Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | FERNANDES CADILHA | ||
| Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO CONTRATO DE AGÊNCIA SUBORDINAÇÃO JURÍDICA | ||
| Nº do Documento: | SJ200410270013764 | ||
| Data do Acordão: | 10/27/2004 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | T REL COIMBRA | ||
| Processo no Tribunal Recurso: | 1432/03 | ||
| Data: | 11/20/2003 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA. | ||
| Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
| Sumário : | Constitui contrato de trabalho subordinado, e não contrato de agência, aquela em que uma das partes se compromete a vender produtos por conta de outra, mas sem suficiente autonomia, mas antes com sujeição a diversas obrigações que revelam a existência de um vínculo de subordinação jurídica, como é o caso da necessidade de comparência a reuniões quinzenais ou semanais convocadas pelo chefe de vendas, de apresentação de relatórios e de fichas de visitas de clientes, bem como a realização de rotas e circuitos de acordo com as indicações fornecidas pela entidade promotora das vendas. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça 1. Relatório. "A", identificado nos autos, veio propor acção emergente de contrato individual de trabalho contra a "B, Complexo Industrial Gráfico, S.A." pedindo que a ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia de 81 653,20 Euros, acrescida de juros, por diversas retribuições em dívida no âmbito do contrato de trabalho existente entre ambos. Por sentença de primeira instância foi julgada parcialmente procedente a acção, vindo a caracterizar-se a relação laboral existente entre as partes como de subordinação jurídica, como alegara o autor, e não como contrato de agência, como pretendia a ré. Em apelação, o Tribunal da Relação de Coimbra confirmou a sentença recorrida, mantendo a sobredita qualificação de contrato de trabalho. É contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante de recurso de revista, em que formula as seguintes conclusões: A) A afirmação constante do nº 28 dos factos provados - «...o chefe de vendas controlava os vendedores, incluindo o autor» - é meramente conclusiva, não podendo, por isso, fazer parte da "matéria de facto" dada como provada ao abrigo do disposto nos art°s 653° do Cód. Proc. Civil e 72° do Cód. Proc. Trabalho, nem ser atendida como fundamento da decisão recorrida. B) O acórdão recorrido reconhece expressamente que há situações - como a dos autos - em que a normal autonomia técnica do trabalhador não permite evidenciar a existência do poder directivo, característico do contrato de trabalho. C) Em manifesto reconhecimento da sua dificuldade em encontrar, na relação contratual entre a Ré e o Autor, algum dos indícios que anteriormente definira como caracterizadores de um contrato de trabalho, o acórdão recorrido vê-se obrigado a "dar um salto em frente", dizendo que, afinal, existe mais um indício, esse sim verdadeiramente caracterizador daquele tipo contratual: sendo o trabalhador um elemento ao serviço dos fins prosseguidos pela unidade produtiva do empregador, existe um contrato de trabalho se se verificar a integração da actividade desenvolvida na organização por ele dirigida. D) A Ré encontrava-se sediada no Porto, aí se encontrando toda a sua estrutura organizativa, não tendo qualquer instalação ou estabelecimento na zona em que o Autor desenvolvia a sua actividade, a mais de 100 Kms de distância. E) Em face dos factos dados como provados. a caracterização da relação jurídica que existiu entre o Autor e a Ré é a de um típico contrato de agência. e não de um contrato de trabalho. F) A subordinação jurídica é o elemento relevante para a distinção entre o contrato de trabalho e os outros contratos que com ele mantêm algumas afinidades, in casu o contrato de agência. G) A autonomia do agente não é de todo absoluta, devendo a sua actuação conformar-se com as orientações recebidas e adequar-se com a política económica da empresa, prestando regularmente contas da sua actividade (Acórdão do STJ de 25 de Janeiro de 2000 (P. 232/99), em Acs. Dout. do STA, 467, 467, 1519), não sendo a autonomia do agente cega e ilimitada, actuando à margem e com o completo desconhecimento do principal, por conta de quem actua e cujos interesses lhe incumbe defender. H) A agência é um contrato de gestão de interesses alheios e, nessa medida, um contrato de colaboração ou de cooperação (cfr. doutrina e jurisprudência citadas por António Pinto Monteiro em "Contrato de Agência", 3ª edição actualizada, Almedina, págs. 39 e 40). I) Nenhum dos factos dados como provados põe em causa a autonomia do Autor enquanto agente da Ré, evidenciam a sua integração na estrutura organizativa desta, sendo ainda certo que aqueles que se traduzem no cumprimento de alguma instrução ou obrigação se inserem dentro dos deveres do agente, consignados no art. 7° do Dec.-Lei nº 176/86. J) É ilegítimo extrapolar-se do documento que contém o circuito a realizar pelo vendedor a conclusão de que o Autor se encontrava obrigado a realizar esse circuito, sendo, aliás, sintomático que, tendo o Autor alegado que estava "obrigado a seguir a rota e o circuito pré definido pela R." (cfr. art. 61° da petição inicial), o Meritíssimo Juiz "a quo" apenas tenha considerado provado que o Autor recebia do Chefe de vendas um documento com "a rota e o circuito a realizar". Ou seja, o juiz, da alegação da Ré relativamente a este facto, entendeu retirar a referência ao facto de o Autor se encontrar obrigado a seguir a rota e o circuito em causa. L) Não foi dado como provado nenhum dos factos alegados pelo Autor, eventualmente indiciadores da existência de um contrato de trabalho, concretamente os factos alegados nos arts. 3°, 5°, 46°, 61°, 62° e 63° da petição inicial. M) Os factos dados como provados - e como não provados - afastam qualquer hipótese de a relação jurídica que existiu entre o Autor e a Ré poder ser caracterizada como um contrato de trabalho. N) De tudo resulta que os factos dados como provados, considerados, quer isoladamente, quer em conjunto, evidenciam que o relacionamento jurídico que existiu entre o Autor e a Ré corresponde a um típico contrato de agência, não evidenciando, ainda que indiciariamente a existência de um contrato de trabalho. O) Consequentemente, o Autor não tem qualquer crédito sobre a Ré. O autor, ora recorrido, sustentou o bem fundado do julgado, e neste Supremo Tribunal de Justiça, a Exma representante do Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negada a revista, por entender que os elementos que caracterizam a relação contratual, considerados na sua globalidade, apontam com maior consistência para a qualificação como um contrato de trabalho. Colhidos os vistos dos Juízes Adjuntos, cumpre apreciar e decidir. 2. Matéria de facto. A Relação confirmou a factualidade dada como assente pelo tribunal de primeira instância, que aqui se tem como reproduzida, nos termos previstos nas disposições conjugadas dos artigos 713º, n.º 6, e 726º do Código de Processo Civil, sem embargo da necessidade de equacionar oportunamente, em sede de conhecimento dos fundamentos da recurso, os factos que se afiguram ser de maior relevância para a dilucidação da matéria em causa. 3. Fundamentação de direito. |