Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 4ª SECÇÃO | ||
| Relator: | FERNANDES DA SILVA | ||
| Descritores: | CASO JULGADO MATERIAL DESPEDIMENTO SEM JUSTA CAUSA | ||
| Data do Acordão: | 01/12/2012 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
| Sumário : | 1. A excepção do caso julgado, enquanto insusceptibilidade de impugnação de uma decisão transitada, visa evitar que o Tribunal da acção seja confrontado com a hipótese de se contradizer ou de se repetir.
Pressupondo a repetição de uma causa (o que ocorre quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir), tal situação não se verifica se/quando o facto concreto de que emerge o direito peticionado é diverso nos dois casos, mesmo que a providência requerida possa ser formalmente semelhante. 2. Inexiste identidade de causa de pedir se/quando a mesma, no segundo caso, é reportada a um facto não só ocorrido posteriormente ao encerramento e discussão da primitiva acção, mas diferente do facto concreto que fundamenta o pedido na primeira. 3. A reintegração, enquanto efeito ou consequência da ilicitude do despedimento, não é confundível com a obrigação sinalagmática de ocupação efectiva do trabalhador na constância de um vínculo juslaboral. 4. Constitui comportamento ilegítimo, subsumível na noção de despedimento ilícito, a terminante disposição do empregador em não admitir um trabalhador, vinculado por um contrato de trabalho sem termo, a retomar as suas funções, consubstanciada na reiterada comunicação escrita de que não era autorizada a sua apresentação ao serviço. | ||
| Decisão Texto Integral: |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I – 1. AA, residente na Rua …, Lote …, …., … …, propôs acção emergente de contrato individual de trabalho contra “BB – Produtos Alimentares, SA”[1], com sede em …, … …, pedindo que seja decretada a nulidade do despedimento e, em consequência, a sua reintegração na ré, com efeitos a 11.07.2001, com a condenação desta a pagar-lhe as retribuições desde 01.10.2003 até à data da sentença, subsídio de férias no montante de € 3.853,26; subsídios de Natal no montante de € 3.853,26; subsídios de alimentação de 01.10.2003 a 20.04.2008, no montante de € 9.294,45; as diferenças salariais, emergentes dos níveis salariais com os colegas e dos aumentos anuais a contabilizarem em eventual execução de sentença; valores vincendos; indemnização por antiguidade no valor de € 7.707,52; juros à taxa legal sobre os valores vencidos e vincendos; diferenças salariais resultantes das Convenções Colectivas ou aumentos efectuados pela ré ao longo dos anos, relegando-se para execução de sentença os respectivos quantitativos. Alegou para o efeito, em resumo útil, que intentou acção judicial declarativa comum contra a “CC – Empresa de Trabalho Temporário, Lda.” e a ora ré, que correu termos no Tribunal de Vila Franca de Xira, onde foi proferida sentença que declarou a existência de um contrato de trabalho sem termo, com efeitos a 11 de Julho de 2001, celebrado entre a A. e a segunda R., tendo ambas sido absolvidas do pedido de reintegração da A. por aí se ter decidido pela inexistência de despedimento, sentença que, confirmada em sede de recurso, transitou oportunamente em julgado. Ainda na pendência dos referidos autos, mas após a decisão da primeira Instância, a A. apresentou-se nas instalações da primeira ré, no dia 12 de Dezembro de 2005, que a informou não estar autorizada a sua apresentação ao serviço. Transitada em julgado a referida decisão, a A. apresentou-se de novo nas instalações da ora ré, no dia 23 de Outubro de 2007, mas a Ré, por ofício de 23 de Novembro de 2007, informou-a de que não estava autorizada a permanecer nas instalações da empresa. Em 30 de Setembro de 2003, a A. auferia o vencimento mensal de € 642,21 acrescido de subsídio de alimentação no valor de € 168,99 e subsídio de turno, de 60% do salário mensal, no valor de € 685,33; tinha o horário das 23.00 às 07.00 horas, com a duração de quarenta horas semanais, com a categoria de operadora de máquinas; exercida, sob a direcção da ré e desta recebendo ordens. Mais alega que auferia um salário inferior ao dos trabalhadores com a mesma categoria profissional ou igualdade de tarefas nas linhas de produção. 2. Regularmente citada, a ré contestou por excepção, invocando o caso julgado e a falta de interesse em agir, e, por impugnação, os factos alegados pela A. Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedentes a excepção do caso julgado e da falta de interesse em agir, tendo sido dispensada a selecção da matéria de facto em face da simplicidade da causa. 3. A Ré interpôs recurso da decisão que julgou improcedentes as excepções do caso julgado e da falta de interesse em agir, impugnação que foi admitida como agravo, com subida diferida, conforme despacho a fls. 224. 4. Prosseguindo os Autos a sua normal tramitação, discutiu-se e julgou-se a acção, com sentença condenatória da R., cujo dispositivo se transcreve: “Nos termos e fundamentos expostos, julga-se a acção parcialmente procedente e em consequência decide-se: - Declara-se ilícito o despedimento da A.; - Condena-se a R. ‘BB – Produtos Alimentares, S.A.’ a pagar à A. as retribuições e subsídios, férias, subsídio de férias e de Natal vencidos e vincendos entre 22 de Março de 2008 até trânsito em julgado da presente decisão, quantias às quais acrescem juros legais desde a data de vencimento de cada uma delas até efectivo e integral pagamento; - Condena-se a R. ‘BB – Produtos Alimentares, S.A.’ a reintegrar a autora, AA, no seu posto de trabalho, com a categoria, antiguidade e retribuição e subsídios que teria se não tivesse sido despedida; - Absolver a R. ‘BB – Produtos Alimentares, S.A.’ do demais peticionado”. 4. Não se conformando com ao assim ajuizado, A R. interpôs recurso de Apelação, mas sem sucesso, já que o Tribunal da Relação de Lisboa confirmou, por unanimidade, a decisão impugnada, julgando improcedentes os recursos de Agravo e de Apelação e confirmando a decisão recorrida – Acórdão a fls. 363 e seguintes. 5. A R. veio então interpor recurso de Revista Excepcional, que foi admitida, conforme fls. 429-442. Terminou aí as respectivas alegações com este quadro conclusivo: a) O Acórdão recorrido está em contradição com o Acórdão fundamento; b) Os fundamentos do Acórdão recorrido, não encontram apoio na lei, na doutrina ou na jurisprudência; c) A decisão recorrida assentou, na errada apreciação dos pressupostos de que dependem as excepções do caso julgado e falta de interesse em agir; d) Há uma identidade de sujeitos, do pedido e da causa de pedir; e) Há uma repetição da causa, uma vez que o Tribunal está colocado na situação de confirmar ou contrariar uma decisão anterior; f) Não se tendo recorrido à execução da sentença está a utilizar-se um meio alternativo inadequado ao fim visado pela A., com menosprezo pelos princípios que regem o processo; g) A A. não tem legitimidade para instaurar a presente acção; h) O Acórdão recorrido contraria a sentença proferida pelo Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira, confirmada por Acórdão da Relação de Lisboa; i) A A. não foi objecto de qualquer despedimento sem justa causa e, como tal, ilícito, pois a R. limitou-se a transmitir à A. que estava a dar cumprimento às decisões proferidas pelo Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira e pelo Tribunal da Relação de Lisboa; j) O Tribunal a quo desrespeitou uma sentença anterior transitada em julgado com evidente menosprezo pelos princípios que regem o processo; k) O Acórdão recorrido, ao julgar improcedente a acção e o recurso, violou o disposto nos artigos 494.º e 497.º do CPC e 429.º e seguintes do CT 2003. Termina requerendo que seja dado provimento ao recurso e revogada a sentença e Acórdão recorridos, absolvendo-se totalmente a R. da instância e do pedido. A recorrida contra-alegou, concluindo, por sua vez: - Apreendendo-se que a causa de pedir entre o acórdão fundamento e o recorrido são distintas, não existindo contradição entre os acórdãos; - Os sujeitos processuais são os mesmos: porém a questão de fundo é diferente; - Nas acções do Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira, apreciou-se do regime contratual entre a empresa de trabalho temporário e a utilizadora, ora recorrente; - Face à determinação do regime contratual do trabalho temporário, convolado em contrato de trabalho sem termo, firmado na sentença de Vila Franca de Xira, com efeitos a 01/07/2001 e 07/05/2001; - E perante a recusa da recorrente em admitir ao seu serviço a recorrida, esta teve de requerer a intervenção judicial para fazer valer o direito ao trabalho, reconhecido na sentença de Vila Franca de Xira; - As decisões da 1ª instância e o acórdão confirmado incidiram sobre o facto da recorrente se opor a que a recorrida retomasse as suas funções, apesar de reconhecer a existência de um contrato de trabalho em vigor desde 01/07/2001; - A questão de fundo, apreciada e decidida no Tribunal do Trabalho de Lisboa, reconhecendo o direito ao trabalho da recorrida ao serviço da recorrente e ordenando a respectiva reintegração, o que não podia ter-se verificado no Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira, onde foi reconhecida a relação jurídica juslaboral entre as partes; - O douto acórdão da Relação, confirmando a sentença, aplicou bem o direito à materialidade assente, dado não se configurar a excepção de caso julgado, o que por manifesto erro de aplicação da lei ocorreu no acórdão fundamento; - No aresto a prolatar tem de ser confirmado a decisão do douto acórdão colocado em crise pela recorrente, dado que fez correcta apreciação dos factos provados e a aplicação do respectivo Direito Remata pela confirmação do acórdão sujeito. __ Já neste Supremo Tribunal o Exm.º Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, Parecer que, notificado às partes, não suscitou qualquer reacção. Colheram-se os vistos dos Exm.ºs Adjuntos. Cumpre decidir. II –
A – O objecto do recurso. Ante as proposições conclusivas que rematam a motivação – por onde se afere e delimita, por via de regra, o objecto e âmbito da impugnação – são questões a dilucidar e resolver as seguintes: - Do caso julgado. - Do despedimento sem justa causa. B – Dos Fundamentos. B.1 – De Facto. As Instâncias deram como provada esta factualidade: I. A autora propôs acção declarativa com processo comum contra “BB – Produtos Alimentares, SA” e “CC – Empresa de Trabalho Temporário, Lda.”, acção que correu termos sob o n.º 662/04.0TTVFX no Tribunal de Vila Franca de Xira, formulando os seguintes pedidos: “ (…) pedindo que a 1ª ré seja condenada a: a) ver reconhecido o direito da autora como trabalhadora efectiva, com efeitos a partir de 03.06.1997; b) pagar-lhe as quantias vencidas de salários, subsídios de férias e de Natal, almoço e turno, no montante global de € 8.794,16, acrescida de juros legais, bem como as quantias vincendas; c) pagar-lhe a compensação por antiguidade no montante de € 5.008,00, se pela mesma optar; d) pagar a sanção pecuniária compulsória de € 500,00/dia, caso não cumpra a decisão do Tribunal; e) pagar juros de mora sobre os montantes vencidos e vincendos; Subsidiariamente, pede condenação da 2.ª Ré a: a) reintegrar a autora com todos os direitos inerentes; b) pagar-lhe as quantias vencidas de salários, férias, subsídios de férias e de Natal, turno e almoço, no montante global de € 8.794,16, acrescida de juros legais; c) pagar-lhe a compensação por antiguidade no montante de € 6.220,80, se pela mesma optar no dia da audiência; d) pagar a sanção pecuniária compulsória de € 500,00 dia, caso não cumpra a decisão do Tribunal; d) pagar sanção pecuniária compulsória de € 500,00/dia, caso não cumpra a decisão do Tribunal; e) pagar juros de mora sobre os montantes vencidos e vincendos.” - (1º, 2º e doc. fls. 14 a 39). II. No dia 20 de Outubro de 2005, foi proferida sentença, junta a fls. 14 a 39 destes autos, cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, assinaladamente o seguinte: “ (…). Conclui-se, pois, que, a partir de 11.07.01, a A. prestou trabalho à 1.ª ré, por força de contrato de trabalho sem termo, ‘ex vi’ do disposto no art. 10.º do DL 358/89, de 17.10. (…). 2ª Questão Na sequência do reconhecimento de que a A. se mostrava ligada à 1.ª ré por força de contrato de trabalho sem termo, pretende esta a sua reintegração na 1.ª ré, uma vez que aí deixou de trabalhar em virtude da comunicação que lhe foi feita, o que consubstancia despedimento ilícito. (…). No caso em apreço, a entidade patronal da autora era já a 1.ª ré por força da existência de contrato sem termo, nos termos supra referidos. E não resultou provado que a 1.ª ré tenha efectuado qualquer comunicação no sentido de pôr termo à relação laboral. (…). Não tendo logrado provar o despedimento, não podem proceder os pedidos formulados com base na ilicitude do referido documento (reintegração e pagamento das prestações pecuniárias vencidas após o despedimento), improcedendo o peticionado, nesta parte. (…). V. Decisão Pelo exposto, julgo parcialmente procedente, por provada, e parcialmente improcedente, por não provada, a presente acção e, em consequência: - Reconheço que, a partir de 11.07.2001, a A., AA, trabalhou para a R. “BB – Produtos Alimentares, SA”, com base em contrato de trabalho sem termo, que se considera desde então celebrado entre a A. e a 1.ª R.; - Absolvo as RR. “BB – Produtos Alimentares, SA” e “CC – Empresa de Trabalho Temporário, Lda.” dos demais pedidos contra elas formulados pela A.. Custas pela A. e R. “BB – Produtos Alimentares, SA”, na proporção do respectivo decaimento – art. 446.º, n.ºs 1 e 2, CPC (aplicável “ex vi” do art. 1.º, n.º 2, al. a), do CPT).” – (3º, 4º, 5º, 6º e doc. fls. 14 a 39). III. Na sequência de recurso da decisão referida no número anterior, interposto pela autora, em 07 de Março de 2007, foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação Lisboa, que julgou improcedente aquele, “confirmando a decisão recorrida” – (7º a 9º, doc. fls. 67 a 86). IV. Por carta datada de 06 de Dezembro de 2005, junta a fls. 87, a autora comunicou à ré: “O Tribunal de Trabalho de Vila Franca de Xira, por sentença proferida nos autos de 662/04, declarou a existência de contrato de trabalho com efeitos a 11/07/2001. Decorridos os prazos legais, venho manifestar a minha vontade de retomar as funções, ao serviço da empresa. Assim, venho informar V.Exªs que pretendo apresentar-me ao serviço no próximo dia 12 de Dezembro, no início do turno da manhã, às 7H00, nas novas instalações da empresa” – (10º). V. A autora, às 07.00 horas do dia 12 de Dezembro de 2005, apresentou-se ao serviço, sendo impedida de retomar as suas funções – (12º, 1ª parte); VI. Por carta de 09 de Dezembro de 2005, junta a fls. 88, a ré comunicou à autora: “Acusamos a recepção da sua carta de 6 de Dezembro p.p., cujo conteúdo muito nos surpreendeu. Com efeito, a sentença a que se refere, julgou improcedente o pedido de integração nos quadros desta Empresa e, daí, o recurso que oportunamente interpôs, por, obviamente, não se ter conformado com aquela decisão. Assim, e salvo decisão em contrário do Tribunal, não tem V. Ex.ª direito a retomar as funções ao serviço desta Empresa, pelo que não lhe é autorizada a apresentação ao serviço” – (12º, 2ª parte); VII. A autora interpôs recurso da decisão referida no número anterior, admitido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, mas não admitido pelo Supremo Tribunal de Justiça – (13º e doc. 89 a 93); VIII. Apresentada reclamação para a conferência, foi confirmada a decisão de não admissão – (14º); IX. A autora emitiu e enviou à ré a carta datada de 17 de Outubro de 2007, junta a fls. 94 e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido, nomeadamente o seguinte: “Como é do conhecimento de V. Ex.ªs, o Tribunal de Vila Franca de Xira, por sentença, declarou a existência de um contrato de trabalho entre essa sociedade e a signatária, com efeitos a 11/07/2001, como trabalhadora efectiva. Interposto recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa – autos 9963/06, 4ª Secção – foi confirmada a sentença da 1ª instância. Interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, autos 2188/07 – 4ª Secção, este não admitiu o recurso de revista. Assim, encontrando-se a signatária vinculada à empresa por contrato de trabalho sem termo com efeitos a 11.07.2001, e perante as decisões dos Tribunais, existe o dever de apresentação ao serviço para o integral desempenho das funções. Perante o exposto, venho informar V. Ex.ªs que me apresento ao serviço no dia 23 de Outubro de 2007, no início do turno da manhã, às 7.00 horas, nas novas instalações da empresa.” – (15º, 1ª parte e doc. fls. 94); X. A autora, às 07.00 horas do dia 23 de Outubro de 2007, apresentou-se ao serviço – (15º, 2ª parte); XI. Por ofício de 23 de Outubro de 2007, por escrito junto a fls. 95, a ré informou a autora que “não está autorizada a permanecer nas instalações da Empresa, uma vez que a decisão do Tribunal de Trabalho de Vila Franca de Xira absolveu a ‘BB’ do pedido efectuado” – (12º e doc. fls. 95); XII. Em 31 de Agosto a autora auferia o vencimento de € 642,21 acrescido de subsídio de alimentação no montante de € 168,99 e subsídio no valor de € 385,33 – (18º); XIII. A autora fazia o horário das 23.00 às 07.00 horas – (19º); XIV. A autora exercia as funções de operadora de máquinas – (20º; XV. A autora picava o ponto – (22º); XVI. A autora recebia ordens das chefias da ‘BB’ quanto ao desempenho das funções – (23º); XVII. A autora é sócia do Sindicato dos Trabalhadores da Química, Farmacêutica, Petróleo e Gás do Centro, Sul e Ilhas – (27º). __ B.2 – Do Direito. A invocada contradição de Acórdãos serviu apenas de fundamento para a admissão da presente Revista Excepcional, tendo sido como tal considerado procedente pela formação a que alude o n.º 3 do art. 721.º-A do C.P.C. – cfr. fls. 429 e seguintes. Aí se esgotou o alcance e efeito útil do identificado Acórdão-fundamento. Como resulta das proposições que integram o acervo conclusivo, a temática constitutiva do thema decidendum, contemplando a resolução das duas identificadas questões, analisa-se em saber, a final – nas palavras da impetrante usadas no intróito das alegações propriamente ditas – se foi ou não acertadamente decidido confirmar-se a sentença que condenou a R./recorrente a reintegrar a A. no seu quadro de trabalhadores e a pagar-lhe as retribuições que se venceram desde que a despediu sem justa causa. B.2.1 – A questão primordial a dilucidar e resolver é, pois, a da (im)procedência da excepção do caso julgado. A razão maior que se convoca – e que se pretende fazer prevalecer – é, assim, a de que a A. deveria ter lançado mão da execução da sentença oportunamente proferida pelo Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira, em vez de utilizar este meio alternativo inadequado de uma segunda acção declarativa, provocando uma repetição da causa, com todos os contornos da figura do caso julgado: identidade de sujeitos, do pedido e da causa de pedir. A R. insiste, deste modo, em que, contrariamente ao ajuizado, a A. não tem legitimidade para instaurar a presente acção, tendo sido erradamente apreciados os pressupostos de que dependem as excepções da falta de interesse em agir e, concomitantemente, do caso julgado. Vejamos, então, começando por avivar, dos factos retidos, os mais relevantes. A A. propôs oportunamente acção declarativa, com processo comum, contra a ‘BB – Produtos Alimentares, S.A.’ e a Empresa de Trabalho Temporário ‘CC, Ld.ª’, demanda que correu termos no Tribunal do Trabalho de V. F. Xira sob o n.º 662/04.OTTVFX, e na qual se decidiu, a final e além do mais, reconhecer que …”a partir de 11.7.2001, a A., AA, trabalhou para a R. ‘BB – Produtos Alimentares, S.A.’, com base em contrato de trabalho sem termo, que se considera desde então celebrado entre a A. e a 1.ª Ré”. Mais se entendeu não se ter logrado provar o alegado despedimento, não procedendo, por isso, os pedidos formulados com base na reclamada ilicitude (reintegração e pagamento das prestações pecuniárias vencidas), claudicando o peticionado, nessa parte. O recurso interposto pela A. foi julgado improcedente e confirmada a sentença. A A. pretendeu entretanto retomar as funções ao serviço da sociedade R., ora recorrente, anunciando a data em que se iria apresentar para o efeito. E assim fez, mas foi impedida de retomar funções, comunicando-lhe a R., por carta de 9.12.2005, que …a sentença a que se refere julgou improcedente o pedido de reintegração nos quadros desta Empresa e, daí, o recurso que oportunamente interpôs por, obviamente, não se ter conformado com aquela decisão. Assim, e salvo decisão em contrário do Tribunal, não tem V. Ex.ª direito a retomar as funções ao serviço desta Empresa, pelo que não é autorizada a apresentação ao serviço’. Transitada entretanto a decisão (o Acórdão da Relação de Lisboa confirmou a sentença, mas o S.T.J. não admitiu a Revista deduzida), a A. enviou carta à R., datada de 17 de Outubro de 2007, conforme extractado no ponto 9. da fundamentação de facto, em que consignou nomeadamente que …’encontrando-se a signatária vinculada à empresa por contrato de trabalho sem termo, com efeitos a 11.7.2001, e perante as decisões dos Tribunais, existe o dever de apresentação ao serviço para o integral desempenho das funções. Perante o exposto, venho informar …que me apresento ao serviço no dia 23 de Outubro de 2007, no início do turno da manhã…nas novas instalações da empresa’. A A. apresentou-se então, como anunciara, mas a R. informou-a, no dia, de que …’não está autorizada a permanecer nas instalações da Empresa, uma vez que a decisão do Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira absolveu a BB do pedido efectuado’. A A. recebia ordens das chefias da ‘BB’ quanto ao desempenho das funções. __ Enfrentando as questões do caso julgado e da falta de interesse em agir, suscitadas no Agravo oportunamente interposto do Despacho Saneador – e ora reeditadas na Revista, praticamente nos mesmos termos – o Acórdão revidendo expendeu a seguinte fundamentação jurídica em que estriba a solução eleita (transcrevem-se os passos mais impressivos): «O caso julgado é a insusceptibilidade de impugnação de uma decisão (despacho, sentença ou acórdão) decorrente do seu trânsito em julgado (art. 677.º do C.P.C.). Traduz-se na inadmissibilidade da substituição ou modificação da decisão por qualquer Tribunal, incluindo aquele que a proferiu, em consequência da insusceptibilidade da sua impugnação por reclamação ou recurso ordinário (Miguel Teixeira de Sousa, ‘Estudos sobre o Novo Processo Civil’, pg. 567). O caso julgado constitui hoje uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso, que tem como fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (art. 494.º, al. i), 495.º e 497.º/2 do C.P.C.). Quando as decisões incidem unicamente sobre aspectos processuais, elas são vinculativas dentro do próprio processo em que foram proferidas, formando-se então o caso julgado formal (art. 672.º), mas quando a decisão é de mérito, ou seja, quando aprecia a procedência ou improcedência da acção, ela adquire o valor de caso julgado material, ou seja, além da eficácia intra-processual, é susceptível de valer num processo distinto daquele em que foi proferida a decisão transitada, dentro dos limites fixados pelos art. 497.º e seguintes do C.P.C. Nos termos do art. 497.º, a excepção do caso julgado pressupõe a repetição de uma causa. E, de acordo com o disposto no art. 498.º, repete-se uma causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir. Há identidade de sujeitos, quando as partes são as mesmas sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica, de pedido, quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico e de causa de pedir, quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico. Mas a causa de pedir é constituída sempre pelo facto concreto de onde emerge o direito reclamado e não pelo facto abstracto descrito na lei. Conforme refere Alberto dos Reis, em Código de Processo Civil Anotado, III, pag. 127, “a causa de pedir não é o facto abstracto configurado na Lei, mas o facto concreto particular que no caso sub judice se apresenta”. (No mesmo sentido José Lebre de Freitas, em Código de Processo Civil Anotado, vol. 2.º, pag. 325). Por isso é que a qualificação jurídica dada aos factos numa primeira acção nunca é elemento identificador do caso julgado, estando vedada nova acção em que aos mesmos factos se atribua nova qualificação. O caso julgado forma-se pela resposta dada pela sentença à pretensão do autor, materializada no pedido formulado na acção, à luz do facto invocado como seu fundamento. A eficácia do caso julgado cobre a decisão, contida na parte final da sentença, ou seja, a resposta à pretensão do autor, concretizada no pedido e delimitada através da respectiva causa de pedir (cfr. A. Varela e outros em Manual do Processo Civil, 2ª ed. Pág. 714). E o mesmo Autor acrescenta: “embora se aceite que a eficácia do caso julgado não se estende aos motivos da decisão, é ponto assente na doutrina que os fundamentos da sentença podem e devem ser utilizados para fixar o sentido e alcance da decisão contida na parte final da sentença coberta pelo caso julgado” (obra citada, pg. 715). Miguel Teixeira de Sousa, refere que “o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge esses fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão” (cfr. obra citada pag. 579). A jurisprudência tem reiterado que são abrangidas pelo caso julgado as questões apreciadas que constituam antecedente lógico indispensável da parte dispositiva da sentença – cfr. Acórdãos S.T.J. de 24.9.92, BMJ 419/648 e de 9.5.96, CJ/S.T.J. 1996, II. No caso dos Autos a Recorrente alega que a decisão recorrida violou o caso julgado formado pela decisão proferida na acção que correu termos sob o n.º 662/04.0TTVFX no Tribunal de Vila Franca de Xira, nomeadamente no que se refere à decisão que absolveu a ora Recorrente do pedido de reintegração da autora, referindo ainda que a causa de pedir não é distinta nas duas acções. Acontece que entre a acção no 662/04.8TTVFX e a presente acção, embora se verifique identidade de sujeitos, só aparentemente se verifica uma identidade de pedidos e de causa de pedir. Com efeito, na acção no 662/04.8TTVFX, que a autora propôs contra ‘BB – Produtos Alimentares, SA’ e “CC, Empresa de Trabalho Temporário, Ld.ª.”, formulou um pedido de reconhecimento da existência de uma relação contratual de natureza laboral com a ré ‘BB, SA’, e, bem assim, no pagamento de uma compensação por antiguidade se pela mesma optar (pressupondo este pedido a existência de um despedimento ilícito) e que lhe fosse reconhecido o seu direito a ser integrada no quadro, bem como a pagar-lhe as retribuições vencidas. Alegou como fundamento destes pedidos a existência de sucessivos contratos de trabalho temporário com a 2.ª ré, sendo que foi contratada para exercer as suas funções nas instalações da 1ª ré. Em 19.09.2003 a A. recebeu uma carta da 2.ª Ré em que lhe comunicava a caducidade do contrato de trabalho temporário com a 1.ª Ré. E nessa acção foi proferida a seguinte decisão: - reconheço que, a partir de 11.07.2001, a A. AA trabalhou para a R. “BB - Produtos Alimentares, SA”, com base em contrato de trabalho sem termo, que se considera desde então celebrado entre a A. e a 1.ª R.; - absolvo as RR. “BB – Produtos Alimentares, SA” e ‘CC – Empresa de Trabalho Temporário, Lda.’ dos demais pedidos contra elas formulados pela A. A Ré ‘BB’ foi absolvida do pedido de reintegração, nessa acção, por não se ter provado que essa empresa tivesse despedido a Autora, uma vez que a carta em que se comunicava a caducidade do contrato de trabalho, com efeitos a partir de 30.09.2003, foi emitida pela 2.ª Ré. Na presente acção, embora o pedido de reintegração/indemnização por antiguidade seja aparentemente idêntico, porque emerge igualmente de um despedimento, na realidade esse pedido fundamenta-‑se num facto jurídico totalmente diverso do que foi invocado na primeira acção, pois a Autora alicerça a causa de pedir na existência de um contrato de trabalho vigente, sem termo, entre ela e a R. ‘BB, S.A.’ desde 11.7.2001 (que lhe foi reconhecido por decisão transitada em julgado) e no facto de esta Ré, por ofício de 23.10.2007, ter informado a A. de que «não está autorizada a permanecer nas instalações da Empresa», o que configura um despedimento. Verifica-se assim, que a causa de pedir que substancia o pedido formulado na presente acção não só se reporta a um facto ocorrido num período temporal posterior ao encerramento da discussão e julgamento da primeira acção, como também se fundamenta num facto concreto diverso do que foi alegado na primitiva acção. E, na verdade, esta nova factualidade que sustenta o despedimento ilícito alegado pela autora nesta acção não foi objecto de apreciação e decisão no âmbito do processo 662/04.0TTVFX. E sendo assim, como entendemos que é, não existe identidade de pedido nem de causa de pedir entre as duas acções, o que implica a improcedência da invocada excepção do caso julgado. A Recorrente suscita também a questão da falta de interesse em agir por parte da Autora, pois, segundo alega, devia ter instaurado execução de sentença e não a presente acção declarativa. Nos termos do art. 26.º, n.º 2, do C.P.C. o interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da acção. O interesse processual consiste na necessidade justificada, razoável, fundada, de usar o processo, de instaurar e fazer prosseguir a acção (Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora. 2.ª ed., pág. 181). Nas acções de mera apreciação, onde o interesse processual mais se assume como verdadeiro pressuposto processual, o interesse em agir decorre de um estado de incerteza sobre a existência ou inexistência do direito a apreciar, emergente de um qualquer facto ou situação objectiva, susceptível de prejudicar o seu titular (cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 81; Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. I, Almedina, 81, pág. 117; e acórdãos do S.T.J., de 16.9.2008, processo 08A2210, de 22.02.2007, processo 078046 e de 8.3.2001, processo 00A3277, disponíveis em www.dgsi.pt. Face ao que ficou dito acerca da excepção do caso julgado, já se vê que a Autora tinha todo o interesse em instaurar a presente acção, porquanto a Ré recusou-se a aceitá-la como sua trabalhadora, verificando-se, assim uma situação objectiva susceptível de prejudicar a Autora e que carecia de tutela judicial. Por outro lado, a Autora não poderia obter o efeito jurídico pretendido através de execução da sentença proferida no Tribunal de Vila Franca de Xira, porquanto nessa sentença não foi apreciada nem decidida a concreta factualidade que enforma o pedido formulado pela Autora na presente acção, razão pela qual essa sentença não constitui título executivo relativamente à questão suscitada nesta acção. Improcede, assim, a excepção da falta de interesse em agir». Tudo visto e ponderado, acompanhamos, no essencial, os termos da fundamentação consubstanciada nas considerações vindas de transcrever, bem como o juízo decisório que as mesmas suportam. (Diremos – parenteticamente e antes de prosseguir – que a partir do momento em que ficou jurisdicionalmente estabelecido, de modo pacífico quanto a tal ponto, que a relação juslaboral entre as aqui litigantes correu, desde 11.7.2001, com base em contrato de trabalho sem termo, que se considera desde então celebrado entre a A. e a 1.ª R. (a R. patronal ‘BB’), apresenta-se-nos pouco compreensível a pretensa consistência e bondade das razões em se apoia a reacção da ora recorrente. Estando as partes vinculadas com base num contrato de trabalho sem termo – a cuja constância se não provou que a R. tivesse posto fim, por qualquer via – a relação juslaboral não sofreu qualquer hiato, mantendo-se inalterada. O direito da A. em apresentar-se na R. e a obrigação desta em a aceitar resulta directamente disso mesmo, ou seja, do ajuizado na decisão que proclamou o reconhecimento de que, a partir de 11.7.2001, a A. trabalhou para a R. …com base em contrato de trabalho sem termo, que se considera desde então celebrado entre a A. e a 1.ª R.. É, por isso, perfeitamente lógico, na economia da decisão, o alcance da absolvição da R. do pedido de reintegração, pretensão que pressupunha, enquanto causa petendi, um despedimento ilícito, que a R. afinal não proferiu. Simplesmente a absolvição do pedido de reintegração, enquanto directa consequência de um despedimento ilícito, que não ocorreu (ineficaz, porque a carta em que se lhe comunicava a caducidade do contrato de trabalho, com efeitos a partir de 30.9.2003, foi emitida pela 2.ª R., já não protagonista, ao tempo, da relação jurídica em causa, como da sentença resulta), não significa, em rectas contas – contrariamente ao que se pretende – que a R. estivesse legitimada a recusar a reocupação da A. nas suas funções). Contrapondo, aduz a recorrente – no que se nos afigura ser, no mínimo, um paralogismo, com respaldo em excertos transcritos do Acórdão-fundamento invocado na interposição da revista excepcional – que o caso julgado não se resume apenas a uma questão formal, qual seja a de saber se são idênticos os sujeitos, o pedido e a causa de pedir, por aí se tendo quedado o Acórdão ora ‘sub judicio’… …’pois para haver despedimento tem que se entender que a recorrente desrespeitou a sentença proferida pelo Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira. E a esta questão a decisão recorrida pura e simplesmente não responde, pois se o fizesse acabaria por reconhecer que há um caso julgado que tem que ser respeitado. Diz-se no Acórdão recorrido que a A. tinha todo o interesse em instaurar a presente acção, porquanto a R. recusou-se a aceitá-la como sua trabalhadora, verificando-se assim uma situação objectiva susceptível de prejudicar a A., que carecia de tutela judicial. Mas que título conferia à A. o direito a apresentar-se e à R. a obrigação de a aceitar? Como é natural, e é essa a tese da A. que o Acórdão recorrido não quer reconhecer, esse título é a sentença do Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira, que a R. estava, e está, obrigada a cumprir’ – sic, a fls. 390. Como se deixou adiantado já, a resposta é apodíctica: O direito da A. de se apresentar na R. e a obrigação de a R. a receber decorrem linearmente do sentenciado, da proclamada constância do vínculo juslaboral por ambas protagonizado e da sua natureza sinalagmática. Cumprindo o que resulta da sentença – …que a R. parece afinal disposta a observar – não vemos por que insiste em que a A. deveria ter-se servido da respectiva execução…e não de uma nova acção. À A. bastaria – como tentou fazer por duas vezes, anunciando, prévia e formalmente, a sua disposição – apresentar-se no local de trabalho para prosseguir a prestação da sua actividade, na sequência do reconhecimento jurisdicional do vínculo contratual que a isso a obrigava. Deixou-se claramente dilucidado e tratado no Acórdão revidendo – a cuja proficiente fundamentação jurídica manifestámos já a nossa inteira adesão, nada de relevante se justificando aditar-lhe – o que se entende por caso julgado e a diferença entre as figuras do caso julgado formal e material. (Reportamo-nos, por isso, à delimitação dogmática do quadro normativo de significação aí delineado). Na sequência da análise e interpretação da factualidade que integra o caso sujeito, alcançou-se a conclusão de que só aparentemente se verifica, ‘in casu’, uma identidade de pedidos e de causa de pedir. E assim é efectivamente. Se é certo que os sujeitos são os mesmos, já a causa de pedir e o pedido não são objectivamente coincidentes. A recusa da R. em consentir que a A. retomasse o trabalho é o facto jurídico, a causa petendi em que assenta o direito que exercitou na acção intentada no Tribunal do Trabalho de Lisboa, e de que ora se cuida. A A., na acção proposta no Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira (Proc. n.º 662/04.0TTVFX) pediu a condenação da R./recorrente a reconhecer o direito daquela como sua trabalhadora efectiva, com efeitos a partir de 3.6.1997, na sequência de sucessivos contratos de trabalho temporário celebrados com a 2.ª R. (de quem recebera, em 19.9.2003, uma carta a comunicar-lhe a caducidade do contrato a partir do dia 30 desse mesmo mês, com a invocação de que cessara o contrato de utilização com a 1.ª R.) e a pagar-lhe, além do mais, a compensação por antiguidade, se pela mesma viesse a optar, formulando subsidiariamente o pedido de condenação da aí 2.ª R., ‘CC Ld.ª’, empresa de trabalho temporário. Na sequência do entendimento de que a A. se achava já vinculada à 1.ª R. por força da existência de um contrato de trabalho sem termo, considerou-se que a comunicação que lhe foi feita pela 2.ª R. não poderia consubstanciar um despedimento, que nunca responsabilizaria a 1.ª, que não efectuou qualquer comunicação à autora no sentido de pôr termo à relação laboral. Sendo a causa petendi o facto concreto de onde emerge o direito reclamado – lembre-se o ensinamento de A. dos Reis e, no mesmo sentido, as notas de Lebre de Freitas[2], citados no Acórdão ‘sub judicio’ – é patente que o facto jurídico em que se funda o pedido exercitado nesta acção é diverso do que foi invocado naquela primeira. Como judiciosamente se consignou no Acórdão em crise, a causa de pedir na presente acção não só se reporta a um facto ocorrido num período temporal posterior ao encerramento da discussão e julgamento da primeira acção, como se funda num facto concreto diverso do que foi alegado na primitiva demanda. São, pois, diferentes, numa e noutra acção, a causa de pedir e o pedido. Ante esta irrefutável constatação, é fora de qualquer dúvida consistente que não se verifica a invocada excepção do caso julgado, como bem se ajuizou. O que vem de dizer-se deixa implicitamente respondida, porque logicamente ultrapassada, a questão da falta de interesse em agir por parte da A., questão que, enquanto tal, no desenhado contexto de facto, não chega sequer a ter autonomia. Pretendendo, como reiteradamente pretendeu, reassumir as suas funções na 1.ª R., enquanto consequência do adrede sentenciado, o direito que ora se reclama não existiria se a mesma R. tivesse aceitado o corolário normal da condenação, dando plena realização à normal decorrência do reconhecimento jurisdicional de que entre as litigantes se estabelecera uma relação juslaboral sem termo, sequenciada desde 11.7.2001. O direito que aqui se reclama perfectibiliza-se com a recusa assumida pela R. em aceitar/viabilizar a prestação, por banda da A., da actividade contratada. Exercitando-o – mediante o justificado/fundado uso do processo – mais não fez a A. do que exprimir o seu interesse em demandar, reflectido na utilidade derivada da procedência da acção, 'ut' art. 26.º/2 do C.P.C.
Claudicam, por conseguinte, as proposições conclusivas que enformam as alíneas a) a h) do respectivo alinhamento. __ B.2.2 – As Instâncias convergiram no sentido de que a recusa da R. em impedir a A. de efectuar a sua prestação laboral, no dia 27.11.2007, configura um inequívoco despedimento, que, por não ter sido precedido do devido processo disciplinar, tem que ser havido como ilícito. Acertadamente o fizeram. Recusando-se, repetida e ilegitimamente, a admitir que a A. retomasse as suas funções, com o argumento de que tinha sido absolvida do pedido de reintegração – mas desvalorizando, ou pretendendo ignorar, que a sentença que invoca para legitimar a sua conduta reconheceu, do mesmo passo, que a A. trabalhou (vinha trabalhando) para a R. desde 11.7.2001, com base num contrato de trabalho sem termo, que se considera desde então celebrado entre a A. e a 1.ª Ré – esta protagonizou o que foi qualificado, e bem, como um despedimento ilícito. Já ficou sobejamente explicitado o sentido e alcance da decisão em que se estriba a recorrente, afigurando-se evidente a sua falha de consistência e fundamento ao persistir na tese de que estava legitimada a não admitir que a A. retomasse as suas funções. A A. não pretendeu a retoma das suas funções na R. – repete-se – no pressuposto da obrigação da R. em reintegrá-la, (reintegração consequente a um pretenso despedimento, que afinal não ocorreu), mas sim, por a R. ter sido condenada a reconhecer a existência (e constância) de uma relação juslaboral sem termo, entre ambas, desde muito antes do episódio da comunicação da caducidade do contrato por banda da empresa de trabalho temporário, como sobredito. Impunha-se à R., na sequência do reconhecimento e proclamação jurisdicional da existência de uma relação de trabalho, cumprir o contrato, em conformidade. Inviabilizando terminantemente à A. a prestação da sua actividade profissional, na vigência do contrato, como resulta dos termos factualizados, a R. pôs fim, ilicitamente, à relação contratual que então vigorava, na plenitude dos seus efeitos, entre si e a A., com as consequências oportunamente discriminadas na sentença que o Acórdão revidendo manteve. Improcedem, por isso, as demais conclusões que rematam a motivação do recurso. III – DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, delibera-se negar a Revista, confirmando o Acórdão impugnado. Custas pela recorrente. Anexa-se o sumário do Acórdão – art. 713.º, n.º 7, do C.P.C., na redacção do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto.
Lisboa, 12 de Janeiro de 2012
Fernandes da Silva (Relator) Gonçalves Rocha Sampaio Gomes __________________________ [1] - Agora ‘BB, Ld.ª’. |