Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
54/15.5JBLSB.E1.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: MANUEL AUGUSTO DE MATOS
Descritores: COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
QUESTÃO NOVA
REJEIÇÃO PARCIAL
REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS
HOMICÍDIO QUALIFICADO
MOTIVO FÚTIL
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PREVENÇÃO GERAL
PREVENÇÃO ESPECIAL
CULPA
ILICITUDE
CÚMULO JURÍDICO
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CONCURSO DE INFRAÇÕES
PENA ÚNICA
PLURIOCASIONALIDADE
Data do Acordão: 07/13/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL PENAL – JULGAMENTO / SENTENÇA / NULIDADE DA SENTENÇA – RECURSOS / RECURSOS ORDINÁRIOS / TRAMITAÇÃO UNITÁRIA.
DIREITO PENAL – CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO / DISPOSIÇÃO PRELIMINAR / ESCOLHA E MEDIDA DA PENA / PUNIÇÃO DO CONCURSO DE CRIMES – PARTE ESPECIAL / CRIMES CONTRA AS PESSOAS / CRIMES CONTRA A VIDA / HOMICÍDIO / HOMICÍDIO QUALIFICADO / CRIMES CONTRA A VIDA EM SOCIEDADE / CRIMES CONTRA O RESPEITO DEVIDO AOS MORTOS.
Doutrina:
-AMÉRICO TAIPA DE CARVALHO, Direito Penal, Parte Geral, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 65 e 66;
-ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Novo Regime (DL 303/2007, de 24-08), Almedina, 2008, 23 ; Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, 2.ª Edição, Almedina, 92 e 93;
-CLAUS ROXIN, Derecho Penal, Parte General, Tomo I, 99 a 101 e 103;
-FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial de Notícias, 227 e ss., 241 e 519 ; Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo I, Coimbra Editora, 1999, 32 e 33 ; O sistema sancionatório do Direito Penal Português inserto em Estudo em Homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, I, 815;
-GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, 2007, Volume I, 446 e 447;
-Jurisprudência Criminal, 288, RJ, 3402, 346;
-LEAL HENRIQUES e SIMAS SANTOS, Código Penal, Anotado, 151;
-M. MIGUEZ GARCIA e J. M. CASTELA RIO, Código Penal, Parte Geral e Especial, 2.ª Edição, 2015, Almedina;
-MAIA GONÇALVES, Código Penal Português Anotado e Comentado, 18.ª Edição, 515;
-MARIA JOÃO ANTUNES, Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 44;
-MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lisboa, Lex, 1997, 395.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 379.º, N.º 2, 400.º, N.º 1, ALÍNEAS E) E F), 410.º, N.ºS 2 E 3, 414.º, N.º 2 E 420.º, N.º 1, ALÍNEA B).
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 40.º, N.ºS 1 E 2, 71.º, N.ºS 1 E 2, 72.º, 73.º, 74.º, 77.º, N.ºS 1 E 2, 131.º, 132.º, N.º 2, ALÍNEA E) E 254.º, N.º 1, ALÍNEA A).
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 24.º, N.º 1.
REGIME PENAL APLICÁVEL A JOVENS DELINQUENTES, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º 401/82, DE 23 DE SETEMBRO: - ARTIGOS 1.º E 4.º.
Referências Internacionais:
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM E DAS LIBERDADES FUNDAMENTAIS: - ARTIGO 2.º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 12-07-1989, IN BMJ N.º 389;
- DE 08-04-1987, 13-07-1994, 12-04-1997, 26-05-1994, 19-10-1994, 30-01-1996, 15-10-1997 E 17-09-1997, IN BMJ 366, 450, PROCESSOS N.ºS 46.169, 46.245, 46.601, 47.027, 48.274, 48.661 E CJ, STJ, ANO V, TIII, 175;
- DE 19-10-1995, IN DR, I SÉRIE - A, N.º 298, DE 28 DE DEZEMBRO DE 1995;
- DE 15-01-1997, IN CJ-STJ, ANO V, TOMO I, 182;
- DE 25-06-1997, PROCESSO N.º 96P1253;
- DE 04-10-2001, PROCESSO N.º 1675/01-5;
- DE 15-12-2005, PROCESSO N.º 05P2978;
- DE 17-01-2007, PROCESSO N.º 06P3845;
- DE 11-07-2007, PROCESSO N.º 1583/07;
- DE 26-09-2007, PROCESSO N.º 07P2591;
- DE 13-07-2009, PROCESSO N.º 59/07.0GCVPA.S1;
- DE 27-05-2010, PROCESSO N.º 58/08.4JAGRD.C1.S1;
- DE 15-12-2011, PROCESSO N.º 706/10.6PHLSB.S1;
- DE 31-01-2012, PROCESSO N.º 894/09.4PBBRR.S1;
- DE 27-06-2012, PROCESSO N.º 127/10.0JABRG.G2.S1;
- DE 24-10-2012, PROCESSO N.º 298/11.9JELSB.L1.S1;
- DE 17-04-2013, PROCESSO N.º 237/11.7JASTB.L1. S1;
- DE 15-05-2013, PROCESSO N.º 154/12.3JDLSB.L1.S1;
- DE 16-10-2013, PROCESSO N.º 455/12.0PCLSB.L1.S1;
- DE 19-02-2014, PROCESSO N.º 168/11.0GCCUB.S1;
- DE 18-06-2014, PROCESSO N.º 578/12.6JABRG.G1;
- DE 03-07-2014, PROCESSO N.º 1081/11.7PAMGR.C1.S1;
- DE 27-05-2015, PROCESSO N.º 445/12.3PBEVR.E1.S1;
- DE 13-04-2016, PROCESSO N.º 61/15.8PFLRS.L1.S1;
- DE 09-03-2017, PROCESSO N.º 582/05.0TASTR.E1.S1;
- DE 22-03-2017, PROCESSO N.º 243/15.2JAFAR.S1;
- DE 29-03-2017, PROCESSO N.º 2183/14.3JAPRT.P1.
Sumário :

I - Não tendo o recorrente suscitado no recurso interposto para a Relação a questão da não aplicação do regime penal dos jovens delinquentes a formulação de tal questão perante este STJ constitui a formulação de uma questão nova, sendo de rejeitar o recurso, por inadmissibilidade legal, nos termos dos arts. 420.º, n.º 1, al. b), e 414.º, n.º 2, ambos do CPP.
II - Não será de aplicar o regime dos jovens delinquentes quando do conjunto dos factos praticados e a sua gravidade o desaconselham em absoluto, por não se mostrar passível de prognose favorável à reinserção social do arguido.
III - Tendo o arguido sido condenado, em 1.ª instância, nas penas parcelares de 17 anos de prisão, pela prática de um crime de homicídio qualificado, e de 1 ano de prisão, pela prática de um crime de profanação de cadáver, condenação essa confirmada pelo Tribunal da Relação, forçoso é considerar, tendo em conta o disposto no art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, que a decisão relativa à fixação da sobredita pena parcelar de 1 ano de prisão é irrecorrível, por se tratar de uma pena não superior a 8 anos, confirmada pela Relação.
IV - A irrecorribilidade quanto a tal pena, por inferior a 5 anos, resultaria sempre do disposto no art. 400.º, n.º 1, al. e), do CPP, em conformidade com o disposto nos arts. 420.º, n.º 1, al. b), e 414.º, n.º 2, do CPP, rejeitando-se o recurso nessa parte, ficando consequentemente, o recurso confinado às questões respeitantes à pena de 17 anos de prisão, aplicada pelo crime de homicídio qualificado, e ainda à pena única fixada em cúmulo jurídico das referidas penas singulares, já que superiores a 8 anos.
V - Não merece censura a qualificação jurídica efectuada pelo tribunal colectivo do crime de homicídio qualificado como motivado por motivo fútil, se o arguido ao praticar os actos de execução do crime de homicídio, foi motivado pela satisfação dos seus instintos agressivos no contexto de uma discussão ocorrida momentos [antes] sobre uma temática que o desagradou - relacionada com a exigência que lhe fora feita por terceiros no sentido de proceder ao pagamento de uma dívida de reduzido valor - [circunstância] fortemente indiciadora da especial censurabilidade ou perversidade do autor do crime de homicídio simples, que encerra o fundamento da agravação. Na realidade, não se está perante uma discussão relevante que alterasse psicologicamente o arguido a ponto de o motivar à prática dos factos tanto mais que a discussão ocorreu inesperadamente no contexto de um encontro num local de habitual convívio com os seus pares (entre os quais se incluía a vítima) a solicitação da própria vítima.
VI - Ponderando o muito elevado grau de ilicitude dos factos, assumindo a culpa do arguido a forma de dolo directo, em elevada intensidade, tendo o arguido manifestado em todo o processo executivo do crime uma vontade firme dirigida ao facto e à concretização do resultado final, uma intensidade, energia e vigor que impressionam negativamente, numa sucessão de golpes com utilização de uma barra de ferro na cabeça da vítima, de 14 anos de idade, o que revela um total desprezo pela sua vida, para além de uma acentuada crueldade, sendo elevadas as exigências de prevenção geral, mas não se podendo ignorar a jovem idade do arguido na data do crime - 17 anos - e a natural imaturidade que, em geral, se lhe associa, e as condições com que se deparou no decurso da formação da sua personalidade, em que avulta o falecimento do seu pai e da sua avó paterna poucos meses depois, as duas pessoas «com quem tinha uma relação de maior proximidade e afecto», pretendendo transmitir ao arguido uma mensagem no sentido de interiorizar que deve investir na sua formação e ressocialização, entendemos que se justificará uma diminuição, ainda que ligeira, da pena de 17 anos de prisão (que lhe foi aplicada em 1.ª instância mantida pela Relação) a aplicar ao crime de homicídio, entende-se adequada e justa a pena de 16 anos de prisão pela prática do crime de homicídio qualificado.
VII - Na leitura compreensiva dos factos provados, o circunstancialismo que rodeou a execução dos crimes de homicídio e de profanação de cadáver, cuja conexão entre ambos é por demais evidente, revela um ilícito global gravíssimo e uma personalidade do arguido-recorrente muito desvaliosa que, não respeita valores essenciais ao viver em sociedade e às normas que a regem, pelo que, perante uma moldura abstracta de cúmulo jurídico que se situa entre os 16 anos e os 17 anos de prisão, ponderando os factos, a natureza dos bens jurídicos violados, resultando uma notória conexão entre os crimes praticados, perante a gravidade do ilícito global e a personalidade muito desvaliosa do arguido, consideramos justa e adequada a pena única de 16 anos e 6 meses de prisão.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I - RELATÓRIO

1. O arguido AA, ..., actualmente detido no Estabelecimento Prisional de ..., foi condenado, por acórdão de 22 de Abril de 2016, proferido pelo Tribunal Colectivo da Secção Criminal da Instância Central da Comarca de ... –, como autor material, em concurso efectivo, de:

- 1 crime de homicídio qualificado, p. e  p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.º 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 17 anos de prisão;

- 1 crime de profanação de cadáver, p. e p. pelo artigo 254.º, n.º 1, alínea a), Código Penal, na pena de 1 anos de prisão.

Em cúmulo jurídico, foi condenado na pena única de 17 anos e 6 meses de prisão.

2. Dessa decisão interpôs o arguido recurso para o Tribunal da Relação de Évora que, por acórdão 11 de Outubro de 2016, lhe negou provimento, confirmando integralmente a decisão condenatória da 1.ª Instância.

 

3. De novo inconformado, interpõe o presente recurso, rematando a respectiva motivação com as seguintes:

«CONCLUSÕES:

1. O arguido e recorrente AA foi condenado por douto acórdão proferido pela Instância Central de Santarém, Secção Criminal da Comarca de Santarém, como co-autor material e em concurso real de:

a) Um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131.°, 132.°, n.º 2, alínea e), todos do CP, na pena de 17 anos de prisão;

b)        Um crime de profanação de cadáver previsto e punido pelo artigo 254.°, n.º 1, alínea a) do CP, na pena de um ano de prisão, e, em cúmulo jurídico na pena única de 17 (dezassete) anos e 6 (seis) meses de prisão

2. Inconformado o recorrente/arguido recorreu para o Venerando Tribunal de Relação, o qual, proferiu venerando acórdão, negando "provimento ao Recurso, mantendo o acórdão recorrido, quanto às penas parcelares e única aplicada ao arguido, bem como ao montante de indemnização em que foi condenado pelos danos não patrimoniais causados".

3. Consigna-se, desde já, que nos termos do estatuído na lei penal adjectiva, o presente recurso incidirá apenas sobre a medida da pena de prisão aplicada em concreto, por se mostrar, na óptica do recorrente, manifestamente injusta, desadequada e desproporcionada, atendendo aos seguintes fundamentos:

4. A idade do arguido

O arguido, à data da prática dos factos tinha 17 anos de idade, tem actualmente 19 anos de idade, sofreu, durante a infância e adolescência, um conjunto de disfuncionalidades familiares e sociais, reportadas nos autos, quer em primeira, quer em segunda instância, e apreciadas, que destabilizaram a sua formação pessoal e que, seguramente contribuíram para uma menor estabilidade e responsabilidade na sua conduta e que contribuíram, sobremaneira para uma vida de consumidor e traficante de menor gravidade, com todas as consequências que lhe estão subjacentes, e que são sobejamente conhecidas na nossa sociedade.

Afigura-se ao recorrente, que a devida apreciação destas situações deveria ter sido ponderada no sentido de atenuar as medidas das penas aplicadas em concreto, em vez de as qualificar

5. O regime especial para jovens

Como supra referiu, ao recorrente dever-lhe-ia ter sido aplicado o regime especial para jovens, no sentido de, ponderadas as suas situações familiares, sociais e económicas, e, em função desse regime deveriam as instâncias anteriores ter ponderado a aplicação das penas parcelares pelo mínimo legal

6. O contacto com o ambiente prisional

Na modesta opinião do recorrente, o qual tem à data 19 anos e tinha 17 anos à data da prática dos factos, já tem dois anos de contacto, em prisão preventiva, com o ambiente prisional, deverá ser evitado, na medida do possível, o menor contacto com esse ambiente para não adquirir todos os vícios e condutas inerentes ao mesmo, o qual, a maior parte das vezes, em vez de contribuir para a ressocialização e integração dos reclusos na sociedade, produz o efeito inverso, razão pela qual deverão as penas aplicadas ser reduzidas

7. A moldura penal aplicável

Face às razões supra aduzidas, deveriam as penas parcelares ser aplicadas pelo mínimo e, após, ser aplicado o cúmulo jurídico, em pena não superior a 14 anos de prisão efectiva

8. No tocante à condenação no pedido de indemnização civil, nada a apontar

9. Face ao exposto, salvo devido respeito, por opinião diversa, o venerando acórdão recorrido violou os art.ºs 71.° e 72.°, ambos de Código Penal, devendo, por isso, a pena ser atenuada e reduzida, na justa medida em que essa redução realizará, seguramente, de forma adequada e suficiente as finalidades da punição

10.       Pelo que ao recorrente não deverá ser aplicada pena superior a 14 anos de prisão

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO APLICÁVEIS, SEMPRE COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE Vªs Ex.ªs DEVE O PRESENTE RECURSO SER CONSIDERADO PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, SER A PENA DE PRISÃO APLICADA AO RECORRENTE REDUZIDA PARA CATORZE ANOS DE PRISÃO.»

4. Respondeu o Ministério Público, concluindo:

«EM CONCLUSÃO:

1- Os recursos são remédios jurídicos que se destinam a corrigir erros que, no caso, serão de direito e cometidos pelo douto acórdão recorrido, proferido em 2ª instância pelo Tribunal da Relação de Évora.

2- Por isso, se o recorrente não questiona, aquando do recurso interposto do acórdão proferido em 1ª instância, a correcção da opção pela não aplicação do regime especial para jovens, consagrado no Dec-Lei nº 401/ 82 de 23 de Setembro, não poderá fazê-lo no recurso interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Évora que dela não conheceu.

3- Ao impugnar as medidas das penas, parcelares e única, aplicadas pelo Tribunal da Relação de Évora o recorrente deveria ter invocado erros de procedimento que se teriam constituído em erros de direito, o que não fez, antes limitando-se a pugnar pela comutação in melius dessas mesmas penas.

4- Na fixação da pena há que atender aos critérios gerais da prevenção e da culpa, nos termos estatuídos no artigo 40°, 71 o do Código Penal e, ainda, à consideração conjunta dos factos e à personalidade do arguido neles revelada, nos termos do artigo 77° do mesmo diploma legal.

5- No caso em apreço, considerando a ilicitude dos factos, a culpa e as elevadas exigências de prevenção geral e especial e, ainda, porque o recorrente não beneficiou do arrependimento não deverá a decisão recorrida sofrer correcção modificativa.

6- O tribunal recorrido não cometeu qualquer erro de direito, quer no que concerne à aplicação dos princípios da adequação e proporcionalidade que não violou, quer no que concerne às operações de determinação das penas parcelares e única, seja na vertente do limite da culpa, seja na vertente da actuação dos fins das penas.

7 - Nenhuma censura, será, pois, de assacar ao douto acórdão proferido por este Tribunal da Relação de Évora que fez adequada interpretação e aplicação da lei.

Nestes termos, e nos demais de direito que doutamente se suprirão, entendemos ser de negar provimento ao recurso interposto pelo arguido confirmando-se, integralmente, o douto acórdão recorrido.»

5. O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal emitiu proficiente parecer de que se transcreve o seguinte trecho[1]:

            «1 – Do recurso:

1.1 – O arguido AA, com os demais sinais dos autos, foi condenado em 1.ª Instância – por Acórdão datado de 22-04-2016, proferido pelo Tribunal Colectivo da Secção Criminal da Instância Central da Comarca de Santarém –, como autor material, em concurso efectivo, de (i)1 crime de “homicídio qualificado, da previsão dos arts. 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2/e) do Código Penal; e (ii)1 crime de “profanação de cadáver”, da previsão do art. 254.º, n.º 1/a), também do Código Penal, nas penas parcelares de 17 (dezassete) anos e de 1 (um) ano, ambas de prisão, respectivamente, e, em cúmulo jurídico, na pena única de dezassete (17) anos e seis (6) meses de prisão.

            1.2 – Desta decisão recorreu para o Tribunal da Relação de Évora onde, por acórdão de 11 de Outubro de 2016, exarado a fls. 1730 e segs., se decidiu negar-lhe provimento, confirmando integralmente aquele veredicto condenatório da 1.ª Instância.

 

            1.3 – É esta última decisão que, ainda inconformado, o arguido traz agora ao reexame deste Supremo Tribunal, em cuja motivação, subsequentemente densificada nas 10 conclusões que a final dela extrai, coloca apenas duas questões: prende-se a primeira, neste ponto ex novo, com a não aplicação do regime penal dos jovens delinquentes, normativamente previsto no art. 4.º do DL n.º 401/82, de 23 de Setembro; e a segunda com a medida concreta de cada uma das sobreditas penas, as parcelares e a pena unitária, que tem por excessivas, pugnando pela redução das primeiras para os respectivos mínimos legais e da segunda para não mais de 14 anos de prisão.

1.3.1 – O recorrente não requereu audiência, nos termos do previsto no n.º 5 do art. 411.º do CPP, pelo que deve o recurso ser conhecido em conferência (art. 419.º, n.º 3/c), do CPP). 

*

            2 - Do mérito do recurso:

            Emitindo parecer, como nos cumpre, sobre as questões que vêm colocadas, cabe dizer o seguinte:

2.1 – Quanto à questão da não aplicação do regime penal dos jovens delinquentes:

2.1.1 – Antes de mais, e secundando a questão prévia neste ponto suscitada, na sua resposta, pela magistrada do Ministério Público junto da Relação, deve dizer-se que, muito embora coubesse nos poderes cognitivos deste Supremo Tribunal conhecer da matéria em causa – [isto, bem entendido, no que diz respeito ao exercício de determinação da pena pelo crime de homicídio[2]–, porque superior a 8 anos de prisão, a verdade é que esse segmento da decisão proferida em 1.ª Instância[3] não foi minimamente impugnado pelo recorrente no recurso que então interpôs para a Relação, não fazendo por isso parte do objecto desse recurso. Com o que comprometeu irremediavelmente o recorrente, no segmento em que o recurso seria viável, a possibilidade de reexame do Acórdão da Relação, ora recorrido.

Com efeito, e como é sabido, os recursos constituem meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamento de questões novas. Os recursos ordinários visam, pois, a reapreciação da decisão proferida, não podendo ser colocadas ao tribunal superior questões novas, não suscitadas perante o tribunal “a quo”. Neste quadro, interposto recurso de aresto da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça, não pode este último Tribunal ser chamado a pronunciar-se sobre matérias não colocadas pelo recorrente perante o tribunal recorrido ou sobre pedidos que ali não foram formulados, ressalvadas, bem entendido, as questões de conhecimento oficioso, que ora também não estão em causa.

2.1.2 – Mas sempre se dirá que, reconhecendo embora alguma flutuação na jurisprudência sobre esta problemática, temos como melhor doutrina a que defende configurar a norma do art. 4.º do DL nº 401/82, um fundamento autónomo de atenuação especial fundado directamente na idade, e que tem como pressuposto o juízo que deve ser formulado sobre a existência de «sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado».

            E, por outro lado, esse juízo reverte essencialmente às condições pessoais e de carácter do jovem condenado – condições de vida, familiares, educação, inserção, de prognose sobre o desempenho da personalidade, mais do que à gravidade das consequências do facto.

           Nesse sentido apontava seguramente, cremos, o ACSTJ de 21.04.05 - Rec. n.º 658/05/5ª, quando afirmava que, citamos, “A atenuação especial da pena para jovens delinquentes, prevista no art.º 4.º do Dec.-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, não se aplica apenas à criminalidade menor, antes se torna mais necessária para crimes de moldura penal mais elevada, quando a imagem global que se forma dos factos e da personalidade do agente nos aponta no sentido de uma futura ressocialização”.

            Também é certo que essa não é uma posição única no panorama da aplicabilidade do Regime em questão, pois é conhecido outro posicionamento em que à gravidade do ilícito e às necessidades da prevenção geral é atribuído um papel mais preponderante.

De todo o modo, e mesmo não partindo assim da gravidade dos factos, o juízo sobre as «sérias vantagens» não pode porém, de todo, prescindir, como momento relevante de julgamento, da refração de duplo sentido da personalidade para os factos (momento fortemente desvalioso pelo desprezo pela vida humana e pelo modo de execução do crime) e dos factos para a personalidade (a não evidência de qualquer tipo de sentimento e/ou de arrependimento). E neste quadro, dependendo a ressocialização da vontade do agente, cremos que a ponderação da relação entre os factos e a personalidade não permite revelar, no caso, a vontade que é pressuposto dessa ressocialização.

           Como se dizia também no ACSTJ de 16.11.06 - Rec. n.º 3524/06/5ª., “pese embora a aplicação do regime em causa (DL n.º 401/82) não fique excluído liminarmente perante a relativa gravidade do crime ou crimes em causa, o certo é que na sua aplicação importa sempre uma avaliação complexa da situação do jovem, nomeadamente a ponderação prognóstica sobre as reais vantagens que para si resultem em termos de reinserção social da aplicação de tal regime favorável, mormente em termos de prevenção da reincidência”.

Partindo dos princípios acima definidos, pode então dizer-se que não é sequer apenas pela via da gravidade do ilícito praticado que há que afastar a atenuação especial que resulta da aplicação do regime dos Jovens, mas sim, e sobretudo, pela constatação de que do conjunto dos factores que, devida e exaustivamente, nos dá conta a este respeito, na sua decisão, a 1.ª Instancia[4], ressalta uma personalidade pouco juvenil ou pouco própria da imaturidade de um jovem, a revelar pelo contrário uma especial perigosidade e por isso, bem longe da criminalidade típica da delinquência juvenil.

Convenhamos pois, manifesta e inexoravelmente, que inexistem de todo, tal como se decidiu, motivos para concluir pela verificação de sérias razões para crer nas vantagens da atenuação especial reclamada pelo recorrente.

2.2 – Quanto à medida concreta das penas:

2.2.1 – Da delimitação do seu, possível, âmbito:

O arguido foi condenado em 1.ª Instância, como decorre do que acima se relatou, nas penas parcelares de 17 anos de prisão, por um crime de “homicídio qualificado”; e 1 ano de prisão, por um crime de “profanação de cadáver”; e na pena única, em cúmulo jurídico, de 17 anos e 6 meses de prisão.

Tendo em conta a decisão da Relação, que confirmou, como vimos, qualquer daquelas penas, estando assim configurada uma situação de “dupla conforme” condenatória, nenhuma dúvida pode subsistir sobre a irrecorribilidade do decidido, nos termos das alíneas e) e f) do n.º 1 do art. 400.º do CPP vigente, na redacção introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro, quanto à sobredita pena de 1 ano de prisão, aplicada pelo crime de profanação de cadáver: trata-se com efeito, nesta parte, de uma pena não superior a 5 anos, aplicada e/ou confirmada em recurso, pela Relação.

           Segue-se portanto, neste quadro, que o presente recurso não pode desde logo, e à partida, deixar de ficar confinado, apenas, às questões respeitantes à outra pena [de 17 anos de prisão, pelo crime de homicídio], tal como ainda à pena única do concurso [17 anos e 6 meses de prisão], isto porque, também independentemente da existência ou não de “dupla conforme”, fixadas ambas em medida superior a 8 anos de prisão.

            Aqui chegados,

2.2.2 – Da medida da pena parcelar pelo crime de homicídio:

Liminarmente, e tendo em conta que, mesmo não sendo objecto de controvérsia, sempre a questão cabe, nesta sede, nos poderes, oficiosos, de cognição deste Tribunal, há que sublinhar que nos não merece reparos a qualificação jurídica dos factos operada pela 1.ª Instância e acolhida pela Relação, isto mesmo na parte em que convoca a circunstância qualificativa da alínea e) do n.º 2 do art. 132.º do Código Penal, como susceptível de evidenciar uma densidade acrescida de culpa do arguido na prática do homicídio.

           Como se provou, com efeito, no local descrito no ponto 1 da decisão de facto proferida, onde através de mensagem escrita que lhe dirigiu, atraiu a vítima, BB, e estando então ali sozinhos, após troca de palavras a propósito de uma exigência que lhe fora feita [ao arguido], por terceiros no sentido do mesmo assegurar, com brevidade, o pagamento de uma dívida contraída pelo BB, da ordem dos € 300,00, referente à aquisição de produto estupefaciente, o arguido e ora recorrente AA, munido de uma barra de ferro com cerca de 63 cm, 1Kg de peso e com uma faixa de borracha preta numa das extremidades, espancou-o brutalmente até à morte, com diversas e violentas pancadas na zona da cabeça.

Ora, a qualificativa enunciada na sobredita alínea e) do n.º 2 do art. 132.º do CPP, refere, entre outras circunstâncias que ora não importa equacionar, o facto de o agente ter atuado por motivo torpe ou fútil.

            Como é sabido, «fútil» quer dizer insignificante, sem relevo.

            Para Maia Gonçalves, In “Código Penal Português”, pág. 515, é um motivo «que não tem qualquer relevo, que não chega a ser motivo, que não pode sequer razoavelmente explicar (e portanto muito menos de algum modo justificar) a conduta. Trata-se de um motivo notoriamente desproporcionado para ser sequer um começo de explicação da conduta».

            Segundo Figueiredo Dias, In “Comentário Conimbricense do Código Penal”, Tomo I, pág. 32/33, o motivo torpe ou fútil é um motivo da actuação «avaliado segundo as concepções éticas e morais ancoradas na comunidade [que] deve ser considerado pesadamente repugnante, baixo ou gratuito […] de tal modo que o facto surge como produto de um profundo desprezo pela vida humana».

            Também de acordo com a jurisprudência do STJ, «motivo torpe é o indecoroso, impudico, sórdido, que repugna a generalidade das pessoas» [Acórdão de 12-02-1998, Processo n.º 1414/97, da 3.ª Secção]. «É o que se considera comummente como muito repugnante ou baixo» [Acórdão de 12-04-2012, Processo n.º 249/11.0PCSNT.S1, da 5.ª Secção]

            Para se avaliar, pois, se um motivo é fútil não pode deixar de relacionar-se a gravidade do comportamento com o móbil do crime. E então, se nenhum motivo justifica causar a morte de outrem – daí a tutela penal que a lei lhe confere –, a grande desproporção entre o que se elege como motivo da acção e aquilo em que esta se analisa, transforma a conduta, não só em algo de todo intolerável, como também absurdo, sem explicação à luz das concepções éticas correntes da sociedade. A razão do cometimento do crime tem um valor irrisório para o normal dos cidadãos, comparado com o mal que com este se provoca.

           A esta luz, e quanto à apontada qualificativa, há então que enfatizar que nos revemos inteiramente no enunciado das circunstâncias da prática do homicídio a este propósito feito, em 1.ª Instância, pelo Tribunal Colectivo, e acolhido pela Relação no aresto recorrido, dele extraindo igualmente, tendo em atenção a motivação acima enunciada, reveladora de inqualificável baixeza de carácter, e aliás também de acordo com a jurisprudência e doutrina acima citadas, mostrar-se verificada a censurabilidade acrescida que é pressuposto da convocação ao caso desta agravante qualificativa. A ponderação das circunstâncias concretas da prática do homicídio serão portanto, também em nosso juízo, de molde a inculcar a ideia daquela diferença essencial de grau susceptível de, como diz Teresa Serra, preencher também o chamado Leitbild deste exemplo-padrão. De resto, e na esteira do decidido no recente acórdão desta 3.ª Secção, proferido no âmbito do processo n.º 78/15.2JALRA.C1.S1, datado de 30-11-2016, sempre as circunstâncias concretas da conduta empreendida pelo arguido, como bem concluiu e afirmou também a 1.ª Instância, permitiriam convocar a cláusula geral de especial censurabilidade contida no n.º 1 do art. 132.º do Código Penal, o denominado “homicídio qualificado atípico”. 

2.2.3 – Esclarecido este ponto, e assim no quadro do homicídio qualificado pela circunstância densificada na mencionada alínea e) do n.º 2 do art. 132.º do Código Penal, anotou o aresto recorrido, para a fundamentação da medida da pena, que, citamos, «[…] Para a determinação das penas parcelares, o tribunal teve em conta os seguintes elementos:

“(...) o elevado grau de ilicitude dos factos, bem como a intensidade do dolo com que o arguido agiu, pois que sabia e quis agir do modo descrito com o propósito de tirar a vida de BB e de ocultar o cadáver do mesmo.

A escolha da cabeça como zona corporal privilegiada para objecto de agressão, a intensidade desta e a sucessão de golpes revelam um dolo intensíssimo.

De acentuar também a crueldade ínsita na utilização de uma barra metálica como instrumento do crime, provocando imenso sofrimento na vitima.

(...) as qualidades da sua personalidade manifestadas no facto, que revelam uma marcada desconformação com o direito, atenta a gravidade e o modo de execução dos factos (pautado por uma ostensiva persistência em consumar o crime de homicídio), mediante a perpetração de sucessivos actos de intensa violência.

Saliente-se que o arguido demonstrou uma manifesta falta de respeito pela vida de BB e uma total ausência de sentido crítico, mostrando-se incapaz de interiorizar o desvalor jurídico, nesta parte da sua conduta.

(...) nenhumas atenuantes de relevo se apuraram. A confissão parcial e a ausência de antecedentes criminais também tem escasso valor atenuativo, por corresponder a situação de normalidade das pessoas fieis ao direito. A conduta do arguido e a violência súbita e inesperada que nele desencadeou a discussão com a vítima, induz algumas exigências de prevenção especial.

No que concerne às exigências de prevenção geral, diremos que as mesmas se fixam num grau muito alto, merecendo, no caso em apreço, um especial cuidado, não só porque tem frequentemente sido levadas a cabo na nossa sociedade, mas também por a comunidade exigir uma repressão eficaz destas condutas delituosas com o fim de prevenir a sua renovação.

Quanto às exigências de prevenção especial, como bem consta do acórdão recorrido, teremos que atender a dificuldade que o arguido apresenta de integração familiar, escolar e social, que se reflectem na relação com os seus pares. Estas dificuldades são decorrentes de um contexto familiar no qual o arguido não se sente seguro e integrado e de perdas afectivas significativas, de familiares de referência, que contribuíram para sentimentos depressivos e comportamentos anti-sociais. […]

O arguido alega que confessou parte dos factos e que é delinquente primário, mas há que tem em conta, que estas circunstâncias foram tidas em conta na medida da pena e tem um escasso valor atenuativo, pelas razões acima referidas.

Mais refere o arguido que, os factos em causa nos autos não poderão ser dissociados da vida madrasta que sempre lhe esteve reservada, dado que se viu privado desde muito cedo, os dez anos, de referências familiares, perda do pai e da avó paterna, chegando a estar institucionalizado e muito menos do seu estado psicológico debilitado, que lhe conferem um grau de culpa diminuído.

Sem dúvida que, a vida tem sido madrasta para o arguido, uma vez que a sua infância e adolescência têm sido problemáticas, mas há que ter em conta que, já teve algumas oportunidades, nomeadamente quando esteve institucionalizado de Setembro de 2010 a Abril de 2012 e posteriormente de Novembro de 2012 a Agosto de 2014, em que em Março de 2013 lhe foi aplicada a medida de internamento em Centro Educativo de dezoito meses, para reflectir sobre o seu modo de vida e arrepiar caminho do tipo de vida desviante que levava, o que não fez.

Alega ainda o arguido que o seu estado psicológico debilitado lhe conferem um grau de culpa diminuído, mas também, não lhe assiste razão, dado que como consta do relatório de avaliação psicológica de fis. 1187 e segs. e do depoimento do Dr° CC, que presentemente lhe presta acompanhamento no Estabelecimento Prisional, que indubitavelmente não padece de qualquer problema de saúde mental e que apresenta debilidades ao nível do seu funcionamento emocional, que se pautam, alem do mais, pela falta de empatia, a impulsividade e, a agressividade.

Sopesando os elementos referidos, e as molduras penais que em abstracto correspondem aos crimes cometidos consideram-se justas adequadas e proporcionais as penas que parcelares que lhe foram aplicadas […].

Revemo-nos inteiramente nestes considerandos. E uma vez que nem o próprio recorrente, em boa verdade, ousou enfrentá-los, pouco mais se nos oferece aditar em defesa do decidido senão que, tendo em conta quer os critérios legais aplicáveis – arts. 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal –, quer sobretudo a moldura penal abstracta ao caso convocável – prisão de 12 a 25 anos –, se nos afigura que a pena concretamente cominada – 17 anos de prisão[5] – não excederá, de todo, a medida permitida pela culpa nem a indispensável à satisfação das necessidades da punição.

Ademais, e não obstante a juventude do arguido, entendemos que não só razões de prevenção especial, mas também necessidades de prevenção geral positiva[que se aferem tendo em conta, como ensina Figueiredo Dias[6], a forma concreta de execução do facto, a sua específica motivação e as consequências que dele resultaram, a situação da vítima e a conduta anterior do agente] – impõem uma censura penal com uma dimensão suficiente para reforçar na comunidade a ideia de efectiva vigência da norma violada e, do mesmo passo, pacificar os sentimentos de incompreensão, e até de revolta, que um comportamento como o do arguido necessariamente suscita.

2.2.4 – Da medida da pena unitária:

Tendo em conta a muito reduzida margem de manobra do Tribunal no exercício de unificação das penas aqui em equação, isto em face da também muito pequena distância entre os respectivos limites, mínimo, de 17 anos de prisão, e máximo, de 18 anos de prisão, estamos em crer qua a opção tomada, fixando a pena única em 17 anos e 6 meses de prisão e, assim, seguindo de resto critério idêntico ao utilizado para a fixação das penas parcelares, próximo do seu limiar médio, não poderá oferecer reparos de maior.

Dir-se-á aliás que, bem vista a motivação neste ponto esgrimida, temos por certo que, contestando embora a medida da pena do concurso, o recorrente fá-lo no pressuposto do triunfo da sua pretensão quanto à medida de cada uma das penas parcelares.

Mas claudicando, nos termos e pelo acima evidenciado, qualquer desses segmentos da sua impugnação, segue-se que também aqui – no presente recurso – nenhuma questão subsiste que se prenda com a medida da pena única do concurso de ambas as sobreditas penas. Isto desde logo porque, e revisitando o texto da motivação oferecida, nem uma palavra alinhou o recorrente sobre a Tendo desde logo matéria em causa. E muito menos sobre o quadro legal de determinação, nesta sede, da medida da pena única, quadro esse densificado, como é sabido, nos arts. 77.º e 78.º do Código Penal.

***

2.3 – TERMOS EM QUE, e sem necessidade de mais desenvolvidos considerandos, se emite parecer no sentido de que:

2.3.1 – É de rejeitar o recurso, por inadmissibilidade legal – nos termos dos arts. 434.º e 420.º, n.º1/b) do CPP –, Isto nos segmentos em que o recorrente convoca, quer por um lado a questão da não aplicação do regime penal dos jovens delinquentes, quer por outro a reapreciação da medida da pena pelo crime de ocultação de cadáver;

            2.3.2 – É de negar, quanto ao mais, provimento ao recurso, confirmando antes o veredicto condenatório proferido.»

            6. Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, doravante CPP, nada mais tendo sido dito.

            7. Colhidos os vistos, por não ter sido requerida a audiência, o recurso será apreciado em conferência – artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP, cumprindo decidir.

            II – FUNDAMENTAÇÃO

            1. Os factos

           As instâncias consideraram provados e não provados os seguintes factos:

            «1.º FACTOS PROVADOS                                                        

Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com interesse para a boa decisão da mesma:

1) AA tinha acesso e utilizava a fracção correspondente ao ..., que designava por “spot”.

2) No dia 11 de maio de 2015, em hora não concretamente apurada, mas situada entre as 20 horas e as 21h 57m, AA encontrou-se com BB no referido “spot”, depois deste lhe ter enviado uma mensagem escrita a marcar esse encontro.

3) Quando se encontravam no interior do referido “spot”, iniciou-se uma troca de palavras entre ambos a propósito da exigência que fora feita a AA por terceiros no sentido do mesmo assegurar, com brevidade, o pagamento de uma dívida contraída por BB em circunstâncias não concretamente apuradas, referente à aquisição de produto estupefaciente de valor indeterminado, mas nunca superior a €300,00 (trezentos euros).

4) No decurso desta discussão, AA muniu-se de uma barra em ferro, medindo cerca de 63 cm (sessenta e três centímetros) e com o peso de um 1Kg (um quilograma) e com uma faixa de borracha preta numa das extremidades e desferiu diversas e violentas pancadas no corpo de BB, atingindo-o por diversas vezes na zona da cabeça.

5) Em consequência da actuação descrita, AA provocou em BB as lesões traumáticas melhor descritas no relatório de autópsia médico-legal de fls. 883 a 886, as quais se dão aqui por integralmente reproduzidas, nomeadamente:

Na cabeça:

- Duas feridas contusas na região frontal, coronais e paralelas, distando 3 cm (três centímetros) entre si, a mais anterior na linha média e à direita da linha média com 2,8 cm (dois centímetros e oitenta milímetros) de comprimento e a posterior com 4,5 cm (quatro centímetros e cinquenta milímetros) de comprimento;

- Ferida contusa na região parietal esquerda, coronal, com 1,8 cm (um centímetro e oitenta milímetros) de comprimento;

- Ferida contusa na região fronto-parietal esquerda, sagital, com 3 cm (três centímetros) de comprimento;

- Duas escoriações na região malar esquerda, a superior com eixo maior vertical com 2 cm × 1,5 cm e a inferior linear e oblíqua para baixo e para a esquerda com 2,3 cm (dois centímetros e trinta milímetros) de comprimento;

- Escoriação na região malar direita, com eixo maior oblíquo para baixo e para a esquerda com 5 cm × 3 cm;

- Equimose roxa escura em ambas as pálpebras;

- Fractura do osso frontal, com 5 (cinco) esquirolas afundadas interessando uma área de 8 cm × 7 cm, a qual continua-se com traço de fractura linear até à sutura parieto occipital, com 14 cm (catorze centímetros) de comprimento;

- Fractura dos andares anteriores, andar médio direito e rochedo esquerdo;

- Hemorragia subaracnoideia sobre todo o hemisfério cerebral direito;

- Focos de contusão na base do cérebro, nos lobos frontais e polo frontal direito;

- Hematoma das pálpebras superior e inferior, bilateralmente;

No tórax:

- Equimose roxa na face posterior do tronco, estendendo-se desde a região escapular direita até ao até ao terço inferior do dorso, terminando na linha média, com eixo maior oblíquo para baixo e para a esquerda com 11 cm × 5 cm;

Membro superior direito:

- Três escoriações no cotovelo, na face postero-lateral, arredondadas: a superior com 0,5 cm (cinquenta milímetros) de diâmetro, a média com 0,80 cm (oitenta milímetros) de diâmetro e a inferior com 1 cm (um centímetro) de comprimento;

- Escoriação na face postero-lateral do antebraço, com eixo maior vertical de 1,5 cm × 0,5 cm;

- Equimose encarnada no dorso da mão com eixo maior horizontal com 8,5 cm × 5,5 cm;

Membro superior esquerdo:

- Três escoriações no cotovelo, na face postero-lateral, duas superiores e no mesmo plano horizontal, distando 0,5 cm (cinquenta milímetros) entre si, a média linear com 0,80 cm (oitenta milímetros) de comprimento e a outra com eixo maior vertical com 2,4 cm × 0,8 cm e a inferior com 0,7 cm de diâmetro;

Membro inferior direito:

- Três equimoses vermelhas na perna, na face anterior, situadas 3cm (três centímetros), 7 cm (sete centímetros) e 11 cm (onze centímetros) abaixo do pólo inferior da rótula: a superior com eixo maior horizontal, com 1,5 cm × 1 cm, a média com eixo maior vertical com 3 cm × 2 cm e a inferior com 1,70 cm (um centímetro e setenta milímetros) de diâmetro;

Membro inferior esquerdo:

- Equimose vermelha na perna, na face anterior, situada 8cm (oito centímetros) abaixo do polo inferior da rótula, com eixo maior vertical, com 1,5 cm × 1 cm;

- Equimose vermelha na perna na face lateral com eixo maior vertical com 2,5 cm × 1 cm, com escoriação inferior com eixo maior vertical, com 2 cm × 1,5 cm; e

- Infiltração sanguínea no tecido subcutâneo subjacente a todas as escoriações e equimoses acima descritas.

6) As lesões traumáticas crânio-meningo-encefálicas descritas foram causa directa e necessária da morte de BB.

7) De seguida, AA fez seu o telemóvel da marca Iphone, modelo A1507, pertencente a BB.

8) AA agiu motivado pela satisfação dos seus instintos agressivos e pela animosidade gerada pela exigência que lhe fora feita por terceiros de assegurar, com brevidade, o pagamento de uma dívida contraída por BB em circunstâncias não concretamente apuradas, referente à aquisição de produto estupefaciente de valor indeterminado, mas nunca superior a €300,00 (trezentos euros).

9) Ao agir do modo descrito, AA previu e quis atingir, como atingiu, zonas vitais do corpo de BB, sabendo que a sua conduta era adequada a provocar a sua morte, resultado que quis e conseguiu.

10) Posteriormente, no dia 13 de maio de 2015, cerca das 10 horas, AA dirigiu-se, uma vez mais, ao apartamento referido onde deixara e ainda jazia o corpo de BB e, arrastando-o pelas escadas do prédio, colocou-o no sótão aí existente, local que sabia não ser frequentado pelos moradores do prédio.

11) Após, AA cobriu o corpo de BB com plásticos, cartões e madeiras aí existentes, dissimulando-o, e limpou os vestígios hemáticos provocados pelo arrastamento do corpo nas zonas comuns do aludido prédio.

12) Ao esconder o cadáver de BB, colocando-o no sótão do prédio referido e dissimulando-o por entre plásticos e outros objectos com vista a ocultá-lo, demonstrando total insensibilidade, AA previu e quis ofender o respeito comunitário devido aos mortos, agindo com vista a que o corpo daquele não fosse localizado, escondendo-o em local apropriado para o efeito, por forma a tentar não ser responsabilizados pela sua morte.

13) AA agiu sempre de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

14) Em circunstâncias não concretamente apuradas, mas anteriores ao acima descrito, AA apropriou-se e fez seus: um casaco de cor preta e branca, da marca Skulk Reggae, com a inscrição Bob Marley no lado esquerdo e um par de ténis da marca Merrel, de cor azul e branca.

15) AA confessou a factualidade que antecede, mas com reservas quanto à intensidade da violência que deu causa às lesões traumáticas sofridas por BB e quanto à intenção de provocar a morte do mesmo.

16) AA não tem antecedentes criminais.

17) O processo de socialização de AA decorreu em ..., local de residência do seu agregado familiar de origem, composto pelos pais, uma irmã consanguínea mais velha e um irmão sete anos mais novo.

18) Durante a infância, o pai de AA foi a sua principal figura de referência, sendo que com a mãe recorda uma relação de menor proximidade.

19) AA apresentou desde cedo um comportamento de grande agitação e irreflexão, que o levou a ter de ser acompanhado no Hospital ..., onde lhe foi diagnosticada “Perturbação de oposição e perturbação de hiperactividade e défice de atenção”.

20) Estes problemas de externalização envolviam desobediência, intolerância à frustração, oposicionismo e, no ambiente pré-escolar e escolar, agressividade com os pares.

21) A partir dos 7 (sete) anos, AA passou a ter acompanhamento de pedopsiquiatria com medicação continuada.

22) AA ingressou na escola em idade normal mas cedo evidenciou um trajecto irregular, com comportamentos inapropriados na sala de aula tais como actos de destruição de material escolar, manifestações violentas com os colegas e falta de respeito pelas figuras de autoridade na escola, registando várias reprovações e problemas disciplinares.

23) AA perdeu o pai aos 10 (dez) anos de idade, vítima de ataque cardíaco, e a avó paterna poucos meses depois.

24) Este foi um dos períodos mais pesarosos da vida de AA pois num espaço de pouco tempo assistiu à morte das duas pessoas com quem tinha uma relação de maior proximidade e afecto.

25) Coincidindo tais acontecimentos com a mudança de escola e de sistema de ensino (ingresso no 5.º ano de escolaridade), AA passou ainda a privilegiar o convívio com um grupo de pares relativamente mais velhos e com comportamentos delituosos, envolvendo-se em condutas de risco, tendo também iniciado hábitos tabágicos e consumos regulares de haxixe; acentuando-se a ruptura com as regras escolares, a desmotivação pelos conteúdos académicos e o absentismo escolar.

26) A persistência de uma atitude faltosa a tarefas sociais esperadas para a sua faixa etária, o total desinvestimento em ocupações estruturadas no tempo livre e a inserção em grupos marginais revelam a radicada irresponsabilidade do arguido e um estilo de vida desregrado.

27) Cerca de 2 (dois) anos após ter enviuvado e a enteada ter ido residir com a mãe para ..., a mãe de AA passou a viver com o actual companheiro, alterando o agregado a residência para ....

28) Neste contexto, AA acentuou os comportamentos de instabilidade e oposição perante a autoridade parental, exercida pela mãe e pelo padrasto, aos quais não reconhecia autoridade nem proximidade afectiva.

29) Face às dificuldades sentidas ao nível da educação e do acompanhamento do filho, a mãe de AA solicitou intervenção da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens da área de residência, daí resultando a aplicação ao mesmo da medida de promoção e protecção de acolhimento na ..., tendo sido institucionalizado em Setembro de 2010.

30) No período de acolhimento, que durou cerca de dois anos, AA registou episódios de comportamentos violentos com colegas, de pequenos furtos e de absentismo escolar, entre outros.

31) AA teve apoio psicológico por parte de técnicos da instituição e consultas de pedopsiquiatria na clínica da ....

32) Em Abril de 2012, AA retornou ao agregado familiar, residente em ... e constituído, então, pela mãe, o padrasto e dois irmãos (o irmão germano e uma irmã mais nova, filha do casal).

33) A reintegração familiar e escolar de AA não foi bem-sucedida, registando-se conflitos e discussões constantes com a mãe e o padrasto, bem como ausências de casa sem consentimento.

34) Neste período continuam os comportamentos disruptivos de AA e mais uma vez a mãe solicita a intervenção da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens, que instaura novo processo ao mesmo por abandono escolar e prática de ilícitos.

35) AA volta a ser institucionalizado em Novembro de 2012 em cumprimento de medida cautelar de guarda, no ..., em regime fechado.

36) Entretanto, por factos tipificados na lei como furto qualificado e tráfico de estupefacientes, foi aplicada a AA a medida de internamento em Centro Educativo, em regime semiaberto, com a duração de dezoito meses, pelo que, em Março de 2013, foi transferido para o ....

37) Com um percurso com avanços e recuos no processo de intervenção educativa faseada das instituições da justiça, AA integrou o curso de Operador de Jardinagem, com equivalência ao 6.º ano de escolaridade, e o curso de formação tecnológica de Instalador e Reparador de Computadores, com equivalência ao 9.º ano de escolaridade, tendo concluído a formação de base deste último antes de terminar a medida de internamento em Agosto de 2014.

38) Neste centro educativo AA foi acompanhado em consulta de pedopsiquiatria no ..., em Lisboa, com prescrição medicamentosa, e beneficiou de sessões de apoio psicológico.

39) Em Agosto de 2014, após a cessação da medida de internamento, AA voltou ao agregado familiar da mãe e do padrasto e inscreveu-se no ano lectivo 2014/15, por preferência pessoal, no curso de técnico de electrónica, na Escola Profissional de ..., o qual apenas frequentou poucos dias, retomando o anterior estilo de vida desestruturante, o convívio privilegiado com grupos marginais e a adopção de comportamentos anti-sociais.

40) AA manteve algumas relações de namoro meramente ocasionais, tendo-se tornado sexualmente activo aos doze anos de idade.

41) AA sente dificuldade em vincular-se afectivamente, sendo o pai e a avó paterna as únicas pessoas que foram significativas e próximas na sua vida.

42) AA mostra-se pouco disponível para a relação interpessoal com os pares, tendo mais conhecidos do que amigos e sendo a convivialidade mais superficial, tendo sido neste contexto que conheceu BB, cerca de 2 (dois) meses antes da verificação dos factos supra enunciados.

43) Antes de ser preso preventivamente, AA residia com a mãe, o padrasto e os dois irmãos, mas havia períodos em que se ausentava e ia residir para casa de amigos, deslocando-se frequentemente a casa da mãe apenas para se alimentar, fazer a higiene pessoal e pedir-lhe dinheiro.

44) AA apresentava uma rotina sem qualquer disciplina e ocupação, passando o tempo em cafés e bares da zona de residência, mantendo consumos de drogas e acompanhando por indivíduos com práticas desviantes.

45) A subsistência do agregado de AA era assegurada pelos lucros provenientes do café, situado em ..., de que a mãe era proprietária e que explorava, coadjuvada pelo companheiro, então desempregado.

46) Após a prisão preventiva de AA, a mãe viu-se forçada a fechar o café devido à hostilidade que, na altura, lhe foi demonstrada pela mãe e família de BB, residentes perto do estabelecimento comercial.

47) Presentemente, a mãe de AA encontra-se a trabalhar na agricultura e o companheiro numa gráfica; residindo o agregado em casa arrendada num bairro social com condições de habitabilidade.

48) No plano individual, de AA revela uma atitude adequada, mas com um discurso superficial na abordagem a nível afectivo/emocional e a adopção de atitudes de desresponsabilização, atribuindo todos os seus comportamentos a causas externas, nomeadamente a influência do grupo de pares e a perda das figuras familiares de referência.

49) A imagem social de AA já era desfavorável antes do presente processo, associada que estava à prática de comportamentos desajustados e ilícitos e ao consumo e tráfico de produtos estupefacientes.

50) Em meio prisional, o percurso de AA foi inicialmente caracterizado pela inércia e desinteresse em qualquer actividade ocupacional ou desportiva, estando a frequentar há dias um curso de formação de pedreiros.

51) AA apresenta uma infracção disciplinar simples, ocorrida no dia 16 de Fevereiro de 2016 por desacatos recíprocos entre reclusos, cuja sanção foi a proibição de utilizar o fundo monetário próprio por um período de 15 (quinze) dias, sendo que, apesar de não sair muito para actividades, não se conhecem outros problemas relacionais com outros reclusos.

52) Nos serviços clínicos do Estabelecimento Prisional de ..., AA mantém-se sujeito a consultas regulares de psiquiatria e a medicação, se bem que mais reduzida do que inicialmente, por se encontrar mais estável.

53) AA tem também consultas mensais com psicólogo da sua confiança, que se desloca ao Estabelecimento Prisional para o efeito e que regista já uma evolução positiva em termos terapêuticos.

54) Ao nível da problemática aditiva, cumpre referir que de AA foi sujeito a testes de despiste de consumo de estupefacientes em Agosto de 2015 e em Janeiro de 2016, sendo que os resultados foram positivos.

55) No estabelecimento prisional, de AA conta com as visitas mensais da mãe (acompanhada por vezes por uma amiga que também conhece o mesmo) e com algum apoio económico por parte desta; nunca tendo o padrasto visitado o mesmo.

56) A progenitora de AA refere que, quando o mesmo venha a ser libertado, existirão muitas dificuldades de integração e aceitação do filho no meio comunitário, salientando que seria benéfico que este integrasse o agregado familiar de um tio materno, em ...; possibilidade que o mesmo aceita.

57) AA revela fraca consciência crítica em relação à aos aludidos factos perpetrados pelo mesmo, mas demonstra capacidade de percepcioná-los como graves, embora o faça sem revelar qualquer perturbação emocional.

58) A progenitora de AA demostra-se incapaz de contrariar os seus comportamentos disruptivos e a influência do grupo de pares; referindo que, embora o apoie em contexto de visitas ao Estabelecimento Prisional, não tem condições pessoais para lhe providenciar supervisão e contenção.

59) AA evidencia dificuldades de envolvimento nas dimensões afectiva e interpessoal revelando ser imaturo e impulsivo, bem como uma notória incapacidade para delinear e prosseguir um plano de vida válido e normativo.

60) Os factos do presente processo provocaram um acentuado impacto social, existindo um sentimento de incredulidade, perplexidade e alarme social, que terá sido ampliado pela mediatização, persistindo ainda, por isso, um grande sentimento de revolta na comunidade em geral.

61) A actual imagem social de AA é associada aos factos pelos quais está acusado, bem como ao convívio com indivíduos problemáticos e com comportamentos desviantes, existindo registo de participações policiais contra o mesmo no posto da Guarda Nacional Republicana de ....

62) Da avaliação psicológica de AA resulta um nível de inteligência abaixo do que seria esperado para a sua idade, observando-se limitações ao nível da organização perceptiva, da conceptualização e do raciocínio lógico em situações com maior grau de abstracção.

63) Os recursos cognitivos de AA assentam numa estrutura racional rígida e a abordagem que faz da realidade é imatura, muito centrada no concreto e excessivamente simplificada, associada ao que é facilmente reconhecível e desejável.

64) Apesar da forma simplista, concreta e utilitária como se lê a realidade, AA possui recursos cognitivos que lhe permitem a compreensão da generalidade de diferentes situações da vida quotidiana e distinção entre comportamentos lícitos e ilícitos.

65) AA revela dificuldades em se adaptar a situações que envolvem adiamento da gratificação, sendo as suas acções voltadas para a satisfação imediata, valorando os seus actos com um falso sentimento de autonomia e de desnecessidade de apoio.

66) AA denota reduzida auto consciência, restrita capacidade de introspecção e tendência para projecção da culpa e da responsabilidade, o que remete para a dificuldade em reflectir sobre as implicações dos comportamentos e emoções, envolvendo compreensão inadequada de si mesmo e apreciação insuficiente do impacto que as suas acções têm sobre os outros,

67) Com prova da realidade bem conservada, orientado auto e alopsicamente, AA compreende o que lhe é dito e perguntado, a que responde sem desvios de pensamento, não se manifestando sinais de patologia ideativa ou qualquer outra problemática do foro da saúde mental.

68) AA apresenta um estilo de vida ocioso com forte atracção por sensações e estímulos externos potentes, por tudo o que impressiona pelo desmedido ou extremo, expressando necessidade de estar em risco, de fazer o contrário do que deve ser feito e de sentir a adrenalina do ilícito.

69) A excessiva necessidade de procura de estimulação de AA repercute-se na ignoração das consequências punitivas das suas acções e na falha repetida da intervenção tutelar.

70) AA não detém objectivos nem expectativas de futuro, resumindo os seus interesses e desejos ao imediato.

71) As lesões traumáticas crânio-meningo-encefálicas supra descritas determinaram a imediata perda de consciência de BB

72) Como consequência directa e necessária da conduta de AA, BB sentiu terror, angústia e dor antes de perder a consciência e, nessa sequência, morrer.

73) BB é filho de ... e ... e nasceu no dia ..., sendo que, à data do seu óbito, gozava de perfeita saúde e não tinha descendentes.

74) BB frequentava a escolaridade obrigatória, com aproveitamento regular e com registo de duas reprovações.

75) No futuro, BB ambicionava constituir família e exercer uma actividade profissional na área da electricidade ou electrotécnica, seguindo o exemplo do seu progenitor.

76) BB era um adolescente muito bem disposto no seu dia a dia, irradiava felicidade e gosto pela vida, sendo uma pessoa alegre, divertida, dinâmica e sociável.

77) BB nutria grande afectividade pelos pais, pela avó materna ... e pela irmã, com apenas 3 (três) anos de idade.

78) BB era um adolescente que cooperava e interagia no seio da sua família, ajudava nas tarefas diárias e participava em decisões familiares.

79) DD e EE viveram momentos de horror, medo, pavor, desgosto, tristeza e crise de nervos com a morte de BB e a ocultação do cadáver do mesmo, cujo paradeiro só conheceram no dia 14 de Maio de 2015.

80) DD e EE sentem uma profunda revolta pela perda de DD, estando envolvidos em profunda dor e tristeza.

81) No período que mediou o óbito de BB e a descoberta do cadáver do mesmo, AA manteve sucessivos contactos com EE, invocando ter intenção de colaborar com as diligências de apuramento do paradeiro daquele, mas fornecendo inúmeras informações falsas com o escopo de, pelo contrário, obstaculizar à sua localização.

82) A avó materna ... perdeu a vontade de viver com a morte de BB, o que afecta psicologicamente EE

            2.º FACTOS NÃO PROVADOS

            Nenhuns outros factos se provaram com interesse para a boa decisão da causa, designadamente, e no essencial, que:

I) Naquele circunstancialismo de tempo e lugar, AA agiu motivado pelo desejo de fazer seus os itens referidos em 5) e 12).

II) DD e EE perderam por completo a vontade de viver, sentem incapacitação para o trabalho e sofreram depressão psicológica, sendo que a mãe esteve na eminência de pôr termo à própria vida.»

            2. Delimitação do objecto do recurso

            Como é jurisprudência pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – detecção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto emergentes da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, referidos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (neste sentido, o acórdão n.º 7/95 do Plenário da Secção Criminal, de 19-10-1995, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 298, de 28 de Dezembro de 1995, e verificação de nulidades, que não devam considerar-se sanadas, nos termos dos artigos 379.º, n.º 2 e 410.º, n.º 3, do CPP – é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação, que se delimita o objecto do recurso e se fixam os limites de cognição do Tribunal Superior.

   

      Das conclusões do recurso, extrai-se serem duas as questões que o recorrente propõe a reapreciação por este Supremo Tribunal:

- A primeira prende-se com a não aplicação do regime penal dos jovens delinquentes, normativamente previsto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro;

- A segunda questão respeita à medida concreta de cada uma das penas parcelares e, bem assim, da pena única fixada em cúmulo jurídico, que tem por excessivas, pugnando pela redução das primeiras para os respectivos mínimos legais e da segunda para não superior a 14 anos de prisão.

3. A não aplicação do regime penal dos jovens delinquentes

No recurso oportunamente interposto para o Tribunal da Relação de Évora, o recorrente submeteu a reapreciação duas questões:

- A questão relativa à medida das penas parcelares e única; e

- A questão da indemnização civil.

Como bem assinala o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal, secundando idêntico entendimento do seu Ex.mo Colega junto do Tribunal da Relação, a questão da não aplicação do regime penal dos jovens delinquentes não foi objecto do recurso interposto para a Relação.

Sendo certo que essa questão foi expressamente apreciada no acórdão do Tribunal Colectivo, decidindo-se pela não aplicação ao arguido desse regime, a verdade é que o arguido, agora recorrente, não a impugnou perante a Relação no recurso que então interpôs.

Do que decorre que tal questão, agora trazido a debate, não foi presente ao tribunal de recurso pelo que estamos perante a formulação de uma questão nova.

Como se considera no recente acórdão deste Supremo Tribunal, de 09-03-2017, proferido no processo n.º 582/05.0TASTR.E1.S1 – 3.ª Secção:

       

«Os recursos destinam-se ao reexame das questões submetidas ao julgamento do tribunal recorrido. O tribunal de recurso aprecia e conhece de questões já conhecidas pelo tribunal recorrido e não de questões que antes não tenham sido submetidas à apreciação deste tribunal – o tribunal de recurso reaprecia o concretamente já decidido, não profere decisões novas.

            Assim sendo, não é lícito invocar no recurso questões que não tenham sido suscitadas nem resolvidas na decisão de que se recorre.

            Destinam-se os recursos a reapreciar as decisões tomadas pelos tribunais de inferior hierarquia e não a decidir questões novas que perante eles não foram equacionadas.

            A preclusão do conhecimento pelo Supremo Tribunal de Justiça de questões não suscitadas perante a Relação, apenas sofre as restrições advindas da natureza da questão levantada quando a sua apreciação deva ou possa fazer-se ex officio (v.g., nulidade de actos jurídicos; questões de inconstitucionalidade normativa; caducidade em matéria de direitos indisponíveis).

            Os recursos ordinários não servem para conhecer de novo da causa, mas antes para controlo da decisão recorrida».

 

Citando-se MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, «[no] direito português, os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o tribunal recorrido no momento do seu proferimento. Isto significa que, em regra, o tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados»[7].

No mesmo sentido ANTÓNIO ABRANTES GERALDES, «[os] recursos ordinários destinam-se a permitir que um tribunal hierarquicamente superior proceda à reponderação da decisão recorrida, objectivo que se reflecte na delimitação das pretensões que lhe podem ser dirigidas e no leque de competências susceptíveis de serem assumidas. Na fase de recurso, as partes e o tribunal superior devem partir do pressuposto de que a questão já foi objecto de decisão, tratando-se apenas de apreciar a sua manutenção, alteração ou revogação. Por outro lado, a demanda do tribunal superior está circunscrita a questões que já tenham sido submetidas ao tribunal de categoria inferior, sem prejuízo da possibilidade de suscitar ou de apreciar questões de conhecimento oficioso»[8].

            O acórdão citado dá nota do «entendimento constante do STJ, sobre a natureza e função processual do recurso, de que este não pode ter como objecto a decisão de questões novas, constituindo apenas um remédio processual que permite a reapreciação, em outra instância, de decisões expressas sobre matérias e questões já submetidas e objecto de decisão do tribunal de que se recorre. Em fórmula impressiva: no recurso não se decide, com rigor, uma causa, mas apenas questões específicas e delimitadas, que tenham já sido objecto de decisão anterior pelo tribunal a quo e que um interessado pretende ver reapreciadas», referenciando vasta jurisprudência, já consolidada, sobre este tópico.

Perante o exposto, seria de rejeitar o recurso, por inadmissibilidade legal, nos termos dos artigos 420.º, n.º 1, alínea b), e 414.º, n.º 2, do CPP, quanto à questão da não aplicação do regime penal dos jovens delinquentes

Sucede, no entanto, que o Tribunal da Relação pronunciou-se e decidiu no acórdão que proferiu no sentido da não concessão da atenuação especial da pena decorrente do regime penal especial para jovens, com os seguintes fundamentos:

«O DL nº 401/82, de 23 de Setembro, estabelece o regime penal dos jovens delinquentes.

Tal diploma dispõe no seu art. 1º que, “1. O presente diploma aplica-se a jovens que tenham cometido um facto qualificado como crime. 2. É considerado jovem para efeitos deste diploma o agente que, à data da prática do crime, tiver completado 16 anos sem ter atingido 21º. 3. O disposto no presente diploma não é aplicável a jovens penalmente inimputáveis em virtude de anomalia psíquica.”

Por sua vez, dispõe o artº 4º que, “Se for aplicável pena de prisão, deve o Juiz atenuar especialmente a pena, nos termos do art. 73º e 74º do C.Penal, quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado”.

Da análise destes preceitos resulta que, para que haja lugar à atenuação especial da pena é necessário que estejam preenchidos dois pressupostos: um de natureza formal, que o jovem tenha a idade compreendida entre os 16 e 21 anos; outro de natureza material, que haja sérias razões que levem o julgador a concluir que da atenuação resultam vantagens para a reinserção social do jovem.

O pressuposto de natureza formal está preenchido, pois o arguido nasceu no dia 16 de Outubro de 1997, por isso, tinha à data dos factos 17 anos

Estará preenchido o pressuposto material?

Quanto a este existe, uma obrigação legal do julgador de, oficiosamente, proceder à averiguação do mesmo devendo apreciar em cada caso concreto, a natureza e o modo de execução do crime, seus motivos determinantes, a personalidade do jovem, a sua conduta anterior e posterior ao crime.

Apesar das características do direito penal dos jovens, que é um direito mais reeducador que sancionador, o legislador não esqueceu os interesses da comunidade e por isso, não afasta a possibilidade de aplicação da pena de prisão “ quando isso se torne necessário, para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade” (§ 7 do preâmbulo).

O acórdão recorrido pronunciou-se sobre a atenuação especial da pena tecendo, para além de outras, as seguintes considerações:

“No caso sub judice a matéria de facto provada evidencia que o arguido, com incipiente preparação escolar após sucessivas reprovações e vivendo na dependência económica da mãe, não manifesta o mínimo esforço no sentido de passar a desenvolver uma actividade laboral estabilizada e garantir a sua adequada inserção social. Ao longo destes últimos anos, o arguido não manteve qualquer ocupação estruturada, de carácter laboral ou formativo, nem manifesta consistência ao nível dos objectivos, regendo a sua vida pela ociosidade, pela prática de comportamentos desviantes e pelo consumo reiterado de substâncias abusivas.

O modesto contributo do arguido para a descoberta da verdade material e a ausência de antecedentes criminais constituem um conjunto de circunstâncias positivas para o arguido e contribuem para um juízo de prognose favorável.

Contudo, sopesando prudentemente todos estes elementos, a personalidade revelada pelo arguido e seu comportamento posterior – revelador de uma ostensiva e perversa falta de crítica em relação aos comportamentos desviantes -, concluímos que não se verifica qualquer fundamento para supor que uma atenuação especial da pena seria propulsora ou beneficiaria a reinserção social do mesmo, pelo que inexiste ostensivamente qualquer justificação para que o mesmo beneficie do aludido regime”.

A confissão dos factos foi parcial, uma vez que o arguido não assumiu a violência que exerceu sobre o corpo da vítima, nem a intenção de matar, pelo que esta circunstância, bem como a ausência de antecedentes criminais, ainda que sejam positivas para o arguido, têm escasso valor atenuativo em relação à sua culpa e à necessidade da pena.

O arguido ao longo da sua adolescência não manifestou o mínimo de esforço no sentido de exercer uma ocupação e se integrar na sociedade, tendo optado por um tipo de vida desestruturado, nomeadamente, privilegiando o convívio com grupos marginais e adoptando comportamento anti-sociais.

Quanto aos factos em causa nos autos, o arguido no apartamento a que se alude no facto nº 1 da matéria provada, desferiu com uma barra de ferro diversas e violentas pancadas na cabeça da vítima de catorze anos, que foram causa directa e necessária da morte desta, por virtude de não pagar, com brevidade, uma dívida a terceiros no valor de € 300,00, que o arguido se incumbira de cobrar, relativa à aquisição de estupefacientes.

De seguida, abandonou a vítima e no segundo dia posterior aos factos dirigiu-se de novo ao apartamento e arrastou o corpo pelas escadas do prédio até ao sótão, onde o dissimulou por entre plásticos e outros objectos com o objectivo de o ocultar.

Este modo de actuar do arguido demonstra que é portador de uma personalidade avessa, contrária ao direito, sem qualquer respeito pelo direito à vida, que é, sem dúvida material e valorativamente o direito mais importante dos direitos fundamentais.

Da personalidade do arguido manifestada nos factos, que não os admitiu em aspectos essenciais, do modo de execução dos mesmos, das razões que levaram à sua prática e do seu comportamento posterior em que abandonou a vítima no apartamento e ocultou o seu cadáver, o que revela uma ostensiva falta de censura em relação aos mesmos, infere-se que inexistem fundamentos para crer que da atenuação resultem vantagens para a reintegração social do jovem condenado, isto é, que a diminuição da pena contribua para a capacidade do arguido se regenerar e se reinserir definitivamente na sociedade, pelo que não há motivos para que beneficie do regime da atenuação especial da pena.»

Retomando considerações que se teceram no recente acórdão de 22-03-2017, proferido no processo n.º 243/15.2JAFAR.S1 – 3.ª Secção, se, nos termos do disposto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, for aplicável pena de prisão deve o Tribunal atenuar especialmente a pena nos termos dos artigos 72.º e 73.º do Código Penal quando tiver razões para crer que dessa atenuação resultem vantagens para a reinserção do jovem condenado.

           

O citado Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro consagra o regime especial para jovens com idades compreendidas entre os 16 e os 21 anos que tenham cometido um facto qualificado como crime.

Ora, ainda que esteja aqui verificado o pressuposto formal para a aplicação daquele regime, ou seja, idade inferior a 21 anos do recorrente, os elementos fornecidos pelos autos excluem a pretendida atenuação especial da pena já que esta não é de aplicação automática.

Efectivamente, a aplicação deste regime não é, assim, obrigatória nem automática, sendo necessário que se tenha estabelecido positivamente que há razões para crer que dessa atenuação especial resultem vantagens para a reinserção social do jovem sem ser afectada a exigência de prevenção geral, isto é, de protecção dos bens jurídicos e da validade das normas (cfr. Ac. do S.T.J. de 08/04/1987, in BMJ 366º-450, e Ac. do S.T.J. de 15/01/1997, in Col. Jur.-STJ, ano V, tomo I, p.182).

           

Importa frisar que o artigo 4.º deste diploma refere expressamente que a pena deve ser atenuada quando houver sérias razões para crer que da atenuação especial resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado.

Como justamente se sublinha no acórdão deste Supremo Tribunal de 18-06-2014 (Proc. n.º 578/12.6JABRG.G1 – 3.ª Secção), «o Dec.º-Lei n.º 401/82, de 23/9, imbuído de atenuação de rigor punitivo, mais ressocializador e reeducador do que sancionatório, não vai ao ponto de firmar essa visão maximalista, como que passando ao limbo do esquecimento os comportamentos desviantes dos jovens, deixando à margem de protecção importantes interesses jurídicos e, sobremodo, se persistentemente afectados».

O núcleo fundamental do direito de menores será, assim, lê-se no mesmo acórdão:

«a avaliação da vantagem da atenuação especial da pena para a reinserção social do arguido jovem. Mas a avaliação de tal possibilidade de reinserção social tem de ser equacionada perante as circunstâncias concretas do caso e do percurso de vida do arguido e não perante considerações vagas e abstractas desligadas da realidade.

Tal juízo arranca de um pressuposto incontornável, do qual também arranca o legislador da Lei 401/82, ou seja, o de que a possibilidade de reinserção do delinquente é um elemento incontornável da sua personalidade, sobretudo quando este se encontra ainda no limiar da sua maturidade. Subjacente o entendimento de que o percurso de ressocialização do menor agente criminal poderá ser impulsionado por uma atenuação especial da pena que constitui, também, uma afirmação de confiança na sua capacidade para escolher uma opção correcta de vida.

O diploma legal em causa, mais do que conferir uma benesse ao jovem delinquente por se entender ser merecedor de um tratamento penal especializado, procura promover a sua ressocialização – razão por que instituiu um direito mais reeducador do que sancionador, a revelar que a reinserção social surge aqui, no direito penal dos jovens delinquentes, como primordial finalidade da pena.

Se é certo que a mesma Lei institui a pena de prisão, fá-lo apenas em última instância, como ultima ratio, quando e apenas isso for exigido pela firme defesa dos interesses fundamentais da sociedade e pela prevenção da criminalidade, o que sucederá no caso de a pena aplicável ser a de prisão superior a 2 anos. Porém, nesse caso, a pena deverá ser especialmente atenuada se concorrerem sérias razões no sentido de que, assim, se facilitará aquela reinserção. Tais directivas, diz o preâmbulo, «...entroncam num pensamento vasto e profundo, no qual a capacidade de ressocialização do homem é pressuposto necessário, sobretudo quando este se encontra no limiar da sua maturidade.

Deste modo, teremos de concluir que a aplicação da atenuação especial, só deverá ser afastada quando os factos demonstrarem estarmos perante aquela especial exigência de defesa da sociedade e seja certo que o jovem delinquente não possui aquela natural capacidade de regeneração».

Não se vislumbrando a existência das mencionadas razões sérias, não há que convocar a atenuação especial decorrente do regime em causa.

Tal acontece, designadamente, quando as situações analisadas são daquelas em que se impõe a aplicação de uma pena de prisão necessária «para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade» como expressamente se refere no preâmbulo do citado Decreto-Lei n.º 401/82.

As aludidas situações são aquelas que se prendem com a frequência e gratuitidade de certo tipo de condutas, pelo grau de violência que comportam, pela instabilidade e insegurança que geram, onde são particularmente actuantes as necessidades de reprovação e de prevenção da criminalidade sendo, por isso, de ponderar cuidadosamente, consoante cada caso, se realmente as ditas razões sérias existem e têm o peso suficiente para justificar a atenuação especial.

Retomando o supracitado acórdão deste Supremo Tribunal 18-06-2014, que temos como paradigmático na análise ao regime penal especial para jovens:

«(…) a equação proposta legalmente pela situação do jovem delinquente não pode deixar de ter em atenção que as razões inerentes à prevenção especial, ou seja, das razões que resultam da prevenção geral do crime. Quando a culpa e a ilicitude são densas e graves, trazendo à colação a inevitável necessidade dum efeito intimidatório, dificilmente se pode compaginar tal circunstância com uma crença na natural vantagem para a ressocialização.

Como vem sendo, também, repetidamente, decidido por este Supremo Tribunal, a aplicação do regime legal não pode manter-se à margem da consideração das exigências de prevenção geral, assentando em preocupações exclusivas ou sequer predominantes, de ressocialização do agente jovem, de prevenção especial, sobrepondo-se-lhe, já que não se pode abdicar de considerações de prevenção geral, sob a forma de “exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico “ (nas palavras do Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Ed. Notícias, § 519, embora a propósito de temática diferente) e de garantia mínima de protecção dos bens jurídicos de mínima observância comunitária – Cfr . Acs de 8. 4. 87, 13.7.94, 12.4.97, 26.5.94, 19.10.94, 30.1.96, 15.10.97 e 17.9.97, in BMJ 366, 450, P.ºs n.ºs 46.169, 46.245, 46. 601, 47.027, 48. 274, 48.661 e CJ, STJ, Ano V, TIII, 175, respectivamente, e, da doutrina, Leal Henriques e Simas Santos, CP, anotado, 151].

Existe aqui uma dupla perspectiva balanceando entre o sopesar das necessidades de prevenção geral, que conjugam a gravidade do ilícito e a densidade da culpa na perspectiva de satisfação das expectativas da comunidade no cumprimento da lei e tutela dos bens jurídicos e, por outro, o próprio percurso de vida do jovem e a crença de que o mesmo pode inflectir no seu rumo de vida pois que é ajustado um juízo positivo na sua regeneração. Neste juízo de prognose conta essencialmente a personalidade do jovem, e a sua circunstância, pois que o mesmo é produto de um determinado contexto social».

O juízo a formular sobre as vantagens da atenuação especial para a reinserção social tem de assentar em condicionalismo que, não se reduzindo à idade do agente, atenda a todo o condicionalismo do cometimento do crime.

Assim, não será de aplicar o regime dos jovens delinquentes quando do conjunto dos factos praticados e a sua gravidade o desaconselham em absoluto, por não se mostrar passível de prognose favorável à reinserção social do arguido (v. acórdão do STJ de 24-10-2012, Proc. n.º 298/11.9JELSB.L1.S1 – 3.ª Secção).»

O arguido, agora recorrente, encontra-se exactamente nesta situação, merecendo a nossa concordância as razões expressas, a tal propósito, quer no acórdão do Tribunal Colectivo, quer no acórdão recorrido, supra transcritas.

Aqui, assume natural relevo a gravidade do crime praticado, o circunstancialismo em que foi executado, as razões de prevenção geral e especial a considerar, tópicos que se desenvolverão de seguida a propósito da aferição da medida da pena aplicada ao arguido.

Por isso, no caso aqui em apreço, não se vislumbra qualquer facto que permita uma tal prognose eminentemente positiva, além de que essa eventual atenuação mostra-se claramente desaconselhada em face das exigências de prevenção que aqui se impõem.

Nestes termos, entendemos que não se pode concluir que resulte especialmente favorável à reinserção social do arguido a atenuação da sua pena, pelo que não se procederá a aplicação do regime legal aqui em causa.

4. Quanto à medida concreta das penas

4.1. Inadmissibilidade de recurso quanto à pena de um ano de prisão aplicada pelo crime de profanação de cadáver

Considera o recorrente que «deveriam as penas parcelares ser aplicadas pelo mínimo e, após, ser aplicado o cúmulo jurídico, em pena não superior a 14 anos de prisão efectiva».

Recorde-se que o arguido foi condenado, em 1.ª Instância, nas penas parcelares de 17 anos de prisão, pela prática do crime de homicídio qualificado, e de 1 ano de prisão, pela prática de um crime de profanação de cadáver.

O Tribunal da Relação confirmou ambas as penas, encontrando-se, desta forma, presente a situação de dupla conforme condenatória.

Assim, e tendo em conta o disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, a decisão relativa à fixação da sobredita pena parcelar de 1 ano de prisão é irrecorrível, por se tratar de pena não superior a 8 anos, confirmada pela Relação.

A irrecorribilidade quanto a tal pena, porque inferior a 5 anos, resultaria sempre do disposto no citado artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do CPP.

Em face do exposto, e em conformidade com o disposto nos artigos 420.º, n.º 1, alínea b), e 414, n.º 2, do CPP, rejeita-se o recurso nesta parte.

Consequentemente, o presente recurso fica confinado às questões respeitantes à pena de 17 anos de prisão, aplicada pela prática do crime de homicídio de homicídio qualificado, e ainda à pena única fixada em cúmulo jurídico das referidas penas singulares, já que superiores a 8 anos.

4.2. Da medida da pena pelo crime de homicídio qualificado

4.2.1. O recorrente não questiona a qualificação jurídica dos factos integradores do crime de homicídio operada pelo Tribunal Colectivo e mantida no acórdão recorrido.

O Tribunal Colectivo considerou verificada a circunstância qualificativa referida na alínea e) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal, segundo a qual, é susceptível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade a circunstância do agente ser determinado por qualquer motivo fútil.

«Motivo torpe ou fútil» é, para FIGUEIREDO DIAS, «o motivo da actuação, avaliado segundo as concepções éticas e morais ancoradas na comunidade, deve ser considerado pesadamente repugnante, baixo ou gratuito (…) de tal modo que o facto surge como produto de um profundo desprezo pelo valor da vida humana»[9].

Sendo no subjectivismo do agente que deverá ser encontrada a natureza da motivação do crime para efeitos de futilidade do motivo, circunstância concretamente considerada na decisão recorrida, motivo fútil é, segundo M. MIGUEZ GARCIA e J. M. CASTELA RIO, o motivo «notoriamente desproporcionado ou inadequado do ponto de vista do homem médio em relação ao crime praticado»; para além da desproporcionalidade, deve acrescer a insensibilidade moral, que tem a sua manifestação mais alta na brutal malvadez ou se traduz em motivos subjectivos ou antecedentes psicológicos que, pela sua insignificância ou frivolidade, sejam desproporcionados com a reacção homicida.

(…) Será o «motivo de importância mínima», mas também o «motivo frívolo, leviano, a ninharia» que leva o agente à prática de um grave crime, «na inteira desproporção entre o motivo e a extrema reacção homicida»[10].

Motivo fútil é entendido por MAIA GONÇALVES como «um motivo sem relevo, sem importância mínima ou manifestamente desproporcionado segundo as concepções da comunidade, incapaz portanto de razoavelmente explicar e muito menos justificar a conduta»[11].

Também a jurisprudência, como se dá nota no acórdão deste Supremo Tribunal, de 13-04-2016, proferido no processo n.º 61/15.8PFLRS.L1.S1 – 3.ª Secção, relatado pelo ora relator, se tem pronunciado neste sentido.

Assim, no acórdão de 31-01.2012 (Proc. n.º 894/09.4PBBRR.S1 - 3ª Secção), considera-se «motivo fútil» como o motivo sem valor, insignificante, ridículo, que não tem relevo, que não pode razoavelmente explicar a conduta do agente, que é notavelmente desproporcionado ou inadequado, na perspectiva do homem médio e em relação ao crime de que se trata, tendo em vista a situação concreta (vide neste sentido acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Julho de 1989, in BMJ n.º 389). O motivo gratuito, frívolo, despropositado ou leviano, avaliado segundo os padrões éticos geralmente aceites na comunidade. Ele assenta, pois, numa ideia de desproporcionalidade flagrante entre a conduta da vítima e a atitude do agente, que choca frontalmente com o sentimento comunitário de justiça.»

Como se lê nos acórdãos de 17-01-2007 (Proc. n.º 06P3845 – 3.ª Secção), e de 26-09-.2007 (Proc. n.º 07P2591 – 3.ª Secção): «Na doutrina, tem sido atribuído ao motivo fútil o alcance de uma razão incompreensível para a generalidade das pessoas, que não pode razoavelmente explicar (e muito menos justificar) o crime, revelando o facto, inteiramente desproporcionado, repudiado pelo homem médio, profunda insensibilidade e inconsideração pela vida humana.

A nossa jurisprudência, a tal respeito, não se dissocia desse entendimento, identificando o motivo fútil não tanto pelo seu pouco relevo ou importância, mas sim pela «desproporcionalidade entre o que impulsionou a conduta desenvolvida e o grau de expressão criminal em que ela se objectivou: no fundo o que prefigure a especial censurabilidade que decorre da futilidade» – Ac. do STJ de 04-10-2001, Proc. n.º 1675/01 – 5.ª; motivo fútil é «o notoriamente desproporcionado ou inadequado aos olhos do homem médio, denotando o agente, com isso, o egoísmo, intolerância, prepotência, mesquinhez» – Ac. do STJ de 25-06-97, Proc. n.º 96P1253; motivo fútil será o motivo frívolo, leviano, a ninharia que leva o agente à prática do crime, na inteira desproporção entre o motivo e a reacção homicida – Ac. do STJ, de 15-12-2005, Proc. n.º 05P2978.»

No acórdão do STJ de 13-07-2009 (Proc. n.º 59/07.0GCVPA.S1 – 5.ª Secção), considerou-se:

«(…) VIII - Provando-se que o arguido, aborrecido com o facto de o ofendido lhe ter fechado a porta e não lhe ter dado dinheiro, abriu a porta a pontapé e, aberta a mesma, acto contínuo, disparou um tiro de arma de fogo, em direcção do ofendido, atingindo-o na cabeça e provocando-lhe a morte, fica afastada a alegação de que se não apurou o motivo da acção, o que impediria a sua qualificação como fútil.

IX - Mas, encontrado o motivo pelo qual agiu o recorrente – aborrecido com o facto de o ofendido lhe ter fechado a porta e não lhe ter dado dinheiro –, importa ver se o mesmo, como entenderam as instâncias, é fútil.

X - Não merece qualquer censura a qualificação do homicídio praticado pelo recorrente, designadamente por ter agido por motivo fútil, se ele matou a tiro de arma de fogo disparada a curta distância um velho de 89 anos, seu conhecido de muitos anos, de madrugada na casa deste, quando ele, frágil e indefeso, se encontrava apenas acompanhado da mulher, igualmente idosa, depois de a vitima o ter auxiliado emprestando-lhe uma ferramenta às 3h30, aborrecido com o facto de o ofendido lhe ter fechado a porta e não lhe ter dado dinheiro que lhe pedira agressivamente.

XI - É um motivo claramente desproporcionado, inadequado face à génese do crime e ao modo de execução, que torna este incompreensível para a generalidade das pessoas, que não pode razoavelmente explicar (e muito menos justificar) o crime, revelando o facto, inteiramente desproporcionado, repudiado pelo homem médio, profunda insensibilidade e inconsideração pela vida humana, insensibilidade moral traduzida na brutal malvadez do agente.»

No acórdão do STJ de 27-05-2010 (58/08.4JAGRD.C1.S1 – 3.ª Secção), já citado, caracteriza-se o «motivo fútil» como «o motivo de importância mínima. Será também o motivo frívolo, leviano, a ninharia que leva o agente à prática desse grave crime, na inteira desproporção entre o motivo e a extrema reacção homicida, o que se apresenta notoriamente inadequado do ponto de vista do homem médio em relação ao crime de que se trate, o que traduz uma desconformidade manifesta entre a gravidade e as consequências da acção cometida e o que impeliu o agente a essa comissão, que acentua o desvalor da conduta por via do desvalor daquilo que impulsionou a sua prática».

No acórdão do STJ de 19-02-2014 (Proc. n.º 168/11.0GCCUB.S1 – 3.ª Secção), exprime-se o entendimento de que motivo fútil «é o motivo de importância mínima. Será, também, o motivo "frívolo, leviano, a “ninharia” que leva o agente à prática desse grave crime, na inteira desproporção entre o motivo e a extrema reacção homicida", o que se apresenta notoriamente inadequado do ponto de vista do homem médio em relação ao crime praticado; o que traduz uma desconformidade manifesta entre a gravidade e as consequências da acção cometida e o que impeliu o agente a essa comissão, que acentua o desvalor da conduta por via do desvalor daquilo que impulsionou a sua prática».

Constando ainda neste acórdão que «o vector fulcral que identifica o "motivo fútil" não é pois tanto o que imprime a ideia de tão pouco ou imperceptível relevo, quase que pode nem chegar a ser motivo, mas sim, aquele que realce a inadequação e faça avultar a desproporcionalidade entre o que impulsionou a conduta desenvolvida e o grau de expressão criminal com que ela se objectivou: - no fundo, em essência, o que prefigure a especial censurabilidade que decorre da futilidade, sendo que esta pressupõe um motivo por ela rotulável e que dela e por ela se envolva (Ac. do STJ de 4/10/2001, proc. nº 1675/01-5)».

Finalmente, no acórdão do STJ de 16-10-2013 (Proc. n.º 455/12.0PCLSB.L1.S1 – 3.ª Secção), apresenta-se o «motivo fútil» como a circunstância qualificativa «com relação à motivação do agente, é a que surge fundada num profundo desprezo do valor da vida humana, acção que não pode razoavelmente explicar e muito menos justificar a conduta; é um motivo que de tão pouco ou imperceptível relevo, não revelador de adequação e que faz avultar a desproporcionalidade entre o que impulsiona a conduta desenvolvida e o grau de expressão criminal com que aquela se objectivou Neste sentido e alcance, em data recente, se pronunciou o STJ nos seus ACs. de 27.6.2012, Rec.º n.º 127/10 .OJABRG.G2.S1e de 17.4.2013, P.º n.º 237/11.7JASTB.L1. S1. (…)

O motivo fútil é incapaz de fornecer uma explicação em termos razoáveis, insignificante, mesquinho, demonstrando insensibilidade moral do agente -Jurisprudência Criminal, 288, RJ, 3402, 346.

É aquele que se apresenta com antecedente psicológico desproporcionado com a reacção homicida, tendo em vista a sensibilidade normal média, assim Heleno Cláudio Fragoso.

Significa que o motivo de actuação avaliado segundo as regras éticas e morais ancoradas na comunidade, deve ser considerado pesadamente baixo, repugnante, de tal modo que o facto surge como produto de um profundo desprezo pela vida humana, sintetiza abrangentemente o Prof. Figueiredo Dias, in Comentário citado, pág. 32».

O Tribunal Colectivo entendeu que o arguido «ao praticar os actos de execução do crime de homicídio, [foi] motivado pela satisfação dos seus instintos agressivos no contexto de uma discussão ocorrida momentos [antes] sobre uma temática que o desagradou – relacionada com a exigência que lhe fora feita por terceiros no sentido de proceder ao pagamento de uma dívida de reduzido valor – [circunstância] fortemente indiciadora da especial censurabilidade ou perversidade do autor do crime de homicídio simples, que encerra o fundamento da agravação. Na realidade, não se está perante uma discussão relevante que alterasse psicologicamente o arguido a ponto de o motivar à prática dos factos tanto mais que a discussão ocorreu inesperadamente no contexto de um encontro num local de habitual convívio com os seus pares (entre os quais se incluía a vítima) a solicitação do próprio BB».

Perante os elementos da doutrina e jurisprudenciais acima condensados e os elementos de facto provados, também nós consideramos juridicamente correcta a qualificação jurídica dos factos efectuada pelas instâncias e que, como já referido, o próprio recorrente não questiona.

4.2.2. O crime de homicídio qualificado praticado pelo arguido-recorrente é punido com a pena de 12 a 25 anos de prisão.

De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal, a medida da pena é determinada, dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, sendo que, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, conforme prescreve o artigo 40.º, n.º 2, do mesmo Código.

Na determinação concreta da pena há que atender às circunstâncias do facto, que deponham a favor ou contra o agente, nomeadamente ao grau de ilicitude, e a outros factores ligados à execução do crime, à intensidade do dolo, aos sentimentos manifestados no cometimento do crime e aos fins e motivos que o determinaram, às condições pessoais do agente, à sua conduta anterior e posterior ao crime (artigo 71.º, n.º 2, do Código Penal).

Sobre a determinação da pena, em razão da culpa do agente e das exigências de prevenção, lê-se no acórdão deste Supremo Tribunal, de 15-12-2011, proferido no processo n.º 706/10.6PHLSB.S1, convocado, mais recentemente no acórdão de 27-05-2015 (proc. n.º 445/12.3PBEVR.E1.S1):

«Ao elemento prevenção, no sentido de prevenção geral positiva ou de integração, vai-se buscar o objectivo de tutela dos bens jurídicos, erigido como finalidade primeira da aplicação de qualquer pena, na esteira de opções hoje prevalecentes a nível de política criminal e plasmadas na lei, mas sem esquecer também a vertente da prevenção especial ou de socialização, ou, segundo os termos legais: a reintegração do agente na sociedade (art. 40.º n.º 1 do CP).

Ao elemento culpa, enquanto traduzindo a vertente pessoal do crime, a marca, documentada no facto, da singular personalidade do agente (com a sua autonomia volitiva e a sua radical liberdade de fazer opções e de escolher determinados caminhos) pede-se que imponha um limite às exigências, porventura expansivas em demasia, de prevenção geral, sob pena de o condenado servir de instrumento a tais exigências.

Neste sentido é que se diz que a medida da tutela dos bens jurídicos, como finalidade primeira da aplicação da pena, é referenciada por um ponto óptimo, consentido pela culpa, e por um ponto mínimo que ainda seja suportável pela necessidade comunitária de afirmar a validade da norma ou a valência dos bens jurídicos violados com a prática do crime. Entre esses limites devem satisfazer-se, quanto possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização (Cf. FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas Do Crime, Editorial de Notícias, pp. 227 e ss.).

Quer isto dizer que as exigências de prevenção traçam, entre aqueles limites óptimo e mínimo, uma submoldura que se inscreve na moldura abstracta correspondente ao tipo legal de crime e que é definida a partir das circunstâncias relevantes para tal efeito e encontrando na culpa uma função limitadora do máximo de pena. Entre tais limites é que vão actuar, justamente, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização, cabendo a esta determinar em último termo a medida da pena, evitando, em toda a extensão possível (...) a quebra da inserção social do agente e dando azo à sua reintegração na sociedade (FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., p. 231).

Ora, os factores a que a lei manda atender para a determinação concreta da pena são os que vêm indicados no referido n.º 2 do art. 71.º do CP e (visto que tal enumeração não é exaustiva) outros que sejam relevantes do ponto de vista da prevenção e da culpa, mas que não façam parte do tipo legal de crime, sob pena de infracção do princípio da proibição da dupla valoração.»

Como também se lê no acórdão deste Supremo Tribunal, de 03-07-2014 (proc. n.º 1081/11.7PAMGR.C1.S1 – 3.ª Secção), «a defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, e o máximo, que a culpa do agente consente; entre estes limites, satisfazem-se quando possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização».

Como justamente refere MARIA JOÃO ANTUNES, «[s]e a medida da pena é a protecção de bens jurídicos e, na medida do possível, a reintegração do agente na sociedade, e se a pena não pode ultrapassar, em caso algum, a medida da culpa (artigo 40.º, n.os 1 e 2, do CP), então a medida da pena há de ser dada pela medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos, sem ultrapassar a medida da culpa, actuando os pontos de vista de prevenção especial de socialização entre o ponto óptimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de tutela de tais bens»[12].

A medida da pena, considera a mesma autora, «há-de ser dada pela medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos, face ao caso concreto, num sentido prospectivo de tutela das expectativas da comunidade na manutenção (ou mesmo no reforço) da vigência da norma infringida»[13].

O acórdão recorrido fundamenta a confirmação da pena de 17 anos fixada na 1.ª instância nos seguintes termos:

«O arguido incorreu no crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts. 131º e 132º, nº 2 al. e) do C.Penal, a que corresponde a pena de 12 a 25 anos de prisão e no crime de profanação de cadáver, p. e p. pelo art. 254º, nº 1, al. a) do C.Penal, a que cabe a pena até dois anos de prisão ou pena de multa até 240 dias.

A aplicação da pena visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade e em caso algum pode ultrapassar a medida da culpa, art.40º nº 1 e 2 do C.Penal.

O art. 71º, nº 2 do C. Penal estabelece que a determinação da medida da pena, dentro dos limites fixados na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo ainda o tribunal, na determinação daquela atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, designadamente as referidas nas várias alíneas do seu n.º 2.

Destes preceitos infere-se que, a função primordial de uma pena, sem embargo de outros aspectos decorrentes de uma prevenção especial positiva, consiste na prevenção dos comportamentos danosos que incidam sobre os bens jurídicos penalmente protegidos.

O seu limite máximo fixar-se-á, em homenagem à salvaguarda da dignidade humana do condenado, em função da culpa revelada, que assim a delimitará, por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que social e normativamente se imponham.

O limite mínimo da pena é dado pelo quantum da pena, que em concreto ainda realize eficazmente essa protecção dos bens jurídicos.

Dentro destes dois limites, situar-se-á o espaço possível para resposta às necessidades da reintegração social do agente.

Como refere Claus Roxin, em Derecho Penal- Parte General, Tomo I, pág. 99/101 e 103, “ a pena não pode ultrapassar na sua duração a medida da culpabilidade mesmo que interesses de tratamento, de segurança ou intimidação revelem como desenlace uma detenção mais prolongada. A sensação de justiça, à qual corresponde um grande significado para a estabilização da consciência jurídico-penal, exige que ninguém possa ser castigado mais duramente do que aquilo que merece; e “merecida” é só uma pena de acordo com a culpabilidade... (....) a pena serve os fins de prevenção especial e geral: limita-se na sua magnitude pela medida da culpabilidade, mas pode fixar-se abaixo deste limite em tanto quanto o achem necessário as exigências preventivas especiais e a ele não se oponham as exigências mínimas preventivas gerais”.

Mais acrescenta o mesmo autor a pág. 100: “certamente a pena não pode ultrapassar a medida da culpabilidade, mas pode não alcançá-la sempre que isso seja permitido pelo fim preventivo. Nele radica uma diferença decisiva frente à teoria da retribuição, que também limita a pena pela medida da culpabilidade, mas que reclama em todo o caso que a dita pena àquela corresponda, com independência de toda a necessidade preventiva”.

Na concretização destes princípios o tribunal aplicou ao arguido as penas que de 17 (dezassete) anos de prisão, em relação ao crime de homicídio qualificado previsto e punido no art. 131º e 132º, nº 2, al. e) do C.Penal, de 1 (um) ano de prisão, em relação ao crime de profanação de cadáver previsto no art. 254º nº 1 al. a) do C.Penal.

Para a determinação das penas parcelares, o tribunal teve em conta os seguintes elementos:

“ (…) o elevado grau de ilicitude dos factos, bem como a intensidade do dolo com que o arguido agiu, pois que sabia e quis agir do modo descrito com o propósito de tirar a vida de BB e de ocultar o cadáver do mesmo.

A escolha da cabeça como zona corporal privilegiada para objecto de agressão, a intensidade desta e a sucessão de golpes revelam um dolo intensíssimo.

De acentuar também a crueldade ínsita na utilização de uma barra metálica como instrumento do crime, provocando imenso sofrimento na vítima.

(…) as qualidades da sua personalidade manifestadas no facto, que revelam uma marcada desconformação com o direito, atenta a gravidade e o modo de execução dos factos (pautado por uma ostensiva persistência em consumar o crime de homicídio), mediante a perpetração de sucessivos actos de intensa violência.

Saliente-se que o arguido demonstrou uma manifesta falta de respeito pela vida de BB e uma total ausência de sentido crítico, mostrando-se incapaz de interiorizar o desvalor jurídico, nesta parte da sua conduta.

(…) nenhumas atenuantes de relevo se apuraram. A confissão parcial e a ausência de antecedentes criminais também têm escasso valor atenuativo, por corresponder a situação de normalidade das pessoas fiéis ao direito. A conduta do arguido e a violência súbita e inesperada que nele desencadeou a discussão com a vítima, induz algumas exigências de prevenção especial.

No que concerne às exigências de prevenção geral, diremos que as mesmas se fixam num grau muito alto, merecendo, no caso em apreço, um especial cuidado, não só porque têm frequentemente sido levadas a cabo na nossa sociedade, mas também por a comunidade exigir uma repressão eficaz destas condutas delituosas com o fim de prevenir a sua renovação.

Quanto às exigências de prevenção especial, como bem consta do acórdão recorrido, teremos que atender à dificuldade que o arguido apresenta de integração familiar, escolar e social, que se reflectem na relação com os seus pares. Estas dificuldades são decorrentes de um contexto familiar no qual o arguido não se sente seguro e integrado e de perdas afectivas significativas, de familiares de referência, que contribuíram para sentimentos depressivos e comportamentos anti-sociais.

Neste contexto, existe um conjunto considerável de factores de risco pessoais, familiares e sociais, nomeadamente a nível do contexto familiar, da falta de controlo parental firme e estruturante dos seus comportamentos, do parco empenho na educação e formação profissional, do abuso de substâncias estupefacientes, da personalidade agressiva e anti-social, da sua atitude fria e desinteressada perante os factos praticados pelos mesmo e da insuficiente capacidade de operacionalização do pensamento sequencial, da capacidade de descentração e controlo dos impulsos, factores que poderão contribuir para a eventual prática de novos ilícitos”.

Perante estes elementos importa reter, que o grau de ilicitude dos factos é muito elevado, atenta a gravidade das consequências da conduta do arguido.

O modo de execução: consistiu em desferir diversas e violentas pancadas com uma barra de ferro, com cerca de 63 cm e com um peso de 1 kg e com uma faixa de borracha preta numa das extremidades, no corpo de BB, atingindo-o por diversas vezes na cabeça, no tórax e ainda nos membros superiores e inferiores, estas que foram determinadas, no essencial, pelas tentativas de defesa da vítima., como resulta dos esclarecimentos da Srª Perita ...prestados em audiência.

Com tal actuação causou a BB as lesões traumáticas descritas no relatório de autópsia médico-legal de fls. 883 a 886, nomeadamente fractura transversal do crânio documentada a fls. 1022, e as demais descritas no nº 5 da matéria provada, cujo teor se dá por reproduzido.

As lesões traumáticas crânio-meningo-encefálicas foram causa directa e necessária da morte de BB.

O dolo é intensíssimo.

Quanto à situação pessoal e familiar: o arguido perdeu o pai aos dez anos e a avó paterna poucos meses depois, momento a partir do qual passou a privilegiar o convívio com um grupo de pares, mais velhos e com comportamentos delituosos, tendo-se acentuado a sua ruptura com as regras escolares e desmotivação pelos conteúdos académicos e absentismo escolar.

Face às dificuldades sentidas ao nível da educação, a pedido da mãe foi institucionalizado em Setembro de 2010, tendo em Abril de 2012 voltado ao agregado familiar, tendo conflitos constantes com a mãe e padrasto.

Voltou a ser institucionalizado, no entanto, quanto regressou a casa voltou ao tipo de vida desestruturada que tinha antes, sem qualquer disciplina e ocupação, ausentava-se da casa da mãe e acompanhava indivíduos com práticas desviantes.

As exigências de prevenção geral são muito elevadas face aos bens jurídicos violados, à frequência com que têm ocorrido na nossa sociedade casos semelhantes, e à necessidade de defesa do ordenamento jurídico na reposição contrafáctica da norma violada.

Como ensina Figueiredo Dias em O sistema sancionatório do Direito Penal Português inserto em Estudo em Homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, I, pág. 815 “A prevenção geral assume o primeiro lugar como finalidade da pena. Prevenção geral, porém, não como prevenção negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva, de integração e reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face á violação da norma ocorrida numa palavra, como estabilização das expectativas comunitárias na validade e na vigência da norma infringida”.

Como se refere no acórdão do STJ de 11-07-2007, de 17-03-1994, procº nº 1583/07-3ª, a criminalidade violenta, em que se integra o crime de homicídio, assume alguma preocupação comunitária in crescendo, pelo que, para confiança da colectividade na lei, em nome de uma desejável tranquilidade e segurança de respeito pela vida humana, as necessidades de prevenir a prática de tal crime são muito presentes.

Trata-se de um crime gerador de grande alarme social e de repúdio das pessoas em geral, face à enorme intranquilidade que gera no tecido social.

Quanto às exigências de prevenção especial, face à personalidade do arguido elas exigem uma atenção redobrada, de forma a que não prevarique de novo.

Vejamos, a argumentação do arguido.

O arguido alega que confessou parte dos factos e que é delinquente primário, mas há que tem em conta, que estas circunstâncias foram tidas em conta na medida da pena e têm um escasso valor atenuativo, pelas razões acima referidas.

Mais refere o arguido que, os factos em causa nos autos não poderão ser dissociados da vida madrasta que sempre lhe esteve reservada, dado que se viu privado desde muito cedo, os dez anos, de referências familiares, perda do pai e da avó paterna, chegando a estar institucionalizado e muito menos do seu estado psicológico debilitado, que lhe conferem um grau de culpa diminuído

Sem dúvida que, a vida tem sido madrasta para o arguido, uma vez que a sua infância e adolescência têm sido problemáticas, mas há que ter em conta que, já teve algumas oportunidades, nomeadamente quando esteve institucionalizado de Setembro de 2010 a Abril de 2012 e posteriormente de Novembro de 2012 a Agosto de 2014, em que em Março de 2013 lhe foi aplicada a medida de internamento em Centro Educativo de dezoito meses, para reflectir sobre o seu modo de vida e arrepiar caminho do tipo de vida desviante que levava, o que não fez.

Alega ainda o arguido que o seu estado psicológico debilitado lhe confere um grau de culpa diminuído, mas também, não lhe assiste razão, dado que como consta do relatório de avaliação psicológica de fls. 1187 e segs e do depoimento do Drº ..., que presentemente lhe presta acompanhamento no Estabelecimento Prisional, que indubitavelmente não padece de qualquer problema de saúde mental e que apresenta debilidades ao nível do seu funcionamento emocional, que se pautam, além do mais, pela falta de empatia, a impulsividade e, a agressividade.

Sopesando os elementos referidos, e as molduras penais que em abstracto correspondem aos crimes cometidos consideram-se justas adequadas e proporcionais as penas que parcelares que lhe foram aplicadas.»

Esta fundamentação não pode deixar de merecer, no essencial, a nossa concordância.

Nos termos do artigo 71.º do Código Penal, a medida concreta da pena é fixada em função da culpa e das exigências da prevenção, devendo atender, nomeadamente, à ilicitude do facto, à intensidade do dolo, aos sentimentos manifestados na prática do crime e à sua motivação, às condições pessoais do agente, à sua conduta anterior e posterior aos factos, à sua falta de preparação para manter conduta lícita.

Na realização dos fins das penas – protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (artigo 40.º, n.º 1 do Código Penal) – as exigências de prevenção geral constituem, nos casos de homicídio, uma finalidade de primordial importância.

A vida humana é o bem essencial, o valor fundamental, inviolável na expressão constitucional (artigo 24.º, n.º 1, da Constituição da República), sendo a comunidade abalada de forma muito intensa quando, por acto voluntário, se ofende a vida de um dos seus membros.

           Como sublinham GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, «o direito à vida é um direito prioritário, pois é condição de todos os outros direitos fundamentais, sendo material e valorativamente o bem mais importante do catálogo de direitos fundamentais e da ordem jurídico-constitucional no seu conjunto»[14].

E, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, 1.ª parte, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, o direito de qualquer pessoa à vida é protegido pela lei, tratando-se essencialmente de um direito a não ser privado da vida, um direito a não ser morto.

São, pois, evidentes e prementes as exigências de prevenção geral expressas na perturbação comunitária que provoca este tipo de crimes que põem em causa valores nucleares da sociedade.

Sendo uma das finalidades das penas a tutela dos bens jurídicos – artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal – definindo a necessidade desta protecção os limites daquelas, há que ter em atenção o bem jurídico tutelado nas normas incriminadoras de homicídio – a vida humana inviolável.

Na realização dos fins das penas, as exigências de prevenção geral constituem nos casos de homicídio uma finalidade de axial importância.

            Essa finalidade de prevenção geral pretende acentuar perante a comunidade o respeito e a confiança na validade das normas que protegem o bem mais essencial.

Relembrando asserções já tecidas, e convocando o ensinamento de FIGUEIREDO DIAS, «A prevenção geral assume o primeiro lugar como finalidade da pena. Prevenção geral, porém, não como prevenção negativa, de intimidação do delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva, de integração e de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida; numa palavra, como estabilização das expectativas comunitárias na validade e na vigência da norma infringida»[15].

Como já se consignou, citando-se MARIA JOÃO ANTUNES, a medida da pena há-de ser dada pela medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos, face ao caso concreto, num sentido prospectivo de tutela das expectativas da comunidade na manutenção da vigência da norma infringida.

Significando a prevenção geral positiva ou de integração, sublinha-o AMÉRICO TAIPA DE CARVALHO, que a pena é um meio de interpelar a sociedade e cada um dos seus membros para a relevância social e individual do respectivo bem jurídico tutelado penalmente.

A prevenção geral positiva tem ainda, considera o mesmo autor, a dimensão ou objectivo da pacificação social ou, por outras palavras, do restabelecimento ou revigoramento da confiança da comunidade na efectiva tutela penal estatal dos bens jurídicos fundamentais à vida colectiva ou individual. Esta mensagem de confiança e de pacificação social é dada, especialmente, através da condenação penal, enquanto reafirmação efectiva da importância do bem jurídico lesado[16].

Mas a pena tem também uma função de prevenção geral negativa ou de dissuasão da prática de futuros crimes.

Nesta perspectiva, como justamente é lembrado no acórdão deste Supremo Tribunal, de 15-05-2013, proferido no processo n.º 154/12.3JDLSB.L1.S1 – 3.ª Secção:

«[O] ponto de partida da individualização penal é a determinação dos fins das penas pois que só arrancando de fins claramente definidos é possível determinar os factos que relevam na respectiva ponderação. Aqui, é preciso, em primeiro lugar, readquirir a noção da importância fundamental que assume a justa retribuição do ilícito, e da culpa, compreendendo o princípio da culpa quer uma função fundamentadora, quer uma função limitadora da mesma pena. Ao mesmo nível que a retribuição justa situa-se o fim da prevenção especial.

Por consequência a pena deve ponderar, também, a forma de contribuir para a reinserção social do arguido e de não prejudicar a sua posição social para além do estritamente inevitável. Esta exigência está plasmada na fórmula de Kohlrausch sobre a prevenção especial “Na individualização da pena o tribunal deve considerar os meios necessários para reconduzir o arguido a uma vida ordenada e ajustada á lei”.

Salienta Jeschek que, na prevenção especial, se contem a protecção da comunidade face ao delinquente perigoso o que é, frequentemente, esquecido. 

Por fim a prevenção geral é um fim indispensável da pena pois que esta deve ser ponderada por forma a neutralizar os efeitos do delito como exemplo negativo para a comunidade e deve contribuir, simultaneamente, para fortalecer a sua consciência jurídica assim como a satisfazer o pedido de justiça por parte do círculo de pessoas afectadas pelo delito e pelas suas consequências (confirmação da ordem jurídica).

Estamos em crer que é nunca é demais acentuar o papel da culpa como critério fundamentador da medida da pena. Na verdade, as normas deveriam “ser reafirmadas na sua própria existência como um fim em si mesmas” enquanto o agente, pelo contrário, tem direito a esperar, e espera, sobretudo uma resposta ao facto injusto e culposo que cometeu. Realçando-se a prevenção como critério fundamental desvanece-se, com prejuízo da justiça individual, a orientação que o Direito penal faz da responsabilidade do agente pela sua acção. 

Sem embargo, a culpa e a prevenção residem em planos distintos. A culpa responde á pergunta de saber de se, e em que medida, o facto deve ser reprovado pessoalmente ao agente, assim como qual é a pena que merece. Só então se coloca a questão, totalmente distinta da prevenção. Aqui há que decidir qual a sanção que parece apropriada para introduzir de novo o agente na comunidade e para influir nesta num sentido social-pedagógico. 

A culpa é a razão de ser da pena e, também, o fundamento para estabelecer a sua dimensão. A prevenção é unicamente a finalidade da mesma.

Em termos dogmáticos é fundamento da individualização da pena a importância do crime para a ordem jurídica violada (conteúdo da ilicitude) e a gravidade da reprovação que deve dirigir-se ao agente do crime por ter praticado o mesmo.»

No crime de homicídio, acentua-se, são muito intensas as exigências de defesa do ordenamento jurídico e da paz social, dada a extrema sensibilidade da comunidade em relação aos mesmos e a premente necessidade de os prevenir.

Há que ter presente, como já se assinalou, o bem jurídico tutelado pela norma incriminadora é, de entre todos, o mais elevado – a vida – pelo que, salvo circunstância de excepcional valor atenuativo, não sejam admissíveis nestes crimes abrandamentos do respectivo sancionamento.

E como referido no acórdão deste Supremo Tribunal de 11-07-2007, processo n.º 1583/07 - 3.ª Secção, convocado em recente acórdão de 29-03-2017 (proc. n.º 2183/14.3JAPRT.P1 – 3.ª Secção), a criminalidade violenta, em que se integra o crime de homicídio, assume alguma preocupação comunitária em crescendo, pelo que, para confiança da colectividade na lei, em nome de uma desejável tranquilidade e segurança de respeito pela vida humana, as necessidades de prevenir a prática de tal crime são muito presentes.

Consequentemente, em termos de prevenção geral, tanto positiva, como intimidatória, as necessidades de endurecimento da reacção penal fazem-se sentir de forma elevada, perante a revolta gerada junto da população em geral pelo tipo de criminalidade ora em apreço, que aparece com frequência.

No caso presente, é muito elevado o grau de ilicitude dos factos, assumindo a culpa do arguido a forma de dolo directo, em elevada intensidade.

O arguido manifestou em todo o processo executivo do crime uma vontade firme dirigida ao facto e à concretização do resultado final, uma intensidade, energia e vigor que impressionam negativamente, numa sucessão de golpes com utilização de uma barra de ferro na cabeça da vítima, de 14 anos de idade, o que revela um total desprezo pela sua vida, para além de uma acentuada crueldade.

Como bem se reconhece no acórdão recorrido, «nenhumas atenuantes de relevo se apuraram. A confissão parcial e a ausência de antecedentes criminais também têm escasso valor atenuativo, por corresponder a situação de normalidade das pessoas fiéis ao direito».

No que concerne às exigências de prevenção geral, reafirma-se que as mesmas se fixam num grau muito elevado, exigindo a comunidade uma repressão eficaz destas condutas delituosas com o fim de prevenir a sua renovação.

Consideramos também serem elevadas as exigências de prevenção especial. Como bem consta do acórdão do Tribunal Colectivo, que o Tribunal da Relação secundou, «teremos que atender à dificuldade que o arguido apresenta de integração familiar, escolar e social, que se reflectem na relação com os seus pares. Estas dificuldades são decorrentes de um contexto familiar no qual o arguido não se sente seguro e integrado e de perdas afectivas significativas, de familiares de referência, que contribuíram para sentimentos depressivos e comportamentos anti-sociais».

Neste contexto, observa-se «um conjunto considerável de factores de risco pessoais, familiares e sociais, nomeadamente a nível do contexto familiar, da falta de controlo parental firme e estruturante dos seus comportamentos, do parco empenho na educação e formação profissional, do abuso de substâncias estupefacientes, da personalidade agressiva e anti-social, da sua atitude fria e desinteressada perante os factos praticados pelos mesmo e da insuficiente capacidade de operacionalização do pensamento sequencial, da capacidade de descentração e controlo dos impulsos, factores que poderão contribuir para a eventual prática de novos ilícitos».

Como consta da factualidade provada relativa ao seu processo de socialização, desde cedo que o arguido-recorrente evidenciou um trajecto irregular, com comportamentos inapropriados na sala de aula (destruição de material escolar, manifestações violentas com os colegas e falta de respeito pelas figuras de autoridade na escola), tendo passado, a partir do ingresso no 5.º ano de escolaridade, a privilegiar o convívio com um grupo de pares relativamente mais velhos e com comportamentos delituosos, envolvendo-se em condutas de risco, tendo também iniciado hábitos tabágicos e consumos regulares de haxixe; acentuando-se a ruptura com as regras escolares, a desmotivação pelos conteúdos académicos e o absentismo escolar.

A persistência de uma atitude faltosa a tarefas sociais esperadas para a sua faixa etária, o total desinvestimento em ocupações estruturadas no tempo livre e a inserção em grupos marginais revelam a radicada irresponsabilidade do arguido e um estilo de vida desregrado.

Face às dificuldades sentidas ao nível da sua educação e acompanhamento, a mãe do arguido solicitou intervenção da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens da área de residência, daí resultando a aplicação ao mesmo da medida de promoção e protecção de acolhimento na ... tendo sido institucionalizado em Setembro de 2010, acolhimento que durou cerca de dois anos, durante o qual o arguido registou episódios de comportamentos violentos com colegas, de pequenos furtos e de absentismo escolar, entre outros.

Tendo retornado ao agregado familiar, residente em ... e constituído, então, pela mãe, o padrasto e dois irmãos (o irmão germano e uma irmã mais nova, filha do casal), a sua reintegração familiar e escolar não foi bem-sucedida, registando-se conflitos e discussões constantes com a mãe e o padrasto, bem como ausências de casa sem consentimento.

Neste período continuam os comportamentos disruptivos do arguido e mais uma vez a mãe solicita a intervenção da Comissão de Protecção de Crianças e Jovens, que instaura novo processo ao mesmo por abandono escolar e prática de ilícitos, voltando a ser institucionalizado em Novembro de 2012 em cumprimento de medida cautelar de guarda, no ..., em regime fechado.

Entretanto, por factos tipificados na lei como furto qualificado e tráfico de estupefacientes, foi aplicada ao arguido a medida de internamento em Centro Educativo, em regime semiaberto, com a duração de dezoito meses, pelo que, em Março de 2013, foi transferido para o ....

Com um percurso com avanços e recuos no processo de intervenção educativa faseada das instituições da justiça, este arguido integrou o curso de Operador de Jardinagem, com equivalência ao 6.º ano de escolaridade, e o curso de formação tecnológica de Instalador e Reparador de Computadores, com equivalência ao 9.º ano de escolaridade, tendo concluído a formação de base deste último antes de terminar a medida de internamento em Agosto de 2014.

Após a cessação da medida de internamento, o arguido voltou ao agregado familiar da mãe e do padrasto e inscreveu-se no ano lectivo 2014/15, por preferência pessoal, no curso de técnico de electrónica, na Escola Profissional de ..., o qual apenas frequentou poucos dias, retomando o anterior estilo de vida desestruturante, o convívio privilegiado com grupos marginais e a adopção de comportamentos anti-sociais.

Em meio prisional, o percurso deste arguido foi inicialmente caracterizado pela inércia e desinteresse em qualquer actividade ocupacional ou desportiva, estando a frequentar há dias um curso de formação de pedreiros.

O arguido evidencia dificuldades de envolvimento nas dimensões afectiva e interpessoal revelando ser imaturo e impulsivo, bem como uma notória incapacidade para delinear e prosseguir um plano de vida válido e normativo.

A actual imagem social do arguido AA é associada aos factos pelos quais está acusado, bem como ao convívio com indivíduos problemáticos e com comportamentos desviantes, existindo registo de participações policiais contra o mesmo no posto da Guarda Nacional Republicana de ....

O arguido revela dificuldades em se adaptar a situações que envolvem adiamento da gratificação, sendo as suas acções voltadas para a satisfação imediata, valorando os seus actos com um falso sentimento de autonomia e de desnecessidade de apoio, denotando reduzida auto consciência, restrita capacidade de introspecção e tendência para projecção da culpa e da responsabilidade, o que remete para a dificuldade em reflectir sobre as implicações dos comportamentos e emoções, envolvendo compreensão inadequada de si mesmo e apreciação insuficiente do impacto que as suas acções têm sobre os outros,

O recorrente vem condenado na pena de 17 anos de prisão pela prática do crime de homicídio qualificado.

À luz dos critérios que se enunciaram, acentuam-se as exigências de prevenção geral que assumem aqui uma especial intensidade, devendo ter-se em devida atenção a intensidade da culpa do arguido manifestada na execução do crime, revelando uma personalidade particularmente desvaliosa em todo o processo de execução do crime de homicídio.

Não se pode, porém, ignorar a jovem idade do arguido na data do cometimento do crime – 17 anos – e a natural imaturidade que, em geral, se lhe associa, e as condições com que se deparou no decurso da formação da sua personalidade, em que avulta o falecimento do seu pai e da sua avá paterna poucos meses depois, as duas pessoas «com quem tinha uma relação de maior proximidade e afecto» (factos 23 e 24).

Pretendendo transmitir ao arguido uma mensagem no sentido de interiorizar que deve investir na sua formação e ressocialização, entendemos que se justificará uma diminuição, ainda que ligeira, da pena a aplicar ao crime de homicídio.

Assim, ponderando todas as circunstâncias do caso, entendemos adequada e justa a pena de 16 anos de prisão pela prática do crime de homicídio qualificado, pena que satisfaz as exigências de prevenção geral, sem afectar as finalidades de prevenção especial, respeitando ainda a medida da culpa do recorrente.

4.3. Medida da pena única

O arguido-recorrente foi condenado na pena única de 17 anos e 6 meses de prisão em cúmulo jurídico que englobou a pena de 17 anos pelo crime de homicídio qualificado e a pena de 1 ano de prisão aplicada pelo crime de profanação de cadáver.

O artigo 77.º do Código Penal estabelece as regras da punição do concurso de crimes, dispondo no n.º 1 que «[q]uando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa única pena», em cuja medida «são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente».

O n.º 2 do mesmo preceito prescreve que «[a] pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão (…), e como limite mínimo, a mais elevada daquelas penas concretamente aplicadas aos vários crimes».

No caso sub judice, tendo em conta as duas penas parcelares aplicadas ao recorrente, a moldura do cúmulo jurídico situa-se entre os 16 anos de prisão e os 17 anos de prisão.

Na determinação da medida concreta da pena conjunta são levados em conta os factos em conjunto e a personalidade do agente, revelando-se uma dimensão penal nova fornecendo o conjunto dos factos a gravidade do ilícito global praticado.

Como bem se considera no acórdão recorrido:

«A pena conjunta do concurso será encontrada em função das exigências gerais de culpa e prevenção, fornecendo a lei, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no artigo 71º, n.º 1, do Código Penal, um critério especial: “na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

Na determinação da pena concreta conjunta, importa, pois, averiguar sobre se ocorre ou não ligação ou conexão entre os factos, bem como a indagação da natureza ou tipo de relação entre os factos, sem esquecer o número, a natureza e gravidade dos crimes praticados e das penas aplicadas, tudo ponderando em conjunto com a personalidade do agente referenciada nos factos, ou seja, reflectida nos factos, visto que estes, como resultado da vontade e actuação do delinquente, espelham a sua forma de pensar e o seu modo de ser, o seu temperamento, carácter e singularidade, tendo em vista uma visão unitária conjunta dos factos, que permita aferir se o ilícito global é ou não produto de uma tendência criminosa do agente, bem como fixar a medida concreta da pena dentro da moldura global penal do concurso, tendo presente o efeito dissuasor e ressocializador que essa pena irá exercer sobre aquele».

Na leitura compreensiva dos factos provados, o circunstancialismo que rodeou a execução dos crimes de homicídio e de profanação de cadáver, cuja conexão entre ambos é por demais evidente, revela um ilícito global gravíssimo e uma personalidade do arguido-recorrente muito desvaliosa que, como também se salienta no acórdão recorrido, «não respeita valores essenciais ao viver em sociedade e às normas que a regem».

À luz das considerações que se vêm de tecer e ponderando os factos, a natureza dos bens jurídicos violados, resultando uma notória conexão entre os crimes praticados, perante a gravidade do ilícito global e a personalidade muito desvaliosa do arguido, consideramos justa e adequada a pena única de 16 anos e 6 meses de prisão.

III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça em:

 

1 – Rejeitar o recurso, por inadmissibilidade legal – artigos 420.º, n.º 1, alínea b), 414.º, n.º 2, 434.º e 400.º, n.º 1, alíneas e) e f), do CPP – quanto à pretensão formulada de reapreciação da medida da pena pelo crime de ocultação de cadáver.

2 – Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido AA e, em consequência:

- Condena-se o recorrente pelo crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.º 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 16 (dezasseis) anos de prisão;

- Em cúmulo jurídico desta pena com a pena de 1 (um) ano de prisão aplicada pela prática de um crime de profanação de cadáver, condena-se o recorrente na pena única de 16 (dezasseis) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Não são devidas custas (artigo 513.º, n.º 1, do CPP).

Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94.º, n.º 2, do CPP

Supremo Tribunal de Justiça, 13 de Julho de 2017

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[1]              Mantêm-se os segmentos textuais destacados e sublinhados no original.
[2] - Quanto à outra pena parcelar, de 1 ano de prisão, aplicada pelo crime de profanação de cadáver, sempre teria de ter-se por definitivamente fixada, nos termos do art. 400.º, n.º1/f) do CPP, porque confirmada pela Relação. 
[3] - Que, note-se, equacionou essa concreta questão, como devia, no ponto 4 do capítulo respeitante à “determinação da espécie e medida da pena”, aí fundamentando devidamente os motivos por que decidiu não aplicar o mencionado regime penal.
[4] - E que aqui nos dispensamos de reequacionar.
[5] - Claramente situada portanto na metade inferior daquela moldura, posto que, como se impunha, mais próxima do seu ponto médio do que do seu limiar mínimo.
[6] - In “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 241.
[7]              Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lisboa, Lex, 1997, p. 395,
[8]              Recursos em Processo Civil, Novo Regime (DL 303/2007, de 24-08), Almedina, 2008, p. 23, e Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014 – 2.ª Edição, Almedina, pp. 92-93.:
[9]              Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo I, Coimbra Editora, 1999, pp. 32-33.
[10]             Código Penal – Parte Geral e Especial, 2.ª Edição – 2015, Almedina.
[11]             Código Penal Português Anotado e Comentado, 18.ª edição, pág. 515.
[12]             Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, p. 44.
[13]             Idem, ibidem.
[14]             Constituição da República Portuguesa Anotada, 2007, volume I, pp. 446-447.
[15]             “O sistema sancionatório do Direito Penal Português”, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, I, p. 815,
[16]             Direito Penal – Parte Geral, 2.ª Edição, Coimbra Editora, pp. 65-66.