Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
600/05.2TCFUN.L1.S1.
Nº Convencional: 6ª SECÇÃO
Relator: JOÃO CAMILO
Descritores: CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
DEVER DE COMUNICAÇÃO
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 06/01/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA EM PARTE A REVISTA DA AUTORA E PREJUDICADO O CONHECIMENTO DA REVISTA DA RÉ
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 559.º, 562.º, 566.º, N.º 1, E 806.º .
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 715.º, N.º 2 E 726.º .
DL Nº 446/85, DE 25/10: - ARTIGOS 5.º, Nº 3, 8º, AL. A), E 9.º.
Sumário :

I. O proponente de cláusula contratual geral deve comunicar o seu conteúdo ao respectivo aderente, de modo adequado e com a antecedência necessária, a que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e a complexidade da cláusula, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência, nos termos do art. 5º do DL nº 446/85 de 25/10.
II. O proponente daquela cláusula tem o ónus de prova do referido dever de comunicação, nos termos do nº 3 do citado art. 5º.
III. O não cumprimento daquele dever implica a invalidade da mesma cláusula, sem prejuízo da validade das demais cláusulas contratuais, tal como dispõe o art. 9º da referido decreto-lei.
IV. Provando-se que a sociedade proponente não comunicou a existência da mencionada cláusula, não lhe comunicou o seu conteúdo e nem sequer lhe entregou cópia com a mesma cláusula, não tem esta validade, mantendo-se, porém, válidas as demais cláusulas contratuais.
Decisão Texto Integral:
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Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
... Rent-a-Car, SA, veio propor, nas Varas Mistas da comarca do Funchal, contra ... - Companhia de Seguros, S.A., e contra AA, acção sob a forma ordinária, pedindo a condenação da 1ª R. no pagamento da quantia de € 102.416,60 ou, subsidiariamente, do 2º R. na quantia de € 101.166,60, acrescidas de juros, à taxa legal vigente e, bem assim, de indemnização por lucros cessantes, a liquidar em execução, correspondentes aos prejuízos alegadamente sofridos pela A., em consequência de acidente sofrido por veiculo, segurado na 1ª R., e objecto de contrato de aluguer celebrado com o 2º R.
Contestaram ambos os RR., alegando, nomeadamente, a 1ª R. a exclusão da sua responsabilidade e arguindo o 2º R. a respectiva ilegitimidade - e concluindo pela improcedência da acção.
Efectuado julgamento, foi proferida sentença, na qual, considerando-se a acção quanto a ela improcedente, se absolveu do pedido a 1ª R. e se condenando o 2º R. a pagar à A. a quantia de € 27.206,55, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação, e da que se vier a liquidar em execução, referente a lucros que aquela deixou de auferir por virtude do acidente em causa.
Inconformados, interpuseram a A. e o 2º R. recursos de apelação, que foram julgados improcedentes na Relação de Lisboa.
Mais uma vez inconformados, os apelantes vieram interpor as presentes revistas, tendo apresentado as alegações tempestivamente.
Corridos os vistos legais, urge apreciar e decidir.
Como é sabido – arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Cód. de Proc. Civil, na versão anterior ao Decreto-Lei nº 303/2007 de 25/08, aqui aplicável, atenta a data da instauração desta acção, e a que pertencerão todas as disposições a citar sem indicação de origem -, o âmbito dos recurso é delimitado pelo teor das conclusões dos recorrentes.
Antes de iniciar a apreciação de cada uma das revistas, há que especificar a matéria de facto que as instâncias deram por provada e que é seguinte:
1 - Aos 27/9/2002, a A. deu e o 2º R. AA tomou de aluguer um veiculo automóvel de marca Opel Astra, veículo que pertence ao grupo G - al. A)
2 - O 2º R. AA conduzia o veículo ...-...-TV com uma taxa de álcool no sangue de 1,67 g/l - al. B).
3 - A A. é uma sociedade comercial anónima cujo objectivo social é o turismo de aluguer de automóveis sem condutor, gestão de frotas e alugueres de longa duração e compra e venda de veículos novos e usados - al. C).
4 - Sendo a actividade principal a que se dedica à actividade de rent-a-car, ou seja, de aluguer de automóveis sem condutor - al. D).
5 - A responsabilidade civil emergente de acidentes de viação do veículo ...-...-TV encontrava-se transferida para a 1ª R. através da apólice de seguro nº 2.809948 - al. E).
6 - A 1ª R. tinha conhecimento de que o veículo seguro seria conduzido por terceiros que celebrariam contratos de aluguer com a A. - al. F).
7 - Em virtude do acidente, o 2º R. pagou à A. a quantia de € 1.250 - al. G).
8 - A apólice nº 002809948 não era individual para tal viatura, mas cobria uma frota da A. - al. H).
9 - A. e 2º R. AA acordaram em fazer um ''upgrade'' ao contrato de aluguer inicial, já que havia necessidade de retomar o veículo de marca Opel Astra, passando o 2º R. a alugar um veículo da classe M - al. I).
10 - Aos 25/10/2002 – embora a petição inicial e as instâncias falem em 2005, tal é lapso como se vê desde logo pela data da instauração da acção -, o 2º R. devolveu o veículo de marca Opel Astra e a A. deu e o 2º R. tomou de aluguer o veículo de marca Zafira, com a matrícula ...-...-TV, com a obrigação deste devolver o referido veículo em bom estado e perfeitas condições de utilização no dia 28/10/2002 - al. J).
11 - Apesar de se tratar de um veículo da classe M, o preço do referido aluguer foi mantido, ficando o 2º R. com a obrigação de pagar um valor diário de aluguer de € 22,l4, a que acresceria o IVA à taxa em vigor de 13%, preço este muito especial pelo facto dos administradores da A. conhecerem, pessoalmente, os sócios gerentes da empresa para a qual o 2º R. laborava (C..., Lda) - al. L).
12 - Aos 26/10/2002, pelas 3.10 h. o 2º R., quando conduzia o veículo supra referido na Rua Brigadeiro Oudinot, no sentido sul - norte, na fila do lado esquerdo, e ao chegar frente ao Centro Comercial Oudinot, ao descrever uma ligeira curva para a direita, o seu condutor perdeu o controlo do veículo, indo este embater de frente numa arrecadação própria para guardar garrafas de gás existente no edifício supra referido no lado direito da rua - al. M).
13 - O estado do tempo era bom - al. N).
14 - Não chovia e o piso estava seco - al. O).
15 - O local do acidente caracteriza-se por ser uma ligeira curva para a direita precedida de recta, com duas filas de trânsito no mesmo sentido - al. P).
16 - Devido ao facto a que se alude em B), o R., ao descrever uma ligeira curva para a direita, perdeu o controlo do veículo automóvel que conduzia, fazendo-o embater violentamente com a lateral esquerda no muro de suporte da via do lado esquerdo e face à violência do embate ter ido embater numa arrecadação própria para guardar garrafas de gás do lado contrário da via - 8º BI.
l7 - O 2º R., animado pelo seu estado ébrio, imprimiu velocidade não adequada ao veículo de modo a imobilizá-lo no espaço livre e visível à sua frente, nem a descrever a aludida curva - 9º BI.
18 - O veículo supra referido ficou totalmente destruído, nomeadamente todo o lado esquerdo, toda a frente (incluindo motor e demais peças) e todo o interior, inclusive com os bancos todos torcidos - al. Q).
19 - Orçando a sua reparação em € 31.301 - al. R).
20 - O valor do veículo era, à data do acidente, de € 27.206,55, o que correspondeu a uma perda total - al. S).
2l - O veículo de matrícula ...-...-TV era um veículo novo, com apenas 4.036 km à data do acidente, e encontrava-se em óptimo estado de conservação - al. T).
22 - Em consequência do embate ficou impossibilitado de circular novamente - al. U).
23 - À data, a A. havia celebrado um contrato de locação financeira, por forma a adquirir o veículo ...-...-TV, pelo qual pagava e continuou a pagar uma renda mensal de € 700, acrescido de IVA, tendo no final do contrato direito a adquirir a propriedade da viatura - 15º BI.
24 - A A. alugava o referido veículo a um preço médio de € 80 por dia a que acrescia o respectivo IVA à taxa em vigor - 16º BI.
25 - Desde a data do acidente a A. não mais pode alugar o veículo automóvel de matrícula ...-...-TV - 18º BI.
26 - A A. teve de suportar a totalidade das rendas do veículo de matrícula ...-...-TV - 2lº BI.
27 - Aos 5/6/2002, a A. aderiu a uma proposta feita pela 1ª R. seguradora tendo sido acordadas determinadas condições especiais na apólice em referência, a saber: responsabilidade civil ilimitada (inclui P.A.I), assistência em viagem e danos próprios (com uma franquia de 4%) - 22º BI.
28 - A A. não foi informada pela R. seguradora de qualquer exclusão à cobertura de danos do referido contrato de seguro, nem tão pouco lhe foi explicado que, caso um condutor a quem alugara um veículo automóvel tivesse um acidente sobre o efeito do álcool, o seguro não cobriria os danos próprios do veículo em causa - 23º BI.
29 - Nem tão pouco lhe foi enviada, sequer, uma cópia da apólice, com as condições gerais e particulares, limitando-se a lª R. a enviar à A. a respectiva carta verde - 24º BI.
30 - Só aos 21/11/2002 enviou a 1ª R., através do seu agente AVS - Corrector de Seguros, as condições gerais da referida apólice - 25º BI.

Vejamos agora cada um dos recursos interpostos.

I. Revista da autora B....
Esta recorrente nas suas alegações formulou conclusões que por falta de concisão não serão aqui transcritas e das quais se deduz que aquela para conhecer neste recurso levanta apenas a seguinte questão:
A cláusula geral nº 37 do contrato de seguro aqui ajuizado e referente à exclusão da responsabilidade da seguradora em caso de acidente sob o efeito do álcool é de excluir nos termos dos arts. 5º, 6º, 8º e 9º do Regime das Cláusulas Contratuais Gerais, pelo que deve a ré seguradora ser condenada como o co-réu, ou, pelo menos, no pagamento do valor do veículo em causa ?

Foram apresentadas contra-alegações pela ré seguradora onde se defendeu a validade da referida cláusula e se pediu a manutenção do decidido.
Vejamos.
Está aqui em causa um pedido de condenação da ré seguradora pelos danos ocasionados num veículo automóvel que a autora-recorrente dera de aluguer sem condutor ao co-réu AA e que este destruiu num acidente ocasionado por conduzir em estado ébrio.
O veículo em causa estava segurado na ré seguradora com inclusão dos danos no próprio veículo, mas tal como consta a fls. 53 e 54, das cláusulas gerais do contrato de seguro em causa, aquele contrato de seguro continha a cláusula nº 37 que na sua alínea e) excluía da cobertura segurada os danos resultantes de sinistros causados por condutor que circule sob influência de álcool.
Por força desta cláusula as instâncias absolveram a ré seguradora, por os danos aqui em apreço estarem abrangidos nesta cláusula de exclusão.
A aqui recorrente e autora vem defendendo a exclusão desta cláusula por, tratando-se de cláusula contratual geral, não haver sido objecto de comunicação do seu conteúdo à recorrente-segurada o que a tornava nula por força do disposto nos arts. 5º, 6º, 8º e 9º do Decreto-Lei nº 446/85 de 25/10.
As instâncias não acolheram esta pretensão.
Apreciando, diremos que aquela cláusula contratual tem natureza geral, tal como as partes e as instâncias aceitaram, o que nos não merece censura, pelo que aquela está submetida às regras do citado Decreto-Lei nº 446/85.
Tal como resulta do preâmbulo deste Decreto-Lei, as regras incluídas naquele visam temperar o princípio individualista da liberdade contratual, visando dar protecção aos consumidores, evitando que estes se vejam prejudicados pela sua adesão, por vezes sem prévia reflexão, às referidas cláusulas gerais sem que tenham possibilidade prática de ponderar sobre o seu conteúdo que não foi por si objecto de discussão, pois foi-lhe apresentado já redigido.
As referidas regras constituem, substancialmente, afloramentos ou aplicações do princípio da boa fé que está consagrado em lugar de destaque no nosso direito civil, como é demais consabido.
Assim, o art. 5º deste diploma legal prescreve que as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las. A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência.
Também está contido no nº 3 deste artigo a atribuição do ónus de prova da comunicação adequada e efectiva ao contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais.
Por seu lado, o art. 6º daquele diploma estipula que o contratante que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique, devendo ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados.
Já o seu art. 8º prescreve que serão excluídas, além de outras, as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do art. 5º e as que forem comunicadas com violação do dever de informação, de molde que não seja de esperar o seu conhecimento efectivo.
Ora há que fazer a aplicação destes preceitos à factualidade apurada e que é a seguinte:
- A autora é uma sociedade comercial anónima cujo objectivo social é o turismo de aluguer de automóveis sem condutor, gestão de frotas e alugueres de longa duração e compra e venda de veículos novos e usados, sendo a sua actividade principal a que se dedica a de rent-a-car, ou seja, de aluguer de automóveis sem condutor;
- A responsabilidade civil emergente de acidentes de viação do veículo em causa estava transferida para a ré seguradora pela apólice nº 2.809948. Esta apólice não era individual para tal viatura, mas cobria uma frota da autora;
- Com efeito, aos 5/6/2002, a A. aderiu a uma proposta feita pela 1ª R. seguradora tendo sido acordadas determinadas condições especiais na apólice em referência, a saber: responsabilidade civil ilimitada (inclui P.A.I), assistência em viagem e danos próprios (com uma franquia de 4%);
- A A. não foi informada pela R. seguradora de qualquer exclusão à cobertura de danos do referido contrato de seguro, nem tão pouco lhe foi explicado que, caso um condutor a quem alugara um veículo automóvel tivesse um acidente sobre o efeito do álcool, o seguro não cobriria os danos próprios do veículo em causa;
- Nem tão pouco lhe foi enviada, sequer, uma cópia da apólice, com as condições gerais e particulares, limitando-se a lª R. a enviar à A. a respectiva carta verde;
- Só aos 21/11/2002 enviou a 1ª R., através do seu agente AVS - Corrector de Seguros, as condições gerais da referida apólice;
- O acidente aqui em apreço ocorreu em 26-10-2002.

Destes factos temos de concordar com a recorrente no sentido de que a ré seguradora não cumpriu o ónus de prova de que fala o nº 3 do art. 5º do citado decreto-lei, pois até se provou o contrário, ou seja, provou-se que a existência no contrato de seguro em causa da cláusula referida não foi comunicada à recorrente segurada e nem sequer lhe foi explicado o seu conteúdo, e nem mesmo lhe foi enviada uma cópia com a referida cláusula, apenas lhe foi enviada a carta verde.
Só após quase um mês do acidente é que a seguradora enviou à recorrente segurada as condições gerais do contrato em causa, contrato este que a segurada já aceitara em 5-06-2002.
Tal como doutamente concluiu o acórdão deste Supremo Tribunal de 28-04-2009 relatado pelo aqui primeiro Conselheiro-Adjunto, no processo 2/09.1YFLSB, nos contratos de adesão por existir aceitação, não particularmente negociada pelo aderente, a lei visa a sua protecção, como parte contratual mais fraca, impondo de modo efectivo um dever de informação por parte do proponente; mesmo que o aderente se não inteire, cabalmente, do conteúdo contratual que aceita, a lei protege-o em relação ao proponente. O dever de comunicação das cláusulas contratuais gerais a cargo do proponente deve abranger a sua totalidade e ser feita de modo adequado, e com antecedência compatível com a extensão e complexidade do contrato, de modo a tornar possível o seu conhecimento “completo e efectivo por quem use de comum diligência”.
E conclui aquele acórdão que o ónus de prova de que foi cumprido o dever de informação compete ao proponente das cláusulas contratuais gerais.
Ora tendo-se provado que a ré seguradora não comunicou a existência daquela cláusula à autora-aderente aqui recorrente e nem sequer lhe foi explicado o conteúdo daquela cláusula, fica preenchida a previsão do art. 8º, al. a) do citado decreto-lei e, por isso, a mesma cláusula não terá validade, mantendo-se válidas as demais cláusulas, tal como prescreve o art. 9º do mesmo diploma legal.
Não aceitamos, assim, o argumento da 1ª instância no sentido de que a recorrente ao discutir com a seguradora as cláusulas especiais aderiu às cláusulas gerais, pois tendo-lhe sido omitida a sua existência, não podia aderir ao que desconhecia. Além disso, a circunstância de a mesma cláusula até existir no regime do seguro obrigatório, também não é relevante, pois nada impedia que não existisse neste concreto tipo de seguro que, neste aspecto, está para além do seguro obrigatório.
Também não procedem os argumentos da recorrida seguradora no sentido de que as exigências de celeridade da vida actual não permitem o cumprimento do dever de comunicação e de informação tal como acima a definimos, atenta a forma habitual como se celebram este tipo de contratos.
As práticas negociais usuais devem ser adaptadas aos preceitos legais e não estes se devem submeter a essas práticas que claramente as violem.
Também a circunstância alegada pela recorrida seguradora de que a própria recorrente se serve de cláusula de igual teor nos contratos que celebra, como proponente de cláusulas contratuais gerais também é irrelevante, pois a existência da cláusula 37º acima referida não é inerente ou obrigatório na celebração deste tipo de contratos, que a pode prever ou não conforme as partes acordarem, ou a proponente assim entender – e o aderente, devidamente informado, o aceite.
E fazendo-a incluir na proposta de adesão pela proponente, esta tem de cumprir os deveres de comunicação e de informação da existência da mesma, sob pena de invalidade da mesma cláusula.
Desta forma, a validade da citada cláusula que fundamentou a improcedência do pedido deduzido contra a ré seguradora, tem de ser considerada excluída e, por isso, há que apreciar a responsabilidade da co-ré que as instâncias não chegaram a apreciar em face da haverem concluído pela sua irresponsabilidade baseada na validade daquela cláusula de exclusão de responsabilidade.
Este conhecimento incumbe a este tribunal de recurso, nos termos do nº 2 do art. 715º, aplicável por força do disposto no art. 726º.
Do contrato de seguro em causa, estão cobertos os danos no próprio veículo segurado até ao limite do seu valor e com a franquia de % 4 .
O valor do veículo que ficou destruído – sendo que o valor do seu concerto é superior ao valor do mesmo antes do sinistro – é de € 27.206,55.
As demais importâncias que a recorrente peticionou ou não foram provadas – despesas de armazenagem -, ou não são devidas tal como a sentença de 1ª instância concluiu – prestações pedidas para pagar o contrato de locação financeira em que a autora era locatária e referente ao veículo em causa -, sob pena de duplicação da indemnização dos danos.
Por outro lado, a autora ainda pediu a condenação da ré no pagamento dos danos decorrentes da impossibilidade de utilizar o veículo em aluguer sem condutor e pelo período de tempo decorrido ou a decorrer até ao pagamento da importância do valor do veículo.
Também aqui a recorrente não tem razão nesta pretensão.
Com efeito, tendo o veículo sido destruído, aquela apenas tem direito ao seu valor, como reparação do dano, nos termos dos arts. 562º e 566º, nº 1 do Cód. Civil, valor esse que, uma vez satisfeito, permitia à recorrente adquirir outro veículo semelhante permitindo, assim, manter o seu negócio.
Caso tenha interpelado a seguradora para esse pagamento e a seguradora se tenha recusado a fazê-lo, teria então a recorrente direito a uma indemnização por esse atraso que, nos termos do art. 806º do Cód. Civil, corresponde aos juros de mora da referida importância.
A autora peticionou também juros de mora, que, como dissemos, são devidos, mas não tendo a autora apontado a data desde quando os pretendia, se tem de entender que o faz desde a citação, tal como concluiu a sentença de 1ª instância.
A taxa de juros, não havendo outra indicação, será a supletiva da lei civil que estiver em vigor – art. 559º do Cód. Civil.
Procede, desta forma parcial, esta revista.

II. Revista do réu AA.
Tendo em conta que a formulação do pedido contra este réu ocorreu de forma subsidiária em relação ao pedido formulado contra a co-ré seguradora, a procedência do pedido contra aquela poderá tornar prejudicado o conhecimento deste recurso.
Porém, há que ver que o pedido subsidiário foi deduzido para o caso de o pedido formulado contra a ré seguradora improceder mesmo em parte - cfr. fls. 12.
E o pedido deduzido contra a ré seguradora improcedeu em parte.
À primeira vista haveria de conhecer do teor do recurso deste réu.
No entanto, a responsabilidade deste apenas pode abranger a quantia de € 27.206,55 acrescida de juros desde a citação sobre aquela quantia e até integral pagamento e a quantia a liquidar decorrente de não poder a autora alugar o veículo desde a data do acidente e até ao pagamento da quantia acima referida.
Isto decorre da circunstância de ter sido esta a condenação proferida pela sentença de 1ª instância e de que não foi, nesta parte, interposto recurso, ou seja, a autora não abrangeu no seu recurso a impugnação da parte do pedido formulado contra este réu de que o mesmo foi absolvido.
Como este réu impugnou toda a sua condenação e como já vimos a condenação na quantia a liquidar não é de manter como já vimos na decisão da primeira revista, resta-nos a condenação no montante de € 27.206,55 e juros e da quantia ilíquida acima referida.
Esta condenação corresponde à condenação da co-ré Z...acima decidida, salvo no que toca à franquia que a autora confessou ter já sido paga pelo réu AA.
Logo, a condenação possível aqui do réu AA é igual à que foi proferida contra a ré Z..., pelo que a natureza subsidiária deste pedido funciona e, por isso, não poderá ser este condenado por falta de pedido.
Desta forma fica prejudicado o conhecimento deste recurso.

Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a revista da autora B... e, por isso, se revoga nesse aspecto o acórdão recorrido, condenando-se a ré Z... a pagar à autora a importância de € 27.206,55 deduzida da franquia de %4 e acrescida de juros de mora legais sobre referida importância devida, a contar da citação e até integral pagamento, mantendo-se a mesma ré absolvida do demais peticionado.
Não se conhece da revista do réu AA por haver ficado prejudicado com a procedência da revista da autora, o que tornou a sua condenação insubsistente, em face da natureza subsidiária da mesma condenação pedida.
As custas na primeira instância e nos recursos da autora de apelação e de revista ficam a cargo da autora e da ré Z... na proporção do decaimento.
As custas pelos recursos de apelação e de revista do réu AA ficam a cargo da ré Z..., nos termos do art. 447º, parte final, por lhe ser imputável a inutilidade daqueles.
2010-06-01.
João Moreira Camilo ( Relator )
António da Fonseca Ramos
António Cardoso de Albuquerque