Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | SIMAS SANTOS | ||
Descritores: | RECURSO DE REVISTA TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTE PODERES DE COGNIÇÃO PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA | ||
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Nº do Documento: | SJ200305150011023 | ||
Data do Acordão: | 05/15/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | 2 V CR DO PORTO | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 567/02 | ||
Data: | 01/27/2003 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC PENAL. | ||
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Sumário : | 1 - É susceptível de revista a correcção das operações de determinação ou do procedimento, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, a falta de indicação de factores relevantes, o desconhecimento pelo tribunal ou a errada aplicação dos princípios gerais de determinação, bem como a violação das regras da experiência ou a desproporção da quantificação efectuada. 2 - Mostra-se adequada a pena de 7 anos e 6 meses de prisão a pena infligida pelo crime de tráfico e estupefacientes, punido com prisão de 4 a 12 anos, quando: - o arguido aceitou transportar 2.675,548 g. de cocaína, do Brasil para Espanha, através de Portugal, mediante a contrapartida de USD 2.000 e o pagamento das despesas com as viagens. - no Brasil vivia com a mulher que actualmente se encontra doente, recebe de reforma mensal cerca de 580 Reais e tem problemas de saúde; - não tem antecedentes criminais em Portugal, mas foi condenado, na Alemanha em 1991, em pena de prisão por crime de tráfico de estupefacientes, que cumpriu. | ||
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Decisão Texto Integral: | Supremo Tribunal de Justiça I 1 - Em dia não concretamente determinada de Março de 2002, mas anterior ao dia 24, o arguido NBB foi contactado no Brasil por um indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, o qual lhe propôs que efectuasse um transporte de cocaína desde aquele país até Espanha, cidade de Madrid, oferecendo-lhe USD 2.000 por tal transporte e bem assim o pagamento das despesas com as viagens. O arguido NBB de imediato acedeu à proposta que lhe foi feita, resolvendo, por sua iniciativa, convidar o seu primo, o arguido R, para o acompanhar, dizendo-lhe que em Portugal iriam contactar portugueses interessados na compra da fazenda, sita em Cabo Frio, Rio de Janeiro, Brasil, pertença de herança em que ambos e, outros familiares, eram interessados, sendo que os arguidos também eram procuradores de alguns desses interessados, tendo aquele aceitado tal convite para viajar. Entretanto, o arguido NBB tratou das viagens para ambos os arguidos e, em dia não concretamente apurada entre finais de Março 2002 e 2/4/2002, o referido indivíduo cuja identidade não foi possível apurar entregou-lhe (ao arguido NBB) no Brasil, duas malas de viagem, onde havia previamente ocultado em cada uma delas cocaína e, bem assim, entregou-lhe cerca de pelo menos USD 1.500, ficando, assim, o arguido NNB na posse das ditas malas e dólares. No dia do embarque, quando o arguido R se encontrou com o arguido NBB, levava consigo uma mochila com a sua roupa para a viagem. Ao ver a mochila, o arguido NBB propôs-lhe que mudasse a roupa que ali trazia para uma das malas de viagem que lhe mostrou, dizendo que não era conveniente viajar de mochila, ao que aquele acedeu e fez tal mudança de roupa. Assim, levando cada um a sua mala de viagem, embarcaram no aeroporto de Salvador, no Brasil, em 3/4/2002 à noite, chegando ao aeroporto de Lisboa no dia seguinte, ou seja, em 4/4/2002, tendo ali tomado avião para o aeroporto Sá Carneiro, chegando a esta cidade do Porto nesse mesmo dia ao final da tarde. Na cidade do Porto, os arguidos instalaram-se na «Pensão Residencial Ribadouro», sita na Rua da Estacão, n.º 28, onde pernoitam, ocupando um quarto. Entretanto, nesta cidade, o arguido R começou a achar que estava a ser seguido por um indivíduo que desconhecia, tendo ficado com medo e, ao mesmo tempo, começou então a desconfiar que as malas com que viajaram tivessem algo de ilícito, dado também o comportamento estranho do arguido NBB - ao qual inicialmente não deu muita importância embora tivesse reparado em tal actuação e o tivesse questionado sobre isso, aceitando na altura a justificação que aquele lhe deu de estar cansado - que, na Alfândega do Porto, quando cada um deles foi revistado, não esperou por ele, actuando como se não o conhecesse, aguardando-o no exterior dentro de um táxi. Por isso, em 5/4/2002, pelas 13 horas, o arguido R foi à esquadra da PSP de Campanhã denunciar a situação e pedir que revistassem as malas de viagem por desconfiar que nelas tivesse sido ocultado algo de ilícito. Na sequência dessa denúncia, os agentes da PSP RCCA e SMSP, deslocaram-se então à referida pensão, onde as malas supra descritas já se encontravam junto da recepção. Foram então apreendidas as duas referidas malas de viagem, melhor descritas no exame de fls. 186, cujo teor aqui se dá por reproduzido, tendo cada uma delas dissimulado no forro e no interior de uma armação em alumínio, um produto sólido que, no conjunto, tinha o peso líquido global de 2.675,548 g., o qual, posteriormente submetido a exame laboratorial - conforme consta de fls. 104, que aqui se dá por reproduzida - revelou a presença de cocaína. Os mesmos agentes da PSP também apreenderam, em poder do arguido NBB, as quantias de 300 reais do Banco do Brasil, 711 dólares americanos, 340 Euros e ainda os documentos agora juntos a fls. 14 a 17 e, em poder do arguido R, as quantias de 400 dólares americanos, 50 Euros e ainda os documentos agora juntos a fls. 28 a 32. As quantias em Euros eram resultado do câmbio de dólares americanos, sendo certo que as importâncias que o arguido R tinha em seu poder lhe havia sido entregues pelo arguido NBB. A totalidade das referidas quantias em dinheiro apreendidas haviam sido entregues ao arguido NBB pelo indivíduo que lhe entregou as malas com cocaína e destinavam-se pelo menos em parte a custear as despesas da viagem. O arguido NBB agiu livre, consciente e voluntariamente, conhecendo a qualidade estupefaciente da cocaína que estava ocultada nas duas referidas malas de viagem, como bem sabia, tendo conhecimento que a sua detenção e transporte era proibido e punido por lei. O arguido R conhecia a qualidade estupefaciente da cocaína, sabendo que a sua detenção e transporte é proibido e punido por lei. 2- O arguido NBB nasceu em 12/2/1939 no Brasil, sendo de nacionalidade brasileira. No Brasil vivia com a mulher, que trabalhava como esteticista até há cerca de 3 meses, sendo que actualmente se encontra doente. Tem 5 filhos que vivem em agregados autónomos e tem dois netos, Já exerceu a profissão de vendedor comissionista de roupa. Também já trabalhou numa empresa ligada a pedras preciosas. Tem problemas de saúde, sendo assistido medicamente no EP onde se encontra preso. Recebe de reforma mensal cerca de 580 Reais. Como habilitações literárias tem o equivalente ao antigo 2º ano do ciclo preparatório. Nunca viveu em Portugal e também neste país não tem residência. Em Portugal não tem antecedentes criminais. Na Alemanha, em 1991, foi condenado em pena de prisão por crime de tráfico de estupefacientes, tendo cumprido parte dessa pena, sendo depois expulso desse país. Perspectiva, quando for libertado, regressar ao Brasil, onde tem a sua família, viver então da sua reforma e, se poder, trabalhar, 3- O arguido R nasceu em 17/4/1971, no Brasil, sendo também de nacionalidade brasileira. Durante parte da sua vida viveu com a mãe e, antes de vir para Portugal, vivia com um primo e mãe deste. Tem duas irmãs, sendo uma delas, ainda menor, vivendo com a mãe. O arguido R trabalhava numa "bombonière" da mãe, prestando serviços na área administrativa desse estabelecimento comercial e bem assim entregava doces e salgados, recebendo a remuneração mensal de 500 Reais. Nos períodos da época alta do turismo na zona da sua residência, trabalhava como recepcionista, actividade essa que já desenvolve há cerca de 15 anos, auferindo mensalmente entre 500 e 500 reais. Também já trabalhou como vendedor e, durante cerca de 8 anos, como «copeiro» em casa particular. No EP trabalha como padeiro e é também visitado pela família do seu companheiro de cela. Como habilitações literárias tem o equivalente ao 12º ano de escolaridade. Em 10/1/2002, o arguido R matriculou-se na «Escola Modelo», id. a fls. 227 a 229, no 1º módulo do Curso de Técnico em Radiologia Médica - Radiodiagnóstico, no período nocturno, das 19 horas às 23 horas, de segunda a sexta-feira, frequentando tal curso até ter saído do Brasil. Nunca viveu em Portugal e também neste país não tem residência. Não tem antecedentes criminais. Quando for libertado perspectiva regressar ao Brasil, para junto da sua família e continuar a sua vida, designadamente, a nível profissional. Nada mais se provou, designadamente, não se provou: - que o arguido NBB tivesse explicado ou dito ao arguido R que iriam transportar cocaína nas malas com que viajaram; - que o arguido R soubesse que nas ditas malas era transportada cocaína; - que o arguido R soubesse que transportava uma mala com cocaína; - que o arguido R tivesse representado que naquelas malas era transportada cocaína, - que o arguido R tivesse representado que ao transportar aquela mala, necessariamente transportava cocaína; - que o arguido R tivesse admitido a possibilidade de naquelas malas ser transportada cocaína e, não obstante isso, fez o transporte referido; - que as quantias em dinheiro apreendidas ao arguido R lhe tivessem sido entregues pelo indivíduo que entregou as malas ao arguido NBB; - que o arguido R conhecia o indivíduo que entregou as malas e dinheiro ao arguido NBB; - que o arguido R soubesse da proveniência das quantias em dinheiro que foram apreendidas; - Os demais factos alegados quanto ao dolo relativamente ao arguido R; - que os arguidos só se deslocaram a Portugal para fazerem uma prospecção do mercado comprador para a fazenda referida nos factos provados; - qualquer outro facto constante da acusação, da contestação ou alegado durante a discussão da causa, com pertinência para a decisão desta ou que se mostre em oposição com os dados como provados. 1.2. Com base nesta factualidade, a 2.ª Vara Criminal do Porto, por acórdão de 27.1.2003 (proc n.º 567/02.9JAPRT), decidiu: - julgar improcedente e não provada a presente acção penal quanto ao arguido R; - julgar, no mais, parcialmente provada e procedente a acção penal, e, consequentemente, condenar o arguido NBB, como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. no art. 21.º, n.º 1 do DL 15/93, conforme declaração de rectificação n.º 20/93, com referência à tabela I-B anexa ao mesmo diploma legal, na pena de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão; - decretar a expulsão do mesmo arguido NBB. II 2.1.O arguido NBB inconformado, recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo na sua motivação: 1 - Face à matéria apurada, o recorrente limitou-se a ser correio de determinada quantidade do cocaína do Brasil para Espanha. 2 - Identificou, desde o início, a pessoa que lhe pediu tal trabalho, facultando os respectivos contactos telefónicos 3 - As condições especificas do recorrente foram exaradas no nº 2 da matéria apurada. 4 - A medida concreta da pena é determinada nos termos do artigo 71.º do CP. 5 - Face a tais critérios e às circunstâncias específicas do recorrente, nomeadamente a idade, estado de saúde, vida pessoal e social estabilizadas, adequa-se a pena concreto de cinco anos de prisão. 6 - Ao ter entendido de outra forma, violou a decisão recorrida os art.ºs 71.º do CP. 2.2. Respondeu o Ministério Público, propugnando a manutenção do julgado e concluindo: 1 - Alega o recorrente que a sua condenação, como autor material de um crime de tráfico e estupefacientes p. e p. no art. 21 nº 1 do DL 15/93 de 22/1, na pena de 8 anos e 6 meses de prisão é excessiva, sendo adequada a pena de cinco anos de prisão. 2 - A determinação concreta da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo do crime depuseram a favor ou contra o agente. 3 - O dolo é directo e a culpa é grave, atendendo ao seu modo de actuação, ao tipo de transporte de produto estupefaciente que efectuou e à expressão quantitativa da cocaína apreendida nas duas malas (5, 475546 Kg - cfr fls 104) 4 - Não tem antecedentes criminais em Portugal, mas já havia sido condenado por crime de tráfico de estupefacientes na Alemanha. 5 - Foram consideradas como circunstâncias atenuantes, ter 63 anos de idade à data dos factos e a situação e condições pessoais de vida, sendo que tem problemas de saúde. 6 - Conjugando todos os referidos elementos, entendemos que a pena concretamente aplicada é adequada, ponderada a culpa, o grau de ilicitude e a condição social do arguido e as exigências de prevenção, atento o facto de que nos dias de hoje a droga assume dimensões de flagelo social. 7 - Sendo justa a pena de 8 anos e 6 meses de prisão aplicada ao arguido. III Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Ministério Público promoveu, no seu visto, a designação de audiência.Colhidos os vistos legais, teve lugar a audiência, pelo que cumpre conhecer e decidir. IV E conhecendo.4.3. Vejamos, pois, começando por analisar os poderes de cognição deste Tribunal em matéria de medida concreta da pena. Mostra-se hoje afastada a concepção da medida da pena concreta, como a «arte de julgar»: um sistema de penas variadas e variáveis, com um acto de individualização judicial da sanção em que à lei cabia, no máximo, o papel de definir a espécie ou espécies de sanções aplicáveis ao facto e os limites dentro dos quais deveria actuar a plena discricionariedade judicial, em cujo processo de individualização interviriam, de resto coeficientes de difícil ou impossível racionalização. De acordo com o disposto nos art.ºs 70.º a 82.º do Código Penal a escolha e a medida da pena, ou seja a determinação das consequências do facto punível, é levada a cabo pelo juiz conforme a sua natureza, gravidade e forma de execução, escolhendo uma das várias possibilidades legalmente previstas, traduzindo-se numa autêntica aplicação do direito. Não só o Código de Processo Penal regulou aquele procedimento, de algum modo autonomizando-o das determinação da culpabilidade (cfr. art.ºs 369.º a 371.º), como o n.º 3 do art. 71.º do Código Penal (e antes dele o n.º 3 do art. 72.º na versão originária) dispõe que «na sentença devem ser expressamente referidos os fundamentos da medida da pena», alargando a sindicabilidade, tornando possível o controlo dos tribunais superiores sobre a decisão de determinação da medida da pena. Mas importa considerar os limites de controlabilidade da determinação da pena em recurso de revista, como é o caso. Não oferece dúvidas de que é susceptível de revista a correcção das operações de determinação ou do procedimento, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, a falta de indicação de factores relevantes, o desconhecimento pelo tribunal ou a errada aplicação dos princípios gerais de determinação. Tendo sido posto em dúvida que a valoração judicial das questões de justiça ou de oportunidade caibam dentro dos poderes de cognição do tribunal de revista (Cfr. Jescheck, Tratado de Derecho Penal, § 82 II 3), deve entender-se que a questão do limite ou da moldura da culpa estaria plenamente sujeita a revista, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, para controlo do qual o recurso de revista seria inadequado, salvo perante a violação das regras da experiência ou a desproporção da quantificação efectuada (neste sentido, Maurach e Zipp, Derecho Penal, § 63, 200, Figueiredo Dias, Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 197 e Simas Santos e Correia Ribeiro, Medida Concreta da Pena, Disparidades, pág. 39). Ao crime de tráfico e estupefacientes corresponde a moldura penal abstracta de prisão de 4 a 12 anos. É dentro dessa moldura penal, que funcionam todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o agente, designadamente: - O grau de ilicitude do facto (o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação de deveres impostos ao agente); - A intensidade do dolo ou negligência; - Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; - As condições pessoais do agente e a sua situação económica; - A conduta anterior ao facto e posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; - A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena. Como se viu está provado que o arguido aceitou transportar 2.675,548 g. de cocaína, do Brasil para Espanha, através de Portugal, mediante a contrapartida de USD 2.000 e o pagamento das despesas com as viagens. No Brasil vivia com a mulher que actualmente se encontra doente, tem 5 filhos que vivem por si e 2 netos, trabalhou como vendedor comissionista e numa empresa ligada a pedras preciosas e recebe de reforma mensal cerca de 580 Reais. Tem problemas de saúde, e o equivalente ao antigo 2º ano do ciclo preparatório. Não tem antecedentes criminais em Portugal, mas foi condenado, na Alemanha em 1991, em pena de prisão por crime de tráfico de estupefacientes, que cumpriu. Perspectiva regressar ao Brasil e viver então da reforma e, eventualmente, trabalhar. A defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo que a culpa do agente consente; entre esses limites, satisfazem-se, quando possível, as necessidades da prevenção especial positiva ou de socialização (Ac. do STJ de 17-09-1997, proc. n.º 624/97). A medida das penas determina-se, já o dissemos, em função da culpa do arguido e das exigências da prevenção, no caso concreto, atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, deponham a favor ou contra ele. A esta luz, e atendendo aos poderes de cognição que a este Supremo Tribunal assistem, impõe-se concluir que a pena concreta fixada e que o recorrente contesta, se situa dentro da sub-moldura a que se fez referência. Com efeito, a pena situa-se sensivelmente dentro dos valores que vem sendo confirmados por este Supremo Tribunal de Justiça para situações idênticas, como se pode ver das seguintes sínteses: «(1) Os correios são indispensáveis à proliferação do tráfico da droga e sem eles o crime já há muito estaria irradicado, pois é evidente que os grandes traficantes não iriam, nem vão, sujeitar-se a ser apanhados com a droga na mão. (2) A confissão do arguido é a consequência natural e necessária de lhe ter sido encontrada a droga e o seu "arrependimento" não é mais do que o resultado de se ver descoberto. (3) É adequada a pena de 8 anos de prisão, tendo-lhe sido apreendidos 2,923 kg de cocaína. (Ac. de 10-01-1990, AJ n.º 5, Proc. nº 40309)» «(1) Comete o crime previsto e punível pelo n.º 1 do art. 23º do DL nº 430/83, de 13 de Dezembro, o arguido que transporta consigo, da América do Sul para Portugal, por avião, 2047 gramas de cocaína, dissimuladas em 6 garrafas, substância estupefaciente que se destinava a ser levada para Espanha, via terrestre, e aí entregue a terceiros para comercialização. (2) Tendo em conta a intensidade do dolo do arguido, traduzida no conhecimento do efeito nefasto daquela droga, e a quantidade elevada da mesma, ainda que se demonstre a confissão por forma espontânea e relevante (após ter sido descoberto), o seu arrependimento sincero, o facto de ser primário e ter agido em consequência de dificuldades económicas e sociais, não se justifica o uso da atenuante especial referida nos art.s 73º e 74º do C Penal de 1982. (3) A pena adequada cifrar-se-á em oito anos de prisão e cinquenta mil escudos de multa e expulsão para o seu país natal.» (Ac. de 16-01-1990, BMJ n.º 393 pag250) «Não é de aplicar atenuação especial da pena aos traficantes de cocaína, sob a forma de "correios". Estes são indispensáveis à proliferação do tráfico e sem eles tal crime de há muito já estaria erradicado, pois, é evidente que os grandes traficantes não iriam, nem vão sujeitar-se a serem apanhados com a droga na mão.» (Ac. do STJ de 04-07-1990, AJ n10/11 * BMJ n399 pag215) «(4) Os correios são indispensáveis à proliferação do tráfico de drogas e sem eles o crime já há muito estaria erradicado, porque é evidente que os grandes traficantes não iriam, nem vão, sujeitar-se serem apanhados com a droga na mão. (5) É adequado a pena de 8 anos de prisão, tendo-lhe sido apreendida 2,923 de cocaína e tendo ele confessado e estando arrependido.» (Ac. de 19-06-1991, BMJ n408 pag227) «No que concerne à prevenção, manda a justiça e a defesa da comunidade, em que nos achamos inseridos e em nome do que julgam os tribunais, que os autores do crime de tráfico de drogas sejam punidos com uma certa severidade, já que, na sua qualidade de "mercadores da morte", especulam com o sofrimento e a morte de milhões de pessoas, causando necessariamente a desagragação das famílias colocando meios através dos quais os seus consumidores praticam os mais graves crimes, nomeadamente no domínio do direito à vida e contra o património, particularidades que atentam, em alto grau, contra a tranquilidade a que têm direito os cidadãos.» (Ac. de 26-06-1991, Proc. nº 41729) «(1) Tendo sido apreendida droga a duas pessoas que a transportavam, como correios, verifica-se a agravação de o crime ter sido cometido por duas pessoas. (2) Apesar de ter sido provado que eles iriam receber elevada contrapartida económica, não se verifica a agravação de os agentes procurarem obter avultadas compensações remuneratórias, por se ignorar o montante que iriam receber e por ganho do correio não ser assim avultado. (3) A correio, que transportava cerca de 7 quilos de cocaína, que nunca respondeu, justifica-se a pena de 8 anos de prisão e 1.000.000$ de multa.» (Ac. de 09-12-1992, Proc. nº 43308) «(1) Em face do valor dos bens jurídicos protegidos pelo incriminação do art. 21, do DL 15/93, de 22-01, os fins de prevenção geral devem prevalecer sobre os de prevenção especial. (2) Por outro lado, dada a indiscutível e perniciosa importância do papel que os chamados "correios de droga" desempenham nos circuitos de tráfico, facilitando a circulação e a disseminação de estupefacientes, não deve usar-se para com eles de demasiada benevolência.» (Ac. de 18-02-1999, Proc. nº 1390/98) Mas a pena encontrada nesse quadro (8 anos e 6 meses) situa-se perto do limite máximo consentido pela culpa, melhor quadrando às circunstâncias do caso já referidas, com destaque para a sua idade e estado de saúde, a pena de 7 anos e 6 meses de prisão já adequada a essa mesma culpa. V Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em conceder provimento ao recurso e alterar a medida da pena que foi infligida ao recorrente, nos termos sobreditos.Honorários Legais à Defensora oficiosa. Sem custas. Lisboa, 15 de Maio de 2003 Simas Santos (Relator) Santos Carvalho Costa Mortágua Abranches Martins |