Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00030981 | ||
Relator: | AUGUSTO ALVES | ||
Descritores: | ABUSO DE LIBERDADE DE IMPRENSA DIFAMAÇÃO TRIBUNAL COMPETENTE DOMICÍLIO | ||
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Nº do Documento: | SJ199611130001413 | ||
Data do Acordão: | 11/13/1996 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC PENAL. | ||
Decisão: | DECLARAÇÃO DE COMPETÊNCIA. | ||
Indicações Eventuais: | CASTRO MENDES TEORIA GERAL 1967 1/228. DIAS MARQUES CCIV67 ANOT PAG67. | ||
Área Temática: | DIR PROC PENAL - RECURSOS. DIR CIV - TEORIA GERAL. DIR CRIM - ABUSO LIBERDADE IMPRENSA. | ||
Legislação Nacional: | CCIV66 ARTIGO 82 ARTIGO 87 N1. CP82 ARTIGO 164 N1 ARTIGO 167 N2 ARTIGO 168 N2 ARTIGO 437 N1 N2. L 58/90 DE 1990/09/07 ARTIGO 41 N2 ARTIGO 42 ARTIGO 53. CP95 ARTIGO 386. | ||
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Sumário : | I - O tribunal competente para conhecer dos crimes injúria, difamação ou ameaça é o do domicílio do ofendido. II - A lei - artigo 53 da Lei 58/90 de 7 de Setembro - não distingue entre domicílio efectivo e o necessário. III - A função de vereador municipal enquadra-se no conceito de funcionário público prevenido no artigo 437 n. 1 do Código Penal de 1982, que o artigo 386 do actual diploma penal reproduziu. IV - Os empregados públicos... quando haja lugar certo para o exercício das suas funções, têm domicílio necessário, sem prejuízo do seu domicílio voluntário, no lugar da residência habitual. V - Se os factos integradores dos crimes referidos na última parte daquele artigo 53 da Lei 58/90, de que se apresenta como ofendido um vereador municipal, não estão em ligação com o exercício das funções do mesmo ofendido, é a residência habitual deste que determina o seu domicílio. VI - Se os factos integradores dos ditos crimes estão conexionados com as funções do vereador municipal que por eles se apresenta como ofendido, então o seu domicílio, para efeitos da determinação do tribunal competente para conhecer de tais crimes, é do necessário. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - O Ministério Público junto da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça, vem requerer a resolução do Conflito Negativo de competência suscitado entre os Excelentíssimos Juízes dos Tribunais da Comarca da Nazaré e de Caldas da Rainha, com os fundamentos seguintes: Os referidos tribunais atribuem-se mutuamente competência, negando a própria, para conhecer do processo em que são arguidos A, B e outro. As decisões em que assim se entendeu transitaram em julgado. Por se tratar de tribunais de 1. instância de diferentes distritos judiciais, compete a este Supremo Tribunal a decisão do conflito. II - Comunicou-se aos tribunais em conflito a denuncia recebida e fixou-se-lhes prazo para responderem. Apenas, respondeu o Excelentíssimo Juiz do Tribunal da Nazaré que diz manter a decisão proferida. Notificados os arguidos. Vieram os mesmos produzir alegações. Reputam-se suficientes as informações e provas juntas. Corridos os vistos legais, cumpre conhecer. III - São os seguintes os factos relevantes: C, Vereador da Câmara Municipal de..., com domicílio na Rua ...Caldas da Rainha apresentou ao Delegado do Procurador da República junto do D.I.A.P., em Lisboa, queixa-crime contra A, com domicílio na Urbanização Areal, Nazaré; B, jornalista , com domicílio profissional na mesma emissora, sita na Avenida ..., em Lisboa; responsável pela programação da ...., que a investigação identificará; empresa proprietária da .... que a investigação identificará. Recebida a queixa, o Delegado do D.I.A.P. excepcionou a competência para dela conhecer e remeteu os autos à Delegação da Procuradoria da República do Tribunal Judicial de Caldas da Rainha, que arquivou o inquérito. Requerida abertura de instrução, foram os autos apresentados ao Excelentíssimo Juiz que, proferindo despacho, considerou que os factos denunciados, em abstracto, são susceptíveis de integrar 1 crime de difamação agravada, na forma de abuso de liberdade de imprensa, tipificado nos artigos 164 n. 1, 167 n. 2 e 168 n. 2, com referência ao artigo 437 n. 1 alínea b), todos do Código Penal e aos artigos 41 n. 2 e 42 da Lei 58/90 de 7 de Setembro. Considerou, porém, que o assistente continua a exercer as funções de Vereador da Câmara Municipal de.... Como tal considerou que o mesmo tem domicílio necessário quanto aos factos relacionados com o exercício de funções. E que o domicílio necessário do assistente é na Câmara Municipal de ... . Em razão disso, excepcionou a competência do Tribunal de Caldas da Rainha considerando competente o Tribunal da comarca da Nazaré, para onde remeteu o processo. Na comarca da Nazaré, apresentados os autos ao Excelentíssimo Juiz, proferiu este despacho em que defende que o n. 1 do artigo 53 da Lei 58/90 de 7 de Setembro que fixa o domicílio do ofendido não distingue entre o domicílio efectivo e o necessário, pelo que entende que é àquele que a lei se refere. Em razão disso, excepciona a competência da comarca da Nazaré para conhecer dos autos. IV - Direito: O artigo 53 da Lei 58/90 de 7 de Setembro dispõe: "O tribunal competente para conhecer das infracções previstas pela presente Lei é o tribunal judicial da sede da entidade emissora, salvo para conhecimento dos crimes de difamação, injúria ou ameaça, em que é competente o tribunal da área do domicílio do ofendido". Daí que versando a queixa sobre factos susceptíveis de integrar crime de difamação na forma de abuso de liberdade de imprensa - artigos 164 n. 1, 167 n. 2 e 168 n. 2 do Código Penal e artigos 41 n. 2 e 42 da Lei 58/90 de 7 de Setembro, o tribunal competente haja de ser o do domicílio do ofendido. O dissídio surge, porém, porque o assistente tem a sua residência na área da comarca de Caldas da Rainha e aponta ser Vereador da Câmara Municipal de ... . Poderá assim hipotizar-se a questão de os factos denunciados estarem relacionados com o exercício da função que o mesmo assistente aduz exercer. Fácil é a solução se os factos denunciados não têm ligação com o exercício dessa função, pois então a residência habitual determina o domicílio - artigo 82 do Código Civil - sendo o Tribunal das Caldas da Rainha o competente. Cumpre, no entanto, considerar se os factos denunciados estão ligados com a função de Vereador da Câmara Municipal de ... . Nesse caso interessaria o disposto no artigo 87 n. 1 do Código Civil que dispõe que "Os empregados públicos... quando haja lugar certo para o exercício dos seus empregos, têm domicílio necessário, sem prejuízo do seu domicílio voluntário no lugar de residência habitual". E quanto aos actos relacionados com esse exercício, o domicílio é esse referido do lugar - Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, I/64, Dias Marques, Código Civil Anotado, 67 e Castro Mendes, Teoria Geral, 1967, 1. página 228. Considerada, porém, a queixa apresentada dela não se infere que os factos denunciados estejam conexos com o exercício da função de Vereador, que o assistente assume. Pelo contrário, na medida em que a transcrição refere "... só assinava projectos a quem lhe desse dinheiro", infere-se que os factos não estão conexos com a função de Vereador, actual. Estão, porventura, em conexão com a função de Presidente da Câmara que o assistente diz ter desempenhado. Todavia, a situação não é a mesma. Se, porventura, a função de Vereador poderia enquadrar-se no conceito de funcionário prevenido pelo artigo 437 n. 1 do Código Penal, que o artigo 386 do Código Penal/vigente reproduziu, já será difícil enquadrar nesse conceito o Presidente da Câmara, que é antes um titular de funções políticas que só seria equiparado a funcionário se lei especial assim o considerasse - artigo 437 n. 2 do Código Penal que o n. 3 do artigo 386 do Código Penal/vigente reproduziu. Mais, porém. Os actos denunciados a estarem relacionados com as funções de Presidente da Câmara referem-se a um domicílio necessário que cessou e não pode assim ser considerado para a determinação da competência. Em razão disso, há apenas que ter em conta o domicílio revelado pela residência actual, que se situa na área da comarca das Caldas da Rainha. E, atento esse domicílio, o Tribunal competente é o das Caldas da Rainha. Em face do exposto, acordam em resolver o conflito de competência suscitado declarando competente o Tribunal da Comarca de Caldas da Rainha para prosseguir os termos da instrução referidos. Sem custas. Lisboa, 13 de Novembro de 1996 Augusto Alves, Virgilio Oliveira, Leonardo Dias, Mariano Pereira. |