Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1064/12.0TVPRT.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: JOÃO TRINDADE
Descritores: DIREITO A HONRA
DIREITO AO BOM NOME
LIBERDADE DE EXPRESSÃO
LIBERDADE DE INFORMAÇÃO
LIBERDADE DE IMPRENSA
COLISÃO DE DIREITOS
JORNAL
DIREITOS DE PERSONALIDADE
DIREITOS FUNDAMENTAIS
ILICITUDE
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PRINCÍPIO DA NECESSIDADE
PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO
Data do Acordão: 03/30/2017
Nº Único do Processo:
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / PESSOAS SINGULARES / DIREITOS DE PERSONALIDADE.
DIREITO DA COMUNICAÇÃO SOCIAL - DIREITOS FUNDAMENTAIS E A COMUNICAÇÃO SOCIAL.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO ( NULIDADDES ) / RECURSOS
Doutrina:
- CAPELO DE SOUSA, O Direito Geral de Personalidade, 434 e ss..
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC) / 2013: - ARTIGOS 615.º, N.º1, AL. C), 674.º, N.º 3, 682.º, N.º 1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 3-02-2001, PROCESSO N.º 1045/04.7TBALQ.L1.S1, IN WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I - No âmbito da violação dos direitos de personalidade, como o direito à honra e ao bom nome, para além de se colocarem problemas de colisão com outros direitos fundamentais, o juízo sobre a ilicitude deve ter em conta o princípio da unidade jurídica e daí que nas causas de justificação da ilicitude se imponha considerar o princípio da ponderação dos valores conflituantes na situação concreta, quando inseridos na titularidade de direitos subjectivos e no cumprimento de deveres jurídicos.

II - A solução dos conflitos entre a liberdade de expressão e informação e o direito à honra passa pela sua harmonização ou pela prevalência a dar a um ou a outro, com recurso aos princípios da proporcionalidade, da necessidade e da adequação às circunstâncias do caso concreto.

III - Existindo verdadeiro “interesse público” (e não meramente um “interesse do público”) em que a comunidade seja informada sobre certas matérias, o dever de informação prevalece sobre a discrição imposta pelos interesses pessoais; porém, a divulgação só justificará a ofensa dos direitos de personalidade fundamentais na medida em que da mesma sobressaia o referido interesse, esbatendo-se a identificação das pessoas envolvidas.

IV - Não sendo as notícias publicitadas num jornal susceptíveis de levar à identificação dos envolvidos, não se pode dizer que tenha sido ultrapassado o que se mostra necessário ao cumprimento da função pública da imprensa.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça :



1- AA intentou contra

 BB - SGPS., S.A.,

CC,

 DD ,

acção de condenação, com processo ordinário, pedindo a condenação das RR. BB e DD

- a divulgar, no mesmo periódico - Jornal EE- e com idêntico relevo (igualmente com chamada de 1ª página), a sentença que vier a ser proferida nos presentes autos;

-e a condenação solidária dos RR. a pagar à A. quantia não inferior a € 37.500,00, acrescida de juros à taxa legal desde a citação.


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2 - Os RR., na contestação, pediram a condenação da A., como litigante de má fé, a pagar-lhes indemnização.


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3 - A Ré BB foi absolvida da instância, por ter sido julgada parte ilegítima, uma vez que o seu objecto social é a gestão de participações sociais, sendo a proprietária do jornal “EE” uma outra sociedade, a FF, SA, que não vem demandada.

Desta decisão interlocutória não se recorreu.


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4 - Após realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença na qual a acção foi julgada improcedente por não provada e os Réus – CC e DD – absolvidos dos pedidos.

Não se condenou a Autora como litigante de má fé.

5 - Inconformada, recorreu desta decisão a Autora.


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6 - A Relação julgou a apelação improcedente, e confirmou a sentença recorrida.                           


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7 - É desta decisão que foi interposta revista pela A. , que encerra as respectivas alegações com as seguintes conclusões:

1- Tendo a nova lei processual mantido, ainda que com alterações, o regime instituído pelo Dec-Lei nº 303/2007, de 24/08 e obtendo o Acórdão recorrido, confirmativo da decisão da instância, votação unânime, ocorre a figura conhecida por "dupla conforme" o que, por princípio seria impeditivo do recurso de revista que é excepcionalmente admitido pelos dispositivos das alíneas a) a c) do nº 1 do artº 672º do mesmo diploma. Nestes casos, impõe-se ao recorrente não só o ónus de produzir alegações não só sobre o objecto do recurso - como sucede na generalidade dos processos recursivos - mas, ainda e sob pena de rejeição, sobre as razões da admissibilidade dessa revista excepcional.

2º, Defende a recorrente estar em causa não só " uma questão cuja apreciação, pela sua referência jurídica, é claramente necessária para uma melhor apreciação do direito " versando "interesses de particular relevo social". Explicitando conceitos e como já foi decidido por este Supremo Tribunal (no âmbito da lei processual anterior mas com equivalência na actual):

"Tem relevância jurídica, para efeito da al a) do n.º1 do art. 721.2-A do CPC, a questão que seja controversa na doutrina e na jurisprudência, sendo o seu esclarecimento necessário a uma melhor aplicação do direito (02-03-2011 Revista excepcional n.º 16368/09.OT2SNT.LIS1)''

e

"Existe a relevância jurídica imposta pela al a) do n. 1 daquele art. 721.º-A quando a questão em apreço é controversa na doutrina e na jurisprudência, assumindo laivos de complexidade a sua subsunção jurídica, por implicar um importante e detalhado exercício de exegese (03-05-2011 Revista excepcional n.º 43/W.6TVPRT.PI.SI)".

3º. O direito à honra, bom nome e consideração e outros tidos por fundamentais que durante muito tempo foram considerados intangíveis, ainda que os factos ofensivos relatados pela imprensa fossem verdadeiros, podem, agora, ser postergados, desde que verificados certos pressupostos, que devem também ser concretizados. Isto porque o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem vem proferindo decisões sobre esta matéria com um entendimento, mantido de forma constante, que assenta no entendimento de que a liberdade de imprensa constitui um dos pilares fundamentais do Estado democrático, do seu progresso e do desenvolvimento de cada pessoa pelo que as excepções constantes do nº 2 do artº 10º da Convenção devem ser interpretadas restritamente.

4º. E porque a liberdade de informação e expressão admite, com alguns limites, expressões que criticam, chocam, ofendem, exageram ou distorcem a realidade, é tolerável que possa limitar direitos de personalidade fundamentais se estiver em causa a realização de um interesse legítimo, geral ou público, só podendo a divulgação justificar a essa ofensa na medida em que sobressaiam esses interesses, esbatendo-se a identificação das pessoas envolvidas. Reconhece-se ainda que o direito público de ser informado tem como parâmetro a utilidade social da notícia, que deve ser integrada pela verdade do facto noticiado ou pela seriedade do artigo de opinião, o que pressupõe, por parte do jornalista, a utilização de fontes de informação fidedignas e, tanto quanto possível, diversificadas. Mais se exige que na produção da ofensa à honra cometida através da imprensa, ao fazer a imputação desvaliosa, se tenha actuado dentro da sua função pública de formação da opinião pública, utilizando os meios concretamente menos danosos para a honra da pessoa visada, com respeito pela verdade das imputações em que fundadamente acreditou, depois de comprovada a verdade da imputação.

5º. Com estas novas concepções que importaram uma significativa alteração na perspectiva que vinha sendo seguida no direito interno no sentido da afirmação do direito à honra como prevalente nos casos de conflito com o direito à liberdade de informação e expressão, não significa que os tribunais portugueses tenham perdido a autonomia de decisão nessa matéria, dado ser-lhes conferida ampla margem de manobra sujeita, no entanto ao controle e fiscalização do TEDH que, obviamente, não avaliza todas as situações de ofensas aos direitos de personalidade consumados pela comunicação social, nomeadamente nos casos reconhecidamente especulativos e de ofensa imoderada, sendo, ao contrário permissivo naquelas situações em que as ofensas ou a censura imoderada se reporta a cidadãos com grande exposição e no exercício de funções públicas.

6º. Analisemos qual a questão jurídica que o processo encerra e como deve ser resolvida em termos do cidadão comum ter a correcta noção do conteúdo e limites dos seus direitos de personalidade. A recorrente, conhecedora dos actos por si praticados e grosseiramente vertidos no processo comum nº 158/08.0TAFVN do então Tribunal de Comarca de F…, considerando-se ofendida na sua honra por as duas notícias publicadas no "EE", pretendeu reagir contra essas ofensas; tinha duas formas de o fazer: ou apresentar queixa-crime contra todos os responsáveis pelos factos noticiados ou intentar acção cível destinada à reparação da ofensa. Ponderadas as circunstâncias, particularmente, a necessidade e especificidades da prova da ilicitude e da culpa dos agentes, exigíveis em cada um desses foros, optou pela apresentação de acção cível. Porém, ao analisar a datação dessas notícias, apercebeu-se imediatamente que enquanto a publicação de 01/03/2013 era posterior à acusação deduzida pelo Ministério Público (de 14/09/2012) no identificado processo-crime, logo admitiu poderem existir dificuldades probatórias no tocante às condutas dos agentes em sede de responsabilidade criminal (ou até civil); já no que tange com a notícia inicial publicada no dia 02/07/2011 (antes, portanto, de conhecida a acusação), mesmo que podendo ter resultado da consulta do processo, não seriam previsíveis obstáculos à comprovação da ilicitude e da culpa (no mínimo, na forma de dolo eventual) dos seus autores, optando, assim, pela instauração de acção cível.

7º. Com grande surpresa da recorrente o tribunal de 1ª instância viria a decidir de preceito no sentido da improcedência da acção com o que se não conformou, interpondo recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou a decisão da instância. Vejamos, em ordem a pôr em relevo os pressupostos da revista excepcional, como o Acórdão recorrido fundamentou as suas conclusões. Refere que " a primeira notícia veio a lume antes de a ora autora ser acusada nesse processo-crime, e a segunda já depois da acusação ter sido deduzida. De qualquer modo os factos noticiados, em ambas as notícias, são os constantes do referido processo-crime" (o sublinhado é nosso).

8º, Salvo o devido, sufragamos que, contra o decidido, a factualidade constante das duas notícias - que não pode ser metida no mesmo "saco"- não tem, ipso facto, justificação por se encontrar vertida num processo-crime. Segundo entendemos, será correcta e integrada na observância das legis artis reprodução ou a mera referência a factos constantes de uma acusação (obviamente desprovida de juízos de valor ou outros comentários marginais). Isto porque se o Sr. Procurador tiver feito o seu trabalho sem erros, como será por via de regra o caso, haverá, pelo menos, indícios bastantes da veracidade desses factos. Existe, nesta hipótese, um "crivo" ou juízo prévio que não podendo assegurar a plena equivalência desses factos com a realidade - e que poderão até vir a "desaparecer" com a inexistência de pronúncia ou caso essa factualidade não seja considerada provada em julgamento ou em sede de recurso -, garante a grande probabilidade dessa coincidência. Já no tocante ao relato noticioso resultante da consulta do inquérito, os responsáveis por uma notícia publicada unicamente com esse suporte, correm sérios riscos de divulgar uma situação menos correcta ou mesmo uma falsidade.

9º. Mesmo reconhecendo-se que a verdade jornalística não terá de ser nem absoluta, nem científica e, muito menos, ter as exigências da verdade judiciária, com o que se condicionaria de forma intolerável o direito à liberdade de informação, certo é que a obtenção da verdade jornalística obriga a certas cautelas que conduzam à coincidência ou, no mínimo, à grande proximidade dos factos publicados com a realidade sob pena de se perder a função pública de formação de opinião prosseguindo-se, ao invés, interesses privados que levam à generalizada desinformação. E, nos casos mais gritantes de ofensa a direitos de personalidade, exige-se que as fontes de informação fidedigna tenham sido diversificadas, assim se controlando a veracidade dos factos, a que acresce a concretização do meio menos danoso para a honra da pessoa visada, esbatendo-se a sua identificação.

10º. Atentemos, então, nos factos e comentários constantes da notícia publicada no "EE", datada de 02/07/2011 (que nos dispensamos de transcrever por razões de economia e que constam do corpo desta peça processual). Parece evidente que todos esses factos e qualificativos - e não apenas a descrição das circunstâncias em que a vítima diz ter mantido pela primeira vez relações de sexo com a ora recorrente - resultaram de declarações produzidas no processo pelo próprio queixoso, que ali se auto denominou de "vítima", mensagem que foi inteira e avidamente acolhida e perfilhada pelo autor da notícia que a reproduziu. Mas, será o queixoso, fonte de informação "fidedigna" ? Haveria alguma garantia de que as declarações por ele prestadas no processo fossem verdadeiras e subsistiria alguma razão que levasse o Sr. jornalista a acreditar na veracidade dessas declarações ? Naturalmente que as respostas terão de ser todas negativas: as declarações do queixoso, porque interessado na "sua verdade", não podem, por si só, ser reputadas de credíveis e, muito menos de fidedignas, nenhuns factos resultando dos autos que tivessem levado o Sr. jornalista, sem mais, a acreditar na sua veracidade. Impunha-se-lhe, portanto, que diversificasse as fontes, não, certamente, pela audição da ex-esposa do ofendido (e também ela ofendida no mencionado processo-crime e com os mesmos interesses) e que, no relato veiculado na mesma notícia se limitou a "lamentações" sem qualquer relevo informativo sério; e, ainda menos, pela versão processualmente apresentada pela autora na acção de impugnação pauliana que intentou contra aqueles que, ao contrário do relatado no Acórdão recorrido, nunca seria de molde a confirmar essas imputações. Com o relato da posição da autora pretendeu-se, com mistificação, dar a aparência do cumprimento do dever de audição da "outra" parte.

11º. Ressalvado o devido respeito por opinião contrária, sustenta a recorrente que o relato noticioso resultante da entrevista da referida GG está nos antípodas dessa necessidade de recurso a "outras" fontes, inserindo-se nos propósitos de provocar na opinião pública uma "censura alargada" da visada pelos sentimentos de indignação e pena resultantes das alegadas consequências das suas condutas. É o chamado sensacionalismo "oculto" mas conducente aos mesmos fins.

12º. O suporte da uma notícia unicamente em factos de um inquérito, produzidos sem contraditório e, portanto, sem que se conheça a "verdade" do visado - que, muito provavelmente, só aparecerá com a contestação por si apresentada, obviamente, se vier a ser deduzida acusação - não pode à partida avalizar o cumprimento das legis artis nem excluir a culpa do agente e a ilicitude da sua conduta. Na recolha que faz desses factos, que não são incontroversos, será o jornalista "tentado" a escolher aqueles que são notícia ainda que susceptíveis de infirmação no futuro. Mas, se isso acontecer, com a inevitável e já consumada produção de danos no património moral do "alvo", estará sempre o agente noticioso estribado na investigação jornalística que empreendeu suportada no processo criminal, demonstrativa da sua "boa fé", por norma, tida por dirimente da sua responsabilidade, o que é a todos os títulos inadmissível.

13º. E se a desresponsabilização criminal, ainda que tenham de ser consideradas as concretas circunstâncias do caso, é tolerável dadas as garantias e os princípios informadores do direito substantivo e adjectivo penal, já para o julgamento em sede de direito civil essa posição não pode ser sustentada como regra. Por absurdo, admitamos até que a investigação foi absolutamente correcta e que, do ponto de vista do cidadão comum os factos recolhidos tinham toda a probabilidade de ser verdadeiros, tendo o jornalista actuado de "alma limpa" e sem que qualquer censura lhe pudesse ser feita no imediato. Porém, submetido esse processo a julgamento, a factualidade vertida na notícia foi claramente infirmada daí resultando que aquele Sr. jornalista, mesmo que involuntariamente, ter divulgado uma notícia falsa com o que provocou o linchamento público do caracter do visado com essa publicação.

14º. E esta será, quanto a nós, uma situação sobre que a doutrina e os tribunais têm de debruçar-se e esclarecer definitivamente em ordem à melhor aplicação do direito: se a descrição de factos noticiosos ofensivos do património moral do visado, ainda que recolhidos segundo as legis artis, se vierem a revelar falsos, esse procedimento editorial é, não obstante, passível censura civil ou, ao contrário, tem o visado com a falsidade produzida o ónus de suportar, à custa da pública Ce, nesse caso, definitiva) destruição do seu caracter, as consequências dessa falsidade. Salvo o devido respeito, o interesse público de qualquer notícia pressupõe a sua veracidade, só podendo ser este o modelo da liberdade de informação e expressão defendido pela Convenção e controlada pelo TEDH.

15º. É neste espaço que deve ser localizada a vexada quaestio prevista na alínea a) do nº 1 do arte 672 do Cód. Proc. Civil sem o que a "terceira apreciação" será inadmissível e com este sentido: a verdade jornalística não pode suportar-se unicamente na publicitação de factos constantes das declarações de uma das "partes" recolhidas por consulta a inquérito penal que tenha por objecto os mesmos factos, por maior que seja o interesse público dessa informação ou a utilidade social dessa notícia. Estando em causa nesse processo do foro criminal questões fácticas com contornos de gravidade evidente e aptidão para lesar um direito fundamental, como era o caso, não deve conceder-se aos Srs. jornalistas um estatuto de idoneidade e de isenção na apreciação dos factos assim recolhidos. Esta apreciação e o seu subsequente relato é susceptível, sem as mesmas garantias de uma decisão judicial, de provocar a colisão com direitos e valores dominantes da comunidade. A questão -que segundo julgamos é inédita, nunca tendo sido tratada nesta perspectiva - não pode deixar de ser considerada para boa ou melhor aplicação do direito.

16º. Explicitemos as razões por que sufragamos que os autores de uma notícia falsa, mesmo que os factos relatados tenham sido conhecidos com observância das obrigações impostas no exercício da actividade jornalística, não podem deixar de ser responsabilizados civilmente pelo visado com essa informação distorcida se dela resultar grave ofensa aos seus direitos fundamentais: o exercício do jornalismo, com raríssimas excepções em que estão subjacentes outros interesses, tem, por via de regra, fins lucrativos; cada exemplar de um jornal, composto por informações diversas, artigos de opinião e notícias destina-se, não a ser distribuído gratuitamente pela população, mas a ser vendido por um determinado preço, daí advindo lucros substanciais (incontestavelmente no caso do "EE"). E, obviamente, quanto mais sensacionais e anómalos se mostrarem os factos publicados, maior será a apetência do fiel público consumidor por essas notícias, aumentando, logicamente, a "tiragem" da edição. Mas, como é evidente, o lucro resultante dessa actividade não pode ser alcançado à custa da falsidade das notícias insertas nessas publicações e, particularmente, quando delas resultem graves e intoleráveis atentados à honra dos visados. Assim, sendo a actividade editorial um meio apto a criar um risco de violação de direitos fundamentais, impõe-se, nesta matéria, iure condendo, a adopção de uma concepção objectiva da responsabilidade civil assente nos pressupostos conduta do agente, dano e nexo causal,

17º. Posição adoptada pelo direito brasileiro nos segmentos que se transcrevem A revolução industrial e tecnológica, reclama em favor da sociedade mecanismos normativos capazes de assegurar o ressarcimento dos danos, se necessário fosse, mediante sacrifício do pressuposto da culpa. A obrigação de indenizar sem culpa surgiu no bojo dessas ideias renovadoras por duas razões: a) a consideração de que certas atividades do homem criam um risco especial para outros homens, e que; b) o exercício de determinados direitos deve implicar ressarcimento dos danos" (ut Zelmo DenarQ u e "aquele que através de sua actividade, cria um risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua actividade e seu comportamento sejam Isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem o direito de ser indenizada por aquele" (in Rev. Trib. 3º Reg. Belo Horizonte, v.41, n.71, p.97-110, jan./jun.2005) .

18º. E nem se diga que com a adopção desta concepção se limita ou restringe intoleravelmente a liberdade de informação e expressão; esta apreciação posterior à publicação apenas impõe uma análise mais rigorosa na recolha dos factos pela antecipada advertência de que poderão vir a ser apreciados pelos tribunais e se forem desconformes com a realidade, os danos causados serão passíveis de reparação. Esta será a demonstração eloquente de que o Direito é, antes de tudo, uuma ciência nascida da vida e feita para disciplinar a própria vida ". A sociedade moderna não pode ver-se desprovida de instrumentos e mecanismos aptos e eficazes a distribuir de forma equitativa a Justiça.

19º. A ninguém suscitará dúvidas que, face ao já alegado e tendo os autos por objecto central a ofensa a direitos fundamentais, todas as questões que daí possam emergir terão, por princípio, grande relevo social pelo que não poderá deixar de ter-se por verificado o pressuposto de revista excepcional previsto na alínea b) do nº 1 do mesmo dispositivo legal. " Para que se verifique o requisito contido na al. b) do n.º 1 do art. 721 e-A do CPC, perante a vaguidade e indeterminação legal do mesmo, que tomam de enorme dificuldade o estabelecimento de critérios para a sua delimitação, há que atentar na matéria de facto articulada e na questão de direito a decidir, de forma a verificar se, perante tal matéria e face a tal questão, poderá surgir uma situação em que possa haver colisão de uma decisão jurídica com valores sócio-culturais dominantes que a devam orientar e cuja eventual ofensa possa suscitar alarme social determinante de profundos sentimentos de Inquietação que minem a tranquilidade de uma generalidade de pessoas, situações em que nomeadamente fique posta em causa a eficácia do direito e a sua credibilidade por se tratar de casos em que há um invulgar Impacto na situação da vida que a norma em apreço vise regular ou em que exista um Interesse comunitário que, pela sua peculiar importância, pudesse levar, por siso, à admissão da revista por os Interesses em jogo ultrapassarem significativamente os limites do caso concreto. (Ac. STJ de 24-05-2011 Revista excepcional n.º 454/09.0TVLSB.L1.S1).

20º. São de "particular relevância social" as questões com repercussão, por conexão, com valores sócio-culturais dominantes, cuja eventual ofensa possa suscitar alarme social determinante de profundos sentimentos de inquietação que minem a tranquilidade de uma generalidade de pessoas, pondo em causa a eficácia do direito e a sua credibilidade, como resulta do caso em análise.

21º. Aliás, a maior censura que, sem quebra de respeito, pode fazer-se ao Acórdão em análise é a falta de lógica que demonstra na sua fundamentação de facto que não pode deixar de chocar o sentimento de justiça dominante; sabendo-se que os factos vertidos na primeira publicação, muito embora viessem a ser mais tarde inseridos na acusação deduzida no processo-crime, não tinham sido confirmados na decisão proferida nesse processo crime, daí apenas se poderá concluir que nem sequer esta peça garante a verdade dos factos nela vertidos, pelo que, por maioria de razão, terá de ser-se escrupulosamente sério e cauteloso nas ilações a retirar de peças soltas e declarações avulsas desse mesmo processo numa fase inicial.

22º. E se o Sr. jornalista e os demais demandados fizeram uma leitura errónea ou precipitada dos factos que recolheram, porque desconformes com a realidade, que, não obstante publicaram, em consequência do que ofenderam de forma intolerável a honra da ora recorrente, nem por isso, deixaram de beneficiar economicamente dessa ofensa pela venda dos jornais que continham esses factos noticiosos, devem, por imperativos da mais elementar justiça, ser, por isso, civilmente responsabilizados. É a todos os títulos inadmissível que a recorrente, depois de ter sido publicamente achincalhada na sua honra e consideração com base em factos que se revelariam falsos, não tenha o direito, eventualmente por inexistência de mecanismo legal adequado, de ver revertida essa situação e reposta a verdade dos factos mediante uma publicação com igual relevo do órgão que os relatou e a atribuição de uma compensação pelo dano causado. Nestas circunstâncias, ou seja, obstando-se a que as funções de qualquer jornalista se traduzam num mero exercício de libertinagem pela clara ultrapassagem da barreira da ilicitude, nada terá o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de censurar. Censurável será deixar-se a culpa, mesmo que na modalidade de dolo eventual ou negligência inconsciente, sem castigo.

23º. Nem poderá deixar de dizer-se que a manter-se a tese da decisão recorrida vai eternizar-se uma injustiça, vivendo a recorrente o resto dos seus dias com o estigma e o "ferrete" de ser "burlona sexual" com tudo o que de mau que lhe está associado, de nada lhe valendo a sua absolvição no processo-crime. Por isso, a autora se mostrou interessada prioritariamente na reposição da verdade dos factos ao requerer a condenação dos réus na divulgação "... no mesmo periódico e com idêntico relevo (igualmente com chamada de 1g página)...", obviamente na pressuposição da procedência da acção, da "... sentença que vier a ser proferida nos presentes autos", o que traduz, na medida do possível, a evidente preocupação da sua "reabilitação" social.

24º. Passando ao objecto do recurso, tendo sido dada a informação aos autos de que a instância absolvera a autora dos crimes por que estava acusada no processo crime de cujo inquérito (e acusação) haviam sido recolhidos os factos noticiados cuja totalidade ou parte não tinham sido considerados provados, impunha-se, tanto quanto defendemos, a reanálise dessa matéria, eventualmente com a decisão de suspensão da instância até ao trânsito em julgado do Acórdão da Relação de Coimbra. De facto, da prolação deste Acórdão poderia resultar, como resultou, a conclusão da incerteza ou falsidade da factualidade acolhida pela instância cível, podendo também decorrer de qualquer segmento da sua fundamentação a inobservância de regras da investigação jornalística, o que não seria irrelevante para a criteriosa decisão da causa.

25º. Hoje, só uma coisa é certa: os direitos de personalidade da autora foram gravemente ofendidos, sendo falsas ou incertas, mas de qualquer modo infundadas, as razões determinantes da publicitação noticiosa em análise. Sem qualquer desrespeito pelo tribunal recorrido, o mínimo que lhe podemos apontar é a sua falta de coerência lógica, mostrando-se ininteligíveis as referências que faz às causas da "perda da honra" como acções da autoria da própria pessoa ou acções que lhe sejam imputadas e consideradas reprováveis pela ordem ética vigente. Omitiu-se que, como decorre do mencionado processo crime, nenhuma censura lhe foi formulada por quaisquer comportamentos que a pudessem tornar merecedora de qualquer reprovação ética. Mas se, como se reconhece "perdeu" a honra, acrescente-se sem qualquer fundamento sério, então, a sua pretensão ganha ainda mais sentido.

26º. Acórdão recorrido fundamenta a regularidade da notícia

-no interesse público dos factos noticiados;

-por os factos noticiados, em ambas as notícias, serem os constantes do referido processo-crime;

-por a autora não ser identificada nas notícias (embora admita que possa vir a ser identificada no meio onde se insere pelo seu teor);

-por inexistir interesse comercial ou de lucro na apresentação das notícias nem as mesmas visarem o aspecto sensacionalista;

-serem sóbrios os títulos e subtítulos que acompanham essas notícias; a divulgação dos factos não ter sido efectuada manifestando a certeza da sua veracidade e respeitando o princípio do mínimo dano, ou seja, foi utilizado o meio, concretamente, menos danoso para a honra do atingido;

-a descrição do "modus operandi" (da autora, entenda-se) ser igualmente do interesse público dada a sofisticação da cilada e as gravosas consequências dos montantes envolvidos. Sem qualquer intuito de desrespeito, vai dizer-se parecer que o tribunal recorrido se pronunciou por um caso diferente.

27º. Não se vê como possa existir interesse público numa ficção sem a prévia advertência de que poderia tratar-se de factos irreais; tão pouco na narrativa na vida amorosa, com ou sem envolvimento sexual, de uma cidadã anónima com outra pessoa mais idosa. A função pública do jornalismo cumpre-se na "actividade relativa à formação democrática e pluralista da opinião pública em matéria social, política, económica e cultural. Só neste domínios existe um interesse público no conhecimento e divulgação da notícia " (Figueiredo Dias, Rev. Leg. e Jur. 115º, 136). Mas, elucidativamente, para o caso dos autos, prossegue o mesmo Professor: " Dizer isto, porém, não significa legitimar toda a restante actividade da imprensa, nomeadamente, a votada para a satisfação de necessidades lúdicas, ou de curiosidade, ou da notícia-sensação. Esta imprensa tem obviamente o seu lugar, contribuindo para a diversidade da existência quotidiana, é, portanto, legítima, Porém, porque não cabe na função pública da imprensa, não beneficia do particular regime de justificação penal no caso de ofensa típica à honra u (Rev. Leg. e Jur. 115Q, 137, com a advertência de que os sublinhados são nossos).

28º. Ninguém tem dúvidas de que as notícias divulgadas resultaram de factos e situações descritas no mencionado processo-crime, a inicial do inquérito e a última da acusação deduzida pelo Mº Pº. Mas, como se expendeu já exuberantemente, designadamente, os factos do inquérito, por si só, nenhuma garantia têm de veracidade, muito particularmente, se a factualidade descrita resultar de declarações prestadas pelo ofendido que tem obviamente um interesse pessoal na condenação da arguida. Considere-se o conteúdo da primeira notícia no segmento "pormenores: sexo após cheque" quando é relatado que o queixoso disse à Polícia Judiciária que só seis meses depois de se conhecerem, tinha mantido pela primeira vez relações sexuais com a arguida, o que coincidiu com a entrega de um cheque de 39 mil euros. Alguém poderá tomar esta declaração como verdadeira sem o recurso a outras fontes que a possam confirmar ? E teria o Sr. jornalista qualquer fundada razão que o levasse a acreditar nessa informação ?

29º. No que tange com a decidida falta de identificação da visada nas notícias em análise deve dizer-se que constitui prática aconselhada pelas legis artis que, a menos que se trate de uma figura com exposição pública, que se deva esbater a identidade do visado. Só por clara inadvertência se pode ter expendido na fundamentação da decisão em recurso que a autora não está identificada nessas publicações: relativamente à primeira notícia, numa pequena vila de 3250 habitantes da sub-região do Pinhal Interior Norte (informação acessível no site do Município), fácil será saber quem é uma tal AA, com 45 anos de idade, residente em M… e que intentou contra os "burlados" no foro cível de F… uma acção no valor de 225 mil euros (aqui até por simples consulta da distribuição de processos no site dos tribunais); na publicação de 1/03/2013 são referidos já os nomes AA, a idade e o facto de ser namorada de HH (o que a decisão crime também não acolheu na totalidade), sem olvidar que a menção à residência constava já do "folhetim" anterior.

30º. Não pode deixar de estranhar-se que o douto Acórdão recorrido tenha concluído muito enxutamente pela inexistência de interesse comercial ou de lucro na apresentação das mencionadas notícias. Salvo o devido respeito, trata-se de factos públicos e notórios, como tal, não carecidos de prova. Mas, a própria decisão recorrida o reconhece quando refere que o jornal "EE" é da propriedade da sociedade comercial "FF, S. A", sociedade, obviamente com fins lucrativos e não de benemerência. O lucro decorre, como é também facto público e notório, da venda dos seus exemplares E tanto a administração dessa sociedade, como a direcção do jornal e os seus trabalhadores estão interessados que cada edição atinja a maior "tiragem" possível.

31º. Se dúvidas houvesse quanto à matriz sensacionalista do periódico, bastaria compulsar as notícias ajuizadas para que essa conclusão fosse de mandatária: os títulos e as expressões utilizadas ("Seduzido", " Idoso alvo de burla sexual", "sexo após o cheque", "namoro omitido", "juras de amor eterno", "estou a viver no fundo de um poço" ...) e os assuntos versados (o sexo e o dinheiro com o reverso da escassez de meios) são matérias adequadas a fazer despertar sentimentos de indignação, choque ou pena. A verdade dos factos pode perfeitamente ficar para depois de produzidas as naturais consequências. Por isso, como é do conhecimento público - mas para que conste -, o "EE" é "campeão" das queixas apresentadas na ERC, Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

32º. Não será pelo facto de no conjunto das duas notícias se utilizar uma vez a expressão "suspeita" e outra "alegada burlona" que os factos relatados perdem, no seu conjunto, o carácter de certeza da informação veiculada. Os adjectivos desvalorativos, as expressões injuriosas e os constantes atentados à dignidade sexual da autora enquanto mulher não são de molde a deixar dúvidas sobre a improbabilidade das imputações, sendo as mesmas adquiridas como certas pelos leitores.

33º. É frontal o nosso desacordo no tocante à reconhecida observância do princípio do dano mínimo que deve presidir à publicação de qualquer notícia séria; ninguém, por menos cioso que seja dos seus direitos, poderá deixar de sentir-se seriamente ofendido na sua honra e consideração social ao ver-se confrontado com as revelações feitas, mesmo que fossem verdadeiras e que, no caso concreto, se não revestiam de qualquer utilidade do ponto de vista informativo.

34º. Existe, todavia, nos autos um pormenor que "desmonta" a tese do dano mínimo: como é do conhecimento generalizado, o grupo empresarial que detém a propriedade do "EE" (e também a " II...") ufana-se de ser "o melhor" e "o primeiro". Retomando as notícias dos autos constata-se que os factos constantes da publicação de 01/03/2013, factualmente, nada trouxeram de novo, a não ser a informação de que tinha sido deduzida acusação contra a visada. O desrespeito pelo princípio do dano mínimo decorre do facto da acusação ter sido notificada no dia 14/09/2011, ou seja, cerca de meio ano antes, vislumbrando-se, com essa notícia "requentada" uma não inocente intenção persecutória contra a autora, não fosse o assunto ser esquecido.

35º. É, no mínimo, tautológico dizer que à comunidade interessa conhecer o "modus operandi" de um crime de burla qualificada, importando, isso sim, o conhecimento de todas as formas de actuação criminosa. Por isso a autoridade policial publica "manuais de instruções" em vista da sua prevenção. Tanto quanto se sabe, esses manuais, não individualizam os autores (mesmo que condenados) de crimes que exijam particular prevenção, o que significa que o interesse público é alcançável sem a identificação nem o "perfil" do potencial criminoso. Se à referida publicação tivesse presidido essa finalidade, teria descrito os factos criminosos como uma ficção e não como um facto real com a identificação dos seus autores e das vítimas, o que mais uma vez comprova a certeza da imputação. Não se vê como um "não assunto" possa, do ponto de vista jornalístico, funcionar como instrumento de utilidade à prevenção criminal.

36º - O Acórdão recorrido manifesta total indiferença pela pessoa da recorrente que, depois de ter sido perseguida criminalmente durante sete longos anos e ser publicamente enxovalhada por uma certa imprensa com imputações arrasadoras da sua honra, acabaria por ser ilibada por decisão transitada em julgado. Porém, caso a decisão em apreço não venha a ser revista, está condenada, sem qualquer resquício de culpa, a suportar o infamante estatuto que lhe foi atribuído pelo "EE", sem qualquer possibilidade de reabilitação. Será que os "palpites", mesmo que venham a mostrar-se infundados podem contrariar a força de uma decisão judicial ?

37º. Ao referir-se ao "modus operandi", à "sofisticação da cilada" e aos "elevados montantes envolvidos" o tribunal a quo parece não ter ainda interiorizado que a autora foi completamente ilibada dos crimes por que fora acusada pelo tribunal de julgamento, com decisão confirmada e já transitada pelo tribunal de recurso. E, reconhecendo-se que nenhum crime foi cometido, são completamente descabidas e impertinentes as referências feitas ao "modus operandi", à "sofisticação da cilada" e aos "elevados montantes envolvidos" que justamente pressupõem a sua prática.

38º. A decisão recorrida violou, entre outros, os dispositivos dos artº 102, nº 2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o artº 26º da Constituição da República Portuguesa, os artºs 702, 483º e 484º do Código Civil, os artºs 2, nº 1, alíneas d) e o) da Lei de Imprensa e artº 615, nº 1, alínea c) e artº 666º, nº 1 do Código de Processo Civil.

Termos em que, e nos melhores de direito que Vªs Exªs suprirão, deve a revista ser julgada procedente, com reenvio do processo para a instância para produção de prova.

Foram apresentadas contra-alegações com as seguintes conclusões:

1) O presente recurso de Revista Excepcional não poderá ser admitido porquanto não se encontram preenchidos os requisitos vertidos - e alegados pela Recorrente - nas alíneas a) e b) do n.s  do artigo 672.e do Código de Processo Civil:

a) Nos presentes autos inexiste qualquer "questão jurídica susceptível de merecer uma melhor aplicação do direito," conforme a alínea a) do n.s 1 do artigo 672º do CPC, porquanto os Recorridos, no exercício da sua profissão, limitaram-se a publicar factos verdadeiros retirados de um processo-crime onde a Recorrente estava acusada por um ilícito penal. Sendo que aos jornalistas não se lhes pode limitar o exercício da sua profissão quando o objeto das suas publicações incidam sobre cidadãos investigados e acusados em processo-crime, fazendo depender o seu trabalho de uma decisão transitada em julgado. b) A Recorrente não invocou qual o interesse de particular relevância social do qual faz depender a alínea b) do n.e l do artigo 672.2 do CPC, limitando-se outrossim a qualificar os presentes autos como uma "ofensa a direitos fundamentais", de modo a sustentar a verificação do referido requisito.

2) Os Recorridos não têm como exercer o contraditório, na presente sede, porquanto o objecto do recurso interposto pela Recorrente incide sobre um Acórdão cuja certidão não foi, em momento próprio, junta aos autos. Neste sentido, caso o presente recurso seja admitido não poderá este Tribunal considerar o referido Acórdão, sob pena de estarmos perante uma nulidade processual, porquanto os Recorridos desconhecem o seu teor.

3) Ainda que exista um Acórdão que, por sua vez, tenha absolvido a Recorrente do crime pelo qual vinha acusada em sede penal, tal não retira o carácter veraz das notícias publicadas pelos Recorridos. Isto porquanto os Recorridos sustentaram as notícias publicadas com base numa acusação proferida por uma autoridade pública sujeita, como tal, a princípios rígidos de objectividade. No entanto, mesmo que a notícia publicada na imprensa atinja o bom-nome e reputação da Recorrente, o facto não será ilícito, porque o exercício correto da liberdade de imprensa corresponde ao exercício regular de um direito constitucionalmente consagrado que, in casu, e ponderadas as circunstâncias, suplanta o direito ao bom-nome da Recorrente.

Termos em que (i) não deverá o presente recurso de revista excepcional ser admitido por este Tribunal por não se encontrarem preenchidos os requisitos vertidos no n.º 1 do artigo 672.º do CPC, ou caso assim não se entenda (ii) deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente e, em consequência, ser mantida a decisão recorrida


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8. Matéria de facto:

1 - No processo 158/08.0TAFVN, o Ministério Público, a 14 de Setembro de 2011, deduziu acusação contra a ora A. e HH, imputando-lhes a prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado e de um crime de burla qualificada, na forma continuada, e identificando como ofendidos JJ e GG.

2 - Da acusação referida no ponto 1 consta o seguinte:

“Em data não concretamente apurada, mas compreendida no ano de 2002, os arguidos, que na altura mantinham um relacionamento de natureza sexual, elaboraram e acordaram num plano que consistia em apoderarem-se de quantias monetárias e de bens susceptíveis de valor económico que pertencessem aos ofendidos.

Para tal, aproveitando-se do facto de o ofendido já ter perto de 60 anos e da sua fragilidade psíquica, acordaram que a arguida se aproximaria do ofendido de forma a ganhar a sua confiança e manter com o mesmo um relacionamento de cariz sexual para, com falsas promessas de que a mesma pretendia morar e construir uma vida em comum com o ofendido, o levar a fazer disposições patrimoniais a favor da arguida, quantias essas que posteriormente seriam gastas em proveito próprio dos arguidos, nomeadamente, com viagens realizadas pelos arguidos.

Assim, em conjugação de esforços e meios, na sequência do plano acima referido, elaborado e aceite por ambos os arguidos, em data não concretamente apurada, mas situada em Outubro de 2002, o arguido, que já era conhecido do ofendido por ter dois stands de automóveis, um deles em P… e outro na A… em F…, apresentou-lhe a arguida, a qual na altura trabalhava por conta do arguido no referido stand de venda de automóveis sito na A…, em F…., e denominado «Stand KK».


Em circunstâncias de tempo e lugar também não concretamente apuradas, mas poucos dias após o ofendido ter conhecido a arguida, esta pediu-lhe que lhe desse um beijo, ao que o arguido acedeu.


Nessa sequência, o ofendido, acreditando que essas necessidades económicas eram reais e tendo em conta a proximidade que se tinha gerado entre os dois, acreditando nas juras de amor que a arguida lhe fazia e confiando que mesma pretendia passar o resto dos dias com ele, foi-lhe entregando diversas quantias de montante não concretamente apurado.


Em circunstâncias de tempo e lugar não concretamente apuradas, e agindo com o propósito exclusivo do ofendido lhe entregar quantias monetárias para comprar ou mandar construir uma casa, a arguida, na sequência do plano gizado entre si e o arguido e melhor descrito supra, durante pelo menos o ano de 2003, insistiu por diversas vezes com o ofendido que tinham de comprar uma casa para residirem no futuro, pedindo-lhe dinheiro para o efeito.

Nessa sequência, o ofendido, acreditando na falsa promessa de que a arguida queria residir consigo e estaria apaixonada por ele, convencido de que iria passar o resto dos dias com ela e que a casa seria para utilização dos dois, decidiu fazer um empréstimo ao banco, uma vez que não tinha liquidez suficiente para entregar à arguida.


Assim, pensando que, face ao teor da conversa da arguida, finalmente iria ter relações sexuais com a arguida, o que até aí ainda não tinha acontecido, pese embora fossem constantes as carícias e juras de amor trocadas entre ambos, o ofendido apôs pelo seu punho o seu nome no verso do cheque nº 430…, endossando-o, e entregou-o à arguida.

Após, o ofendido e a arguida dirigiram-se a uma residencial sita em …, próxima do Santuário, e, ali chegados, mantiveram relações sexuais de cópula completa.


Agindo nos moldes acima referidos, os arguidos determinaram o ofendido a entregar-lhe uma quantia monetária não concretamente apurada, mas superior a € 559.184,00.


Os objectos retirados da referida residência têm um valor total não concretamente apurado, mas superior a € 75.000,00.


A arguida não exerce qualquer actividade económica vivendo exclusivamente da prática de actos semelhantes aos acima narrados, tendo já sido condenada pela prática de um crime de burla qualificada no âmbito do processo nº 68/08.1TALSA, que correu termos no Tribunal Judicial da L…, processo em que o arguido também era acusado, mas foi absolvido”.

3 - Da primeira página do EE do dia 2 de Julho de 2011 constam os seguintes dizeres:

“Seduzido

Idoso alvo de burla sexual

Pág. 12”.

4 - Da página 14 do EE desse dia consta a seguinte notícia da autoria da R. DD:

“Seduziu idoso por meio milhão

Septuagenário atraído por promessas de «vida feliz e um longo futuro»

Ela pediu-lhe um beijo e prometeu-lhe «uma vida a dois, feliz e com um longo futuro». Mas ele teria de adiantar dinheiro para comprar e preparar «a casinha» onde iriam morar juntos. Perante as juras de amor, um idoso de 73 anos residente em P… entregou a uma mulher, de 45, com antecedentes criminais por burla, mais de meio milhão de euros entre 2002 e 2007.

Proprietário de um posto de abastecimento de combustíveis e de um prédio com café, o lesado, JJ, acabou por vender todos os bens e agora doente - está hospitalizado - e sem recursos, está em risco de perder também a casa. É que a alegada burlona, AA, instaurou uma acção contra o idoso e a sua ex-mulher para pagamento de letras assinadas por ele no valor de 225 mil euros.

«Estou a viver no fundo de um poço. Só tenho doenças e dívidas. Mato-me a trabalhar e sobrevivo da caridade dos vizinhos”, lamenta GG, 61 anos, ex-mulher de JJ, que também é ré no processo. A acção está na fase de julgamento e corre no mesmo tribunal – F… - onde está o inquérito em que AA e o namorado são arguidos. O caso foi investigado pela PJ do Centro e está agora nas mãos do Ministério Público, que, perante os indícios de burla qualificada, mandou apreender a casa e o dinheiro das contas bancárias da suspeita.

Aos olhos da vítima, AA - já condenada pelo Tribunal da Lousã a seis meses de prisão, suspensa, por cobrar 9185 euros por actos de bruxaria - sempre se revelou «apaixonada». As mensagens de amor que constam do processo fazem alusão a projectos futuros conjuntos e incluem recomendações para que a vítima faça tudo pela casa onde iriam viver. A suspeita, residente em M…, nega as acusações e diz que o idoso é que lhe deve dinheiro de um empréstimo que lhe fez e era do conhecimento da então esposa”.

“Pormenores

Sexo após cheque

Só meses depois de se conhecerem, vítima e arguida mantiveram a primeira relação sexual, o que terá coincidido com a entrega de um cheque de 39 mil euros, disse o idoso à PJ.

Namoro omitido

Os dois conheceram-se no stand de que era dono o namorado da alegada burlona, que é também arguido. Mas ela apresentou-se ao idoso como funcionária e terá omitido a relação amorosa.

Jogador de futebol

A arguida disse que tinha dinheiro dado pelo ex-marido, que foi jogador do ….. A PJ confirmou, através da Federação, que só jogou como júnior em A….”

5 - Da página 16 do EE do dia 1 de Março de 2013 consta a seguinte notícia da autoria da R. DD:

“Burlona seduz idoso e desvia 500 mil €

As juras de amor eterno e as falsas promessas de uma vida a dois levaram um idoso de P…. a entregar a uma burlona mais de meio milhão de euros. Após investigação da Polícia Judiciária do Centro, o Ministério Público acusa agora a mulher, 45 anos, e o namorado de 52, de terem engendrado o plano que deixou JJ, de 73 anos, e a sua ex-mulher, GG, «na miséria».

AA, namorada de HH, já condenada por cobrar 9185 euros por bruxarias, fez crer que estava apaixonada por JJ e que o dinheiro era para a casa onde iriam morar os dois.

Dono de umas bombas de gasolina e de um prédio, o idoso vendeu tudo e pode ficar sem casa. AA reclama uma alegada dívida de 225 mil euros. Além de burla, os arguidos são acusados de furtar móveis no valor de 75 mil euros”.

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9 - A Formação admitiu a revista nos termos seguintes:

Como detalhadamente se pode ver, entre outros, no Acórdão deste Tribunal de 30.6.2011, processo n.° 1272/04.7TBBCL.G1.S1, com texto dis­ponível em www.dasi.pt, a ideia de defesa da honra em termos praticamente absolutos sofreu profundo revés - principalmente no que tange à comunicação social - com a interpretação do artigo 10.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem levada a cabo pelo TEDH e, depois, com a vinda a lume da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Sendo, concomitantemente, dado adquirido que a liberdade, assim fortemente ampliada, não pode deixar de ter limites, veio ao de cima a necessidade de intenso esforço jurisprudencial em ordem a situar dentro ou fora dos limites daquela cada um dos casos que sucessivamente chegava aos tribunais.

Esse esforço jurisprudencial é claramente necessário para que os muitos cidadãos que lidem com estas questões venham adquirindo segurança em ordem a saberem até onde se pode ou não ir, nomeadamente no que concerne a publicações na comunicação social.

Nessa conformidade, cremos que a intervenção deste Supremo Tribunal é claramente exigida pela melhor aplicação do direito, estando verifi­cado o mencionado pressuposto da alínea a).

E ficando prejudicada a apreciação do da alínea b).

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10 - O mérito da causa:

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões neles insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº3 e 690º do Código de Processo Civil.


As questões a resolver são as seguintes:

A. Objecto do recurso

B. Nulidade - Artº 615º, nº 1 c) do CPC

C. Liberdade de informação- Direito á Honra


A - Objecto do recurso

A recorrente remata as conclusões da seguinte forma:

“…..deve a revista ser julgada procedente, com reenvio do processo para a instância para produção de prova”(sublinhado nosso).

Sucede que nas alegações não faz a mínima referência a qualquer fundamento onde possa sustentar esta pretensão.

Como a recorrente certamente não desconhece, é vedado ao Supremo Tribunal de Justiça censurar o julgamento da matéria de facto efectuado pelas Instâncias, uma vez que é um Tribunal de Revista e não de Instância.

A lei é clara ao dispor no artº 682º/1 do novo Código de Processo Civil/2013 (tal como acontecia, aliás, no artº 729º do CPC revogado) que aos factos materiais fixados pelo Tribunal recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.

Por outro lado, o nº 3 do artº 674º do CPC é expresso ao estatuir que o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa, não pode ser objecto de Revista, ressalvadas as excepções legais, que aqui não se verificam.


B - Nulidade - Artº 615º, nº 1 c) do CPC

Inopinadamente a recorrente invoca esta nulidade sem concretizar ou especificar se estamos perante oposição, ambiguidade ou obscuridade.

Para que exista a nulidade a que se refere a alínea c) do nº 1 do artº 615º do NCPC/2013, é necessário que tal contradição suponha um vício intrínseco à sua própria lógica, traduzido em a fundamentação não poder suportar o sentido da decisão que veio a ser proferida (por todos, o Ac. STJ de 3-02-2001, Pº 1045/04.7TBALQ.L1.S1 in www.dgsi.pt), o que não ocorre in casu.

A A./recorrente incorre num imperfeito enquadramento jurídico da situação, já que, tanto quanto podemos descortinar, aponta a causa do vício no thema decidendum.

Nulidade da sentença e error in iudicando não se confundem. ([1])

No caso concreto, do que o Recorrente reclama é deste e não daquela.

Tal como a questão é configurada, estamos eventualmente perante um erro de julgamento, razão por que improcede a nulidade suscitada.


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C - Liberdade de informar – Direito á honra

Perante a decisão da Formação importa agora saber se, ao publicarem as notícias foram cumpridas as exigências e cautelas necessárias ou se foi exorbitado o âmbito do direito e liberdade de informar, tendo, por essa via, violado o direito à honra e ao bom-nome e reputação do autor.

 As instâncias, após analisarem os vários requisitos([2]) considerando que  os mesmos foram cumpridos, o que subscrevemos, colocaram o foco da sua análise na  identificação das pessoas envolvidas.

E é sobre esse ponto que passamos a dar a nossa maior atenção.

No âmbito da violação dos direitos de personalidade, como o direito à honra e ao bom nome, colocam-se não só problemas de colisão com outros direitos fundamentais, como o juízo sobre a ilicitude deve ter em conta o princípio da unidade da ordem jurídica.

Por isso, nas causas de justificação da ilicitude de ofensas à honra impõe-se considerar o “princípio da ponderação dos valores conflituantes na situação concreta”, designadamente quando inseridos na titularidade de direitos subjectivos ou no cumprimento de deveres jurídicos ( cf., por ex., CAPELO DE SOUSA, loc. cit., pág.434 e segs. ).

Existindo verdadeiro interesse público em que a comunidade seja informada sobre certas matérias, o dever de informação prevalece sobre a discrição imposta pelos interesses pessoais.

Sempre, no entanto, será de exigir o respeito por um princípio, não apenas de verdade, necessidade e adequação, mas também de proporcionalidade (ou razoabilidade).([3])

A solução dos conflitos entre a liberdade de expressão e informação e o direito à honra passa pela sua harmonização ou pela prevalência a dar a um ou a outro, com recurso aos princípios da proporcionalidade, da necessidade e da adequação às circunstâncias do caso concreto.

O exercício da liberdade de expressão e de informação, eventualmente, limitador de outros direitos de personalidade, deve, porém, obedecer (sempre) à realização de um interesse legítimo que será, por via de regra, um interesse geral ou um “interesse público”, enquanto conceito normativo, e não, meramente, “um interesse do público” só podendo a divulgação justificar a ofensa dos direitos de personalidade fundamentais, na medida em que da mesma sobressaiam aqueles interesses, esbatendo-se a identificação das pessoas envolvidas[23]/[24].

Chegados aqui, considerando as notícias potencialmente ofensivas, importa apurar se, servindo o fim legítimo do direito de informação foi ou não, não ultrapassado o que se mostra necessário ao cumprimento da função pública da imprensa[25],se havia razões objectivas para associar o nome da A. à notícia.

Prévia a esta questão temos que apurar se as notícias tal como foram publicitadas são susceptíveis de levar á identificação dos envolvidos.

Neste campo estamos em sintonia com as instâncias que concluem pela negativa.

De qualquer das maneiras respondendo à interrogação que fizemos supra, cumpre-nos registar, que nas situações como a ora em apreço, para se cumprir a nobre  função de informar, não vemos razões objectivas, não vemos necessidade de associar nomes à notícia que possam conduzir à identificação dos envolvidos  já que tal não traz mais impacto alertante .

Caixa de texto: 11-DECISÃO:
Nesta conformidade, acorda-se em negar provimento à revista.
Custas pela recorrente.
Notifique.

                                     


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Lisboa, 2017-03-30


João Trindade (Relator)

Tavares de Paiva

Abrantes Geraldes

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[1] 1231/09.3TTLSB.L1.S1
[2] VII - De acordo com alguma doutrina, transportável para a responsabilidade civil, essa boa
fé é composta dos seguintes elementos fundamentais: 1) os factos inverídicos têm de ser
verosímeis, ou seja, têm de ser portadores de uma aparência de veracidade susceptível de
provocar a adesão do homem normal e não só do informador; 2) o informador terá de
demonstrar que procedeu a uma averiguação séria, segundo as regras e os cuidados que as
concretas circunstâncias do caso razoavelmente exigiam, provando se necessário que a
fonte era idónea ou que chegou a confrontar as informações com várias fontes; 3) o
informador terá de demonstrar que agiu com moderação nos seus propósitos, ou seja, que
se conteve dentro dos limites da necessidade de informar e dos fins ético-sociais do direito
de informar, evitando o sensacionalismo ou os pormenores mais ofensivos ou com pouco
valor informativo; 4) o informador deverá demonstrar a ausência de animosidade pessoal
em relação ao ofendido a fim de que a informação inverídica não possa considerar-se
ataque pessoal.
17-09-2009 - Revista n.º 832/06.6TLSBTS.S1 - 6.ª Secção

[3] Revista n.º 184/02 - 7.ª Secção-07-03-2002 -