| Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | SOUSA PEIXOTO | ||
| Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO A TERMO PRORROGAÇÃO TRABALHADOR À PROCURA DE PRIMEIRO EMPREGO | ||
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| Nº do Documento: | SJ200709120017974 | ||
| Data do Acordão: | 09/12/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
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| Meio Processual: | REVISTA. | ||
| Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
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| Sumário : | 1. À luz do art.º 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, a prorrogação do contrato de trabalho a termo por período diferente do estipulado inicialmente estava sujeita aos requisitos materiais e formais da sua celebração. 2. Assim se o motivo indicado para a prorrogação do contrato não se enquadrar no elenco de situações previstas no n.º 1 do art.º 41.º da LCCT, o termo da prorrogação é nulo e esta considera-se sem termo, o mesmo acontecendo com o contrato. 3. Tratando-se de um negócio formal, a declaração só pode valer com um sentido que tenha um mínimo de correspondência no texto do documento que titula o acordo de prorrogação. 4. Ainda que o contrato tenha sido celebrado com o fundamento de que o trabalhador estava à procura de primeiro emprego (isto é, com o fundamento de que nunca tinha sido contratado por tempo indeterminado), a prorrogação do contrato deve ser considerada sem termo, se o motivo invocado para a mesma tiver sido o facto de o trabalhador “continuar na situação de procurar emprego e não ter, por motivo alheio à sua vontade, encontrado emprego compatível com a sua formação profissional”. 5. Este motivo não se enquadra no elenco de situações previstas no n.º 1 do art.º 41.º da LCCT e a declaração assim emitida não pode ser interpretada com o sentido de que o motivo da prorrogação foi o mesmo da celebração do contrato. | ||
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| Decisão Texto Integral: | Acordam na secção social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. "AA" propôs, no Tribunal do Trabalho de Coimbra, a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra os Empresa-A, pedindo: a) que se declarasse que o contrato celebrado em 4.6.2001 viola o disposto no art.º 3.º, n.º 1, da lei n.º 38/96, de 31/8, devendo em consequência ser considerado como contrato de trabalho celebrado por tempo indeterminado; b) caso assim não se entenda, que o autor seja considerado como contratado por tempo indeterminado, por não assegurar necessidades transitórias de serviço, mas sim permanentes; c) que se declarasse a nulidade da adenda aposta no verso do contrato de trabalho celebrado em 4.6.2001; d) que se declarasse a ilicitude do despedimento operado pela ré através da entrega do ofício datado de 18.11.2002; e) que se condenasse a ré a reintegrar o autor no seu posto de trabalho, sem perda de antiguidade; f) que se condenasse a ré a pagar ao autor todas as retribuições vencidas e vincendas desde a data do despedimento até à decisão final, contabilizando-se em € 510,27 as vencidas nos 30 dias que antecederam a data de propositura da acção; g) tudo acrescido de juros de mora à taxa legal. Em resumo, o autor alegou que a estipulação do termo inserida no contrato de trabalho celebrado com a ré, em 1 de Junho de 2001, era nula, o mesmo acontecendo com a prorrogação de que o mesmo foi alvo em 29.11.2001. E, mais concretamente, alegou que o contrato inicial foi celebrado para suprir necessidades transitórias do serviço, não constando, todavia, do seu texto a indicação concreta dos factos e circunstâncias que motivaram tal celebração, violando-se, assim, o disposto no art.º 3.º, n.º 1, da Lei - (2) n.º 38/96, de 31/8; que o teor da cláusula 5.ª do contrato, nos termos da qual ele teria declarado “nunca ter sido contratado por tempo indeterminado” era falso, uma vez que já anteriormente havia trabalhado para outro empregador, facto de que a ré era conhecedora; que o conteúdo e alcance da referida cláusula não lhe foi explicado, tendo-lhe o contrato sido apresentado naqueles termos para assim ser assinado; que o motivo aposto na adenda, para justificar a prorrogação do contrato, por mais 12 meses também não era naturalmente verdadeiro e que as funções por si exercidas, durante todo o período de execução do trabalho, nada tinham a ver com a satisfação de necessidades transitórias de serviço, mas com a satisfação de necessidades permanentes da empresa. Na contestação, a ré defendeu a validade do termo, alegando que o contrato foi celebrado ao abrigo da alínea h) do [n.º 1], do art.º 41.º da LCCT, aprovada pelo Decreto--Lei n.º 64-A/89, de 27/2, ou seja, com o fundamento de que o autor era um trabalhador à procura de primeiro emprego, considerando-se como tal aquele que nunca foi contratado por tempo indeterminado e alegando que a conduta do autor, ao afirmar que a declaração que fez na cláusula 5.ª do contrato era falsa, viola o disposto no art.º 227.º, n.º 1, do C.C., por pretender prevalecer-se desse facto, para arguir a nulidade do contrato. Na 1.ª instância, a acção foi julgada totalmente improcedente, por se ter entendido que o motivo indicado no contrato para justificar a sua celebração a termo foi o facto de o autor ser um trabalhador à procura de primeiro emprego, considerando-se como tal aquele que nunca trabalhou por tempo indeterminado; que aquele motivo era só por si suficiente para justificar a estipulação do termo, independentemente da natureza transitória ou permanente das necessidades que a contratação visou satisfazer; que a estipulação do termo não era válida, por ter ficado provado que o autor não era trabalhador à procura de primeiro emprego, mas que a sua conduta configurava um caso de abuso do direito, face ao que havia declarado na cláusula 5.ª do contrato; que a prorrogação do contrato por mais doze meses era válida. O autor recorreu da sentença, alegando, em resumo, o seguinte: o contrato subscrito em 1.6.2001 foi celebrado nos termos da alínea h) do art.º 41.º do D.L. n.º 64-A/89 e a fim de suprir necessidades temporárias de serviço; porém, ao referir a alínea h), o contrato não indica o motivo concreto e real, isto é, não indica se o autor foi contratado por ser trabalhador à procura de primeiro emprego, por ser desempregado de longa duração ou por estar em outra qualquer situação prevista em legislação especial de política de emprego; por outro lado, embora no contrato se diga que o autor foi contratado para suprir necessidades transitórias de serviço, a verdade é que essas necessidades não foram concretizadas; a cláusula 5.ª do contrato não tem qualquer valor ou peso jurídico, em primeiro lugar, porque do contrato não consta que o autor tenha sido contratado por ser um trabalhador à procura de primeiro emprego e, em segundo lugar, porque o conceito de trabalhador à procura de primeiro emprego não é o que consta daquela cláusula; a adenda de prorrogação do contrato deve ser considerada como um novo contrato e o motivo justificativo nela aposto não foi o facto de o autor ser um trabalhador à procura de primeiro emprego, mas sim o facto de “o segundo outorgante continuar na situação de procurar emprego e não ter, ainda, por motivo alheio à sua vontade, encontrado emprego compatível com a sua formação profissional”, não constando este motivo de nenhuma das alíneas do n.º 1 do art.º 41.º da LCCT. Conhecendo do recurso, o Tribunal da Relação de Coimbra revogou a sentença e condenou a ré a reintegrar o autor, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, com efeitos a partir de 5.12.2001 e a pagar-lhe todas as retribuições que ele deixou de auferir desde 27.10.2003 até ao trânsito em julgado da sentença, acrescidas de juros de mora à taxa legal desde os respectivos vencimentos, em montante a liquidar em execução de sentença. E tal condenação ancorou-se na seguinte argumentação: - um dos motivos justificativos do termo aposto no contrato de trabalho celebrado entre as partes, em 1 de Junho de 2001, foi o facto do autor ser um trabalhador à procura de primeiro emprego; trabalhador à procura de primeiro emprego é aquele que nunca trabalhou por tempo indeterminado; - a indicação de que o contrato era celebrado nos termos da alínea h) do art.º 41.º da LCCT, acrescida da declaração emitida pelo autor na cláusula 5.ª do contrato de “nunca ter sido contratado por tempo indeterminado”, cumpria cabalmente a exigência contida no art.º 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38/96, de 31/8, nos termos do qual a indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo só é atendível se mencionar concretamente os factos e circunstâncias que integram esse motivo; - o autor incorreu em abuso do direito, ao querer aproveitar-se do facto de ter sido dado como provado que ele não era um trabalhador à procura de primeiro emprego; - o facto de no contrato ter sido consignado que a contratação do autor se destinava a “suprir necessidades transitórias do serviço” era irrelevante, apesar desse fundamento não satisfazer minimamente as exigências legais, uma vez que o contrato também havia sido celebrado pelo facto do autor ser um trabalhador à procura de primeiro emprego; - aquando da celebração da adenda de prorrogação do contrato, em 29.11.2001, por mais doze meses, já a Lei n.º 18/2001, de 3/7, estava em vigor; nos termos do art.º 41.º-A da LCCT aditado pela referida Lei n.º 18/2001, “[a] celebração sucessiva e ou intervalada de contratos de trabalho a termo, entre as mesmas partes, para o exercício das mesmas funções ou para satisfação das mesmas necessidades do empregador determina a conversão automática da relação jurídica em contrato sem termo”, mas a referida adenda não configura a celebração de um novo contrato de trabalho, traduzindo-se apenas numa mera prorrogação do contrato que havia sido celebrado em 1.6.2001; - nos termos do art.º 3.º, n.º 2, da Lei n.º 38/96, de 31/8, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 18/2001, a prorrogação do contrato de trabalho a termo, por período diferente do estipulado, está sujeita aos requisitos materiais e formais da sua celebração e contará para todos efeitos como renovação do contrato inicial; - a adenda em causa satisfaz as exigências formais, uma vez que contém a indicação do motivo justificativo da prorrogação do contrato inicialmente celebrado, mas o motivo indicado (continuar o autor “na situação de procurar emprego e não ter, ainda, por motivo alheio à sua vontade, encontrado emprego compatível com a sua formação profissional”) não faz parte do elenco de situações contempladas no art.º 41.º da LCCT e, além disso, é falso; - por isso, a estipulação do termo aposto na adenda é nula, o que acarreta a conversão do contrato em contrato sem termo e a consequente ilicitude da sua cessação levada a cabo por parte da ré. Inconformada com o acórdão da Relação, a ré interpôs recurso de revista, sintetizando as respectivas alegações da seguinte forma: A – É entendimento maioritário da doutrina e da jurisprudência que a renovação expressa do contrato de trabalho opera a extensão do contrato inicialmente celebrado por novo período e não a estipulação de um novo contrato de trabalho. Trata-se, efectivamente, de um fenómeno de renovação de um vínculo contratual preexistente, mantendo-se o mesmo por um novo período de tempo. B – De acordo com o teor do acórdão recorrido, o motivo justificativo constante do contrato de trabalho a termo certo assinado a 1 de Junho de 2001 era válido, legítimo e eficaz. Conforme bem esclarece o teor do acórdão ora recorrido, “(...) o motivo justificativo do termo aposto no convénio em análise é o do trabalhador se encontrar à procura do primeiro emprego (...)”. C – O conceito de procura do primeiro emprego pressupõe que o trabalhador em causa nunca tenha prestado trabalho ao abrigo de um contrato de trabalho por tempo indeterminado. D – Bem decidiu o douto Tribunal da Relação de Coimbra ao não fazer recair sobre a empresa ora recorrente a responsabilidade por tal facto, uma vez que havia sido o A., ora recorrido, quem, falsamente afirmando uma inverdade, havia colocado em erro a recorrente e, nessa medida, havia directamente originado a invalidade do contrato de trabalho inicialmente celebrado, procurando, depois disso, aproveitar-se de forma ilegítima e, como bem referiu a douta Relação de Coimbra, em manifesto abuso de direito. E – E fazendo reportar então todas estas considerações ao momento em que a adenda ao contrato de trabalho foi realizada, sempre se diria que nenhuma razão se encontra para que os superiores entendimentos perfilhados pela douta Relação de Coimbra, no seu acórdão, deixassem de se verificar. F – De um ponto de vista meramente lógico nada permite concluir que, naquele momento, o pressuposto ao abrigo do qual havia sido celebrado o contrato de trabalho não se mantivesse. Para a recorrente, tendo em conta que a prestação de trabalho foi consecutiva e, tanto quanto sabe, exclusiva, durante a execução dos 6 meses iniciais do contrato de trabalho e até 29 de Novembro de 2001 (data em que é assinada a referida adenda) o A., ora Recorrido, não prestou trabalho a qualquer entidade ao abrigo de um contrato de trabalho por tempo indeterminado e, se o fez, disso não deu conhecimento à ora Recorrente. G – Se no momento da contratação o motivo justificativo era válido, nenhuma razão se distingue para considerar que o mesmo não possa suceder no momento da renovação do referido contrato. Tanto num como noutro momento, a inexistência dos pressupostos de facto susceptíveis de legitimar o recurso a este tipo de contratação por parte da recorrente não lhe podem ser imputáveis, sob pena de, assim, se permitir o aproveitamento ilegítimo por parte do recorrido de um erro para o qual ele (e apenas ele!) contribuiu. H – Se o acórdão colheu o mérito de consagrar esta realidade no momento em que o contrato de trabalho foi assinado, imputando directamente ao recorrido a execução de um contrato de trabalho a termo certo sem que os requisitos materiais para o efeito estivessem reunidos, da mesma forma o deveria ter consagrado no momento em que foi executada a adenda, cuja finalidade foi a de promover a renovação do contrato de trabalho, na medida em que, nesse momento, a ora recorrente se mantinha firmemente na convicção de que tal pressuposto material era existente, tanto à data da celebração, como à data da renovação. Considerar este facto para efeito da celebração do contrato de trabalho, para depois o ignorar no momento da renovação, traduz, salvo o devido respeito, uma incoerência argumentativa na medida em que os pressupostos ao abrigo dos quais o douto Tribunal da Relação de Coimbra firmou a sua convicção, relativamente ao momento da celebração do contrato de trabalho com o Recorrido, são exactamente os mesmos. I – Em virtude da adenda ao contrato de trabalho assinado a 29 de Novembro de 2001, foram renovados os pressupostos ao abrigo dos quais havia sido celebrado o contrato de trabalho, nomeadamente se afirmando que, nessa data, o ora recorrido não havia ainda encontrado emprego compatível com a sua formação profissional. Do teor da adenda assinada na data supra referida não resulta o entendimento de que se estava a oferecer um novo motivo justificativo. Mais não se faz senão remeter para uma situação que "ainda" se constatava no momento da celebração de tal adenda: a impossibilidade por parte do recorrido de encontrar um emprego compatível com a sua formação profissional. Mais não fizeram as partes senão evidenciar que no momento em que a adenda foi executada, as razões e os fundamentos que levaram à celebração do contrato de trabalho, cerca de 6 meses antes, se mantinham inalteradas. J – Se é verdade que o contrato de trabalho foi assinado por ambas as partes ora em litígio, não é menos verdade que a adenda ao contrato de trabalho também o foi e se era válido considerar que o Recorrido agiu em manifesto abuso de direito, no primeiro caso, com o que de resto se concorda integralmente, nenhuma razão parece existir para que o mesmo juízo de censurabilidade e ilegalidade não seja aqui levado a cabo. L – O recorrente colocou em erro a recorrente no sentido de permitir que, mais tarde, pudesse vir aproveitar-se desse erro de forma a obter para si um benefício ou um enriquecimento ilegítimo, pelo qual pugnou e veio inclusivamente a obter merecimento em consequência do acórdão do douto Tribunal da Relação de Coimbra. M – O preceito legal enunciado, nomeadamente o n.º 2 do art.º 3.º da Lei n.º 38/96 de 31 de Agosto, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, não foi efectivamente violado no âmbito da concretização da adenda ao contrato de trabalho assinado a 1 de Junho de 2001. A verdade é que a imposição da necessidade de justificação material, que não se contesta, não pode deixar de ser considerado no âmbito das diversas possibilidades então admissíveis para a execução – lícita – de contratos de trabalho a termo certo. Naturalmente que não poderá ignorar-se que é necessário ao intérprete um juízo de adequação prévio ao momento em que se aplique o referido preceito a cada caso concreto, mais precisamente, a cada justificação material (factual) oferecida para esse efeito. Assim, será distinta a demonstração da necessidade de manutenção de um contrato de trabalho a termo certo, em virtude da substituição de um trabalhador ausente, de uma outra em que se pretenda evidenciar que, num determinado período de referência, se verificou e manteve um aumento imprevisto e excepcional da actividade de uma determinada empresa. Entre estas condições justificativas e a que se discute nos autos encontra-se uma evidente diferença. É que a justificação material que legitima o recurso à contratação a termo reside, neste caso, na esfera da disponibilidade do trabalhador. N – Esta justificação material é oferecida pelo legislador no sentido de permitir que trabalhadores ainda não enquadrados com a sua normal actividade profissional, e desde que integrados nas condições específicas de aplicação mencionadas no preceito, possam desta forma prestar trabalho, servindo um interesse que também é naturalmente da empresa, mas que, acima de tudo, se encontra estatuído a favor do trabalhador. Por esta razão, parece-nos razoável e justo admitir que a demonstração dos requisitos materiais que legitimaram a contratação a termo e que, por essa via, agora legitimam o recurso à adenda ao contrato de trabalho, pode e deve variar consoante o tipo de interesses que se pretenda acautelar em virtude da contratação e, nessa medida, não pode naturalmente impor-se à ora recorrente que, no momento em que executa a renovação do contrato de trabalho a termo certo, demonstre ou faça demonstrar, para além do que fez na adenda aqui analisada, que os motivos justificativos do recurso a este tipo de contratação, intrinsecamente respeitantes ao próprio trabalhador (sublinhe-se!), sejam por si comprovados. O – Por todas estas razões, entende a recorrente, salvo o devido que respeito, que a norma constante do diploma acima melhor identificado não foi de forma alguma violada, porque efectivamente os requisitos de facto susceptíveis de serem identificados, para este caso específico, constavam da adenda ao contrato de trabalho. P – E se o foi, no que não se concede, então tal responsabilidade não pode senão recair sobre o recorrido, na medida em que também aqui, à luz do que já anteriormente havia feito, colocou e manteve a recorrente em erro sobre pressupostos de facto que, então, afirmou como verdadeiros (daí ter aposto a sua assinatura!) e que agora, convenientemente, reconhece como falsos, de forma a consubstanciar aquilo que tão bem foi já classificado como um inadmissível abuso de direito. O autor não contra-alegou e, neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se pela não concessão da revista, em “parecer” a que as partes não reagiram. Colhidos os vistos dos juízes adjuntos, cumpre apreciar e decidir. 2. Os factos Os factos dados que, sem qualquer impugnação, vêm dados como provados desde a 1.ª instância são os seguintes: 1) Em finais de Maio de 2001, o A. foi contactado telefonicamente, para se apresentar nas instalações da Ré, no COP 3000 Coimbra, para dar início a um contrato de trabalho a termo. 2) Uns meses antes, o A. tinha prestado provas psicotécnicas a mando da Ré, pelo que, quando recebeu o telefonema, sentiu expectativas quanto ao facto de estar a ser chamado para trabalhar para a Ré. 3) À data, o A. era trabalhador efectivo de uma firma. 4) O contrato foi assinado a 1/6/01 e iniciou-se em 4/6/01. 5) Assim, a partir desta data, o A., sob a autoridade, fiscalização e direcção da Ré e mediante retribuição, iniciou a função de CRT, no CDP 3000 Coimbra, por conta da Ré. 6) A retribuição acordada foi de 102.300$00, trabalhando o A. 39 horas semanais, mediante escala de serviço existente no CDP 3000 Coimbra. 7) O contrato foi celebrado pelo período de 6 meses, a iniciar em 4/6/01. 8) Com a indicação de se tratar de um contrato para suprir necessidades transitórias de serviço. 9) Na 5ª cláusula do contrato, está referido que o A. declara nunca ter sido contratado anteriormente por tempo indeterminado. 10) O contrato terminaria em 3/12/01. 11) E efectivamente não foi o mesmo denunciado pela Ré. 12) No entanto, em 29/11/01, foi aditada, ao verso do contrato, uma adenda para o prorrogar. 13) Prorrogação essa pelo período de 12 meses. 14) Ficou, assim, o A. a trabalhar no mesmo local e com a mesma categoria profissional, as mesmas horas de trabalho e a mesma remuneração. 15) O A., naquela data, não se encontrava na situação de procurar 1.º emprego. 16) Em data que o A. não sabe precisar ao certo, foi-lhe entregue em mão um ofício datado de 18/11/02, onde a Ré o informava de que o contrato terminaria em 3/12/02 e não seria renovado. 17) Não foi instaurado qualquer processo disciplinar ao autor. 18 ) O A. sempre assegurou o mesmo tipo de serviço. 19) Foi com base no conceito de trabalhador à procura de 1.º emprego que a Ré contratou o autor. 3. O direito Nos termos do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27/2, em vigor à data dos factos em apreço nos presentes autos, a celebração de contratos de trabalho a termo só era legalmente admitida nas situações taxativamente referidas nas alíneas do n.º 1 do art.º 41.º da referido regime jurídico, que, de forma, abreviada, passaremos a designar por LCCT e a sua celebração fora daquelas situações acarretava a nulidade da estipulação do termo, mantendo-se o contrato, mas sem qualquer termo (art.º 41.º, n.º 2). Uma das situações em que a celebração de contratos de trabalho a termo era permitida ocorria quando o trabalhador contratado era trabalhador à procura de primeiro emprego ou desempregado de longa duração ou quando se encontrasse noutras situações previstas em legislação especial de política de emprego (vide alínea h) do referido n.º 1 do art.º 41.º). Todavia, para que a celebração do contrato fosse válida, não bastava que no caso se verificasse algumas das situações previstas no n.º 1 do art.º 41.º. O contrato tinha necessariamente de ser reduzido a escrito, tinha de ser assinado por ambas as partes e conter uma série de indicações, uma das quais era a do prazo estipulado com indicação do motivo justificativo ou, no caso de contratos a termo incerto, a menção da actividade, tarefa ou obra cuja execução justifique a respectiva celebração ou o nome do trabalhador substituído e data da celebração (art.º 42.º, n.º 1, al. e) da LCCT). A falta de algumas daquelas indicações acarretava a nulidade do termo e implicava a conversão do contrato em contrato sem termo. E a falta de indicação do motivo justificativo do prazo era uma delas (art.º 42.º, n.º 3, com referência à alínea e) do n.º 2). Não bastava, porém, uma qualquer referência ao motivo justificativo para que a indicação fosse válida. Segundo a doutrina e a jurisprudência, a indicação só era válida se permitisse apreender com relativa facilidade as concretas razões que integravam o motivo indicado. E, consagrando o entendimento firmado na doutrina e na jurisprudência, a Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto, veio prescrever que a indicação do motivo justificativo do prazo estipulado “só [era] atendível se mencionar concretamente os factos e circunstâncias que integram esse motivo” (art.º 3.º, n.º 1, da referida Lei 38/96). E, mais tarde, a Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, alterando o n.º 1 do art.º 3.º da Lei n.º 38/96, veio aumentar o grau de exigência daquela concretização, acrescentando que a redacção da indicação do motivo devia “permitir estabelecer com clareza a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado” (3). Por sua vez, nos termos do art.º 46.º da LCCT, o contrato de trabalho a termo caducava no termo do prazo estipulado desde que a entidade empregadora comunicasse ao trabalhador até oito dias antes de o prazo expirar, por forma escrita, a vontade de o não renovar (n.º 1), implicando a falta daquela comunicação a renovação do contrato por período igual ao prazo inicial (n.º 2). E. nos termos do n.º 4 do art.º 44.º da LCCT, considerava-se como um único contrato aquele que fosse objecto de renovação. A LCCT nada dizia acerca da renovação do contrato por período diferente do inicialmente acordado, mas a Lei n.º 38/96 veio estabelecer, no seu art.º 3.º, n.º 2, que “[a] prorrogação do contrato a termo por período diferente do estipulado inicialmente [estava] sujeita aos requisitos formais da sua celebração”, o que significava que, pelo menos, tinha de ser reduzida a escrito. Mais tarde, porém, com a Lei n.º 18/2001, a prorrogação do contrato a termo por período diferente do inicialmente passou a estar sujeita não só aos requisitos formais, mas também aos requisitos materiais da celebração do contrato, em consequência da nova redacção que aquela Lei veio dar ao n.º 2 do referido art.º 3.º da Lei n.º 38/96, a qual passou a ser a seguinte: “A prorrogação do contrato a termo por período diferente do estipulado inicialmente está sujeita aos requisitos materiais e formais da sua celebração e contará para todos os efeitos como renovação do contrato inicial.” Deste modo, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 18/2001, a renovação do contrato por período diferente do inicialmente convencionado, para ser válida, tinha de ser necessariamente reduzida a escrito e o respectivo documento devia conter, além do mais que ao caso em apreço não interessa, a indicação, devidamente concretizada, do motivo justificativo da prorrogação. E, além disso, era necessário que o motivo indicado fosse verdadeiro e fizesse parte do elenco de situações previstas no art.º 41.º, n.º 1, da referida LCCT. Feita a resenha das disposições legais atinentes ao caso em apreço, importa ajuizar do mérito do recurso. 4. As questões Como já foi referido, o Tribunal da Relação condenou a ré, por ter considerado que o termo aposto na adenda de prorrogação do contrato era nulo, pelo facto de o motivo justificativo indicado não fazer parte do elenco das situações em que a lei permite a celebração de contratos de trabalho a termo. A recorrente discorda de tal decisão, por duas ordens de razões: em primeiro lugar, por entender que o motivo indicado na adenda é o mesmo que fora indicado no contrato (trabalhador à procura de primeiro emprego); em segundo lugar, por entender que as razões que levaram a Relação a considerar abusiva a conduta do autor relativamente ao motivo indicado no contrato se mantinham válidas para a prorrogação. São, pois, duas as questões suscitadas pela recorrente: - saber se o motivo indicado na adenda é formalmente válido; - saber se houve abuso do direito por parte do autor. 4.1 Da (in)validade do termo aposto na adenda de prorrogação do contrato A adenda em questão foi subscrita em 29 de Novembro de 2001. Nessa data já a Lei n.º 18/2001, de 3 de Julho, estava em vigor, uma vez que, nos termos do seu art.º 4.º, essa entrada em vigor ocorreu 30 dias após a data da sua publicação. Deste modo, por força do disposto no art.º 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38/96, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 18/2001, a prorrogação do contrato feita através da referida adenda, estava sujeita aos requisitos materiais e formais da sua celebração, uma vez que o contrato foi prorrogado por período diferente (12 meses) do inicialmente estipulado (6 meses). E no aspecto formal, a adenda satisfaz os requisitos legais: consta de documento escrito, está assinada por ambas as partes e contém a indicação do motivo justificativo da prorrogação. Todavia, o mesmo já não acontece no que toca aos requisitos materiais, pois, como bem se diz no acórdão recorrido, o motivo nela invocado para a prorrogação do contrato não faz parte das situações em que a lei admite a contratação a termo. Efectivamente, ao contrário do que diz a recorrente, o motivo indicado na adenda não é o mesmo que foi invocado no contrato. Mais, concretamente, não foi o facto de o autor ser trabalhador à procura de primeiro emprego. O que na adenda ficou a constar foi algo bastante diferente: “As partes acordam em prorrogar o contrato celebrado em 2001-06.04, pelo período de 12 Meses em virtude de o segundo outorgante continuar na situação de procurar emprego e não ter, por motivo alheio à sua vontade, encontrado emprego compatível com a sua formação profissional.” Naquele motivo não existe a menor referência à situação de primeiro emprego. Apenas se diz que o autor continua na situação de procurar emprego compatível com a sua formação profissional. E dúvidas não há de que este motivo não se enquadra, como bem diz o acórdão e a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta, em nenhuma das situações elencadas no n.º 1 do art.º 41.º da LCCT. Poder-se-ia dizer, à luz do disposto no art.º 236.º, n.º 1, do C.C., que o verdadeiro motivo da prorrogação do contrato foi o facto de o autor continuar a ser um trabalhador à procura de primeiro emprego, por ter sido esse o motivo justificativo do prazo inicial estipulado. E admite-se, até, que essa pudesse ter sido a vontade real das partes. Todavia, como se disse nos acórdãos deste tribunal, proferidos em 30.3.2006 e em 10.5.2006, respectivamente, nos processos n.º 3921/05 e n.º 10/06, ambos da 4.ª Secção (que tiveram por relator e adjuntos os mesmos juízes conselheiros que subscrevem o presente acórdão e em que as situações em apreço eram praticamente iguais à dos presentes autos (4) ), o disposto no n.º 1 do art.º 3.º da Lei n.º 38/96 não permite que se avance nesse sentido, uma vez que nos termos daquele normativo a indicação do motivo “só é atendível se mencionar concretamente os factos e circunstâncias que objectivamente integram esse motivo, devendo a sua redacção permitir estabelecer com clareza a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”. Além disso, tratando-se de um negócio formal, aquela declaração só podia valer com um sentido que tivesse um mínimo de correspondência no texto da adenda (art.º 238.º, n.º 1, do C.C.), o que manifestamente não acontece. E sendo assim, com se entende que é, a estipulação do termo aposto na adenda é nula, o que significa que o contrato foi prorrogado sem termo, convertendo-se, por isso, em contrato sem termo, o que, por sua vez, torna ilícita a sua cessação por banda da ré, por se tratar de uma cessação sem invocação de justa causa objectiva ou subjectiva. 4.2 Do abuso do direito Nos termos do art.º 334.º do C. C., o abuso do direito traduz-se no exercício ilegítimo do direito por parte do seu titular, o que ocorre quando ele excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Segundo a concepção adoptada pelo nosso legislador (concepção objectiva do abuso do direito), não é necessário que o titular do direito tenha consciência de que, ao exercer o direito, está a exceder os aludidos limites. Basta que tais limites sejam objectivamente excedidos, sem que isso signifique que os factores subjectivos, como, por exemplo, a intenção com que titular actuou, sejam totalmente alheios ao conceito de abuso do direito. Como diz A. Varela (5), “[a] consideração desses factores pode interessar, quer para determinar se houve ofensa da boa fé ou dos bons costumes, quer para decidir se se exorbitou do fim social ou económico do direito.” Por outro lado, não basta que o titular do direito exceda os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito exercido. É necessário que o excesso cometido seja manifesto. Na decisão recorrida entendeu-se, no que toca à estipulação do termo inserida no contrato inicial, que o autor incorreu em abuso do direito ao querer aproveitar-se do facto de ter sido dado como provado que ele não era um trabalhador à procura de primeiro emprego, contrariando, assim, a declaração que havia feito aquando da celebração do contrato e que neste foi inserida. Segundo a recorrente, se, por aquela razão, a conduta do autor foi considerada abusiva no que toca à invocação da nulidade do termo inicial, nenhuma razão parece existir para que o mesmo juízo de censurabilidade e ilegalidade não seja levado a cabo no que diz respeito à adenda, uma vez que o autor colocou a ré em erro, a fim de que mais tarde pudesse vir a aproveitar-se desse erro e, por essa via, obter para si um benefício ou enriquecimento ilegítimo, pelo qual pugnou e que veio realmente a obter merecimento em consequência do acórdão recorrido. A falta de razão da ré, ora no papel de recorrente, é por demais manifesta, uma vez que, ao contrário do que aconteceu no contrato inicial, em que o autor declarou que nunca tinha sido contratado por tempo indeterminado, fazendo crer à ré que ele era efectivamente um trabalhador à procura de primeiro emprego, na adenda ao contrato o autor não emitiu qualquer declaração relativamente ao motivo nela indicado para justificar a prorrogação do termo. E mesmo que da adenda constasse que o autor havia declarado ser verdadeiro o motivo justificativo da prorrogação do termo nela inserida, não havia motivo para considerar que o autor havia incorrido em abuso do direito ao invocar a nulidade do termo da prorrogação com o fundamento de que o motivo indicado não era verdadeiro, uma vez que a nulidade do termo aposto na adenda não resultou da inveracidade do motivo indicado, mas do facto de tal motivo não fazer parte do elenco de situações em que a contratação a termo é permitida por lei. 5. Decisão Nos termos expostos, decide-se manter a douta decisão recorrida. Custas pela recorrente, nas instâncias e no Supremo. Lisboa, 12 de Setembro de 2007 Sousa Peixoto (Relator) Sousa Grandão Pinto Hespanhol -------------------------------------------------------- (1) - Relator: Sousa Peixoto (R.º 200), Adjuntos: Sousa Grandão e Pinto Hespanhol. (2) - E não DL, como, por mero lapso, é dito pelo autor. (3) - A Lei n.º 18/2001 deu a seguinte redacção ao n.º 1 do art.º 3,º da Lei n.º 38/96: “A indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo, em conformidade com o n.º 1 do artigo 41.º e com a alínea e) do n.º 1 do artigo 42.º do regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, só é atendível se mencionar concretamente os factos e circunstâncias que objectivamente integram esse motivo, devendo a sua redacção permitir estabelecer com clareza a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.” (4) - Nos processos em causa, a ré era a também aqui ré e o motivo justificativo da prorrogação dos contratos de trabalho em causa naqueles processos era o seguinte: No processo n.º 3921/05, “[a]s partes acordam em prorrogar o contrato celebrado em 2002-02-07, por um período de 4 Meses em virtude de o segundo outorgante não ter ainda, por motivo alheio à sua vontade, encontrado emprego compatível com a sua formação profissional e expectativas profissionais” e, no processo 10/96, “[a]s partes acordam em prorrogar o contrato celebrado em 2001-05-23, pelo período de 12 Meses em virtude de o segundo outorgante continuar na situação de procurar emprego e não ter, ainda, por motivo alheio à sua vontade, encontrado emprego compatível com a sua formação profissional”. (5) - Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª edição revista e actualizada, p. 298. |