Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
177/07.4PBTMR.S1
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: ISABEL PAIS MARTINS
Descritores: ACÓRDÃO
CÚMULO JURÍDICO
REQUISITOS DA SENTENÇA
PENA ÚNICA
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
FACTOS PROVADOS
NULIDADE DE SENTENÇA
ANULAÇÃO DE JULGAMENTO
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 11/05/2009
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO O RECURSO
Sumário :
I - O legislador, para além de determinar a obrigatoriedade de fundamentação, de facto e de direito, de todos os actos decisórios proferidos no decurso do processo (art. 97.º, n.º 5, do CPP), a qual decorre de imperativo constitucional (art. 205.º, n.º 1), instituiu, para as decisões que conheçam, a final do objecto do processo, uma exigência de fundamentação acrescida.

II - A sentença proferida após a realização da audiência a que se refere o art. 472.º do CPP, com a específica finalidade de determinação da pena única no caso de conhecimento superveniente do concurso, está submetida aos requisitos gerais da sentença enunciados no art. 374.º do CPP.

III -No que respeita aos factos provados deve conter todos os factos que interessam à comprovação da situação de concurso de crimes e à determinação da pena única; por isso, os factos provados devem demonstrar, por um lado, que se mostram preenchidos os pressupostos indicados no art. 78.º, n.ºs 1 e 2, do CP, e, por outro, devem ser suficientes para a determinação da pena única.

IV -O nosso sistema rejeita uma visão atomística da pluralidade dos crimes e obriga a ponderar o seu conjunto, a possível conexão dos factos entre si e a relação da personalidade do agente com o conjunto dos factos: assim, a fundamentação de facto da sentença a proferir após a realização da audiência a que alude o art. 472.º do CPP e para os efeitos do art. 78.º do CP deve conter a indicação das datas das condenações e do respectivo trânsito, a indicação das datas da prática dos crimes objecto dessas condenações e das penas que, por eles, foram aplicadas, a caracterização dos crimes que foram objecto dessas condenações e todos os factos que interessam à compreensão da personalidade do condenado neles manifestada.

V - Se assim não se proceder, para além da decisão não cumprir o requisito da “enumeração dos factos provados” que interessam à decisão fica irremediavelmente prejudicada a própria fundamentação da medida da pena.

VI -A especificação dos fundamentos que presidiram à escolha e à medida da pena integra-se no dever de fundamentação das razões de direito da decisão, a que se refere o art. 374.º, n.º 2, e a omissão de tal especificação determina a nulidade da sentença (art. 379.º, n.º 1, al. a), do CPP).

VII - A falta de referência ao trânsito das decisões é, pura e simplesmente, a omissão de um pressuposto da realização do cúmulo, por conhecimento superveniente do concurso.

VIII - Tal nulidade afecta a validade da audiência de julgamento, na medida em que o seu suprimento passa pela obtenção de elementos – v. g., relatório social, cabal esclarecimento dos antecedentes criminais e a real indicação da data da prática dos crimes –, que a motivação de facto do acórdão não demonstra que tenham sido obtidos pelo tribunal.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça

I


1. Realizada a audiência, nos termos do artigo 472.º do Código de Processo Penal [CPP], para realização do cúmulo jurídico das penas em que o arguido AA, devidamente identificado nos autos, foi condenado nos processos 177/07.4TBTMR, do 3.º juízo do Tribunal Judicial de Tomar, 194/07.4GBTMR (àquele apensado) e 139/07.1GAFZZ, do Tribunal Judicial de Ferreira do Zêzere, por acórdão de 29/06/2009, foi decidido condená-lo na pena única de 11 (onze) anos de prisão.

2. Inconformado, o arguido veio interpor recurso para este Tribunal, rematando a motivação apresentada com a formulação das seguintes conclusões:

«1ª) A pena única de que ora se recorre é manifestamente excessiva face ao quantum que poderia resultar da boa aplicação do art. 77°, n.° 2 do CP.

«2º) Se é certo que os factos praticados pelo arguido revestem alguma gravidade, não menos certo é que aqueles ocorreram num contexto de toxicodependência do recorrente.

«3ª) Aqui chegados, importaria concluir que tão importante como punir, seria tratar, curar, assistir o recluso/doente.

«4ª) Ora, convenhamos que uma pena de prisão de onze anos será um período excessivo para essa "terapêutica", hipotecando-se toda e qualquer possibilidade de ressocialização do agente.

«6ª) (1) Com a decisão proferida foram violados os art. 40° e 77° do CP.»

Termina pedindo que, no provimento do recurso, lhe seja aplicada uma pena única próxima do mínimo legal previsto no artigo 77.º do Código Penal [CP].

3. O Ministério Público, na 1.ª instância, respondeu ao recurso no sentido da confirmação do acórdão recorrido.

4. Admitido o recurso, foram os autos remetidos a esta instância.

5. Na oportunidade conferida pelo artigo 416.º, n.º 1, do CPP, o Exm.º Procurador-geral-adjunto foi de parecer de que o recurso não merece provimento e pronunciou-se, ainda, pela correcção dos lapsos materiais detectados no acórdão – e que evidencia –, nos termos do artigo 380.º, n.os 1, alínea b), e 2, do CPP.

6. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o recorrente não respondeu.

7. Por não ter sido requerida a realização de audiência (artigo 411.º, n.º 5, do CPP), foi decidido, no exame preliminar, julgar o recurso em conferência.

Colhidos os vistos, com projecto de acórdão, realizou-se a conferência.

Dos trabalhos da mesma procede o presente acórdão.


II


1. Na consideração das conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, pelas quais se define o objecto do recurso (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), a questão trazida à discussão pelo recorrente circunscreve-se à medida da pena única, que o recorrente tem por excessiva.

2. A análise do acórdão recorrido mostra o que passaremos a referir.

2.1. Foi dada por assente a seguinte matéria de facto:

« AA foi condenado:

«1- Nos presentes autos, por decisão proferida a 19.05.2004 e por factos de Setembro de 2003 de 1997 pela prática de:

«Dois crimes de condução sem habilitação legal (artigo 3º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 02.98 de 03.01 e 75º e 76º do C.Penal) na pena de dezoito meses de prisão, para cada um.

«Dois crime de roubo (p. e p. pelos art.ºs 75º e 76º, 210º nº1 do C.Penal) na pena de dois anos e seis meses de prisão, para cada um.

«2- Nos autos de processo comum colectivo comum colectivo 139/07.1GAFZZ por decisão proferida a 19.05.2004 e por factos de Setembro de 2003 de 1997 pela prática de:

«Um crime de condução sem habilitação legal (artigo 3º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 02.98 de 03.01) na pena de dezoito meses de prisão.

«Um crime de condução de veículo em estado de embriaguez (artigo 292º, n.º 1, do Código Penal) na pena de seis meses de prisão.

«Um crime de roubo (p. e p. pelos art.ºs 73º, 210º nºs 1 e 2, al. b), com referência ao disposto no art. 204º nº 2 al. a) e f) na pena de cinco anos de prisão.

«Um crime de detenção de arma proibida (p e p nos art.ºs. 86º, n.º 1 alínea d), da Lei 5/2006 de 23 de Fevereiro, por referência aos art. 2º, n.º 1 alínea l), art. 3º, n.º 2, alínea f) e art. 4º, n.º 1 e 2 do mesmo diploma) na pena de um ano de prisão.

«3- Nestes autos, do seu CRC consta que:

«José Luís Maurito foi condenado, em cúmulo jurídico operado no âmbito dos autos de Processo Comum Colectivo, nº 274/00.7PCCBR da Vara de competência Mista, 2ª secção de Coimbra, pela prática de crime de furto simples, p.p. pelo artigo 203º, nº1CP(A), um crime de tráfico de estupefacientes, de menor gravidade p.p. pelo artigo 25, al. a) do DL 15/93 de 22.01, um crime de desobediência qualificada, p.p. pelo artigo 348ª, nº1 e nº2 CP, um crime de condução sem habilitação legal, p.p. pelo artigo 3º, nº2 do DL 2/98 (B), um outro crime de furto, p.p. pelo artigo 203º, nº1 CP, um crime de condução perigosa de veículo automóvel, p.p. pelo artigo 291º, nº1. al. b) CP, um crime de resistência sobre funcionário p.p. pelo artigo 347º CP (C), um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. pelo artigo 292º CP e um crime de condução sem habilitação legal, p.p. pelo artigo 3º, nº2 do DL 2/98 (D), na pena única de cinco anos e seis meses de prisão.

«No âmbito deste processo, o arguido foi colocado em liberdade definitiva, com extinção da pena, em 09.10.05.

«Os factos praticados no âmbito destes autos, objecto deste processo foram praticados quando ainda não haviam decorrido 5 anos após a colocação do arguido em liberdade.

«Mostrando assim não lhe terem servido de advertência suficiente contra o crime, as condenações anteriores.

«Por factos ocorridos em 10 Fevereiro de 2000, julgados no âmbito do processo comum singular nº 274/00.7 PCCBR, do 2º Juízo do Tribunal de Coimbra, o arguido foi condenado, por decisão datada de 23 de Abril de 2002, transitado em julgado no dia 8 de Maio de 2002, na pena de 9 (nove) meses de prisão, pela prática de um crime de furto, previsto e punido pelo artº 203º, nº1 do Código Penal.

«Naquele mesmo processo, por decisão datada de 17 de Dezembro de 2002, transitada em julgado no dia 10 de Janeiro de 2003, o arguido foi condenado, em cúmulo jurídico, na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

«O arguido esteve ainda preso à ordem do processo comum colectivo nº203/00.8 PBTMR, do 1º Juízo do Tribunal judicial de Tomar [cuja pena foi englobada no cúmulo jurídico efectuado processo comum colectivo nº274/00.7 PCCBR, da 1ª Secção da Vara de Competência Mista de Coimbra].

«Do CRC do arguido consta ainda que o mesmo foi condenado no PCC nº 112.00 do 1º Juízo do Tribunal de Tomar transitado em julgado em 3.7.01 em cúmulo jurídico com as penas dos processos Comum Colectivo nºs 157.99 da 2ª Vara Criminal do Porto e nº 86.99 do 2º Juízo do Tribunal de Tomar na pena de 8 anos de prisão por tráfico de estupefacientes, desobediência qualificada e condução sem habilitação legal.

«Que o mesmo foi condenado no PS nº 16.00 do 4º Juízo Criminal de Coimbra na pena de 90 dias de multa por condução sem habilitação legal, transitado em julgado a 18.1.00;

«Que o mesmo foi condenado no PCC nº 29.98 do Tribunal de Círculo de Pombal na pena de 3 anos e 6 meses de prisão por falsidade de depoimento e declarações transitado em julgado a 12.6.99.

«Que o mesmo foi condenado no Proc. Sumário nº 262.92 do Tribunal Judicial de Ourém na pena de 50 dias de prisão substituídos por igual tempo de multa à taxa diária de 250$00 por crime de injúrias e condução ilegal, por decisão datada de 12.5.92.

«Que o mesmo foi condenado no P Comum nº 446.91 do Tribunal de Círculo de S. João da Madeira na pena de 7 meses de prisão, Que lhe foi perdoada, por falsidade declarações e por decisão datada de 29.03.93.

«Que o mesmo foi condenado no PCC nº 167.92 do Tribunal de Círculo de Tomar na pena de 160 dias de multa à taxa diária de 300$00, por detenção de arma proibida e por decisão datada de 20.04.93.

«Que o mesmo foi condenado no PCS nº 155.93 do Tribunal de Círculo de Tomar na pena de 25 dias de multa à taxa diária de 200$00, por introdução em casa alheia e por decisão datada de 30.05.95.

«Que foi condenado no PCC nº 112.95 do Tribunal de Círculo de Coimbra na pena de sete meses de prisão, por falsas declarações e por decisão datada de 17.03.97.

«Que foi condenado no PCS nº 102.97 do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra na pena de dez meses de prisão pela prática de um crime de evasão e por decisão datada de 30.06.97.

«Que foi condenado no PCC nº 171.94 do Tribunal de Círculo de Tomar na pena de dois nãos e oito meses de prisão pela prática de um crime de roubo e por decisão datada de 16.10.97.

«Que foi condenado no PCS nº 370.96 do Tribunal judicial da Comarca de Coimbra na pena de quatro meses e prisão pela prática de um crime de ofensas corporais e por decisão datada de 19.12.97.

«Que o mesmo foi condenado no PCS nº 528.96 do 3º juízo Criminal do Tribunal Judicial de Coimbra na pena oito meses de prisão, por detenção de arma proibida e por decisão datada de 03.02.98.

«Que foi condenado no PCS nº 19.96 do Tribunal Judicial de Alvaiázere na pena de 40 dias de prisão, por falso testemunho e por decisão datada de 26.02.98.

«Que foi condenado no PCC nº 29.98 do Tribunal de Círculo Judicial de Pombal na pena única de 4 anos e seis meses de prisão e vinte cinco dias de multa, á taxa diária de 200$00, por decisão datada de 28.10.98 (englobando as penas aplicadas nos autos do PCC n.º 347.95, nº 112.95,, do Tribunal de Círculo de Coimbra, n.º102.9 do 2º Juízo Criminal de Coimbra, nº 370.96 do 1º Juízo Criminal de Coimbra, n.º528.96 do 3º Juízo Criminal de Coimbra e n.º 155.94 do 2º juízo do Tribunal judicial de Tomar).

«Que foi condenado no PCC nº 369.98 do 3º Juízo Criminal do Porto na pena de sete meses de prisão pela prática de um crime de falsificação de documento, por decisão datada de 10.03.99.

«Que foi condenado no Proc. Sumário nº 64.00 do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Tomar na pena de cento e vinte dias de multa à taxa diária de 250$00, pela prática de um crime de condução ilegal e por decisão datada de 14.04.00.

«Foi ainda condenado, nos autos de processo comum colectivo, n.º 88.06 0TBTMR do 1º Juízo do Tribunal judicial de Tomar, por decisão datada de 02.10.2006, transitada a 18.10.2006 no seguinte:

«Como autor material e em concurso real de um crime de furto simples p. e p. pelo artº 203 do C.Penal na pena de 18 meses de prisão; um crime de condução perigosa de veículo rodoviário p.e.p pelo artº 291 nº 1 al b) do CP na pena de 24 meses de prisão; e um crime de condução de veículo sem habilitação legal p.e.p. pelo artº 3 nº 2 do DL nº 2/98 de 3/1 na pena de 12 meses de prisão.

«Em cúmulo jurídico na pena única de 3 (três) anos de prisão.

«Pena esta suspensa por um período de 5 anos com a condição de o arguido:

«1) se tratar em comunidade terapêutica à sua escolha em regime de internamento, devendo para tanto proceder à busca de comunidade que o receba.

«2) Caso não consiga ser recebido, documentar nos autos que lhe foi recusada a entrada e os motivos de tal recusa e neste caso dirigir-se ao CAT da área da sua residência para obter tratamento.

«3) De 3 em 3 meses documentar nos autos o estado em que se encontra o seu tratamento.

«4) Se submeter às regras de um plano individual de readaptação social a elaborar pelos técnicos do IRS e que acompanharão o seu desenvolvimento.

«5) Responder comparecendo a todas as solicitações e pedidos de comparência que lhe sejam feitos pelo IRS ou outras instituições.

«6) Não contactar com toxicodependentes e não frequentar lugares relacionados com o tráfico e o consumo designadamente o Bairro da Rosa em Eiras, Coimbra.»

2.2. A motivação da decisão de facto revela que os factos dados por provados tiveram por base, exclusivamente, prova documental junta aos autos.

Sob a epígrafe «Indicação das provas e sua análise crítica», diz-se:

«Os factos provados em 1 e 3: fundaram-se nos acórdãos destes autos de fols. 212 a 239 e 354 a 385.

«Os factos provados em 2: fundaram-se no acórdão cuja certidão se encontra junta a fols. 263 a 301.

2.3. No plano da fundamentação jurídica, consta da decisão recorrida o seguinte:

«Nos termos do art. 78.°, n.º 1 do Código Penal, se, depois de uma condenação transitada em julgado, mas antes de a respectiva pena estar cumprida, prescrita ou extinta, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo 77.°, que prescreve as normas de punição do concurso de crimes.

«O n.º 2 manda aplicar o mesmo regime no caso de todos os, crimes terem sido objecto separadamente de condenações transitadas em julgado.

«Assim, nos termos do disposto no artigo 77º, n.º 1, do Código Penal “quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.”

«Neste caso, a pena aplicável terá como limite superior a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de penas de prisão e 900 dias tratando-se de penas de multa; e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, conforme o disposto no art.º 77º, n.º 2, deste mesmo diploma.

«Expostos que ficam estes critérios vejamos então o caso dos autos:

«Atentas as regras legais precedentemente expostas, a pena abstracta aplicável ao concurso determinado pelas penas parcelares referidas nos factos 1) e 5) é a de prisão de 5 a 16 anos.

«Considerando em conjunto os factos e a personalidade do arguido tal como vertido nos acórdãos condenatórios, verificamos que o arguido tem vindo a praticar um elevado número de crimes, diversificados, tendo cumprido penas efectivas de prisão, voltando a reincidir, sendo até os últimos crimes mais graves já que veio a ser condenado em crimes de roubo passando a usar de violência contra as pessoas para a subtracção de bens patrimoniais.

«Este é um facto de grande importância para o achamento da pena única a aplicar, já que pode afirmar-se que o arguido para além de comportamentos associais vem vindo a ser cada vez mais violento. Visando a aplicação da pena de prisão a preparação do agente para regressar à vida em sociedade sem delinquir (ressocialização), poderemos inferir que o período de reclusão já decorrido ainda não terá produzido algum efeito socializador no arguido, e que a aplicação de uma pena única não elevada, atento o tipo de crimes praticados, produzirá efeitos mais nefastos no tangente à integração futura do arguido na sociedade dada elevada necessidade de prevenção especial que nos autos se impõem.

«Assim, tudo ponderado, considera-se adequada a pena única de onze anos de prisão.»

3. Delimitado o objecto do recurso à questão da medida da pena única, como, antes, enunciámos, sempre a este Tribunal cumpre oficiosamente conhecer de nulidades do acórdão que não devam considerar-se sanadas (artigo 410.º, n.º 3, do CPP).

Ora, o acórdão recorrido é nulo, como passaremos a demonstrar.

3.1. Sobre os requisitos da sentença dispõe o n.º 2 do artigo 374.º do CPP que: «2 – Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal».

E a alínea a) do n.º 1 do artigo 379.º comina a nulidade da sentença que: «a) […] não contiver as menções referidas no artigo 374.º, n. os 2 e 3, alínea b)».

O legislador, para além de determinar a obrigatoriedade de fundamentação, de facto e de direito, de todos os actos decisórios proferidos no decurso do processo (artigo 97.º, n.º 5, do CPP), a qual decorre de imperativo constitucional (artigo 205.º, n.º 1, da CRP), instituiu, para as decisões que conheçam, a final, do objecto do processo, uma exigência de fundamentação acrescida.

Com efeito, «a fundamentação dos actos é imposta pelos sistemas democráticos com finalidades várias. Permite a sindicância da legalidade do acto, por uma parte, e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correcção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, actuando por isso como meio de autodisciplina» (2) .

3.2. A sentença proferida após a realização da audiência a que se refere o artigo 472.º do CPP, com a específica finalidade de determinação da pena única no caso de conhecimento superveniente do concurso, está submetida aos requisitos gerais da sentença enunciados no artigo 374.º do CPP.

No que respeita à enumeração dos factos provados deve conter todos os factos que interessam à comprovação da situação de concurso de crimes e à determinação da pena única.

Por isso, os factos provados devem demonstrar, por um lado, que se mostram preenchidos os pressupostos enunciados no artigo 78.º, n.os 1 e 2, do Código Penal [CP] e, por outro, devem ser suficientes para a determinação da pena única.

3.3. Segundo o critério do artigo 77.º, n.º 1, segunda parte, do CP, na determinação da pena do concurso – no quadro da moldura abstracta formada nos termos do n.º 2 do mesmo artigo – são considerados em conjunto os factos e a personalidade do agente.

No nosso sistema, a pena conjunta pretende ajustar a sanção – dentro da moldura formada a partir de concretas penas singulares – à unidade relacional de ilícito e de culpa, fundada na conexão auctoris causa própria do concurso de crimes.

Como destaca Cristina Líbano Monteiro (3):

«(...) quem julga há-de descer da ficção, da visão compartimentada que está na base da construção da moldura e atentar na unicidade do sujeito em julgamento. A perspectiva nova, conjunta, não apaga a pluralidade de ilícitos, antes a converte numa nova conexão de sentido. Adverte que o todo não equivale à mera soma das partes e repara, além disso, que os mesmos tipos legais de crime são passíveis de relações existenciais diversíssimas, a reclamar uma valoração que não se repete de caso para caso. A esse novo ilícito corresponderá uma nova culpa. Que continua a ser culpa pelos factos em relação. Afinal, a avaliação conjunta dos factos e da personalidade de que fala o CP.»

O que significa que o nosso sistema rejeita uma visão atomística da pluralidade dos crimes e obriga a ponderar o seu conjunto, a possível conexão dos factos entre si e a relação da personalidade do agente com o conjunto de factos.

3.4. A fundamentação de facto da sentença a proferir após a realização da audiência, nos termos do artigo 472.º do CPP e para os efeitos do artigo 78.º do CP, deve conter, por isso, a indicação das datas das condenações e do respectivo trânsito, a indicação das datas da prática dos crimes objecto dessas condenações e das penas que, por eles, foram aplicadas, a caracterização dos crimes que foram objecto dessas condenações e todos os factos que interessam à compreensão da personalidade do condenado neles manifestada.

Como tem sido afirmado, neste Tribunal (4), se não é necessário nem útil que a decisão que efectue o cúmulo jurídico de penas, aplicadas em decisões já transitadas, enumere exaustivamente os factos dados por provados nas decisões anteriores já é imprescindível que contenha uma descrição, ainda que sumária, desses factos, de modo a permitir conhecer a realidade concreta dos crimes anteriormente cometidos e a personalidade do arguido, o que passa, designadamente, pelo esclarecimento do seu percurso de vida.

3.5. Se assim não se proceder, para além de a decisão não cumprir o requisito de “enumeração dos factos provados” que interessam à decisão, fica irremediavelmente prejudicada a própria fundamentação da medida da pena.

Com efeito, na elaboração da sentença condenatória releva, ainda, o artigo 375.º do CPP que, no seu n.º 1, dispõe, nomeadamente, que «a sentença condenatória especifica os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada». Trata-se da concretização, a nível processual, da imposição resultante do n.º 3 do artigo 71.º do CP - «3 – Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena».

Numa simplificação das coisas, poderíamos ser tentados a afirmar que, como nenhuma norma comina a nulidade para a inobservância do dever de especificação dos fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada, imposto pelo artigo 375.º, n.º 1, do CPP, tal inobservância consubstanciaria mera irregularidade (5) .

Entendemos, porém, que a especificação dos fundamentos que presidiram à escolha e à medida da pena se integra no dever de fundamentação das razões de direito da decisão, a que se refere o n.º 2 do artigo 374.º, e que a omissão de tal especificação determina, portanto, a nulidade da sentença (artigo 379.º, n.º 1 alínea a), do CPP).

Os motivos de direito que fundamentam a decisão não são, assim, apenas as razões jurídicas relativas à qualificação jurídica dos factos dados por provados, mas também as considerações que interessam à escolha da pena (quando ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa de liberdade – artigo 70.º do CP) e à determinação da medida concreta da pena. A operação complexa de determinação da medida concreta da pena deve ser esclarecida na sentença por forma a tornar compreensíveis as razões da medida da pena e, quando for caso disso, de não opção por uma pena de substituição.

No caso de realização de cúmulo jurídico de penas, a específica fundamentação da pena única determinada em função da ponderação conjunta dos factos e da personalidade do arguido, na dimensão assinalada supra (cfr. II 3.3.) também deve ser esclarecedora das razões por que o tribunal “chegou” a determinada pena única.

O que obriga a uma especial fundamentação, «só assim se evitando que a medida da pena do concurso surja como fruto de um acto intuitivo – da “arte” do juiz uma vez mais – ou puramente mecânico e, portanto, arbitrário» (6).

A fundamentação deve passar, portanto, pela avaliação da conexão e do tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifica e pela avaliação da personalidade unitária do agente. Particularizando este segundo juízo – e para além dos aspectos habitualmente sublinhados, como a detecção de uma eventual tendência criminosa do agente (7) ou de uma mera pluriocasionalidade que não radica em qualidades desvaliosas da personalidade – o tribunal deverá atender a considerações de exigibilidade relativa e à análise da concreta necessidade de pena resultante da inter-relação dos vários ilícitos típicos (8) .

3.6. A fundamentação de facto [enumeração dos factos provados) do acórdão recorrido é manifestamente deficiente.

3.6.1. Referindo os processos em que o arguido foi condenado, a natureza dos crimes cometidos e as penas parcelares cominadas, não refere o trânsito das decisões condenatórias e, verdadeiramente, não contém a data da prática dos factos – «Setembro de 2003 de 1997» é uma indicação obscura, por si mesma insusceptível de esclarecer a data da prática dos factos.

O que significa que a fundamentação de facto do acórdão não contém os factos necessários para a comprovação dos pressupostos do concurso de crimes.

3.6.2. Neste aspecto, não aderimos, porém, à tese sustentada pelo Ex.mo Procurador-geral-adjunto da existência de simples lapsos materiais susceptíveis de correcção, neste Tribunal, nos termos do artigo 380.º, n.os 1, alínea b), e 2, do CPP.

Com efeito, a omissão da indicação do trânsito das decisões condenatórias, a falta de indicação da data da prática dos crimes, ainda que, neste ponto, se manifeste um evidente erro de escrita, e, até, a verificação da correcção das datas das condenações (a coincidência das datas indicadas – 19/05/2004 – e a sua anterioridade relativamente à data do acórdão suscitam dúvidas sérias sobre a sua exactidão), só poderiam ser ultrapassadas, por este tribunal, com acesso à prova documental em que se fundou a decisão recorrida, ou seja, por via do conhecimento de facto, e consequente alteração da decisão em matéria de facto. O que os poderes de cognição deste tribunal não comportam.

E, de qualquer modo, só relativamente à indicação da data da prática dos crimes se pode considerar a existência de erro material porque a referência que consta do acórdão é a demonstração clara do erro de escrita.

Já quanto aos restantes aspectos, o mesmo não se pode afirmar.

A falta de referência ao trânsito das decisões é pura e simplesmente a omissão de um pressuposto da realização do cúmulo, por conhecimento superveniente do concurso.

Pode estranhar-se a coincidência das datas das condenações, nos dois processos e, até, o tempo, entretanto decorrido, até à realização do julgamento para realização do cúmulo, mas o que é certo é que o texto do acórdão não fornece a demonstração clara de que, neste particular, o tribunal incorreu em erro material.

3.6.3. Para além destes aspectos, a fundamentação de facto do acórdão nada, afinal, esclarece sobre os “factos” que foram objecto de condenação, nos processos, em causa, impedindo, por isso, uma avaliação global [conjunta] dos mesmos.

São, ainda, os factos provados nos processos referidos no acórdão recorrido que relevam para que seja possível avaliar a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifica e a personalidade do agente neles manifestada.

Para o cumprimento do requisito de “enumeração dos factos provados”, não basta, portanto, que o tribunal se limite a indicar os crimes que foram objecto de condenação nos processos, haveria, ainda, que especificar, embora de forma concisa, repete-se, os factos que os consubstanciam.

Por outro lado, a fundamentação de facto do acórdão é, também, omissa quanto às condições pessoais do recorrente e ao seu percurso de vida. Ou seja, não foram apurados factos que relevam para o conhecimento da personalidade do recorrente e para a definição da sua culpa pelos factos em relação.

Com efeito, as referências aos antecedentes criminais do recorrente não são, em si mesmas, suficientes e bastantes para esclarecer esses aspectos.

Verificando-se, ainda, que o registo efectuado dos antecedentes criminais do arguido, embora aparentemente exaustivo, nem sequer é verdadeiramente elucidativo do trajecto criminoso do recorrente.

A compreensão do trajecto criminoso do recorrente reclamava, nomeadamente, que fosse esclarecido quando se iniciou, que fossem compreensíveis as relações de concurso e de sucessão que se estabelecem entre os crimes cometidos, no aspecto da sucessão de crimes importava, ainda, esclarecer os crimes que foram cometidos depois de o recorrente já ter sofrido penas de prisão, para o que interessava, também, saber que penas de prisão efectivamente cumpriu e em que períodos ocorreu esse cumprimento.

O rol de antecedentes criminais do recorrente, como foi levado ao elenco dos factos provados é, nessa perspectiva, uma amálgama praticamente inextricável.

Há uma sistemática omissão de indicação da data da prática dos crimes.

Registaram-se condenações em penas parcelares, que foram englobadas em penas únicas, sem que, relativamente às penas únicas, se especificassem todas as penas parcelares que englobaram. Caso da pena única cominada no processo n.º 274/00.7PCCBR, referida, aliás, por duas vezes, só se ficando a saber que englobou a pena de 9 meses de prisão em que o recorrente foi condenado, nesse processo, por um crime de furto simples, e a pena, não concretizada, aplicada no processo n.º 203/00.8PBTMR.

Já no caso da pena única em que o recorrente foi condenado no processo n.º 29/98, do Tribunal de Círculo de Pombal, se aparecem indicados os processos que foram englobados, com indicação, anterior, das penas aplicadas, nesses processos (salvo, quanto ao processo n.º 155/94, do 2.º juízo do Tribunal Judicial de Tomar, a não ser que se trate de lapso e seja o, antes indicado, processo n.º 155/93 do Tribunal de Círculo de Tomar) não se mostra clarificado que se tenha consignado que, por decisão datada de 28/10/98, o recorrente foi condenado na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão e 25 dias de multa, mas que também se tenha consignado que, por decisão transitada em 12/06/1999, foi condenado na pena de 3 anos e 6 meses de prisão.

Quanto às penas únicas de prisão em que o recorrente foi condenado (pena única de 5 anos e 6 meses de prisão, no processo n.º 274/00.7PCCBR, pena única de 8 anos de prisão, no processo 112/00, do 1.º juízo do Tribunal de Tomar e pena única – qual seja não está esclarecido – aplicada no processo 29/98, do Tribunal de Círculo de Pombal), só relativamente à pena única aplicada no processo n.º 274/00.7PCCBR consta, mas apenas isso, a data em que foi colocado em liberdade definitiva, quanto às outras penas desconhece-se tudo o que se refere ao seu cumprimento.

Também quanto à pena única de 3 anos de prisão, suspensa por um período de 5 anos, sob condições, em que o recorrente foi condenado, por decisão de 02/10/2006, transitada, proferida no processo n.º 88/06OTBTMR, do 1.º juízo do Tribunal Judicial de Tomar, nada foi levado ao elenco dos factos provados quanto ao cumprimento ou incumprimento, por parte do recorrente, das condições que lhe foram impostas, e à própria subsistência da suspensão da execução da pena.

Sendo certo, também, que a falta da real indicação da data da prática dos crimes que integram o concurso de crimes, objecto de apreciação, neste processo, não permite conclusões válidas sobre a falência do plano de tratamento e readaptação que ao recorrente foi imposto naquele outro processo.

3.7. Também no aspecto da fundamentação jurídica da pena única, o acórdão é manifestamente deficiente. Deficiência esta que aparece como consequência necessária da insuficiente fundamentação de facto.

A fundamentação da complexa determinação da pena única esgota-se em generalidades, sem efectivo conteúdo útil, uma vez que não esclarece de que jeito o tribunal apreciou os factos – ausentes do acórdão – e nada elucida sobre o modo como o tribunal avaliou a personalidade do recorrente neles manifestada.

Uma vez que, quando se refere aos antecedentes criminais do recorrente – deficientemente esclarecidos na fundamentação de facto, como demonstrámos –, fá-lo, unicamente, na perspectiva das exigências de prevenção especial que, no caso, se manifestam.

3.8. Pelas razões expostas, e em suma, não pode deixar de concluir-se que as deficiências reveladas na fundamentação de facto do acórdão com prejuízo da própria fundamentação jurídica da determinação da pena única, conformam a nulidade do acórdão do artigo 379.º, n.º 1, alínea a), com referência ao artigo 374.º, n.º 2, do CPP, por insuficiência de fundamentação de facto e de direito.

A nulidade declarada afecta, ainda, a validade da audiência de julgamento, realizada nos termos do artigo 472.º do CPP, na medida em que o seu suprimento passa pela obtenção de elementos [v.g., um relatório social para julgamento (artigo 370.º do CPP), o cabal esclarecimento dos antecedentes criminais do recorrente, na dimensão assinalada], que a motivação de facto do acórdão não demonstra que tenham sido obtidos pelo tribunal, quando o artigo 472.º do CPP prevê que o tribunal ordene oficiosamente as diligências que se lhe afigurem necessárias para a decisão.

Pelo que, nos termos do artigo 123.º do CPP, determinamos, ainda, a repetição da audiência a que se refere o artigo 472.º do CPP.


III


Termos em que, declaramos a nulidade do acórdão e determinamos que, após realização de nova audiência, nos termos do artigo 472.º do CPP, seja proferido novo acórdão.

Não há lugar a tributação.

Supremo Tribunal de Justiça, 5 de Novembro de 2009

Isabel Pais Martins (Relatora)

Manuel Braz (com declaração de voto, segundo a qual “Concordo com a decisão de fazer voltar o processo à fase da audiência, mas seguiria via diversa. (…) No caso, existe insuficiência de fundamentação, mas ocorre um vício maior, que não invalida apenas a sentença, mas a própria audiência: o vício da insuficiência da matéria de facto – art. 410.º, n.º 2, al. a) –, que, esse sim é de conhecimento oficioso. (…) Reenviaria, pois, o processo, nos termos do art. 426.º, n.º 1”)

Carmona da Mota (“desempatando, como presidente da secção, a favor da Exma. Relatora”)

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1- Segue-se a numeração original.

2- Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, Editorial Verbo, 2000, p. 294.

3- «A pena “unitária” do concurso de crimes», Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 16.º, n.º 1, Janeiro-Março 2006, Coimbra Editora, p. 151 e ss.

4- Cfr., dentre os mais recentes, os acórdãos de 14/05/2009 (processo n.º 170/04.9PBVCT), e de 21/05/2009 (processo n.º 2218/05.0GBABF).

5- Cfr. artigo 118.º, n. os 1 e 2, do CPP.

6- Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, p. 291.

7- E só neste caso será adequado atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal.

8- Neste sentido, cfr. autores e ob. cit, respectivamente, p. 164 ( Revista cit.) e p. 291 (Consequências ... cit.)