Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JSTJ00025156 | ||
Relator: | AMADO GOMES | ||
Descritores: | AMNISTIA PRESSUPOSTOS REINCIDÊNCIA REJEIÇÃO DE RECURSO | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | SJ199405180461373 | ||
Data do Acordão: | 05/18/1994 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | REC PENAL. | ||
Decisão: | REGEITADO O RECURSO. | ||
Área Temática: | DIR CRIM - TEORIA GERAL. | ||
Legislação Nacional: | CPP87 ARTIGO 311 N1 ARTIGO 368 N1 ARTIGO 388 N1 ARTIGO 401 N1 B ARTIGO 420. L 23/91 DE 1991/07/04 ARTIGO 1 F ARTIGO 3. CP82 ARTIGO 76 N4 ARTIGO 126 N4. | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | I - A amnistia, consagrada no artigo 126 do Código Penal pode ser própria ou imprópria. É própria a que extingue o crime e intrevém antes da sentença penal transitada em julgado, operando, assim, a extinção do procedimento criminal. É imprópria a que é concedida após condenação definitiva, fazendo cessar a execução da pena principal e das penas acessórias. II - Para efeitos de reincidência a amnistia imprópria da pena equipara-se ao seu cumprimento. III - É de rejeitar o recurso a que falte motivação, legitimada de quem o interpõe ou for manifesta a sua improcedência. | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Acusado pelo Ministério Público da prática, em 9 de Agosto de 1990, entre as 3 e as 5 horas, de um crime tentado de furto qualificado, no valor de 25000 escudos, previsto e punido pelos artigos 22, 23, 296 e 297 n. 2 c), do Código Penal, foi julgado no 4 Juízo Criminal de Lisboa o arguido A. Por acórdão de 29 de Setembro de 1993 foi julgada procedente a acusação e o arguido considerado autor material de tal crime mas, nos termos do disposto nos artigos 1 f) e 3 da Lei n. 23/91, de 4/7, foi julgado extinto, por amnistia, o procedimento criminal por tal crime. O arguido interpôs recurso desta decisão, com os seguintes fundamentos: 1 - Houve alteração substancial dos factos descritos na acusação porque, dizendo esta que o arguido foi surpreendido quando se preparava para desaparafusar a roda do veículo, o acórdão deu como provado que o arguido desaparafusou alguns parafusos da roda do veículo. 2 - Não se entendendo assim, foi violado o artigo 358 do Código de Processo Penal visto que tratando-se de alteração com relevo para a decisão, devia ter sido comunicada a alteração ao arguido. 3 - Não há no percurso quaisquer indícios da existência de uma chave de velas e de uma chave escavada, consideradas no acórdão. 4 - O facto de o crime ter sido amnistiado não lhe retira interesse processual porque as amnistias constam do registo criminal e ainda por razões de dignidade pessoal. E concluiu pedindo: a) Anulação do acórdão nos termos dos artigos 359 n. 1 f) e 379 h); ou b) nos termos dos artigos 358 1 f) e 379 h); c) o acórdão terá sempre de ser de absolvição por terem sido considerados factos não existentes no processo. Respondeu o Ministério Público com desenvolvida e fundamentada argumentação concluindo que o recurso deve ser rejeitado ou não provido. Neste Supremo Tribunal o Excelentíssimo Procurador- -Geral Adjunto teve vista dos autos. O relator suscitou a questão da rejeição do recurso. Foram colhidos os vistos legais, vindo os autos à conferência para ser decidida tal questão. Passa-se a decidir. Em processo penal, o arguido só tem legitimidade para recorrer de decisões contra ele proferidas, de acordo com o disposto no artigo 401 n. 1 h) do Código de Processo Penal, tal como todos os artigos que venham a ser citados sem menção de diploma. O acórdão recorrido não é condenatório, contrariamente ao que entende o recorrente, nem foi contra ele proferido. É certo que conhecem desnecessariamente do mérito da causa mas, ao dar como provado o crime apontado pela acusação, aplicou a amnistia prevista na Lei n. 23/91, de 4 de Julho - artigo 1 f) e 3 - e declarou extinto o procedimento criminal, o que equivale à absolvição da instância. Não houve, portanto, condenação e a decisão foi favorável ao arguido. Acrescentar-se-à que este nem sequer devia ter sido julgado pois a própria acusação já não devia ter sido recebida. Com efeito, a acusação foi deduzida em 24 de Janeiro de 1992 (folhas 45 e 46), data em já estava em vigor a Lei n. 23/91 e o processo fornecia todos os elementos necessários à aplicação desta providência: - data dos fatos; - tipo de crime e forma tentada; - ausência de prejuízos, tendo em vista o artigo 3 da citada Lei; - requisitos do n. 4 do artigo 126 do Código Penal. Não tendo sido aplicada a amnistia nesse momento nem na oportunidade dos artigos 311 n. 1 e 388 n. 1, devia o Tribunal ter conhecido dela na elaboração da sentença (artigo 368 n. 1), como questão prévia, não conhecendo do mérito da causa. Por sua vez, o arguido não alegou esta excepção peremptória. Nada disto foi feito e o arguido acabou por ser julgado, sendo certo, porém, que para se aplicar uma amnistia não é necessário proceder ao julgamento a fim de ser provada a existência do crime. Não obstante o facto de o arguido ter sido julgado e ter-se provado que praticou o crime tentado que lhe era imputado, não significa que tenha legitimidade para interpor recurso da decisão proferida. O artigo 126 n. 1 do Código Penal distingue a amnistia própria da imprópria: a primeira é a aplicada antes de ter havido condenação e extingue o procedimento criminal, como no caso destes autos; a amnistia imprópria é a que é aplicada depois da condenação, a qual apenas faz cessar a execução, tanto da pena principal como das acessórias, o que significa que a condenação não se apaga. Com a aplicação da amnistia própria tudo se passa como se o crime não tivesse sido praticado, não se produzindo, portanto, quaisquer efeitos futuros, designadamente quanto à reincidência. Já o mesmo não sucede na aplicação da amnistia imprópria porque a extinção da execução da pena equipara-se ao seu cumprimento para efeitos da reincidência - artigo 76 n. 4 do Código Penal. Daí que atrás se tenha dito que não houve condenação e que a decisão tenha sido favorável ao recorrente. A amnistia própria é impessoal; é dirigida ao crime e não aos seus agentes. O arguido não tem, assim, legitimidade para recorrer. E não tem, também, interesse processual. Segundo a sua alegação, o seu interesse processual advém de razões de dignidade pessoal e do facto de as amnistias constarem do registo criminal. Quanto à sua dignidade pessoal, não chegou a ser ofendida porque não chegou a haver condenação, tudo se passando como se não tivesse praticado os factos. Não se alterou a presunção de inocência que já existia antes do julgamento. O averbamento da amnistia no registo criminal em nada o prejudica porque, como já se disse, não produz efeitos na reincidência e apaga os efeitos do recebimento da acusação que, entretanto, ali foi averbada (vd. folha 68) e, este, é que poderia prejudicá-lo. Estando apagados os efeitos do crime, com carácter retroactivo, não há que apreciar quaisquer outras questões. Nestes termos, atento o disposto no artigo 420 do Código de Processo Penal, acorda-se em rejeitar o recurso, condenando-se o recorrente em 4 UC'S de taxa de justiça. Lisboa, 18 de Maio de 1994. Amado Gomes; Ferreira Vidigal; Castanheira da Costa. Decisão impugnada: Acórdão de 29 de Setembro de 1993 do Quarto Juízo Criminal de Lisboa, Primeira Secção. |