Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | BRAVO SERRA | ||
Descritores: | ACIDENTE DE TRABALHO ACÇÃO DE DESONERAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | SJ200711220035244 | ||
Data do Acordão: | 11/22/2007 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
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Sumário : | I - Nos casos de acidente perspectivável, do mesmo passo, como um acidente de trabalho e um acidente de viação, e sendo paga ao sinistrado pela seguradora do responsável pelo acidente de viação, a título de reparação pelos danos patrimoniais advindos da sua incapacidade de ganho, a indemnização de € 76.549,52, a entidade responsável pela reparação do acidente de trabalho deve ser desonerada do pagamento da pensão anual e vitalícia a seu cargo até que as prestações dessa pensão, devidas pelo acidente de trabalho, atinjam aquele montante, já auferido, de € 76.549,52, e isto ainda que a indemnização paga em consequência do acidente viário tivesse tido por base, na fixação do capital indemnizatório, o salário que o acidentado usufruía, ao tempo do acidente, salário esse porventura de montante inferior ao das pensões actualizadas. II – É que, sendo o montante indemnizatório pago de uma só vez pela seguradora do terceiro responsável, isso significa o percebimento de uma capitalização que não significa um mero factor multiplicativo da remuneração que deixou de ser auferida e, prospectivamente, o iria ser, já que, tratando-se de uma capitalização, não se pode alhear, de todo em todo, o respectivo rendimento. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Por apenso aos autos emergentes de acidente de trabalho que correram seus termos no 5º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa e nos quais figurava como acidentada AA – autos esses nos quais foi proferida homologação da conciliação efectuada e de acordo com a qual a Empresa-A, S.A., se comprometeu a pagar à sinistrada, que, por força do acidente que sofreu, ficou a padecer de uma IPP de 85%, com incapacidade permanente absoluta para o trabalho, a pensão anual e vitalícia de Esc. 467.968$00 –, veio a ....Seguros, S.A., (denominação hoje assumida por aquela Empresa-A, S.A., em virtude de alteração integral do contrato social, que esta instituiu) intentar, contra a aludida sinistrada, acção de processo comum, peticionando a sua desoneração do pagamento da acordada pensão até perfazer € 76.549,52. Invocou, para tanto e súmula, que o sinistro de que AA foi vítima configurou, do mesmo passo, um acidente de viação e um acidente de trabalho, vindo a Empresa-B, S.A. (hoje ...., S.A.), em acção instaurada pelo acidente de viação, a ser condenada a pagar à sinistrada as quantias de € 76.549,52 e € 24.939,89, respectivamente a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, vindo a primeira daquelas quantias a ser paga à mesma sinistrada, razão pelo qual se deveria considerar a autora desonerada do pagamento da pensão, nos termos do nº 2 da Base XXXVII da Lei nº 2.127, de 3 de Agosto de 1965. Após ter a ré contestado, excepcionando a ilegitimidade da autora, impugnando o valor da acção e deduzindo impugnação, foi, em 6 de Setembro de 2006, proferida sentença que, julgando a acção procedente, determinou que a autora ficava desonerada de pagar à ré a pensão vitalícia a que se obrigou até perfazer o montante de € 76.549,52. Do assim decidido apelou a ré para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 28 de Março de 2007, julgou improcedente a apelação. 2. Continuando insatisfeita, pediu a ré revista daquele aresto, formulando, no final da alegação adrede produzida, o seguinte quadro conclusivo: – “1 – A recorrida pediu fosse desonerada do pagamento da pensão devida à recorrente (por acidente de trabalho) até perfazer o montante de 76 549,52 €, com fundamento no disposto no nº 2 da base XXXVII, da Lei 2 127. 2 – Nos termos desta norma, a pedida desoneração será considerada no caso de a vítima do acidente receber de terceiros indemnização superior à devida pela entidade patronal ou seguradora. 3 – Tal como a recorrente alegou na sua contestação, os factos alegados pela recorrida na sua p.i., são manifestamente insuficientes para se concluir pela aplicação da invocada norma. 4 – Nada nos autos permite concluir, nem tal foi alegado, que a indemnização recebida pela recorrente de outra seguradora, pelo mesmo acidente que foi simultaneamente de trabalho e de viação, foi superior à indemnização devida pela recorrida. 5 – Pelo contrário, os factos demonstram que a indemnização recebida pela recorrente de terceiros é inferior à que a recorrida está obrigada. 6 – A indemnização recebida no ano de 1994 pela recorrente, no valor de 76 549,52 € (15 346 800$00) refere-se ao capital correspondente a 60% de um salário anual de 609 000$00 multiplicado por 42 anos, isto é, um salário anual não actualizável de 365 400$00 – 1 822,61 € (609 000$00 x 60%) (365 400$00 x 42 = 15 346 800$00 ou 76549,52 €) (certidão do acórdão da R. Lisboa junto aos autos). 7 – A pensão anual devida pela recorrida à recorrente é de 2 863,82 € e era de 2 334,21 € (467.968$00) em 01.08.91, valores superiores ao salário anual de 1822,61 € que serviu de cálculo à indemnização recebida pela recorrente no valor de 76549,52 €. 8 – Não está em causa o entendimento jurisprudencial pacífico de que as indemnizações devidas por acidente simultaneamente de trabalho e de viação não são cumuláveis, mas sim, 9 – apurar se se verificam os pressupostos do pedido da recorrida de desoneração da pensão a que estava obrigada, ou seja, se a indemnização recebida pela recorrente por terceira seguradora foi superior à devida pela recorrida. 10 – Ora, como ficou demonstrado, a indemnização devida pela recorrida é e sempre foi superior à que a recorrente recebeu de terceiros. 11 – Assim, ao confirmar decisão de 1[ª] instância, o douto acórdão recorrido fez errada interpretação e aplicação do direito aos factos, violando o disposto na citada norma constante no nº 2 da base XXXVII. 12 – Quando muito, a recorrida só poderia ficar desonerada de pagar anualmente à recorrente a quantia de 1 822,61 € até esta perfazer a idade de 65 anos, continuando sempre a pagar o que exceder aquela quantia até ao montante anual actualizado a que está obrigada. 13 – Nestes termos, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se o douto acórdão recorrido e absolvendo a recorrente do pedido, ou, se assim se não entender, limitando a desoneração ao montante anual de 1 822,61 € e até a recorrente atingir os 65 anos, como é de JUSTIÇA Respondeu a autora à alegação da ré, propugnando pela improcedência do recurso e rematando a sua resposta com as seguintes «conclusões»: – “1. O acidente dos autos qualifica-se como sendo simultaneamente acidente de viação e acidente de trabalho. 2. Na Lei n.º 2127 assume particular relevo a Base XXXVII, que previne para a hipótese de o acidente ser causado por companheiro de trabalho ou por terceiros. 3. A ideia prevalecente do regime da Base XXXVII é a de que as duas medidas de reparação não se cumulam, na parte respeitante aos danos patrimoniais, são antes complementares. 4. É este o sentido da desoneração da pensão fixada a cargo da seguradora de acidentes de trabalho. 5. O que se pretende é apenas ressarcir totalmente o prejuízo sofrido, não permitindo injustos locupletamentos como sucederia no caso de ser viável a acumulação das duas indemnizações. 6. Tendo a lesada recebido uma indemnização que é constituída por danos patrimoniais e danos não patrimoniais, os campos da indemnização estão devidamente limitados. 7. Através da pensão fixada no processo de acidente de trabalho também se visou compensar a sinistrada do dano patrimonial que consistiu no prejuízo económico decorrente da redução da sua capacidade de trabalho, provocada pelo acidente. 8. Nesta medida, para os efeitos do disposto nos n.º 2 e 3 da Base XXXVII, os danos patrimoniais que esta pensão visa compensar coincidem com aqueles que, através da indemnização cível se visou ressarcir, sem prejuízo de num caso e noutro, ser diferente o critério da sua medida e quantificação.” A Ex.ma Representante do Ministério Público neste Supremo Tribunal exarou «parecer», no qual propugnou pela improcedência da revista. Corridos os «vistos», cumpre decidir. II 1. Vem dada por assente a seguinte matéria de facto, que este Supremo tem de acatar, já que se não coloca aqui qualquer das situações a que se reporta o nº 2 do artº 722º do Código de Processo Civil: –– a) no 5º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa correram uns autos de processo crime com o nº 615/91, em que foi arguido BB, imputando-se-lhe a prática das contravenções previstas e punidas pelos artigos 5º, nº 2, 7º, nº 1, e 11º, todos do Código da Estrada e um crime previsto e punível pelas disposições combinadas dos artigos 148º, números 1 e 3, e 143º, alíneas b) e c), do Código Penal; – b) a então ofendida nos referidos autos (sinistrada nos autos de acidente de trabalho) constituiu-se assistente e aderiu à acusação deduzida pelo Ministério Público; – c) o procedimento criminal relativamente ao crime e às contravenções imputadas ao arguido BB foi declarado extinto nos termos da amnistia prevista no artº 1, alíneas w) e y), da Lei nº 23/91 de 4 de Julho; – d) a então assistente deduziu pedido de indemnização cível contra BB, Sociedade de Transportes Empresa-C, Lda, e Empresa-B, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de Esc. 50.000.000$00 por danos morais e patrimoniais sofridos; – e) foi admitida a intervenção da Empresa-A, a qual veio a deduzir pedido de indemnização cível contra os responsáveis pelo acidente, pretendendo ser reembolsada, nos termos da Base XXXVII da Lei 2127, dos valores despendidos com a ofendida, que orçaram em Esc. 7.010.614$00, acrescidos das despesas futuras a liquidar em execução de sentença; – f) na sentença proferida em 1ª instância foi julgado improcedente o pedido de indemnização deduzido pela Companhia de Seguros Empresa-A e julgado parcialmente procedente o pedido deduzido pela então assistente e demandante, condenando-se a Empresa-B a pagar-lhe uma indemnização no montante de Esc. 1.500.000$00, vindo os demais demandados a ser absolvidos da instância, por se ter entendido que o montante dos prejuízos se continha nos limites previstos no artº 29, nº 1, alínea a), conjugado com os artigos 8º, nº 1, e 6º, do Decreto-Lei nº 522/85; – g) dessa sentença interpuseram recurso a Companhia de Seguros Empresa-A e a ofendida AA; – i) o recurso da Companhia de Seguros Empresa-A não foi apreciado, dado que a mesma não liquidou a taxa de justiça devida; – j) sobre o recurso interposto recaiu o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, junto aos autos a fls. 96 a 114 – recurso nº 5665/93 da 5ª secção –, que transitou em julgado em 11.11.2004, no mesmo tendo sido decidido alterar a sentença recorrida e condenar a Empresa-B a pagar à sinistrada a indemnização de Esc. 20.346.800$00, sendo Esc. 15.346.800$00 a título de danos patrimoniais e Esc. 5.000.000$00 a título de danos não patrimoniais; – k) a Empresa-A, S.A., alterou a denominação para ... Seguros, S.A., alteração que foi registada mediante a apresentação 8, de 27 de Outubro de 2003, e alterou de novo a denominação para Empresa-B, S.A., alteração que foi registada mediante a apresentação 30, de 23 de Março de 2004; – l) no processo principal, foi fixada à AA uma IPP de 85%, com incapacidade absoluta para o trabalho habitual, com necessidade de apoio de terceira pessoa, e atribuída uma pensão anual e vitalícia, com início em 1 de Agosto de 1991, no valor de Esc. 467.968$00, da responsabilidade da Empresa-A, S.A.; – m) a referida pensão tem vindo a ser actualizada e, a partir de 1 de Janeiro de 2005, foi actualizada para o montante de € 2.863,82 – fls. 55 do processo principal. 2. A questão a decidir, como claramente resulta do «relato» supra efectuado, resume-se em saber se, sendo o acidente sofrido por AA perspectivável, do mesmo passo, como um acidente de trabalho e um acidente de viação, e tendo a ela sido paga, a título de reparação pelos danos patrimoniais advindos da sua incapacidade de ganho, uma dada indemnização, pagamento esse que ocorreu por força de contrato de seguro que visava o ressarcimento de prejuízos que suportou a título de infortúnio laboral, a posterior recepção, pela mesma sinistrada, de uma quantia que lhe foi paga com vista a ser indemnizada pelos danos patrimoniais sofridos em consequência do mesmo acidente, mas em sede de reparação resultante do acidente de viação, desonera a entidade que procedeu ao primeiro pagamento, desde que este seja de montante inferior ao do segundo. Tendo as 1ª e 2ª instâncias conferido a tal questão resposta positiva, insurge-se a ré por intermédio deste procedimento recursivo esgrimindo, em súmula, com o argumento de acordo com o qual, tendo a indemnização que recebeu a título de reparação pelo acidente de viação sido calculada com base num capital equivalente ao salário anual, não actualizável, que auferiria num período compreendido entre a data do evento infortunístico e até à idade da reforma – quarenta e dois anos –, o respectivo montante é inferior àquele que por ela foi recebido da entidade seguradora e que lhe foi pago com esteio na característica laboral do acidente em causa, motivo pelo qual, ponderando o disposto no nº 2 da Base XXXVII da Lei nº 2.127, não se poderia concluir que a indemnização percebida pelo acidente de viação fosse superior à devida por força do acidente de trabalho. O acórdão agora impugnado fundou o seu juízo de improcedência quanto à pretensão deduzida na apelação interposta pela ré, ora recorrente, com as seguintes considerações: – “(…) A recorrente não põe em causa que as indemnizações devidas por um acidente que seja simultaneamente de trabalho e de viação não são cumuláveis, antes se complementam no sentido de que a emergente do acidente de trabalho subsiste para além da medida em que venha a ser absorvida pela estabelecida nos termos da lei geral, tal como foi explicitado na sentença recorrida. E esse é, efectivamente, o regime jurídico que resulta dos nº 1, 2 e 3 da Base XXXVII da lei 2.127 de 3.08.65, vigente à data do acidente (e que foi mantido integralmente no art. 31º da Lei 100/97 de 13.09). O que a Recorrente alega, se bem percebemos, é que não se verificam os pressupostos para a desoneração da pensão que a Apelada estava obrigada a pagar à Apelante, pois não foram alegados nem estão provados factos que permitam concluir que a indemnização recebida pela apelante da terceira seguradora foi superior à devida pela apelada e, em caso afirmativo, em que medida. Mas carece de razão. Com efeito, o trabalhador que sofre um acidente que simultaneamente é de trabalho e de viação, fica titular de dois direitos à reparação: um, baseado na responsabilidade objectiva ou no risco económico ou de autoridade da entidade patronal; e o outro, baseado na responsabilidade subjectiva de terceiro, ou seja, cm facto ilícito de terceiro. Mas o regime que resulta da Base XXXVII da L.A.T. é o de que as duas medidas de reparação não se cumulam, quer a indemnização recebida por terceiros seja superior quer seja inferior à devida pela entidade responsável pela reparação do acidente de trabalho. No primeiro caso, a desoneração da entidade responsável pelo acidente de trabalho será total, no segundo caso será limitada àquele montante, Mas importa referir que a proibição de cumulação se verifica apenas em relação ao mesmo dano concreto. Conforme refere Carlos Alegre ‘concorrendo mais que um direito a indemnização por virtude do mesmo acidente, em relação ao mesmo dano concreto, a sua concretização, através da reparação respectiva, não é cumulável’. Ora, de acordo com os factos provados a aqui Ré AA , sofreu um acidente que foi simultaneamente de viação e de trabalho. E recebeu da seguradora responsável pelo acidente de viação a indemnização de € 76,549,52, a título de danos patrimoniais, bem como a quantia de € 24,939,89, a título de danos não patrimoniais; e, pelo acidente de trabalho, de que resultou para a sinistrada uma incapacidade IPP de 85% com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH), foi a antecessora da aqui Apelada condenada a pagar-lhe a pensão anual e vitalícia de 467.968$00, com início em 1.09.91, pensão esta que tem sido actualizada, sendo que cm 1.1.2005 foi actualizada para € 2.863,82. Quer a indemnização arbitrada na acção cível emergente do acidente de viação, por danos patrimoniais, quer a pensão atribuída na acção de acidente de trabalho por IPATH, visaram ressarcir o mesmo dano concreto, ou seja, a diminuição da sua capacidade de trabalho e de ganho, dano de natureza patrimonial. Compreende-se e justifica-se, por isso, que a ora Autora, enquanto responsável pela reparação do acidente de trabalho seja desonerada do pagamento da pensão à aqui Ré AA até que o valor das prestações devidas pelo acidente de trabalho atinjam o montante de € 76.549,52, por ela já auferido da responsável pelo acidente de viação. Assim, poderá a Apelada, enquanto responsável pela reparação do acidente de trabalho, suspender, desde já, o pagamento das respectivas prestações à Apelante, até que o valor dessas prestações atinja o montante global € 76.549,52, após o que recomeçará o pagamento da pensão à sinistrada, com as respectivas actualizações, uma vez que a pensão é de natureza vitalícia. (…)” Vejamos. 3. A Lei nº 2.127, aplicável ao caso sub specie, atenta a data do acidente em causa, dispunha na sua Base XXXVII: – Acidente originado por companheiros ou terceiros 1. Quando o acidente for causado por companheiros da vítima ou terceiros, o direito à reparação não prejudica o direito à acção contra aqueles, nos termos da lei geral. 2. Se a vítima do acidente receber de companheiros ou de terceiros indemnização superior à devida pela entidade patronal ou seguradora, esta considerar-se-á desonerada da respectiva obrigação e terá direito a ser reembolsada pela vítima das quantias que tiver pago ou despendido. 3. Se a indemnização arbitrada à vítima ou aos seus representantes for de montante inferior aos dos benefícios conferidos em consequência do acidente ou da doença, a desoneração da responsabilidade será limitada àquele montante. 4. A entidade patronal ou a seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente terá o direito de regresso contra os responsáveis referidos no n.º 1, se a vítima não houver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano, a contar da data do acidente. Também à entidade patronal ou seguradora assiste o direito de intervir como parte principal no processo em que a vítima exigir aos responsáveis a indemnização a que alude esta base. O extractado preceito contempla, nos seus números 2 e 3, duas situações distintas. A primeira (a prescrita no nº 2) reporta-se à situação em que a indemnização recebida pelo trabalhador sinistrado de companheiros ou de terceiros que deram causa ao acidente (e é este último caso o que agora releva) é superior àquela que é a devida pela entidade patronal daquele mesmo trabalhador (ou pela seguradora, no caso de ter sido firmado contrato de seguro por via do qual o pagamento do devido em consequência de acidente laboral foi assumido pela entidade legalmente autorizada a realizar esse tipo de seguro). Neste tipo de situação, a entidade que procedeu – ou irá proceder – ao pagamento da indemnização com base no acidente de trabalho (isto é, a entidade patronal ou a entidade seguradora) considera-se desonerada da obrigação de pagamento, seja nos casos em que nenhuma prestação a esse título já ocorreu, seja nas hipóteses em que houve já prestações efectuadas a tal título, situações estas em que terá direito a ser reembolsada do que tiver pago. A segunda situação (estatuída no nº 3) refere-se aos casos em que a indemnização recebida pela vítima por parte de companheiros ou terceiros é de montante inferior aos benefícios que percebeu (ou perceberá) com base no acidente de trabalho. Nestes casos, a desoneração da entidade responsável pela reparação dos danos advindos do infortúnio laboral é limitada tão somente ao quantitativo correspondente àquela indemnização. Ora, foi justamente a prescrição ínsita no nº 3 que levou ao juízo formulado no acórdão recorrido e ao dispositivo nele integrado, confirmando o decidido na 1ª instância, ou seja, o de se considerar a autora desonerada de efectuar o pagamento das pensões que se obrigou a prestar à ré até ao montante equivalente ao da indemnização que lhe foi arbitrada a título de danos patrimoniais pelo acidente viário e pelo qual foi responsabilizada a seguradora Empresa-B, S.A. (hoje ..., S.A.). Não assiste, assim, razão à impugnante quando a mesma pugna pela violação do nº 2 da Base XXXVII da Lei nº 2.127. 4. Todavia, se bem se percebe a sua alegação, parece que a recorrente brande com um argumento segundo o qual a desoneração da autora só deveria concretizar-se até a um quantitativo igual àquele que teria servido de base à fixação da indemnização pelo acidente viário, isto é, o salário anual que, para efeitos de alcance do quantitativo indemnizatório então arbitrado, foi tido em conta – e que corresponderia a € 1.822,61 –, e isto porque à reparação dos danos em consequência do acidente laboral, a pensão anual e vitalícia acordada era de € 2.334,21, sendo, actualmente, por força da actualização, de € 2.863,82. É evidente a falha de raciocínio da recorrente. Na verdade, (ainda que se parta de uma tal aceitação), não se pode olvidar que, muito embora o quantum indemnizatório por danos patrimoniais advindos do acidente de viação tivesse por base de cálculo um valor correspondente ao valor do salário da ré auferido à data do acidente, o que é certo é que esse quantum veio a ser por ela recebido de uma só vez, não se tratando, pois, de uma indemnização fixada sob a forma de renda anual (como, aliás, poderia ter sucedido). Neste contexto, sendo o montante indemnizatório pago de uma só vez, isso significa o percebimento de uma capitalização que não significa um mero factor multiplicativo da remuneração que deixou de ser auferida e, prospectivamente, o iria ser, já que, tratando-se de uma capitalização, não se pode alhear, de todo em todo, o respectivo rendimento. Já, por outro lado, o devido pela ora autora foi estabelecido sob a forma de uma pensão anual e vitalícia, tendo, obviamente, sofrido actualizações, já que se não tratou de uma atribuição correspondente a um quantitativo global de capitalização, susceptível de gerar rendimento. Ora, nada apontando para que o capital indemnizatório recebido pela recorrente pelo acidente de viação e respectivo rendimento, reflectido que fosse em moldes anuais, seja de montante inferior ao da pensão anual devida pela recorrida, não merece censura, pelos fundamentos que agora se aduzem, o acórdão impugnado. III Em face do que se deixa dito, nega-se a revista.Custas pela impugnante, sem prejuízo de, não havendo pagamento voluntário, se atentar no benefício de apoio judiciário de que ela desfruta.Lisboa, 22 de Novembro de 2007 Bravo Serra (Relator) Mário Pereira Maria Laura Leonardo |