Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | FERNANDO FRÓIS | ||
Descritores: | HOMICÍDIO QUALIFICADO CULPA ESPECIAL CENSURABILIDADE ESPECIAL PERVERSIDADE MOTIVO FÚTIL CAÇADEIRA | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | SJ200811260037063 | ||
Data do Acordão: | 11/26/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | I - Para a qualificação do crime de homicídio, o legislador português combinou um critério generalizador, determinante de um especial tipo de culpa, com a técnica dos chamados exemplos padrão. Assim, a qualificação deriva da verificação de um tipo de culpa agravado, assente numa cláusula geral extensiva e descrito com recurso a conceitos indeterminados – a «especial censurabilidade ou perversidade» do agente referida no n.º 1 do art. 132.º do CP –, verificação indiciada por circunstâncias ou elementos, uns relativos ao facto, outros ao autor, exemplarmente elencados no n.º 2. II - Elementos estes cuja constatação, por um lado, não implica sem mais a realização do tipo de culpa e a consequente qualificação; e cuja não verificação, por outro, não impede que se detectem outros elementos substancialmente análogos aos descritos e que integrem o tipo de culpa qualificador. Deste modo, deve afirmar-se que o tipo de culpa supõe a realização dos elementos constitutivos do tipo orientador, que resulta de uma imagem global do facto agravada correspondente ao especial conteúdo de culpa tido em conta no art. 132.º, n.º 2. III - A propósito da agravante qualificativa da al. d) do n.º 2 do art. 132.º do CP, ou seja, a circunstância de o agente «agir por motivo fútil», refere-se a fls. 39 do Comentário Conimbricense do Código Penal que «O exemplo padrão constante da alínea d) é, diferentemente do que sucede com os anteriores, estruturado com apelo a elementos estritamente subjectivos, relacionados com a especial motivação do agente. (…) Ser determinado a matar por qualquer motivo torpe ou fútil significa que o motivo da actuação avaliado segundo as concepções éticas e morais ancoradas na comunidade, deve ser considerado pesadamente repugnante, baixo ou gratuito, de tal modo que o facto surge como produto de um profundo desprezo pelo valor da vida humana». IV - E, mais adiante: «Dado o carácter estritamente subjectivo das situações referenciadas, dir-se-ia que elas valem imediatamente como censurabilidade ou perversidade do agente e, por conseguinte, a sua natureza de exemplo-padrão se encontra extremamente (quando não completamente) esbatida. Mas não é exacto. Ainda aqui podem existir motivações não expressamente descritas que, pela sua estrutura valorativa correspondente a uma das descritas, permitam a qualificação. Como pode, de outro lado, a situação ser uma tal que a motivação, se bem que expressa, não possa em definitivo valer como especial censurabilidade ou perversidade, maxime por se ligar a um estado de afecto particularmente intenso (v.g. o ciúme ligado à paixão)». V - Motivo fútil é o motivo de importância mínima, o motivo sem valor, insignificante para explicar ou tornar aceitável, dentro do razoável, a actuação do agente do crime. Será aquele motivo subjectivo que, pela sua insignificância ou frivolidade, é desproporcionado com a reacção homicida (cf., neste sentido, Leal Henriques e Simas Santos, in Código Penal Anotado, 1996, vol. II, pág. 44). VI - Como diz Nelson Hungria, «o motivo é fútil quando notavelmente desproporcionado ou inadequado, do ponto de vista do homo medius, e em relação ao crime de que se trata. Se o motivo torpe revela um grau particular de perversidade, o motivo fútil traduz o egoísmo intolerante, prepotente, mesquinho, que vai até à insensibilidade moral». VII - Fútil será, portanto, aquele motivo que se apresenta com razão subjectiva desproporcionada relativamente à gravidade da infracção penal ou «o motivo frívolo, leviano, a ninharia que leva o agente à prática do crime, na inteira desproporção entre o motivo e a reacção homicida» (cf. Ac. deste STJ de 15-12-2005, Proc. n.º 05P2978). VIII - Vindo provado, para além do mais, que: - por questões relacionadas com ciúmes e por desconfiar que a mulher andava metida com um indivíduo de nome P, o arguido envolveu-se em discussões com aquela (não se tendo apurado quer o número de tais discussões, quer a data (momento) a partir da qual as mesmas começaram, quer o seu grau de periodicidade); - no dia 04-09-1999, pouco antes das 21h00, na sequência de uma dessas discussões (em que o arguido voltou a acusar a sua companheira de andar com o P e que este, perante o próprio arguido, se gabava de ter dormido com ela e inclusivamente dizia que o filho que esta trazia na barriga era filho dele, P), o arguido saiu para o exterior da sua residência e, momentos depois, voltou a entrar no café G… (onde tinha permanecido toda a tarde a jogar à moeda com amigos) e, munido de uma espingarda de caça, devidamente municiada com cartuchos de calibre 12, disparou dois tiros à “queima-roupa” na direcção da parte de trás da cabeça do P, a menos de 1 metro do corpo daquele; - ao ser atingido, o P caiu imediatamente no chão, não tendo tido sequer tempo de esboçar qualquer tipo de defesa e, de seguida, o arguido novamente apontou a caçadeira, desta vez na direcção do tórax da vítima, que se encontrava caída de bruços, e disparou novamente, tendo o P falecido de imediato; é de concluir que os motivos do crime (resposta a questões de ciúme e desconfiança, sendo que os ciúmes do arguido que motivaram o crime não têm suporte fáctico na matéria assente, pois não ficou provado que entre a vítima P e a companheira do arguido tivesse havido qualquer relacionamento amoroso e/ou sexual ou mesmo de qualquer outro tipo) e a forma como aquele foi praticado (o arguido usou uma espingarda de caça contra a vítima indefesa, sem lhe ter dirigido qualquer palavra ou pedido qualquer explicação, tendo disparado por trás da vítima e na direcção da cabeça, um primeiro tiro, de forma inesperada e traiçoeira quando aquela estava ao balcão, a tomar café; e, quando a mesma já estava no chão, caída de bruços, o arguido disparou um segundo tiro na direcção do tórax da mesma, atingindo-a mortalmente com ambos os disparos) evidenciam uma personalidade intolerante do arguido e que este agiu com manifesto desprezo e absoluta falta de respeito pela vida humana, revelando tal conduta uma especial censurabilidade. IX - Os sentimentos que levaram o arguido à prática do crime são de todo desproporcionados e injustos, e a sua reacção não se compreende, nem mesmo a admitir-se que terá agido motivado por ciúmes. X - E se é certo que para haver motivo fútil para efeitos da al. c) do n.º 2 do art. 132.º do CP não basta que a reacção seja desproporcionada ao condicionalismo que a despertou, e que só o exame ponderado de todas as circunstâncias é que pode determinar se o agente actuou ou não por motivo insignificante, sem valor (cf. Ac. deste STJ de 06-03-1991, AJ n.º 17, Proc. n.º 41666), a verdade é que do exame do circunstancialismo concreto em que os factos foram praticados resulta não só que o sentimento que determinou o arguido é claramente desproporcionado relativamente à gravidade do crime que cometeu, mas também que o motivo que despertou a prática do crime não é capaz de explicar ou tornar aceitável, dentro do razoável, a actuação do arguido. XI - Estamos, pois, perante um caso em que os ciúmes – face ao circunstancialismo referido – constituem motivo fútil, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 132.º, n.º 2, al. d), do CP (cf. Teresa Serra, Homicídio Qualificado, pág. 75). XII - Por outro lado, mesmo que não se considerasse fútil a motivação do arguido, dos factos assentes resulta «que aquele manifestou personalidade torpe e perversa em toda a sua actuação, ao colocar à mão a arma de fogo, que nem lhe pertencia e que só ocasionalmente se encontrava na sua posse, ao apontar a arma em posição ofensiva contra a vítima e ao disparar, à queima-roupa e por duas vezes, tal arma contra aquele que veio a ser sua vítima mortal, a vítima PE, causando-lhe as lesões descritas no relatório da autópsia, a saber, lesões em órgãos vitais, donde decorreu a sua morte». XIII - O arguido agiu, pois, não só com manifesta superioridade em razão da arma mas também, como se disse atrás, com completa insensibilidade e absoluta indiferença e desprezo pela vida humana. XIV - As circunstâncias em que o arguido causou a morte da vítima revelam, assim, especial censurabilidade, sendo de concluir que os factos provados integram a prática de um homicídio qualificado, p. e p. pelos arts. 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, al. d), do CP, na redacção em vigor à data dos factos. | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
Na 3ª Vara Criminal de Lisboa, no processo comum nº 955/99.6SWLSB, foi submetido a julgamento perante Tribunal Colectivo, o arguido:
– AA, filho de BB e de CC, natural de Lisboa, nascido a 22/03/1971, solteiro, vendedor ambulante/trabalhador da construção civil, residente na rua da ilha do faial, pátio oliveira mota, nº ..., Pontinha, actualmente preso no estabelecimento prisional da polícia judiciária.
Era-lhe imputada a prática de:
- Um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 131 e 132º nºs 1 e 2-d), ambos do Código Penal; e - Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 275º-3 e 4 do Código Penal, com referência ao artigo 3º-1 do DL nº 207-A/75, de 17.04.
Deduziram pedido de indemnização civil contra o mesmo arguido:
- DD e mulher EE, identificados nos autos, no montante global de € 50.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora até integral pagamento.
A final, foi proferida sentença que, além do mais:
A – PARTE CRIMINAL:
Julgou provada e procedente a acusação e condenou o arguido FF: a) Como autor material e em concurso real: - pela prática, como autor material, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131º e 132º nº1 e 2 d) do C. Penal na redacção em vigor à data dos factos aprovada pelo DL 48/95, de 15.03, na pena de 16 ( dezasseis ) anos de prisão; - pela prática, como autor material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 275 nº3 e 4 do Código Penal, com referência ao art. 3º nº1 do DL 207-A/75, de 17.04, na pena de 1 ( um ) ano de prisão. b) Em cúmulo jurídico de tais penas, foi o mesmo arguido condenado na pena única de 16 ( dezasseis ) anos e 6 ( seis ) meses de prisão.
B – PARTE CÍVEL:
1 - Julgou procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelos assistentes/demandantes DD e EE, e, consequentemente: a) Condenou o arguido a pagar aos mencionados demandantes a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros desde a notificação para contestação de tal pedido ao arguido e até integral pagamento, á taxa legal de juro civil.
Inconformado com tal condenação, o arguido interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, pretendendo a revogação do acórdão condenatório e a convolação do crime para o de homicídio simples e redução da pena para 9 anos de prisão; a redução da pena do crime de detenção de arma proibida para 6 meses de prisão; e a redução da pena única para 9 anos e 3 meses de prisão. Caso assim se não entenda e se mantenha a qualificação do crime de homicídio, pede então a redução da pena para 12 anos de prisão e a redução da pena única para 12 anos e 3 meses de prisão. Não formula pedido expresso quanto à parte cível mas, resulta da respectiva motivação, pretende que o montante indemnizatório seja reduzido e fixado em € 35.000,00 (trinta e cinco mil euros).
Na respectiva motivação formula as seguintes conclusões:
1) Foi o recorrente condenado, pela 3a Vara Criminal de Lisboa, pela prática de um crime de homicídio qualificado, previsto e punível pelo disposto nos artigos 131.°, 132.° nº 1 e nº 2 al. d) do Código Penal, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 48/95 de 15 de Março, na pena de 16 anos de prisão, e ainda pela prática de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artº 275.° n.° 3 e 4 do Código Penal, por referência ao disposto no art.° 3 nº 1 do D.L. nº 207-A/75, de 17/04 na pena de 1 ano de prisão.
Na respectiva motivação, formular as conclusões seguintes:
1º Face aos factos dados como provados, o Tribunal " a quo " colocou e analisou de forma muito clara a questão jurídica e resolveu a mesma da única forma possível, ou seja, considerando que o comportamento do arguido foi determinado por motivo fútil revelador de especial perversidade e censurabilidade.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
As questões suscitadas pelo recorrente e a decidir são as seguintes:
1 – Qualificação jurídica dos factos provados: crime de homicídio qualificado (como entendeu a instância) ou crime de homicídio simples (como entende o arguido/recorrente)?
2 - Tratando-se de homicídio simples, a pena a aplicar não deveria ser superior a 9 anos de prisão?
3 - Mas, mesmo tratando-se de homicídio qualificado, a pena aplicada por este crime é excessiva pelo que deverá ser reduzida para 12 anos de prisão?
4 – E também deverá ser reduzida – para 6 meses de prisão - a pena do crime de detenção de arma proibida?
5 - Em consequência, a pena única aplicada deverá ser igualmente reduzida para 9 anos e 3 meses de prisão (no caso de se considerar que os factos integram a prática de um crime de homicídio simples) ou para 12 anos e 3 meses de prisão (no caso de se entender que o crime de homicídio é qualificado)? 6 - A indemnização fixada para os danos (não patrimoniais) é exagerada devendo, por isso, ser reduzida para € 35.000,00?
Vejamos então:
É a seguinte a matéria de facto provada:
- Que a vítima HH disse ao arguido que tinha dormido com a companheira dele, a GG, dizendo-lhe, inclusivamente, que o filho “que esta trazia na barriga” não era seu filho, mas sim dele, HH. - Que o arguido ouviu frases de terceiros tais como: “o HH é que monta bem.” Que arguido ouviu ainda um amigo da vítima dizer, quando o arguido passou junto dele com a sua companheira GG: “olha ela está grávida; cala-te; cala-te”. - Que no bairro onde o arguido morava ou no “Café Granada” que frequentava, houvesse rumores, comentários, falatórios no sentido de a GG, sua companheira na altura, ter, ter tido ou quisesse ter um relacionamento amoroso/sexual com o falecido HH. - Que o arguido encontrava-se alcoolizado nas circunstâncias de tempo, modo e lugar descritas em 5. A 8. Do elenco dos factos provados. - O momento em que passaram a ocorrer as discussões referenciadas em 4. E 6., o número ou o grau de periodicidade das mesmas. - Que o arguido tenha disparado o segundo tiro porque se assustou quando a vitima HH após ter sofrido o primeiro tiro cambaleou na sua direcção, tendo disparado a arma inadvertidamente. - Que a vítima HH após ter sido baleado pela primeira vez tenha caído para a frente e em direcção ao arguido e caído a seus pés. - Que o arguido, nas circunstâncias descritas em19. Tenha fugido juntamente com a sua então companheira GG e os seus filhos. - Que a GG tenha reatado relação com o arguido há cerca de três anos. OS FACTOS E O DIREITO:
Cumpre agora apreciar e decidir as questões suscitadas neste recurso e atrás elencadas.
1ª Questão:
No acórdão recorrido qualificaram-se os factos provados como integrando a prática de um crime de homicídio qualificado. E isto, porque se considerou que o crime foi cometido por motivo fútil e o circunstancialismo que rodeou a acção criminosa manifesta uma acrescida censurabilidade da conduta do arguido. O recorrente, porém, entende que a factualidade provada não permite fazer aquele enquadramento jurídico, não podendo considerar-se que o crime tenha sido cometido por motivo fútil.
Quid juris?
Para a qualificação do crime de homicídio, o legislador português combinou um critério generalizador, determinante de um especial tipo de culpa, com a técnica dos chamados exemplos-padrão. Assim, a qualificação deriva da verificação de um tipo de culpa agravado, assente numa cláusula geral extensiva e descrito com recurso a conceitos indeterminados: a “ especial censurabilidade ou perversidade “ do agente referida no nº1 do art. 132º do C. Penal; verificação indiciada por circunstâncias ou elementos uns relativos ao facto, outros ao autor, exemplarmente elencados no nº 2. Elementos estes cuja verificação, por um lado, não implica sem mais a realização do tipo de culpa e a consequente qualificação; e cuja não verificação, por outro lado, não impede que se verifiquem outros elementos substancialmente análogos aos descritos e que integrem o tipo de culpa qualificador. Deste modo, devendo afirmar-se que o tipo de culpa supõe a realização dos elementos constitutivos do tipo orientador – que resulta de uma imagem global do facto agravada correspondente ao especial conteúdo de culpa tido em conta no art. 132º nº2 – neste sentido, Prof. Figueiredo Dias, pag. 26. Segundo defende o mesmo autor, in ob. cit., pag. 27, «muitos dos elementos constantes das diversas alíneas do art. 132º nº 2, em si mesmos tomados, não contendem directamente com uma atitude mais desvaliosa do agente, mas sim com um mais acentuado desvalor da acção e da conduta, com a forma de cometimento do crime. Ainda nestes casos, porém, não é esse maior desvalor da conduta o determinante da agravação, antes ele é mediado sempre por um mais acentuado desvalor da atitude: a especial censurabilidade ou perversidade do agente, é dizer, o especial tipo de culpa do homicídio agravado. Só assim se podendo compreender e aceitar que haja hipóteses em que aqueles elementos estão presentes e, todavia, a qualificação vem em definitivo a ser negada». E, a fls. 29, «o pensamento da lei é, na verdade, o de pretender imputar à “ especial censurabilidade “ aquelas condutas em que o especial juízo de culpa se fundamenta na refracção, ao nível da atitude do agente, de formas de realização do facto especialmente desvaliosas, e à “ perversidade “ aquelas em que o especial juízo de culpa se fundamenta directamente na documentação no facto de qualidades da personalidade do agente especialmente desvaliosas». Assim, as circunstâncias agravantes qualificativas do artigo 132º do Código Penal, sendo, como são, elementos da culpa (e não do tipo legal de crime), não são de funcionamento automático (cfr. neste sentido também Teresa Serra in Homicídio Qualificado Tipo de Culpa e Medida da Pena, 1990, pág.60), pelo que pode verificar-se qualquer delas e, apesar disso, concluir-se que o agente não agiu com especial censurabilidade ou perversidade (neste sentido, cfr. Ac. STJ de 20.03.1985, BMJ 345, 248). Portanto, uma vez que aquelas circunstâncias não operam automaticamente, é indispensável determinar se, no caso concreto, qualquer daquelas circunstâncias (que se verifique) preenche ou não o elemento qualificante da especial censurabilidade ou perversidade e justificam uma sanção que não cabe na moldura incriminadora do homicídio simples (cfr. Acs. STJ de 04.07.1996 in CJ Acs. STJ, IV, Tomo 2, pág. 222; e de 11.12.1997, BMJ 472, 154). Importa, portanto, determinar se, no caso em apreço, a morte foi causada em circunstâncias que revelam especial censurabilidade ou perversidade nos termos referidos no artigo 132º do CP. O tribunal de 1ª instância concluiu que sim pois considerou que a factualidade provada integra a qualificativa da alínea d) do nº 2 do citado artigo 132º do Código Penal, ou seja, a circunstância de o agente “agir por motivo fútil”. A propósito desta circunstância agravante qualificativa, refere-se a fls. 39 do Comentário Conimbricense do Código Penal que “O exemplo padrão constante da alínea d) é, diferentemente do que sucede com os anteriores, estruturado com apelo a elementos estritamente subjectivos, relacionados com a especial motivação do agente. … Ser determinado a matar por qualquer motivo torpe ou fútil significa que o motivo da actuação avaliado segundo as concepções éticas e morais ancoradas na comunidade, deve ser considerado pesadamente repugnante, baixo ou gratuito, de tal modo que o facto surge como produto de um profundo desprezo pelo valor da vida humana”. E, mais adiante: “Dado o carácter estritamente subjectivo das situações referenciadas, dir-se-ia que elas valem imediatamente como censurabilidade ou perversidade do agente e, por conseguinte, a sua natureza de exmplo-padrão se encontra extremamente (quando não completamente) esbatida. Mas não é exacto. Ainda aqui podem existir motivações não expressamente descritas que, pela sua estrutura valorativa correspondente a uma das descritas, permitam a qualificação. Como pode, de outro lado, a situação ser uma tal que a motivação, se bem que expressa, não possa em definitivo valer como especial censurabilidade ou perversidade, maxime por se ligar a um estado de afecto particularmente intenso (v.g. o ciúme ligado à paixão)”. Motivo fútil é o motivo de importância mínima, o motivo sem valor, insignificante para explicar ou tornar aceitável, dentro do razoável, a actuação do agente do crime. Motivo fútil será aquele motivo subjectivo que pela sua insignificância ou frivolidade, é desproporcionado com a reacção homicida (neste sentido, cfr. Leal Henriques e Simas Santos in Código Penal Anotado, 1996, II volume, pág 44). Como diz Nelson Hungria, pág. 164 “o motivo é fútil quando notavelmente desproporcionado ou inadequado, do ponto de vista do homo medius, e em relação ao crime de que se trata. Se o motivo torpe revela um grau particular de perversidade, o motivo fútil traduz o egoísmo intolerante, prepotente, mesquinho, que vai até à insensibilidade moral”. No mesmo sentido, refere Bettiol in Direito Penal, Parte Geral, III, ed. port., 131 e segs: “Se por motivo entendermos o antecedente psíquico da acção, teremos um motivo fútil sempre que seja possível estabelecer uma desproporção manifesta entre a gravidade do facto e a intensidade ou a natureza do motivo que impeliu à acção. Trata-se, como diz Maggiore, de uma insensibilidade moral que tem a sua manifestação mais alta na brutal malvadez” Fútil será, portanto, aquele motivo que se apresenta com razão subjectiva desproporcionada com a gravidade da infracção penal ou “o motivo frívolo, leviano, a ninharia que leva o agente à prática do crime, na inteira desproporção entre o motivo e a reacção homicida” (cfr. ac. deste STJ de 15.12.2005, in Proc. 05P2978).
Quanto a este aspecto, está provado, designadamente, que “O arguido actuou com intenção de matar o ofendido, o que logrou conseguir, demonstrando manifesto desprezo e desrespeito pela vida humana, atendendo ao motivo que o levou a praticar tal acto, motivo esse referenciado em 4 e 6” (cfr. nº 32 dos factos provados). E está ainda provado que por questões relacionadas com ciúmes e por desconfiar que a mulher andava metida com um indivíduo de nome HH, o arguido envolveu-se em discussões com sua mulher. No entanto, não se apurou quer o número de tais discussões, quer a data (momento) a partir da qual tais discussões começaram, quer o grau de periodicidade das mesmas. E provado ficou ainda que, no dia 4 de Setembro de 1999, pouco antes das 21 hora, na sequência de uma daquela discussões (em que o arguido voltou a acusar a sua companheira de andar com o HH e que este, perante o próprio arguido, se gabava de ter dormido com ela e inclusivamente dizia que o filho que esta trazia na barriga era filho dele, HH), o arguido saiu para o exterior da sua residência e, momentos depois, voltou a entrar no café “Granada” (onde tinha permanecido toda a parte a jogar à moeda com amigos) e munido duma espingarda de caça, devidamente municiada com cartuchos de calibre 12, disparou dois tiros à “queima roupa” na direcção da parte de trás da cabeça do HH, a menos de 1 metro do corpo daquele. Também está assente que ao ser atingido, o HH caiu imediatamente no chão, não tendo tido sequer tempo de esboçar qualquer tipo de defesa e, de seguida, o arguido novamente apontou a caçadeira, desta vez na direcção do tórax da vítima que se encontrava caído de bruços, e disparou novamente, tendo o HH falecido de imediato. Face a esta matéria de facto provada, sobretudo os motivos do crime (resposta a questões de ciúme e desconfiança), e a forma como aquele foi praticado (o arguido usou uma espingarda de caça contra a vítima indefesa, sem lhe ter dirigido qualquer palavra ou pedido qualquer explicação, tendo disparado por trás da vítima e na direcção da cabeça, um primeiro tiro, de forma inesperada e traiçoeira quando aquela estava ao balcão, a tomar café; e, quando a mesma já estava no chão, caída de bruços, o arguido disparou um segundo tiro na direcção do tórax da mesma, atingindo-a mortalmente com ambos os disparos) revelam uma personalidade intolerante do arguido e que este agiu com manifesto desprezo e absoluta falta de respeito pela vida humana, revelando tal conduta, uma especial censurabilidade. 3ª, 4ª e 5ª questões:
Trataremos estas questões de forma conjunta na medida em que se reportam ao mesmo segmento do recurso: a medida concreta das penas parcelares e da pena única. Equacionámos assim tais questões:
3 - Mas, mesmo tratando-se de homicídio qualificado, a pena aplicada por este crime é excessiva pelo que deverá ser reduzida para 12 anos de prisão? 4 – E também deverá ser reduzida – para 6 meses de prisão - a pena do crime de detenção de arma proibida? 5 - Em consequência, a pena única aplicada deverá ser igualmente reduzida para 9 anos e 3 meses de prisão (no caso de se considerar que os factos integram a prática de um crime de homicídio simples) ou para 12 anos e 3 meses de prisão (no caso de se entender que o crime de homicídio é qualificado)?
Vejamos:
Assente a qualificação jurídica dos factos provados como integrando a prática de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 131 e 132º nºs 1 e 2-d), ambos do Código Penal (redacção vigente à data dos factos) e um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 275º-3 e 4 do Código Penal, com referência ao artigo 3º-1 do DL nº 207-A/75, de 17.04, há que apreciar a medida da(s) pena(s). Não é questionada a aplicação do regime penal vigente à data da prática dos factos, nem a opção feita pela aplicação de pena privativa de liberdade. O crime de homicídio supra referido é punível, em abstracto, com pena de prisão de 12 a 25 anos. Quanto a este crime foi aplicada a pena concreta de 16 anos de prisão. E o crime de detenção de arma proibida, supra mencionado, é punível, também abstractamente, com pena de prisão até 3 anos (face á opção de aplicação de pena privativa de liberdade). E tal crime foi punido, no caso em análise, com a pena concreta de 1 ano de prisão. Vejamos, então. Actualmente, todos estão de acordo em que é susceptível de revista a correcção do procedimento ou das operações de determinação, o desconhecimento pelo tribunal ou a errónea aplicação dos princípios gerais de determinação, a falta de indicação de factores relevantes para aquela ou, pelo contrário, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis. Porém, há quem defenda que a valoração judicial das questões de justiça ou de oportunidade, estariam subtraídas ao controlo do tribunal de revista. Outros ainda, distinguem: a questão do limite ou da moldura da culpa, estaria plenamente sujeita a revista, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção. Mas a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum de pena, o recurso de revista seria inadequado. Só assim não será – e aquela medida será controlável mesmo em revista, se, p.ex, tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada (cfr. Figueiredo Dias in Direito Penal Português – As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 278, pág.211; e Ac. deste STJ, 3ª Secção, in Proc. 2555/06). Nos termos do artigo 71º nº 1 do Código Penal, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. Toda a pena tem, como suporte axiológico-normativo uma culpa concreta. Daí que não haja pena sem culpa - nulla poena sine culpa. Mas, por outro lado, a culpa constitui também o limite máximo da pena – (cfr. Ac STJ de 26.10.00 in Proc. 2528/00, desta 3ª Secção: “a culpa jurídico-penal traduz-se num juízo de censura que funciona, a um tempo, como um fundamento e um limite inultrapassável da medida da pena”). Isto mesmo resulta claro do estatuído no artigo 40º-2 do C.P.: em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa. Além disso, como se disse, há que atentar nas exigências de prevenção, quer geral, quer especial. “Com o recurso à prevenção geral busca-se dar satisfação aos anseios comunitários da punição do caso concreto, tendo em atenção de igual modo a necessidade premente da tutela dos bens e valores jurídicos. Com o apelo à prevenção especial aspira-se em conceder resposta às exigências da socialização (ou ressocialização) do agente delitivo em ordem a uma sua integração digna no meio social” (Cfr. Ac. desta 3ª Secção deste Supremo Tribunal, de 26.10.00, in processo nº 2528/00). Citando Figueiredo Dias (obra supra citada, pág. 214) “ … a culpa e prevenção são, assim, os dois termos do binómio com auxílio do qual há-de ser construído o modelo da medida da pena”. E, mais adiante (pág. 215) “ …a exigência legal de que a medida da pena seja encontrada pelo juiz em função da culpa e da prevenção é absolutamente compreensível e justificável. Através do requisito de que sejam levadas em conta as exigências de prevenção, dá-se lugar à necessidade comunitária da punição do caso concreto e, consequentemente, à realização in casu das finalidades da pena. Através do requisito de que seja tomada em consideração a culpa do agente, dá-se tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime – ligada ao mandamento incondicional de respeito pela eminente dignidade da pessoa do agente – limita de forma inultrapassável as exigências de prevenção …”. A este respeito, é pertinente citar aqui o acórdão do STJ de 1/03/00, in processo nº 53/2000, desta 3ª Secção “ … a culpa, salvaguarda da dignidade humana do agente, não sendo o fundamento último da pena, define, em concreto, os seus limite mínimo e máximo absolutamente intransponível, por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que se façam sentir. A prevenção especial positiva, porém, subordinada que está à finalidade da protecção dos bens jurídicos, já não tem virtualidade para determinar o limite mínimo, este logicamente não pode ser outro que não o mínimo da pena que, em concreto, ainda realiza, eficazmente, aquela protecção … se, por um lado, a prevenção geral positiva é a finalidade primordial da pena e, se, por outro, esta nunca pode ultrapassar a medida da culpa, então parece evidente que – dentro, claro está, da moldura legal – a moldura da pena legal aplicável ao caso concreto (moldura de prevenção) há-de definir-se entre o mínimo imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias e o máximo que a culpa do agente consente; entre tais limites, encontra-se o espaço possível de resposta às necessidades da sua reintegração social …”.
Por seu turno, estatui o nº 2 do mesmo artigo 71º do CP que na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente, o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; a intensidade do dolo ou da negligência; os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; as condições pessoais do agente e a sua situação económica; a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando seja destinada a reparar as consequências do crime; a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
Importa ter em atenção a moldura penal correspondente aos crimes praticados pelo arguido/recorrente (tendo-se em atenção, por um lado, a opção feita na decisão recorrida e que não é posta em causa no recurso, de aplicação de pena privativa de liberdade; e, por outro lado, que não foi suscitada qualquer questão relativa à aplicação da lei no tempo, aspecto esse devidamente referido na decisão da 1ª instância e que não nos merece reparo): - 1 crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131º e 132º-1 e 2-d), do C.P. na redacção então vigente: pena de prisão de 12 a 25 anos; e - 1 crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 275º-3 e 4 do Código Penal, com referência ao artigo 3º-1 do DL nº 207-A/75, de 17.04: pena de prisão até 3 anos.
Por outro lado, importa também ter presente que, quanto à medida das penas parcelares, a decisão recorrida refere expressamente:
Quanto ao crime de detenção de arma proibida: “…O tribunal, pelos motivos gerais referenciados supra, fundamenta também a pena encontrada para este crime. A isto acrescentaremos que há ainda que ter em atenção que as razões de prevenção geral são acentuadas, dada a frequência com que no nosso País vêm sendo praticados crimes com utilização de armas de fogo.
Ponderando, pois, tudo quanto se deixou dito – designadamente a culpa do arguido, as exigências de prevenção especial e geral, as necessidades de ressocialização do arguido, a elevada ilicitude dos factos sobretudo por causa do modo de execução dos mesmos, a gravidade das suas consequências, a intensidade do dolo (directo), os motivos que determinaram a prática do crime, as respectivas molduras penais abstractas, a personalidade do arguido manifestada nos factos, as suas condições pessoais e económicas, a ausência de antecedentes criminais e a reputação (no círculo de amigos) de pessoa não violente – consideram-se adequadas e justas as penas parcelares aplicadas, sendo ainda de ter em conta que a pena aplicada e relativa ao crime de homicídio qualificado (16 anos) fica mais próxima do limite mínimo (12 anos) do que do limite máximo (25 anos). Por isso se mantêm as penas parcelares.
Relativamente á pena a fixar em cúmulo jurídico, há que ter em conta, no seu conjunto, os factos e a personalidade do agente, sendo que a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos dois crimes (no caso, 17 anos de prisão) e, como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos dois referidos crimes (no caso, 16 anos de prisão) – cfr. artigo 77º-2 do CP. Ora, observando os critérios estabelecidos nos artigos 77º e 78º do Código Penal e ponderando os factos (provados) e a personalidade do arguido, julga-se adequada e justa, a pena única aplicada de 16 anos e 6 meses de prisão que, por isso, se mantém.
Assim, também neste segmento, o recurso improcede.
6ª questão:
A indemnização fixada para os danos (não patrimoniais) é exagerada devendo, por isso, ser reduzida para € 35.000,00?
A vida é um bem que não tem preço. É o bem supremo, o mais valioso. É passível de reparação ou compensação pecuniária – cfr. artigo 496º-3, 2ª parte, do Código Civil. Como dizem Pires de Lima e Antunes Varela, (CC Anot., Vol. I, 2ª Ed., pág. 435) “o montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado...segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização, às flutuações do valor da moeda, etc.. E deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida.” Também Leite de Campos (A Indemnização do Dano da Morte, pág. 12) ensina que nos danos não patrimoniais “a grandeza do dano só é susceptível de determinação indiciária fundada em critérios de normalidade. É insusceptível de determinação exacta, por o padrão ser constituído por algo qualitativo diverso como é o dinheiro, meio da sua compensação. Aqui, mais do que nunca, nos encontramos na incerteza, inerente a um imprescindível juízo de equidade.” Sem se cair em exageros, a indemnização, como refere certa jurisprudência, “deve ter um alcance significativo e não meramente simbólico” impondo-se que a jurisprudência caminhe seguramente para indemnizações não miserabilistas. Decorre da matéria de facto assente que a morte do HH deixou nos assistentes, seus pais, um profundo vazio, dor e angústia, pois era filho único, ainda solteiro e com eles convivente. Pelo exposto, o recurso improcede também nesta parte.
DECISÃO:
Nos termos expostos acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas (parte criminal e parte cível) pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 Ucs.
Lisboa, 26 de Novembro de 2008 Fernando Fróis (Relator) Henriques Gaspar
|