Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | RIBEIRO DE ALMEIDA | ||
Descritores: | PROPRIEDADE INDUSTRIAL DENOMINAÇÃO SOCIAL RECURSO HIERÁRQUICO FIRMA CONFUSÃO NOVIDADE | ||
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Nº do Documento: | SJ200306240019141 | ||
Data do Acordão: | 06/24/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL PORTO | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 2519/02 | ||
Data: | 12/19/2002 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
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Sumário : | I- A firma tem que obedecer ao principio da novidade ou da exclusividade, ao da verdade e ao da unidade. Tais princípios visam proporcionar aos consumidores opções informadas evitando a que confunda as sociedades e ao mesmo tempo evitar que os comerciantes a e as sociedades sejam alvo de concorrência desleal. II- O juízo sobre a confundibilidade da firma deve aferir-se em função da opinião de um homem comum, medianamente ponderado e atento; um consumidor cauto, ou um fornecedor avisado, ante aqueles elementos parcialmente comuns na firma de duas sociedades, possa, com um grau razoável de probabilidade, não as distinguir. O consumidor comum não é aquele que compra produtos específicos. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça A) No Tribunal judicial da Comarca da Maia, "A - INFORMÁTICA, S. A." interpôs recurso contencioso do despacho do Ex.mo DIRECTOR GERAL DOS REGISTOS E DO NOTARIADO, que indeferiu o recurso hierárquico interposto do indeferimento do certificado de admissibilidade da denominação "..." com fundamento em confundibilidade com a firma-denominação "B - NORTE - INFORMÁTICA E GESTÃO, LDA", também recorrida. Instruído e tramitado o processo, foi negado provimento ao recurso. Inconformada recorreu para a Relação do Porto que julgou improcedente a apelação. B) Recorre agora para este Supremo, e alegando, formula estas conclusões: 1) O tema a decidir reside em saber se o nome de estabelecimento «...» é ou não susceptível de confusão com a denominação social «B - Norte - Informática e Gestão Lda.» 2) A Recorrente discorda do método adoptado na decisão recorrida sobre a comparação entre os sinais distintivos que estão efectivamente em confronto: o nome de estabelecimento "..." com a denominação social "B - Norte - Informática e Gestão, Lda." - e não com o sinal "B". 3) A expressão "..." não é uma palavra da língua portuguesa (ou de qualquer das línguas estrangeiras mais conhecidas em Portugal), nem uma composição gráfica a que possa ser atribuído algum significado, sendo uma expressão de fantasia. 4) Quanto à denominação social "B - Norte - Informática e Gestão, Lda.", verifica-se que, no acórdão recorrido, ela não foi tomada na sua globalidade, mas unicamente pela expressão "B", que foi isolada do conjunto a que pertence e posta em comparação directa com o nome "...". 5) Não se afigura curial "reduzir--se" a denominação social da Recorrida a um dos seus elementos constitutivos (e, muito menos, ao elemento "B") e, de seguida, comparar o elemento assim isolado com o nome de estabelecimento da Recorrente, posto que, mutatis mutandis, como se escreve no douto Acórdão do Supremo Tribunal justiça de 3/5/2001 (Revista n.º 1021/01 - 6.a Secção), «É por intuição sintética e não por dissecação analítica que deve proceder-se à comparação das marcas, e «Haverá imitação se a semelhança do conjunto gerar a possibilidade de confusão pela fácil indução em erro do consumidor - e este é o consumidor médio dos produtos ou serviços em questão, tomando em conta o estrato populacional a que primordialmente eles são destinados. 6) A expressão "B" da denominação da Recorrida não permite ao homem médio, tendo por referência o bonus pater familias, determinar qual será a actividade a que se dedica a sociedade. 7) A capacidade distintiva da denominação da Recorrida reside, necessariamente, nos dizeres que vêm após o elemento "B", pois aí é que se encontram os elementos prevalentes sobre a natureza e actividade da "B - Norte - Informática e Gestão, Lda.". 8) O Tribunal a quo concordou com este entendimento, dizendo o seguinte: «Acompanha-se a Apelante quando sustenta que a capacidade distintiva da denominação da Apelada está nos dizeres que vêm após a expressão «B» pois é aí que residem os elementos prevalentes sobre a natureza e actividade da sociedade». 9) Tem sido este o entendimento da jurisprudência, como por exemplo, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 25/2/97, confirmado pelo Acórdão do Supremo Tribunal de justiça de 23/9/97, que decidiu não existir confusão entre as denominações sociais "MODIS - Distribuição Centralizada, S.A." e "MIDIS 10) Refira-se, ainda, o Acórdão do Supremo Tribunal de justiça de 14/6/95 (Recurso n.º 86.675), que decidiu que a denominação "QUORUM - Consultores e Contabilistas, Lda." não é confundível com a denominação "QUORUM - Gestão e Promoção Imobiliária, S.A.", por considerar que «( ...) o vocábulo "Quorum" - único elemento comum -, embora de forte sonoridade, susceptível porventura de nele se concentrar a tendência para abreviar as denominações em confronto, pela ausência de significado próprio não tem a capacidade para fazer qualquer sugestão sobre a identificação natureza e actividades do seu titular, ou sela, não tem a capacidade caracterizadora própria das firmas de denominações sociais. 11) A referida jurisprudência é aplicável in casu, por maioria de razão, posto que, no caso sobre que incidiu essa decisão do S.T.J. (entre outras semelhantes), não se verificava nenhuma diferença entre os vocábulos iniciais das duas denominações em confronto - em ambos os casos "QUORUM" -, enquanto no caso sub judice o nome de estabelecimento "..." é diferente do elemento inicial da denominação social "B - Norte - Informática e Gestão, Lda.". - Comércio de Representações, Lda." 12) Resulta da citada jurisprudência (cuja aplicação ao caso sub judice a Recorrente defende e o Tribunal a quo afirmou "acompanhar", mas sem daí tirar a devida conclusão), que a denominação "B - Norte - Informática e Gestão, Lda." não se caracteriza pela expressão "B". 13) O Tribunal a quo errou ao comparar o nome de estabelecimento "VOBIS" com a expressão "B", por não ser este o elemento característico e distintivo da referida denominação social. 14) O homem médio apreende imediatamente a notável dissemelhança entre os sinais distintivos em confronto: "...." e "B - Norte - Informática e Gestão, Lda.". 15) De um lado, está um sinal distintivo constituído por uma única expressão, "...", enquanto do outro está um sinal distintivo constituído por várias expressões, que e imediatamente apreendido por um destinatário normal como sendo a denominação de uma sociedade por quotas: "B - Norte - Informática e Gestão, Lda.". 16) O nome de estabelecimento "..." não é susceptível de confusão com a denominação social "B - Norte - Informática e Gestão, Lda.". 17) Sem conceder, nem sequer a expressão "VOBIS" pode ser considerada confundível com a expressão "B", pois têm fonéticas distintas - consequência da primeira letra de cada uma delas imprimir uma sonoridade própria. 18) Em apoio da Recorrente milita o facto de nunca ter ocorrido qualquer situação de confusão entre o seu nome de estabelecimento e a denominação social da Recorrida. 19) Apesar destes sinais distintivos coexistirem há 6 anos, a Recorrida não alegou nem provou que alguma vez tivesse ocorrido a confusão entre eles. 20) Esta factualidade é relevante, por ser do conhecimento geral que o nome de estabelecimento "...." é usado de forma pública e notória - facto notório que este Supremo Tribunal reconhecerá, certamente. 21) Ora, se nem com uma tal notoriedade e exposição pública ocorreu alguma situação de confusão entre o nome "...." e a denominação social da Recorrida, será razoável considerar-se, como no Acórdão recorrido, que aquele sinal é confundível com este? 22) O Tribunal a quo não ponderou devidamente o facto do consumidor - o mais e o menos atento - nunca ter confundido os dois sinais distintivos, apesar de coexistirem há 6 anos. 23) O Acórdão da Relação do Porto sob revista viola o disposto nos artigos 33, nºs 1 e 2 e 57, n.º 1 do Regime jurídico do RNPC, e deve ser revogado, e, por consequência, deve este Supremo Tribunal determinar que o RNPC emita o certificado negativo de firma ou denominação social n.º 870.810, "VOBIS". Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.C) Os Factos: 1) Foi pedida na secção de serviços do RNPC certificado comprovativo de que não existe registo de firma denominação idêntica ao nome do estabelecimento «Vobis» que a requerente (ora recorrente) pretende registar, com sede em Matosinhos; 2) O objecto da «Vobis» é o «comércio grossista e retalhista de equipamento de informática e prestação de serviços conexos»; 3) O referido pedido foi indeferido, por despacho de 17/04/99, por confundibilidade com a firma B - Norte - Informática e Gestão Lda., confirmado por despacho do Director Geral dos Registos e Notariado de 8/07/1999; 4) A firma "B - Norte - Informática e Gestão Lda." tem sede no Porto e tem como objecto social a «comercialização, produção, importação e exportação de computadores, acessórios e software; formação ligada a hardware e software, consultadoria e gestão de empresas e de departamentos de informática para organização e instalação de sistemas informáticos; D) Decidindo: A questão objecto deste recurso consiste em saber se são confundíveis a denominação social B - Norte - Informática e Gestão Lda. e o nome de estabelecimento «...». São três os princípios a que deve obedecer a firma: o da novidade ou da exclusividade, o da verdade e o da unidade. Estes princípios em última análise visam proporcionar aos consumidores opções informadas evitando que confunda esta com aqueloutra sociedade, e evitar que os comerciantes e as sociedades sejam alvo de concorrência desleal. (cf. Ac. STJ/CJSTJ, 1997/I/67) O principio da novidade, visa, como ensina o Prof. Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, Vol. I, 1965, pág.299: «" Assegurar às firmas a sua função diferenciadora. Destina-se, por outras palavras, a permitir a terceiros a fácil identificação dos comerciantes com que pretendam entrar em relações negociais. Ora é evidente que esta identificação continua a ser possível, nos mesmos casos em que as firmas contenham elementos comuns. O que se impõe é que estes elementos comuns não sejam os prevalentes" Novidade significa pois, o mesmo que inconfundibilidade, e há-de ser aferida em relação ao conteúdo global da firma" De muito semelhante opinião é o Professor Luís Brito Correia que ensina que o juízo sobre a confundibilidade da firma deve aferir-se em função «da opinião dum homem médio de diligência normal» (Direito Comercial Vol. I 1987 pág. 245). O princípio da novidade está expresso no Artigo 33 nº 1 do RNPC que preceitua assim: As firmas e denominações devem ser distintas e não susceptíveis de confusão ou erro com as registadas ou licenciadas no mesmo âmbito de exclusividade, mesmo quando a lei permita a inclusão de elementos utilizados por outras já registadas, ou notoriamente conhecidas. A novidade é pois um requisito exigido ás firmas, relativamente a outras que sejam actuantes num espaço territorial coincidente, mesmo que parcialmente. O que importa é avaliar se um cidadão comum, medianamente ponderado e atento; um consumidor cauto, ou um fornecedor avisado, ante aqueles elementos parcialmente comuns na firma de duas sociedades, possa, com um grau razoável de probabilidade, não as distinguir. Mas o juízo de distintibilidade deve ser feito em concreto perante todos os factores ponderáveis que o Artigo 32 n.º 2 e 5 do RNPC a título exemplificativo. Este preceito reportando-se ao núcleo da firma ou seja, aos seus elementos característicos, ainda é mais exigente: (") Ainda quando constituídos por designações de fantasia, siglas ou composições, não podem sugerir actividade diferente da que constitui o objecto social. Como bem se referencia no Acórdão recorrido, como o confronto se dá entre uma firma denominação e o nome de um estabelecimento, no caso uma sociedade por quotas e uma anónima, não trás qualquer contributo para a resolução deste problema o critério do domicilio ou sede. Quanto à afinidade ou proximidade das actividades exercidas a posição do estabelecimento e da outra pessoa colectiva é de certa sobreposição não se distinguindo o mesmo se diga quanto ao âmbito territorial das actividades exercidas. Os elementos comuns, aqui e agora, são as palavras Vobis e B. No vocábulo Vobis o «prefixo» V - confere uma sonoridade que os distingue, pese embora aquele denominador comum. No conjunto dos dizeres da firma e do estabelecimento em questão: Vobis e B - Norte - Informática e Gestão Lda., não pode considerar-se que exista um alto grau de probabilidade de um consumidor ou operador comercial, razoavelmente esclarecido e ponderado, as possa confundir. O vocábulo «Vobis» não permite ao consumidor comum, que não é o comprador de produtos informáticos, saber se perante a mera designação de «Vobis» está perante uma empresa que tenha por objecto a comercialização de produtos informáticos. Já não seria assim se ao vocábulo «Vobis» estivesse associado outro que designasse o ramo de negócio do estabelecimento. E como já se deixou dito, o consumidor comum, perante os elementos que sejam comuns, fique impossibilitado de distinguir as duas sociedades. Ora no caso que nos ocupa, o vocábulo «Vobis», não tem qualquer significado para o consumidor comum, pois não indica o ramo de actividade do estabelecimento. A designação B - Norte - Informática e Gestão Lda., dá a conhecer ao consumidor comum que se trata de uma empresa que se dedica ao ramo informático e de gestão. Não se pode assim ver qualquer elemento de confundibilidade entre o vocábulo «Vobis» e a firma usada pela sociedade comercial por quotas. Como se sentenciou no Ac. do STJ, de 14.6.95, in CJSTJ, 1995, 2, 129, "A lei não proíbe que determinada denominação social tenha algum elemento comum com o de outra anteriormente registada, quando tal elemento não seja decisivo para afastar o princípio da exclusividade" Neste caso os elementos que distinguem a designação do estabelecimento comercial e da sociedade são os elementos que vêm a seguir ao vocábulo B e não a sua comparação ou probabilidade de confusão com o vocábulo «Vobis», uma vez que este não tem a potencialidade de referenciar o ramo de sua actividade, o mesmo acontecendo com aquele enquanto elemento isolado, pois o ramo de actividade só é referenciado com os dizeres seguintes de B - Norte - Informática e Gestão Lda., apresentam assim inegáveis diferenças. E) Face ao que se deixou exposto, acorda-se em conceder a revista e, consequentemente em julgar procedente o pedido da recorrente. As custas em ambas as Instâncias e as deste recurso são da responsabilidade da recorrida. Lisboa, 24 de Junho de 2003 Ribeiro de Almeida Afonso de Melo Nuno Cameira |