Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00038856 | ||
Relator: | ALMEIDA DEVEZA | ||
Descritores: | INTERESSE EM AGIR | ||
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Nº do Documento: | SJ199910200001374 | ||
Data do Acordão: | 10/20/1999 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL PORTO | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 764/98 | ||
Data: | 01/12/1999 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | PROVIDO. | ||
Indicações Eventuais: | JURISPRUDÊNCIA UNIFORME. | ||
Área Temática: | DIR TRAB. DIR PROC CIV. | ||
Legislação Nacional: | CPC95 ARTIGO 2 N2 ARTIGO 4 N2. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO STJ DE 1986/02/06 IN BMJ N354 PAG447. | ||
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Sumário : | I- O pedido de declaração da existência de um direito deve decorrer da sequência da alegação de uma determinada situação de conflitualidade entre as partes ou da alegação de um estado de incerteza objectivamente determinado, passível de comprometer o valor da relação jurídica e que se não traduza num mero capricho, ou em um puro interesse subjectivo, para obter uma decisão jurídica. II- O interesse em agir consiste em o direito do demandante estar carecido de tutela judicial, representando o interesse em utilizar a acção judicial e em recorrer ao processo respectivo, para ver satisfeito o interesse substancial lesado pelo comportamento da parte contrária. | ||
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Decisão Texto Integral: | 1 ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: I- A "A", com os sinais dos autos, intentou acção declarativa, com processo ordinário, contra B e C, ambas com os sinais dos autos, pretendendo que "deve ser decretado que as diuturnidades pagas, pelo 2º R aos seus trabalhadores no activo sempre fizeram e fazem parte do ordenado ou salário, e como tal ter de ser considerado, para todos os efeitos legais, e os RR condenados a assim o ver julgado". Alega, em resumo, que são associados da A os reformados e os pensionistas de sobrevivência, dos Regulamentos do Montepio dos Empregados Superiores e Caixa de Socorros e Pensões, de 21/5/927, da 2ª R; a A estatutariamente representa os associados relativamente a assuntos relacionados com os seus interesses; entre a A e o 1º R vem-se travando discussão acerca sobre o que deve entender-se por ordenado ou salário que a 2ª R vem, desde 1980, praticando aos seus trabalhadores no activo; até 31/5/975, a 2ª R, nos ordenados ou salários auferidos pelos seus trabalhadores, fazia acrescer, como parte integrante da retribuição, as diuturnidades; aquando dos respectivos aumentos salariais eram aumentados na mesma proporção o vencimento base e as diuturnidades; entre 1/6/975 e 28/1/980, a 2ª R eliminou as diuturnidades, integrando o seu valor no salário ou ordenado; em 28/1/980, a 2ª R reinstalou o sistema de diuturnidades, considerando-as como parte integrante da retribuição, sendo esta desmembrada em dois itens, vencimento base + diuturnidades = a ordenado ou salário ou vencimento normal; os valores das respectivas diuturnidades e do vencimento base, desde 1980, vieram a ser actualizados na mesma proporção, sendo o seu pagamento regular e permanente; o 1ºR, nos termos legais, integrou em si as instituições previdenciais; a actualização das pensões dos associados da A são levados a efeito a partir de uma percentagem definida em tais regulamentos a incidir sobre o aumento do salário ou ordenado que a 2ª R praticava ao pessoal activo; a prática do 1º R quanto ao considerar o que seja o aumento de ordenado ou salário praticado pela 2ª R ao seu pessoal do activo consiste em não considerar as diuturnidades como fazendo parte integrante da retribuição, ou seja, não consideram tal como ordenado ou salário, entendendo a A que as diuturnidades fazem parte daquele ordenado ou salário; a 2ªR, juntamente com as entidades representativas dos trabalhadores, através do instrumento do A.E. fixa as condições salariais do seu pessoal, ou seja, define os respectivos ordenados ou salários; dos valores mencionados s título de diuturnidades, os empregados fazem descontos para a Segurança Social, e sempre fizeram, bem como os associados da A, quando ainda ao serviço da 2ª R, também faziam, sempre as diuturnidades estiveram instituídas; a 2ª R, nos recibos de vencimento, processa o valor a título de diuturnidades como vencimento, ou seja, o vencimento normal tem as rubricas de vencimento base+diuturnidades; as actualizações das diuturnidades, em sede de A.E., têm sido da mesma percentagem que as actualizações do vencimento base; a 2ª R sempre pagou o valor das diuturnidades nos mesmos termos em que pagou o vencimento base aos seus trabalhadores com regularidade e permanência, sendo elas de considerar como vencimento. A acção foi decidida no despacho liminar, absolvendo-se as RR da Instância, por falta de interesse em agir da A. A A não se conformando com o decidido agravou para o Tribunal da Relação do Porto que, negando provimento ao agravo, confirmou a decisão recorrida . II- De novo inconformada a A agravou para este Supremo tendo concluído as suas alegações da forma seguinte: 1) A questão das diuturnidades (se têm a natureza jurídica de salário ou ordenado, e tal representam na política salarial da R "C") é prévia à questão do direito dos associados da A à actualização das pensões tendo em conta tais diuturnidades; 2) A questão da actualização das pensões -- e a correspondente acção de condenação da R "B" é do foro dos tribunais administrativos; 3) A questão prévia (natureza das diuturnidades...) pode (e deve) ser resolvida no foro laboral, podendo a A usar desse meio; 4) Há uma situação de incerteza objectiva e grave: 5) A R "B" nega às diuturnidades a natureza do ordenado ou salário e como tal omite no processamento de actualização das pensões o que respeita às diuturnidades; 6) O que imediatamente acima se diz, causa prejuízo grave aos associados da A e a esta mesma; 7) Há manifesto e claro interesse em agir, ou seja, a necessidade de tutela judiciária; 8) As relações sub judice são concretas; 9) Foram violados, entre outros, o pressuposto processual do interesse em agir, art.3º e art.4º, nº2 al a) do C.P.C., bem como os normativos referidos nas presentes alegações. Termina, pedindo se conceda provimento ao recurso e se revoguem as decisões das Instâncias, ordenando-se o prosseguimento dos autos. Não houve contra alegações. III-A- Após ter sido admitido o recurso, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de o agravo ser provido. Este parecer foi notificado às partes, apenas tendo respondido a A, manifestando a sua concordância com aquele parecer. Foram corridos os vistos legais. Cumpre decidir. III-B- No presente agravo está só em causa a questão do "interesse em agir" por parte da A. Nos termos do nº2 do art. 2º do C.P.C. "A todo o direito corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo..." . A A pede que seja decretado que as diuturnidades pagas pela R "C" aos seus trabalhadores sempre fizeram e fazem parte do ordenado ou salário, e como tal deve ser considerado para todos os efeitos legais, e os RR serem condenados a assim o reconhecerem ou verem julgado. Em concordância com este princípio estabelece o art.4º, nº2 do C.P.C. que as acções declarativas podem ser de simples apreciação, de condenação ou constitutivas. As de simples apreciação destinam-se a obter unicamente a declaração da existência (acções positivas) ou inexistência (negativas) de um facto ou de um direito. O pedido formulado pela A, e tendo em conta o que na petição alega, e que acima se deixou dito, integra-se no tipo de acção de simples apreciação positiva, tipo de acção esse que se destina a obter uma sentença que defina se o direito existe, com efeitode caso julgado. A causa de pedir supõe a alegação de uma concreta relação jurídica produtora de direitos e de obrigações cujo conteúdo se discuta. Na verdade, ela alega que os seus associados (que representa) recebem da R "C" uma retribuição composta por vencimento base e diuturnidades, devendo estas ser consideradas como integradoras da retribuição e pretende que os RR venham a ser convencidos de que aquelas diuturnidades integram a retribuição, o que o Réu B nega. Este tipo de acção destina-se a obter uma sentença que defina se o direito existe, com efeito de caso julgado. O pedido de declaração da existência de um direito deve decorrer da sequência da alegação de uma determinada situação de conflitualidade entre as partes ou da alegação de um estado de incerteza objectivamente determinado, passível de comprometer o valor da relação jurídica. E, como se verifica das alegações da petição, que se dão por reproduzidas, e do que acima se disse, em resumo, sobre elas e o objecto do litígio, temos, como se disse, que a acção se configura como de simples apreciação positiva. Por sua vez, o interesse em agir consiste em o direito do demandante estar carecido de tutela judicial, representando o interesse em utilizar a acção judicial e em recorrer ao processo respectivo, para se ver satisfeito o interesse substancial lesado pelo comportamento da parte contrária. Consiste -- como se diz no Acórdão deste Supremo, de 6/2/986, in BMJ nº354, págs.447 -- em o direito do demandante estar carecido de tutela judicial, na real precisão de utilizar a arma judicial, sem o que a actividade jurisdicional seria exercitada em vão, constituindo um pressuposto processual. E, tendo em conta o carácter processual, o interesse em agir -- interesse processual -- traduz-se na necessidade de o A utilizar o processo por a sua situação de carência necessitar da intervenção dos tribunais (Cr. A. Varela, em Manual de Processo Civil, 2ª ed.,págs.179). Mas, aquela necessidade de se socorrer das vias judiciais não deve ser considerada como a única ou a última via aberta para a realização da pretensão formulada. Mas, também não bastará uma necessidade de satisfação de um mero capricho ou de um puro interesse subjectivo de obter uma decisão judicial. O que se exige é que, por força dele, exista uma necessidade justificada, razoável fundada de lançar mão do processo ( ob e Autor citado,págs.183). Ora, tendo em conta o que acima se disse, esquematicamente, sobre o interesse em agir, verifica-se que nos presentes autos estão presentes os seus pressupostos. A A alega a existência de um direito ,existência essa suficientemente objectivada, direito esse que a Ré B lhe nega. Com esta acção a A não revela um mero capricho em obter uma decisão e a necessidade da acção mostra-se como justificada, razoável e fundada. Assim, revela-se o interesse em agir da sua parte, motivo pelo qual o agravo há-de proceder. V- Assim, acorda-se em conceder provimento ao agravo, revoga-se a decisão agravada e ordena-se o prosseguimento dos autos. Custas pelos agravados. Lisboa, 20 de Outubro de 1999. Alemida Deveza, Sousa Lamas, Diniz Nunes. |