidade indiana, declarou, em 30/5/2001, na 2ª. Conservatória do Registo Civil de Lisboa, pretender adquirir a nacionalidade portuguesa de sua mulher, a cidadã portuguesa B. Em 22/5/2002, o Mº Pº instaurou contra esse requerente, no Tribunal da Relação de Lisboa, para tanto competente, acção com processo especial de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa, fundada nos artºs. 9º ss da Lei da Nacionalidade - Lei nº. 37/81, de 3/10, aquele com a redacção que lhe foi dada pelo artº. 1º da Lei nº. 25/94, de 19/8, e 22º ss do Regulamento respectivo - DL 322/82, de 12/8 -, por sua vez alterado pelo DL 253/94, de 20/10. Citado, o requerente da aquisição da nacionalidade portuguesa, requerido na acção, contestou. Foram ouvidas as duas testemunhas indicadas nesse articulado (um concidadão do requerente, e a senhoria deste, de nacionalidade espanhola). Instruída a causa, foram oferecidas alegações. 2. Foi, com invocação do artº. 705º CPC, proferida decisão liminar em que, bem que noutra ordem, se consideraram provados os seguintes factos: - O requerido nasceu em 2/8/62 em Raipur, República da Índia (doc. a fls. 71). - Reside em Portugal desde 1994. - Contraiu em 18/5/95 casamento com a nacional portuguesa B (doc. a fls. 38). - Em 30/5/2001, declarou na 2ª. Conservatória do Registo Civil de Lisboa, pretender adquirir a nacionalidade portuguesa, com base nesse casamento (doc. a fls. 36 e 37). - Possui o Bilhete de Identidade de Cidadão Estrangeiro (doc. a fls. 49). - Nada consta do seu certificado do registo criminal (doc. a fls. 36 e 37). - Desempenha as funções inerentes à categoria profissional de cantoneiro de limpeza na zona da Grande Lisboa (doc. a fls. 70 e 71). - Apresentou as declarações de IRS referentes aos anos de 2000 e 2001 (docs a fls. 45 a 50 e 68 a 69). - É beneficiário da Segurança Social (doc. a fls. 51). - É titular de uma conta na Caixa Geral de Depósitos, agência de Almirante Reis (doc. a fls. 23 e 24). - Vive em casa arrendada, pagando a renda mensal de 498,80 euros (doc. a fls. 66 e 67). - Tem poucos conhecimentos de língua portuguesa, conseguindo fazer-se entender. 3. Referido, nessa base, mostrar-se preenchida a previsão do artº. 3º da Lei da Nacionalidade, considerou-se mais: - com referência a Ac. STJ de 25/2/93, CJSTJ, I, 1º, 157, que, deduzida oposição com fundamento na al. a) do artº. 9º dessa mesma Lei, ou seja, na não comprovação pelo interessado de ligação efectiva à comunidade nacional, a jurisprudência considerava que os fundamentos de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa previstos naquele artº. 9º não passavam de índices da indesejabilidade da integração do interessado na comunidade nacional, carecendo de ser completados com outros factores que tal evidenciassem ; - que em virtude das alterações introduzidas em 1994, a ligação efectiva à comunidade nacional constitui actualmente autêntico pressuposto da aquisição da nacionalidade portuguesa por efeito da vontade, recaindo sobre o candidato a essa aquisição o ónus da correspondente prova, de tal modo que, não a fazendo, há fundamento bastante para a procedência da acção de oposição. Assim transferido, em 1994, do Mº Pº para o interessado o ónus da prova da ligação efectiva à comunidade nacional, declarou-se não ter-se dúvida de que essa prova foi feita, como demonstrado pela matéria de facto indicada em 2., supra. Considerou-se que o requerido nesta acção tem a sua residência permanente em Lisboa, onde trabalha, e que "provou a existência de laços efectivos de relacionamento social e económico-profissional, que abonam a ideia de um sentimento de pertença à comunidade portuguesa, onde não é indesejado". Julgou-se, nessa base, improcedente a oposição deduzida à aquisição da nacionalidade portuguesa, que foi atribuída ao requerido. 4. A subsequente reclamação do Mº Pº foi, em conferência, indeferida, por maioria. Daí este recurso de apelação. A rematar a alegação do recorrente, vêm formuladas 10 conclusões em que, em síntese, se considera que a prova produzida permite, quando muito, afirmar que existem indícios de um princípio de integração, pelo casamento, sendo poucos os conhecimentos da língua portuguesa por parte do recorrido; e mais, todavia, exigir o artº. 9º, al. a), da Lei da Nacionalidade uma integração efectiva na comunidade nacional, pela comunicação, participação e convivência com essa comunidade, de que não está feita prova; aliás referindo o recorrido, no artigo 8º da sua contestação, que "não se identifica cultural e sociologicamente com Portugal". Houve contra-alegação, e, corridos os vistos legais, cumpre decidir, em vista da matéria de facto já indicada em 2., supra. 5. Remete-se, por brevidade, para a doutrina do Ac. STJ de 2/3/99, BMJ 485/366-II e III, de que há cópia nos autos a fls. 87 ss. Não basta, enfim, para a aquisição da nacionalidade portuguesa o casamento com nacional português e a idoneidade moral e cívica: exige-se a prova de factos que revelem um sentimento de pertença à comunidade nacional. Ora, para além do casamento, - mesmo se subsistente, ao tempo da decisão recorrida, há mais de 7 anos (o que afastará que se esteja perante casamento de ocasião) -, não se vê bem onde na matéria de facto provada se manifestam os considerados laços efectivos de relacionamento social . Segundo se apurou, o ora recorrido, para além de ser casado com cidadã nacional, trabalha, tem conta bancária, cumpre as suas obrigações fiscais, é beneficiário da segurança social, e vive em casa arrendada: o que tudo o M Pº com razão reporta aos artºs. 15º, nº. 1 CRP, e 14º, nº. 1, C.Civ. Em termos de relacionamento social, porém, é isto tudo; não há, nomeadamente, nos autos, notícia dos amigos portugueses referidos (em III) na contra-alegação do recorrido; e relativamente a quem reside em Portugal desde 1994, afiguram-se os factos mencionados pouco para abonar a ideia de um sentimento de pertença à comunidade portuguesa, e a efectiva ligação à comunidade nacional considerada, por maioria, na instância recorrida. Tanto mais assim por parte de quem, com residência em Portugal, já há 8 anos, ao tempo da decisão recorrida, tem (ainda) poucos conhecimentos de língua portuguesa, conseguindo (apenas) fazer-se entender. Para tanto irrelevante a religião seguida, relativamente à qual vale o artº. 13º CRP, nem já, de todo o modo, necessário será mencionar, mais, os indemonstrados conhecimentos dos costumes, da história e dos de mais aspectos da cultura portuguesa, a que alude o voto de vencido. Insuficiente para o efeito o critério utilitário revelado nos artigos 8º e 10º da contestação, não pode, enfim, deixar de dar-se razão a esse voto, e de, com ele, considerar não mostrar-se provado o requisito pre visto na al. a) do artº. 9º da Lei da Nacionalidade - ligação efectiva do requerido à comunidade nacional. 6. Terá, pois, de julgar-se procedente este recurso. E daí a seguinte decisão: Dando provimento ao presente recurso, revoga-se a decisão recorrida. Julga-se procedente esta acção, e ordena-se, em consequência o arquivamento do processo respectivo na Conservatória dos Registos Centrais; à qual deverá, após trânsito, ser enviada certidão deste acórdão. Não são devidas custas (artº. 27º do citado Regulamento da Nacionalidade Portuguesa). Lisboa, 17 de Junho de 2003 Oliveira Barros Salvador da Costa Ferreira de Sousa |