Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | SANTOS CARVALHO | ||
Descritores: | MEDIDA DA PENA MEDIDA CONCRETA DA PENA PREVENÇÃO GERAL PREVENÇÃO ESPECIAL CULPA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA | ||
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Nº do Documento: | SJ20060628020425 | ||
Data do Acordão: | 06/28/2006 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROVIDO PARCIALMENTE | ||
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Sumário : | I - Na graduação da pena deve olhar-se para as funções de prevenção geral e especial das penas, mas sem se perder de vista a culpa do agente. II - Numa concepção moderna, a finalidade essencial e primordial da aplicação da pena reside na prevenção geral, o que significa “que a pena deve ser medida basicamente de acordo com a necessidade de tutela de bens jurídicos que se exprime no caso concreto…alcançando-se mediante a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada…” (Anabela Miranda Rodrigues, “A determinação da medida da pena privativa de liberdade”, Coimbra Editora, pág. 570). III - “É, pois, o próprio conceito de prevenção geral de que se parte que justifica que se fale aqui de uma «moldura» de pena. Esta terá certamente um limite definido pela medida de pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas: o limite máximo da pena, que constituirá, do mesmo passo, o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade. Mas, abaixo desta medida de pena, outras haverá que a comunidade entende que são ainda suficientes para proteger as suas expectativas na validade das normas - até ao que considere que é o limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas. Aqui residirá o limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral; definido, pois, em concreto, pelo absolutamente imprescindível para se realizar essa finalidade de prevenção geral e que pode entender-se sob a forma de defesa da ordem jurídica (mesma obra, pág. seguinte). IV - A prevenção especial, por seu lado, é encarada como a necessidade de socialização do agente, embora no sentido, modesto mas realista, de o preparar para no futuro não cometer outros crimes. V - Resta acrescentar que, também aqui, é chamada a intervir a culpa a desempenhar o papel de limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas…” (ainda a mesma obra, pág. 575). “Sendo a pena efectivamente medida pela prevenção geral, ela deve respeitar o limite da culpa e, assim, preservar a dignidade humana do condenado” (pág. 558). VI - O art. 50.º do CP consagra um poder-dever, ou seja, um poder vinculado do julgador, no sentido em que ele terá que decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização das finalidades de punição, sempre que se verifiquem os necessários pressupostos. VII - Na suspensão da execução da pena é necessário que o julgador, reportando-se ao momento da decisão e não ao da prática do crime, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de que a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição. VIII - Na suspensão da execução da pena o tribunal deve correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem dúvidas sobre a capacidade do réu para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa. 28-06-2006 Proc. n.º 2042/06 - 5.ª Secção Santos Carvalho (relator) ** Costa Mortágua Rodrigues da Costa Arménio Sottomayor | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. AA foi julgado na 2ª Vara de Competência Mista de Loures, acusado de um crime de tráfico de estupefacientes p.p. pelo art.º 21.º, n.º 1 do Dec.-Lei nº. 15/93 de 22 de Janeiro, e veio a ser condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade p.p. pelo art.º 25.º, al. a), do mesmo diploma, na pena de 3 (três) anos de prisão 2. Inconformado, recorre para este Supremo Tribunal de Justiça e, da sua motivação, extrai as seguintes conclusões: 1. O recorrente foi condenado na pena de 3 anos de prisão pela prática do crime previsto e punido pelo art.º 25º al. a) por referência ao art.º 21º, n.º 1 ambos do DL 15/93 de 22/01; 2. O tribunal “a quo” entendeu não ser de suspender a execução da pena quando em nosso entender, e salvo o devido respeito, deveria a pena ser suspensa na sua execução; 3. O tribunal “a quo” deu como provado designadamente os factos enumerados nos art.º 2 e 3 da motivação de recurso. 4. O ponto da nossa discórdia prende-se apenas com a medida concreta da pena, pois cremos que face aos factos apreciados na sua globalidade e ao comportamento do arguido no processo e na sua vida ser de aplicar uma pena até dois anos e suspensa na sua execução por 4 anos. 5. Tendo em atenção a quantidade de droga apreendida, o facto de se tratar de um actividade ocasional, que não constitui modo de vida do recorrente, de ter cinco filhos menores e de não ter antecedentes criminais; 6. Por outro lado, tendo em conta a atitude colaborante do arguido na descoberta da verdade ser positivo e benéfico o juízo de prognose em relação à sua conduta futura; 7. Parece que a simples ameaça da pena é suficiente para o levar a trilhar apenas caminhos da licitude, devendo nós apostar numa suspensão da pena por um período longo; 8. A pena ajustada é a de 2 anos de prisão e suspensa na sua execução por 4 anos, acompanhada da proibição de frequentar lugares onde se trafica droga, já que estamos perante um caso de ocasionalidade delituosa, com quantidades de droga pequena e porque o recorrente confessou e não tem antecedentes criminais e tem cinco filhos menores que dele precisam; 9. Face à pequena quantidade de droga, ao carácter ocasional dos actos, dar-lhe uma oportunidade de voltar a trilhar caminhos de ilicitude é a melhor solução em termos de politica criminal; 10. Aliás, a linha de orientação dogmática e jurisprudencial que o recorrente seguiu foi a dos Ac. cuja cópia se junta, nos quais se suspendeu a execução da pena (Doc. 1 e 2); 11. O tribunal “a quo” violou a norma do art.º 50º do C.Penal, normas que o tribunal “a quo” interpretou no sentido de não suspender a execução da pena quando deveria ter interpretado no sentido de suspender a execução da pena. NESTES TERMOS, deve ser dado provimento ao recurso, revogado o acórdão recorrido, e condenado o recorrente em pena não superior a 2 anos de prisão e suspensa na sua execução. 3. O Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu ao recurso e concluiu pelo seu não provimento. 4. Colhidos os vistos e realizada a audiência com o formalismo legal, cumpre decidir. As principais questões são as seguintes: 1ª- Deve a pena ser fixada em dois anos de prisão? 2ª- Deve ser suspensa na sua execução? Os factos provados são os seguintes: 1. Desde pelo menos o mês de Maio de 2005 e até ao dia 7 de Julho de 2005, o arguido dedicou-se à venda de heroína e cocaína a consumidores dessas substâncias, obtendo nessa actividade a maior parte dos rendimentos de que necessitava para a sua subsistência, não exercendo qualquer outra actividade laboral de forma regular. 2. O arguido procedeu à venda dos sobreditos produtos em vários dias no Catujal, deslocando-se para o efeito no seu veículo automóvel de matrícula 00-00-00, levando consigo várias doses individuais de cocaína e heroína que aí vendia ao preço de € 5 cada. 3. No dia 7 de Julho de 2005, pelas 12h35, o arguido deslocou-se ao Catujal no seu veículo automóvel de matrícula 00-00-00, levando nessa altura consigo 29 pequenas embalagens contendo heroína que, no conjunto, tinham o peso líquido de 4,832 gramas e 16 pequenas embalagens contendo cocaína que, no conjunto, tinham o peso líquido de 3,411 gramas, destinando tais produtos para venda a terceiros. 4. O arguido detinha, ainda, em seu poder, naquele dia, a quantia de € 275 em notas do Banco Central Europeu, que obtivera através da venda de cocaína e heroína, bem como os telemóveis Nokia 6310 IMEI 300000000, com o cartão 96 000000 e Nokia 1100 IMEI 30000000000, com o cartão 96 00000000. 5. Naquele mesmo dia, foram apreendidos ao arguido os seguintes objectos que se encontravam no interior do seu veículo: - um televisor Worten; - um auto-rádio Sony com leitor de Mini Disc e respectivo comando; - um subwoofer Infinity; - uma caixa de CD’s Sony; - um pré-amplificador Sony Explod; - um amplificador Alpine; - quatro altifalantes Kenwood. 6. Posteriormente, foram apreendidos os seguintes objectos que se encontravam no interior da residência do arguido: - um telemóvel Nokia 3210, IMEI 449142204125271; - um telemóvel Samsung SGH-R219S, IMEI 350736268671042; - um telemóvel Alcatel , IMEI 332157538666550; - 14 relógios de pulso da marca TMN; - uma caixa de CD’s Sony CDX-434RF (nº. de série 1563413); - uma caixa de CD’s Sony CDX-616 (nº. de série 1545652); - uma caixa de CD’s Panasonic CX-DP600EN (nº. de série 10185); - um auto-rádio BestBuy (nº. de série 03040672); - um auto-rádio Sony XR-C4100 (nº. de série 530158); - um painel frontal de auto-rádio Sony XR-5890R; - uma televisão portátil Denver DFT-506, com comando e cabo de ligação ao isqueiro; - uma máquina fotográfica Canon EOS-500; - uma televisão portátil Brigmton BMT-52-TFT (nº. de série 42005200390); - um scanner Scanjet M451 (nº. de série ITC6015019). 7. O arguido tinha perfeito conhecimento da natureza e características dos sobreditos produtos que detinha e vendia, designadamente a sua natureza estupefaciente, bem sabendo que a sua detenção e venda a terceiros eram proibidas, mas, não obstante, quis agir da forma como agiu. 8. Sabia, ainda, o arguido que a sua conduta era proibida e punida por lei. Mais se apurou que: - O arguido, de 37 anos de idade, é solteiro e tem como habilitações o 8º ano de escolaridade. Trabalhou na área da construção civil e participou num curso de aperfeiçoamento de encarregados da construção civil e obras públicas que decorreu de 18/10/93 a 18/04/94. Frequentou, ainda, um curso de técnicas de cozinha e pastelaria do Fundo Social Europeu de 23/05/2002 a 31/12/2002, seguido de estágio remunerado em várias unidades hoteleiras com a duração de um ano e meio aproximadamente. Durante algum tempo e com carácter transitório, o arguido explorou uma oficina de reparação de viaturas situada num espaço contíguo à sua habitação, fazendo alguns biscates. À data dos factos, o arguido encontrava-se desempregado desde há cerca de 2 anos, sendo que procedia de vez em quando à comercialização de peças de automóveis, que eram compradas em Portugal e vendidas em S. Tomé e Príncipe. Antes de ter sido detido, vivia com uma companheira e 2 filhos menores e ainda um primo e um irmão do arguido. Tem ainda outros três filhos menores, frutos de relacionamentos anteriores, que vivem em Portugal com as respectivas mães. O arguido tem autorização de residência em Portugal que, entretanto, caducou. No Estabelecimento Prisional frequentou um curso de informática na óptica do utilizador, com assiduidade e sucesso, faltando-lhe realizar o exame final. O arguido não tem antecedentes criminais. Encontra-se preso preventivamente desde 7/07/2005, à ordem dos presentes autos. MEDIDA DA PENA E PENA DE SUBSTITUIÇÃO (SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO): Quanto à medida da pena, vem este Supremo Tribunal de Justiça considerando que é susceptível de revista a correcção das operações de determinação ou do procedimento, a indicação de factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, a falta de indicação de factores relevantes, o desconhecimento pelo tribunal ou a errada aplicação dos princípios gerais de determinação, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, para controlo do qual o recurso de revista seria inadequado, salvo perante a violação das regras da experiência ou a desproporção da quantificação efectuada. Ora, na graduação da pena deve olhar-se para as funções de prevenção geral e especial das penas, mas sem se perder de vista a culpa do agente. Numa concepção moderna, a finalidade essencial e primordial da aplicação da pena reside na prevenção geral, o que significa “que a pena deve ser medida basicamente de acordo com a necessidade de tutela de bens jurídicos que se exprime no caso concreto...alcançando-se mediante a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada...” (Anabela Miranda Rodrigues, “A Determinação da Medida da Pena Privativa de Liberdade”, Coimbra Editora, pág. 570). “É, pois, o próprio conceito de prevenção geral de que se parte que justifica que se fale aqui de uma «moldura» de pena. Esta terá certamente um limite definido pela medida de pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas: o limite máximo da pena. Que constituirá, do mesmo passo, o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade. Mas, abaixo desta medida de pena, outras haverá que a comunidade entende que são ainda suficientes para proteger as suas expectativas na validade das normas - até ao que considere que é o limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas. Aqui residirá o limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral; definido, pois, em concreto, pelo absolutamente imprescindível para se realizar essa finalidade de prevenção geral e que pode entender-se sob a forma de defesa da ordem jurídica (mesma obra, pág. seguinte). A prevenção especial, por seu lado, é encarada como a necessidade de socialização do agente, embora no sentido, modesto mas realista, de o preparar para no futuro não cometer outros crimes. “Resta acrescentar que, também aqui, é chamada a intervir a culpa a desempenhar o papel de limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas...” (ainda a mesma obra, pág. 575). “Sendo a pena efectivamente medida pela prevenção geral, ela deve respeitar o limite da culpa e, assim, preservar a dignidade humana do condenado” (pág. 558). O Código Penal espelhou estas preocupações nos artigos 70º e 71º. Dá-se preferência às penas não privativas da liberdade, mas tal tem de ser feito de uma forma fundamentada, pois há que apurar criteriosamente se a pena não detentiva realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (art.º 70º). E «1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. 2. Na determinação da pena, o tribunal atenderá a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente: a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; b) A intensidade do dolo ou da negligência; c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica; e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena» (art.º 71º, n.ºs 1 e 2, do CP). Ora, o tribunal recorrido discorreu assim sobre a medida da pena: “Na escolha e determinação da medida concreta da pena a aplicar ao arguido, atender-se-á à culpa do agente, às exigências de prevenção e de reprovação do crime e ainda às seguintes circunstâncias: - ao acentuado grau de ilicitude do facto, traduzido na quantidade de produto estupefaciente que o arguido transportava na sua viatura e na natureza do mesmo, pois tratava-se de heroína e cocaína, que se integram no grupo das chamadas “drogas duras”; - à intensidade do dolo, que é directo; - ao período temporal durante o qual o arguido se dedicou a esta actividade; - à ausência de antecedentes criminais do arguido; - às circunstâncias da sua vida pessoal; - à confissão quase integral dos factos por parte do arguido; - à verdadeira praga que constitui para a nossa sociedade o problema do tráfico e do consumo de estupefacientes, quer pelo factor destrutivo que acarreta para quem dela depende, quer pelo facto de grande número dos crimes perpetrados, nomeadamente contra o património e contra as pessoas (roubos), terem na sua génese a necessidade de conseguir obter os necessários proventos à aquisição da dose diária; - à necessidade de se fazer sentir ao arguido o desvalor dos seus actos e de responsabilizá-lo pelas consequências dos mesmos. Em face das circunstâncias atrás descritas, entendemos que, atenta a culpa do agente, bem como os fins de prevenção geral e especial, as finalidades da punição só serão alcançadas pela imposição ao arguido de uma pena privativa da liberdade, por através desta mais eficazmente se alcançar o escopo de lhe fazer sentir o profundo desvalor dos seus actos e a censura social que sobre os mesmos recai, dissuadindo-o, ainda, de repetir a prática de actos de natureza semelhante. Apesar do arguido não ter antecedentes criminais, entendeu este Tribunal ser de optar por uma pena de prisão efectiva, por entender que a suspensão da execução da pena, neste caso, não realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Assim, tudo ponderado, tem-se por justo e adequado às exigências de reprovação e de prevenção de futuros crimes, a aplicação ao arguido de uma pena de prisão efectiva ligeiramente superior ao meio da moldura penal. Não censuramos a escolha de uma pena efectiva de prisão e a opção que se tomou pela não suspensão da execução da pena. Na verdade, dispõe o art.º 50.°, n.º 1, do Cód. Penal: "O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 3 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida; à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição". Este preceito consagra agora um poder-dever, ou seja um poder vinculado do julgador, que terá que decretar a suspensão da execução da pena, na modalidade que se afigurar mais conveniente para a realização daquelas finalidades, sempre que se verifiquem os necessários pressupostos (Maia Gonçalves, Código Penal Anotado, 14ª edição, pág. 191). Sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, o juiz tem o dever de suspender a execução da pena: esta é uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico (Ac. do STJ, de 27 de Junho de 1996; in CJ, Acs do STJ, IV, tomo 2, 204). Para este efeito, é necessário que o julgador, reportando-se ao momento da decisão e não ao da prática do crime, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de que a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição (Ac. do STJ, de 11/05/1995, in proc. n.º 4777/3ª). Este juízo de prognose favorável ao comportamento futuro do arguido pode assentar numa expectativa razoável de que a simples ameaça da pena de prisão será suficiente para realizar as finalidades da punição e consequentemente a ressocialização (em liberdade) do arguido (acórdãos do STJ, de 17/09/1997, in proc. n.º 423/97 da 3ª Secção e de 29/03/2001, in proc. n.º 261/01 da 5ª Secção). Ou dito de outro modo: a suspensão da execução da pena "deverá ter na sua base uma prognose social favorável ao réu, a esperança de que o réu sentirá a sua condenação como uma advertência e que não cometerá no futuro nenhum crime" (Acórdão do STJ, proc. n.º 1092/01 – 5ª secção). "O tribunal deverá correr um risco prudente, uma vez que esperança não é seguramente certeza, mas se tem dúvidas sobre a capacidade do réu para compreender a oportunidade de ressocialização que lhe é oferecida, a prognose deve ser negativa" (Leal-Henriques e Simas Santos, Código Penal, em anotação ao art.º 50°, citado no acórdão supra referido e com sublinhados nossos). No caso vertente verifica-se que não é possível fazer ainda um juízo de prognose favorável, pois não está feita prova de que o arguido tem trabalho assegurado e de que obterá autorização de residência. Note-se que o arguido estava desempregado há quase 2 anos antes de preso e terá sido essa circunstância e a necessidade de sustentar a numerosa prole de cinco filhos (de mais duma mulher) que o terá levado à conduta criminosa. Mesmo o curso de informática que está a fazer no estabelecimento prisional não estará ainda concluído, pois ainda faltava o exame final. Por isso, entende-se que não é de suspender a execução da pena, tanto mais que no crime de tráfico de estupefacientes há uma forte exigência de prevenção geral, que não se compadece com sanções aligeiradas e sem um forte apoio nos factos relativos ao grau de culpa, personalidade e modo de vida do arguido. Mas, sendo o arguido delinquente primário, já tendo trabalhado anteriormente, ainda que de forma ocasional, estando em prisão preventiva à ordem destes autos desde 7/7/2005, deve ser punido com uma pena mais curta do que a fixada na 1ª instância, que permita, se for caso disso, uma rápida concessão da liberdade condicional, a qual, como sabemos, é antecedida de um estudo actualizado do IRS e permite ao juiz de execução uma ponderação criteriosa, nomeadamente, sobre as regras e deveres que a acompanham. Termos em que o recurso merece provimento parcial, fixando-se a pena em dois anos de prisão, como pede o recorrente, mas não suspensa. 5. Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em reduzir a pena pelo crime de tráfico de menor gravidade a dois anos de prisão. Fixam-se em 3 UC a taxa de justiça a cargo do recorrente, com metade de procuradoria (art.ºs 87.º, n.º 1-a e 95.º, n.º 1, do CCJ), pelo decaimento parcial. Notifique. Supremo Tribunal de Justiça, 28 de Junho de 2006 Santos Carvalho (relator) Costa Mortágua Rodrigues da Costa Arménio Sottomayor |