Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01657/20.1BELSB |
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Data do Acordão: | 07/13/2023 |
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Tribunal: | 1 SECÇÃO |
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Relator: | SUZANA TAVARES DA SILVA |
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Descritores: | CONTRATAÇÃO PÚBLICA DISCRICIONARIEDADE REQUISITOS PROPOSTA |
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Sumário: | Inexistindo uma exigência expressa nos documentos do concurso a respeito das concretas características físicas ou materiais que uma proposta deve apresentar para uma barreira de protecção anti-terrorismo que seja apta a prevenir um edifício de um embate de um veículo rodoviário pesado, cabe ao júri do concurso a avaliação da adequação da solução apresentada nas propostas e ao tribunal, no âmbito dos seus poderes de fiscalização da conformidade jurídica da decisão do júri, verificar se a solução adoptada é conforme às regras e aos princípios que envolvem a formulação de juízos de avaliação no âmbito do poder discricionário. |
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Nº Convencional: | JSTA00071756 |
Nº do Documento: | SA12023071301657/20 |
Data de Entrada: | 06/16/2023 |
Recorrente: | A... E OUTROS |
Recorrido 1: | B..., SA E OUTROS |
Votação: | UNANIMIDADE |
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Meio Processual: | RECURSO DE REVISTA |
Objecto: | ACÓRDÃO TCA SUL |
Decisão: | CONCEDE PROVIMENTO |
Área Temática 1: | CONTRATAÇÃO PÚBLICA |
Legislação Nacional: | Artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP, |
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Aditamento: | ![]() |
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Texto Integral: | Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – C..., S.A., com os sinais dos autos, propôs no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC de Lisboa), acção administrativa de contencioso pré-contratual contra a A... igualmente com os sinais dos autos, em que indicou como contra-interessados a B... S.A. e a D... S.A., também com os sinais dos autos, e concluiu, formulando o seguinte pedido: «[…] Nestes termos e nos mais de direito que V. Excelência doutamente suprirá, deve a presente acção ser julgada procedente, por provada e fundada, e, em consequência, ser anulado o acto de adjudicação impugnado, pois que as propostas apresentadas pela D… e pela B... devem ser excluídas, o que, em consequência, determina a condenação da Entidade Demandada em adjudicar o objecto do Concurso, em ambos os Lotes, em favor da C.... […]». 2 – Por sentença de 18.04.2022 foi a acção julgada parcialmente procedente nos seguintes termos: «[…] Nos termos e com os fundamentos supra expostos: a) decido julgar a ação parcialmente procedente e, consequentemente, anulo a Deliberação n.º 1379/2020, da sessão ordinária da Mesa da A... do dia 03.09.2020, na parte em que autorizou a adjudicação do Lote ... do procedimento à Contrainteressada D... S.A., absolvendo-se a Entidade Demandada e as Contrainteressadas dos restantes pedidos. b) julgo improcedente o pedido formulado pela Contrainteressada B..., S.A., absolvendo-se a Autora e a Entidade Demandada do pedido. Responsabilidade por custas pela Autora, a Entidade Demandada, a Contrainteressada D… e a Contrainteressada B..., na proporção de 45%, 15%, 15% e 25%, respetivamente. [ 3 – Inconformados, a D... SA e a A... interpuseram recurso de apelação para o TCA Sul, tendo a autora C..., SA interposto recurso subordinado, ao abrigo do disposto nos artigos 142.º, n.º 1 do CPTA e 633.º do CPC. O acórdão do TCA Sul negou provimento aos recursos interpostos pela D... SA e pela A... e concedeu parcial provimento ao recurso subordinado interposto pela C..., SA, revogando a sentença recorrida, na parte em que absolvera a entidade demandada do pedido de condenação a adjudicar o contrato objecto do concurso, relativo ao Lote ..., à autora C..., com a consequente condenação desta a adjudicar-lhe o mencionado Lote .... 4 – Desta última decisão, interpuseram recurso de revista para o STA a A... e a D... SA, os quais foram admitidos por acórdão do STA de 25.05.2023. 5 – A Recorrente A... formulou alegações que concluiu da seguinte forma: «[…] a) A presente Revista vem interposta, pela A... da parte do Acórdão do TCA Sul que, concedendo provimento parcial do recurso subordinado da C..., condenou a A... em resultado da anulação da adjudicação do Lote ... à D… (a Deliberação nº 1379/2020, da sessão ordinária da Mesa da A... de 03.09.2020), a condenou a adjudicar à C... o contrato para o Lote ... do Concurso Público Internacional para a Prestação de Serviços de Rede de Dados Distribuída e Centros de Dados Secundário para a A...; b) Confrontada com o pedido de condenação para adjudicar o contrato à C..., sentença do TAC de Lisboa entendeu que não estavam reunidas as condições necessárias para se condenar a A... a adjudicar à C... o contrato e, assim sendo, devolveu a decisão da matéria à Entidade Adjudicante; c) A anulação do ato de adjudicação fundou-se exclusivamente na circunstância de a proposta (da D…) incumprir o determinado no artigo 7.2.4.7, alínea d), do Programa do Concurso e o exigido na Cláusula 34.3, REQ-B4, alínea d) do Caderno de Encargos, que exigiam que o edifício proposto para a instalação do Lote ..., Centro de Dados Secundário, devia apresentar “controlos antiterrorismo, nomeadamente barreiras de proteção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado”; d) O Acórdão do TCA Sul, alega a A... está eivado do vício de violação de lei material por afrontar diretamente o princípio da igualdade de tratamento, o princípio da comparabilidade das propostas e o princípio da concorrência, consagrados pelo nº 1 do art. 1º-A do CCP, sublinhado pelo nº 2 do art. 201º do CPA e, bem assim, que cerceia diretamente o nº 1 do art. 20º da CRP, que garante o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, ou seja, que assegura a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos; e) Essa decisão formal-jurídica do Acórdão do TCA Sul despoleta efeitos materialmente incomportáveis para a contratação pública portuguesa, para a A... e para o Direito; f) As consequências imediatas da alegada existência de um erro ostensivo sancionado pelo Tribunal na avaliação das propostas, prendem-se com a consequente condenação judicial da A... na adjudicação do contrato a uma proposta (da C...) que não está em condições de ser adjudicável porque padece dos mesmos problemas de base pelos quais os Tribunais determinaram a exclusão da proposta da D… por erro grosseiro na sua análise imputado à A...; g) Nenhuma das proposta apresentada, e foram três, cumpre o solicitado: e nenhuma proposta logrou demonstrar documentalmente esse cumprimento, tanto que o júri, de forma completamente excecional, procurando solucionar bem o caso, deslocou-se aos locais propostos pelos concorrentes de localização do edifico do Centro de Dados Secundário para, in loco, melhor aquilatar sobre se, naqueles concretos casos, podia considerar-se que as propostas cumpriam esse requisito técnico do controlo antiterrorismo exigido pelas peças do procedimento; h) Tudo em favor do procedimento e em favor da manutenção do maior número de propostas adjudicáveis no procedimento concursal; i) Como não o Tribunal não se debruçou sobre as três propostas apresentadas para saber se todas cumpriam todas ou não esse requisito, só devolvendo a decisão à A... é que tal desiderato pode ser atingido porque, se assim for, a Entidade Adjudicante, conforme previsto no nº 3 do art. 72º do CCP, está legitimada a “solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento de irregularidades formais das suas candidaturas e propostas que careçam de ser supridas, desde que tal suprimento não seja suscetível de modificar o respetivo conteúdo e não desrespeite os princípios da igualdade de tratamento e da concorrência”; j) A adjudicação só pode ser feita, segundo o critério de adjudicação, à proposta economicamente mais favorável e a uma proposta que esteja em condições de ser adjudicável porque, se assim não for, é a própria legalidade do procedimento concursal no seu todo que fica em causa; k) As consequências mediatas que derivam da decisão do Acórdão do TCA Sul, de condenar a A... a adjudicar o contrato a um concorrente não adjudicatário (a C...), têm que ver com o cerceamento do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos dos concorrentes que apresentaram propostas ao procedimento concursal; l) Porque não sendo praticado um novo ato de adjudicação impugnável pela A... os concorrentes D… e B... que apresentaram proposta ao concurso, não podem pedir o seu controlo pelos tribunais e ficam privados de sindicar supostos incumprimentos existentes na proposta da C... a quem o tribunal mandou a A... adjudicar o contrato para o Lote ... do concurso; m) Sem a devolução da decisão à A... os demais concorrentes não têm o direito de pronúncia em sede de audiência prévia dos interessados sobre projetados intuitos adjudicatários e classificativos da A... e perdem o direito a uma tutela judiciária efetiva, na medida em que a A... não praticará um novo ato de adjudicação impugnável, como consequência do caso julgado material desta ação, ficando em xeque o acesso ao direito e a uma tutela judiciária efetiva que a Constituição assegura a todos no nº 1 do seu art. 20º; n) Atento a anulação de um ato de adjudicação pela verificação de erro valorado pelo tribunal como grosseiro e imputado ao júri na fase de análise do cumprimento dos requisitos do Caderno de Encargos, impunham neste caso os deveres de prudência que se devolvesse a decisão à Entidade Adjudicante para permitir o escrutínio das propostas, evitando que as outras propostas (recebidas) padeçam de erros tão palmares como aquele que o tribunal sancionou na proposta da D… e, mesmo assim, sejam colocadas na posição de adjudicatário, como fez automaticamente o Acórdão do TCA Sul, na parte dele de que aqui se recorre (julgando parcialmente procedente um recurso subordinado da C...); o) Se a A... não tiver oportunidade de reanalisar as propostas apresentadas, refletindo nessa análise o erro ostensivo que corroeu a proposta da D..., isso significa que a decisão de condenar da A... a adjudicar o contrato para o Lote ... à C... consubstancia a prática de um ato ilegal pela A... colocando-a perante a obrigação de tratar de forma desigual as propostas apresentadas, assim se violando um dos princípios mais importantes da contratação pública, o princípio da concorrência, previsto no art. 1º-A do CCP e pelo nº 2 do CPA; p) Como se julgou, entre outros, no Acórdão do TCA Sul de 10.12.2019, Proc. nº 561/19.0BELSB, “no âmbito da contratação pública, a observância do princípio da concorrência implica, designadamente, a necessidade de assegurar a comparabilidade das propostas, que para o efeito devem responder aos mesmos requisitos definidos no caderno de encargos”; q) O comando impositivo dirigido à Entidade Adjudicante traduz-se na prática de uma conduta ilícita porque configura numa adjudicação ilegal, na medida em que está por comprovar o que a proposta da C... cumpre as exigências previstas no respetivo Caderno de Encargos em relação aos mencionados controlos de terrorismo; r) Se este Supremo Tribunal Administrativo não aceitasse e não concedesse a Revista, seríamos forçado a reconhecer que o Direito impôs uma solução para o caso que não é legal ou, mesmo se fosse, não é a melhor, nem equitativa, porque, sem razão que o justifique, impede que as Entidades Adjudicantes, em consequência da anulação do ato de adjudicação praticado, reanalisem as propostas apresentadas a concurso em função de questões que antes foram sopesadas intencionalmente de uma determinada forma, mas que agora os tribunais entendem que, por se tratarem de erros manifestos, dever ser sancionados nas propostas pelo Júri; s) Cabe ao Supremo Tribunal Administrativo evitar situações intoleráveis que se constituíram ou correm o risco de se consolidar na ordem jurídica em resultado de variáveis judiciais que não são controláveis (ou recorríveis) em sede de recurso ordinário pelas partes; t) Sendo também bastante verosímil que o tema se suscite noutros processos porque se trata de uma questão de relevância jurídica e transversal para todo o panorama da contratação pública e extremamente relevante para os tribunais: pelo que urge esclarecer a mesma e assim diminuir a litigância e a pendência noutros diferendos em que as mesmas sejam suscitadas, sob pena de os direitos de defesa (e de contraditório) e de acesso à Justiça, sob a vertente da tutela judiciária efetiva ficarem em perigo; u) O âmbito geral e carácter transversal da questão sub iudice é suficientemente demonstrativo da sua importância fundamental, pela sua relevância jurídica; v) Acresce que o Acórdão recorrido, na parte em que dele se recorre, adota uma conceção que colide com os princípios constitucionais da legalidade e tutela efetiva, assim como com o princípio da igualdade (substancial) das partes, da comparabilidade das propostas e da concorrência, que são princípios infraconstitucionais (ou legais) de grande importância e de vasta aplicação a nível da contratação pública; w) Ao colidir com estes princípios, um deles fundamental e estruturante na conformação da atuação dos Tribunais e da Administração Pública, os outros, fundamentais e estruturantes do próprio Estado de Direito, não só se confirma que estamos perante uma questão de importância fundamental, pela sua relevância jurídica, como também se observa que a admissão do recurso é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, isto é, uma que não colida com princípios fundamentais da República Portuguesa; x) O júri deu menor importância na análise das propostas ao requisito dos controlos antiterrorismo, nomeadamente as barreiras de proteção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado, pelo que, por apelo ao princípio do favor do concurso, todas as propostas foram consideradas como cumprindo esse requisito; y) Da sua interpretação autêntica do requisito do Caderno de Encargos, depreende-se que o júri queria sobretudo que a A... pudesse “acautelar que não fosse proposto um local especialmente vulnerável, eventualmente exposto à via pública, não concebido para o fim em vista, e em que um veículo pesado pudesse, depois de adquirir a velocidade necessária, invadir o centro de dados ou causar-lhe estragos de monta; z) A colocação de barreiras não era a única solução ou medida antiterrorista que se pedia aos concorrentes que apresentassem nas propostas, tanto que da análise do requisito resulta expressamente que se pedia que fosse evidenciado pelos concorrentes a existência de controlos antiterrorismo, “nomeadamente barreiras de proteção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado”; aa) Como esse foi o “erro grosseiro ou palmar sobre os respectivos pressupostos” imputado pelo Tribunal à deliberação do Júri do Concurso e que conduziu à anulação da adjudicação à proposta da D…, por não resultar da simples análise dos documentos constantes da proposta que cumpria com o determinado no artigo 7.2.4.7, alínea d) do Programa do Concurso, nem como o exigido na cláusula 34.3, REQ-B4, alínea d) do Caderno de Encargos, é necessário que a A... reanalise as propostas à luz do erro ostensivo indicado pelo Tribunal; bb) Acresce que não resulta provado dos autos que a C... cumpre esse requisito, pelo que o TCA Sul andou mal ao condenar a A... a adjudicar-lhe o contrato, inquinado o Acórdão recorrido por erro de direito; cc) Andou sentença a quo andou bem ao decidir que “identificada a invalidade do ato de adjudicação, não dispõe o Tribunal de condições para condenar a entidade demandada a praticar os atos necessários à graduação em primeiro lugar da autora, mas sim e apenas condenar a entidade demandada a retomar o procedimento ao momento em que é cometida a ilegalidade, isto é, ao momento em que o júri aprecia as propostas para apurar se são suscetíveis de adjudicação (operação de análise das propostas)”; dd) Não andou bem o Acórdão do TCA Sul ao julgar que “a A... adjudicou o Lote ... a uma proposta que merecia ser excluída, por apresentar termos ou condições que violavam aspetos da execução do contrato a celebrar não submetidos à concorrência, e que, por isso, foi justamente excluída. Donde, tendo a proposta da recorrente C... sido admitida e graduada em segundo lugar – e que, conforme resulta do ponto xii., aditado ao probatório, cumpria com o determinado no ponto 34.4 das cláusulas técnicas do Caderno de Encargos – REQ-B4 O edifício onde esteja inserido o centro de dados deverá apresentar as seguintes características: (…) d) Controlos antiterrorismo, nomeadamente barreiras de proteção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado – a única solução legalmente possível era adjudicar o contrato, relativamente àquele Lote ..., à proposta classificada imediatamente a seguir, ou seja, à recorrente C...” (destaque nosso); ee) Não resulta dos autos o que se escreveu no acórdão recorrido para fundamentar a decisão (ora posta em crise) de condenar a A... a adjudicar o contrato à C..., segundo a qual “conforme resulta do ponto xii., aditado ao probatório, (a C...) cumpria com o determinado no ponto 34.4 das cláusulas técnicas do Caderno de Encargos” e que “a única solução legalmente possível era adjudicar o contrato, relativamente àquele Lote ..., à proposta classificada imediatamente a seguir, ou seja, à recorrente C...” (cfr. ponto 36 do Acórdão, pp. 51 e 52); ff) Razão pela qual o Acórdão recorrido padece de erro de Direito e de facto que, por si só, invalidam a tese sufragada no mesmo, de que, nas circunstâncias do caso concreto, em vez de ser a A... a reanalisar as propostas, impunha-se o Tribunal condená-la a adjudicar o contrato para o Lote ... a uma proposta que, convenhamos, pouco ou nada difere da proposta da D… em relação aos controlos antiterrorismo; gg) Se assim não for, são os princípios da igualdade de tratamento e da concorrência que são postos automaticamente em xeque pelo Acórdão do TCA Sul que, pelos motivos expostos, decidiu mais do que a sentença do TAC de Lisboa, mas fê-lo com base em pressupostos que não têm qualquer confirmação no plano dos factos do processo e que, portanto, a inquinam juridicamente por erro de Direito. Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas, se roga que - a presente Revista seja admitida e seja julgada procedente, por provada; - o Acórdão do TCA Sul seja parcialmente revogado por, no julgamento realizado, padecer de erros de direito que o inquinam; - a A... seja condenada a retomar o procedimento ao momento em que é cometida a ilegalidade, isto é, ao momento em que o júri aprecia as propostas para apurar se são suscetíveis de adjudicação (operação de análise das propostas). […]».
D. A A... considerou que a proposta da D… cumpria as exigências técnicas palmadas no REQ-B4, cuja consagração foi operada pela Entidade Adjudicante mediante o emprego dos conceitos de "controlos antiterrorismo" e de "barreiras de proteção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo presado", convocando o exercício de poderes de discricionariedade técnica, pelo júri do procedimento, que não podiam ter sido plenamente reformulados pelo Tribunal o quo, conforme se verificou na decisão recorrida. E. Ao contrário do que entendeu o Tribunal o quo, a demonstração, pelos concorrentes, do cumprimento do aludido requisito deveria ser efetuada mediante a indicação expressa de evidências - não só, mas também fotográficas - da implementação de controlos antiterrorismo. F. Não pode proceder, com efeito, a tentativa de legitimação da ingerência do acórdão recorrido no exercício do poder de análise da proposta da D… com fundamento na autovinculação, pela A... às normas das peças do procedimento, porquanto as mesmas não procederam a uma integral redução da discricionariedade da Entidade Adjudicante. G. Pelo facto de o poder jurisdicional não dispor dos conhecimentos especializados que a concretização dos conceitos técnicos em apreço reclama, não podem os Tribunais substituir-se à Administração no exercício dos poderes discricionários a que aludem tais conceções, devendo cingir-se o controlo judicial ao plano do erro manifesto. H. O acórdão recorrido sustenta a legitimidade do julgamento proferido pelo Tribunal a quo num suposto erro grosseiro na admissão da proposta da D…, por a fotografia que consta da mesma para comprovar o cumprimento do requisito técnico REQ-B4 ilustrar cancelas que constituem "um condicionamento sobejamente insuficiente para suster ataques terroristas por via rodoviária". I. A este juízo subjaz inequivocamente, uma ingerência na margem de discricionariedade técnica da Administração, mediante uma inaceitável restrição do requisito técnico REQB4 à perentória imposição de efetivos obstáculos físicos que impeçam a passagem de veículos pesados, ignorando o enquadramento da consagração de tal requisito, a posição especializada dos destinatários da norma e, inclusive, a formulação das normas relevantes das peças procedimentais. J. O Tribunal o quo procede, ainda, a uma imposição restritiva, e sem correspondência nas peças do procedimento, dos elementos de comprovação do mencionado requisito apenas às evidências fotográficas, em completa desconsideração dos demais elementos textuais, da segunda fotografia constantes da proposta da Recorrente e, ainda, dos esclarecimentos relativos à proposta que foram obtidos pelo júri do procedimento mediante a visita ao local do doto center da Recorrente a que o mesmo procedeu. K. Em especial, não pode a Recorrente consentir com o afastamento, pela decisão recorrida, dos elementos recolhidos pelo júri do procedimento no contexto da visita mencionada, por a mesma ser imposta, atenta a complexidade e a especificada do objeto do contrato a celebrar, pelo princípio do inquisitório e, ademais, por ela ter sido consentida por todos os concorrentes (cujos centros de dados foram também visitados pela A...). L. As mencionadas ingerências do Tribunal no exercício de poderes próprios da A... enfermam o acórdão recorrido de um erro de julgamento, na parte em que mantém a anulação do ato de adjudicação, por violação do princípio da separação de poderes, que impõem a sua revogação. M. Sem conceder quanto ao exposto, a violação do princípio da separação de poderes é ainda mais flagrante na parte do acórdão recorrido que condena a A... a adjudicar a proposta da C.... N. Quanto a esta, a decisão recorrida assenta no inaceitável pressuposto de que o ato de adjudicação da proposta graduada em segundo lugar é única solução legalmente possível, devido ao aproveitamento, operado pelo Tribunal o quo, da decisão de adjudicação (abstratamente considerada) e da decisão de admissão e de graduação em segundo lugar da proposta da C..., das quais aquele Tribunal extraiu, com o devido respeito, indevidamente, verdadeiras (auto)vinculações para a Entidade Adjudicante. O. Sucede que estas decisões, ínsitas no ato de adjudicação, apenas poderiam permanecer intactas à ilegalidade assacada pelo acórdão recorrido à admissão da proposta da D…, se os parâmetros mobilizados pela A... para concretizar os conceitos técnicos concretamente relevantes para admitir a proposta da D… não tivessem influenciado aquelas decisões e, em especial, a decisão de admissão da proposta da C... para o Lote .... P. Com efeito, a decisão de condenação incorre num hiato lógico, por pressupor de forma irrazoável o cumprimento daquele pressuposto (de resistência das demais decisões presentes no ato de adjudicação à ilegalidade declarada), sendo a apreciação das dessas decisões alheia ao objeto do presente litígio e correspondendo, uma vez mais, a um poder próprio da A... que não poderá ser concretizado pelo poder jurisdicional, conforme sucederá com a condenação de que se recorre. Q. À decisão de adjudicação que é pressuposta pela Entidade Adjudicante contrapõe-se o poder de não adjudicar que, embora obedeça a um numerus clausus, previsto no artigo 79.º do CCP, remete para um verdadeiro poder discricionário, associado ao preenchimento de conceitos vagos e indeterminados que convocam um juízo de conveniência que jamais cuja reanálise jamais pode ser afastada pelo Tribunal o quo, por ser por de mais evidente que os pressupostos da anterior decisão de adjudicação foram derrubados pela anulação do ato de adjudicação. R. Por outro lado, tendo a proposta da C... sido admitida por aplicação de uma interpretação do conceito técnico constante do requisito REQ-B4 manifestamente mais ampla, conforme resulta das considerações formuladas pelo júri no relatório final e por imposição do princípio da igualdade de tratamento, é inquestionável que essa decisão não se compadece com os parâmetros decisórios que são impostos pelo acórdão recorrido, mediante a condenação de exclusão da proposta da D… S. Não procedendo, com efeito, a tese de que a decisão de admissão da proposta da C... não é prejudicada pela ilegalidade assacada pelo Tribunal recorrido ao ato de adjudicação, pois aquela proposta foi apreciada atendendo aos mesmos critérios a que foi sujeita a decisão de admissão da proposta da Recorrente, que foi anulada pelo Tribunal o quo. T. Esta suposição do Tribunal Central Administrativo Sul ignora, ademais, que do ponto do probatório para o qual remete a fundamentação da decisão não resulta que a proposta da Recorrida cumpriu o REQ-B4, mas tão-somente que a C... fez constar da sua proposta uma fotografia com a finalidade de ilustrar as aludidas barreiras de controlo à tentativa de invasões terroristas (aliás, à semelhança do que fez a D…), nada se estatuindo quanto à idoneidade dos mecanismos ilustrados para a finalidade tutelada pelo REQ-B4. U. Não pode, pois, a Recorrente aceitar que o Tribunal o quo, mediante a condenação da A... a adjudicar a proposta da C..., consinta com uma intolerável violação do princípio da igualdade de tratamento dos concorrentes, por proceder e ordenar a aplicação à proposto do D… de parâmetros de decisão mais restritivos e exigentes daqueles o que, o final, será sujeito o proposto do Recorrido C…, o que sempre conduziria à prático de um ato administrativo ilegal. V. Embora a Recorrente não ignore que a decisão proferida pelo Tribunal o quo se alicerça em decisões do Supremo Tribunal Administrativo aparentemente semelhantes, conforme destacado, importa realçar que esta jurisprudência não pode ser aplicada ao presente caso, por dele diferir no que concerne aos poderes administrativos que foram objeto de controlo pelo poder jurisdicional para determinar a ilegalidade da exclusão da proposta inicialmente adjudicada. W. Ao contrário do sucedido nas aludidas decisões deste douto Supremo Tribunal, no litígio sub judice a exclusão da proposta da D…, sem conceder quanto à censura desta decisão, não foi considerada imposta pelo Tribunal o quo com fundamento no controlo do exercício de poderes da Entidade Adjudicante estritamente vinculados, antes interferindo, em certa medida, com a discricionariedade técnica de que a A... dispunha relativamente à verificação do requisito REQ-B4. X. Não pode, pois, proceder a convicção do Tribunal o quo de que, perante a anulação do ato de adjudicação (sem conceder quanto ao erro de julgamento de que padece esta decisão) existe uma "única solução legalmente possível", não se encontrando preenchidos os imperativos requisitos do artigo 71.º, n.º 2, do CPTA. Y. Tudo concorrendo para que a decisão recorrida incorra num erro grosseiro de julgamento, devendo para o efeito, ser revogada e substituída por outra que julgue o presente recurso totalmente procedente. Z. PEDIDO DE DISPENSA DO REMANESCENTE A norma do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais determina que o remanescente da taxa de justiça é considerado no conto o final, solvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de formo fundamentado, atendendo designadamente à conduto processual dos portes, dispensar o pagamento. No caso dos autos, tendo em conta a conduta das partes e, ainda, o facto de não ter sido realizado julgamento, nem sido suscitadas questões incidentais de que o Tribunal tivesse de tomar conhecimento e tendo, ainda, o processo corrido os seus normais trâmites, sem prejuízo dos recursos interpostos, será de considerar a dispensa do pagamento. Nestes termos, requer-se, ao abrigo do artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais, a dispensa do pagamento do remanescente que possa eventualmente vir a ser considerado nestes autos. Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deverá o presente recurso de revista ser admitido e julgado totalmente procedente, com todas as consequências legais, designadamente, determinando-se a revogação do acórdão recorrido. Mais se requer, nos termos expostos e caso se entenda aplicável a esta acção, a dispensa do pagamento do remanescente das taxas de justiça que possa ser devido. […]».
I. Não merecem provimento os recursos interpostos pela Entidade Demandada A... e a Contra-Interessada D…, desde logo porque as questões trazidas a este Venerando Tribunal não cumprem o exigido no art.º 150.º do CPTA para poderem ser apreciadas em sede de revista. II. Acresce que é manifesto que a D… na sua proposta ao Lote ... não deu cumprimento ao exigido no Programa, verificando-se por quanto ali foi evidenciado que o Caderno de Encargos é violado. III. Na verdade, pedindo-se no Programa evidências nas propostas para o cumprimento do REQ-B4, nomeadamente em relação a “controlos antiterrorismo, nomeadamente barreiras de protecção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado”, a D… limitou-se a apresentar uma fotografia da portaria das instalações, cujos únicos obstáculos à circulação são umas cancelas amovíveis. IV. Como acima se alegou e o próprio Júri do Concurso o confirmou, pretender apresentar tais cancelas para cumprimento daquele requisito do Caderno de Encargos é risível. V. Pelo que, nos termos do previsto no art.º 70.º, n.º, 2, alíneas a) e b), do CCP, a proposta da D… nunca devia ter sido admitida, pelo que muito bem esteve o Tribunal a quo em determinar a sua exclusão. VI. Por fim, deve a decisão ser mantida na parte em que condena a A... a adjudicar a proposta da C... como foi pedido. VII. Na verdade, resultando a C... como a melhor classificada no Lote ... por força da exclusão da proposta da D…, a decisão de adjudicação em seu favor resulta num acto vinculado, sendo desnecessário que o processo retorne às mãos da A... para outras diligências prévias. VIII. A A... teve já ocasião de analisar e avaliar a proposta da C..., cuja validade nunca foi devidamente impugnada ou posta em causa, seja pela A... seja pela D… IX. Assim, nos termos previstos no art.º 71.º do CPTA, em consequência da anulação da proposta da D…, nada mais resta que adjudicar em favor da C..., pelo que se requer a este Tribunal Superior que determine, dentro dos seus poderes e competências, a condenação da A... em adjudicar a proposta da C..., seguindo-se os demais termos do procedimento concursal de acordo com a Lei. […]».
«[…] “(…) 13. E, por se revelar essencial para a apreciação do mérito do recurso subordinado interposto pela autora “C..., SA”, adita-se ao probatório o seguinte facto: xii) Para demonstrar o cumprimento do ponto 34.4 das cláusulas técnicas do Caderno de Encargos – REQ-B4 O edifício onde esteja inserido o centro de dados deverá apresentar as seguintes características: (…) d) Controlos antiterrorismo, nomeadamente barreiras de protecção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado – a proposta da “C..., SA” tinha o seguinte conteúdo:
• Controlos antiterrorismo [IMAGEM] Figura 8 - Barreiras de Proteção no Acesso ao Edifício • Duas caixas de acesso para cada operador de telecomunicações, com dois caminhos distintos: [IMAGEM] Figura 9 - Caixa de Acesso a Operador (Caixa 1)
[…]».
2. De Direito 2.1. As questões que vêm suscitadas nos dois recursos de revista aqui em apreço carecem de um prévio enquadramento. Assim, lembramos que o litígio se reporta ao concurso público aberto pela A... para aquisição de “prestação de serviços de rede de dados distribuída (Lote ...) e centros de dados secundários (Lote ...)”. De acordo com a análise e graduação das propostas efectuadas pelo júri do concurso, nenhuma proposta foi excluída, tendo sido formulada uma graduação para o Lote ... em que a D… ficou em primeiro lugar, seguida da B... (2.º lugar) e da C... (3.º lugar), e uma graduação para o Lote ... em que a D… ficou também em primeiro lugar, seguida da C... (2.º lugar) e da B... (3.º lugar). Em face desta proposta do júri, o contrato dos dois lotes foi adjudicado à D…. A C... não se conformou com o resultado e propôs uma acção urgente de contencioso pré-contratual na qual alegava que o acto de adjudicação enfermava de diversas ilegalidades − a saber: i) a proposta da D… deveria de ter sido excluída do Lote ... por expressamente se escusar a cumprir os termos e condições do CE; ii) a proposta da B... deveria igualmente ter sido excluída do Lote ... por falhas graves; iii) a proposta da D… para o Lote ... deveria de ser excluída por não cumprir um requisito técnico (o REQ-B4), que era o de não apresentar evidências (nomeadamente fotografias) de que o edifício onde iria ser instalado o centro dispunha de “controlos antiterrorismo, nomeadamente barreiras de protecção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado”; iv) a proposta da B... para o Lote ... deveria igualmente ser excluída por falhas graves – e, como tal, tinha de ser anulado, assim como os actos subsequentes do mesmo, e requeria ainda que o Tribunal condenasse a A... a adjudicar-lhe o contrato. O TAC de Lisboa, por sentença de 18.04.2022, julgou improcedentes as alegadas ilegalidades referentes ao Lote ... e julgou procedente a acção na parte referente ao Lote ..., considerando que a proposta apresentada pela D… não podia ter sido aceite, sustentando essa decisão nos seguintes argumentos: i) “[...] Face à imagem fotográfica patenteada na proposta da D…, resta concluir que não ficou evidenciado que os acessos ao edifício indicado estão providos dos obstáculos ou barreiras de cariz antiterrorista, sendo as cancelas um condicionamento sobejamente insuficiente para suster ataques terroristas por via rodoviária [...]”; ii) “[...] as impressões captadas por elementos do Júri em visita ao local, acerca das caraterísticas e configuração das acessibilidades, não podem relevar no juízo sobre o cumprimento deste requisito, que se prende unicamente com as evidências contidas nas propostas [...]”. A sentença concluiu também pela improcedência do pedido de condenação da A... a graduar a A. em primeiro lugar e adjudicar-lhe o Lote ... por “não dispor de condições para o efeito”, limitando-se a condenar a Entidade Demandada a “retomar o procedimento ao momento em que é cometida a ilegalidade”. Desta decisão, na parte em que julgou procedente a ilegalidade do acto de adjudicação do Lote ... por não ter excluído a proposta da D…, recorreram para o TCA Sul a D… e a A... tendo a C... apresentado recurso subordinado relativo à parte em que fora julgado improcedente o pedido de condenação da A... a adjudicar-lhe aquele Lote .... O TCA Sul julgou improcedentes os recursos principais, sustentando que “[...] tendo o júri considerado, em manifesto e palmar erro, que a proposta da D… cumpria com o exigido no artigo 7.2.4.7, alínea d) do Programa do Concurso e com o exigido na cláusula 34.3, REQ-B4, alínea d) do Caderno de Encargos, é manifesto que a sentença recorrida não incorreu no apontado erro de julgamento de direito, não se tendo substituído à entidade adjudicante em momentos de discricionariedade ou de exercício de poderes discricionários, improcedendo desta forma todas as conclusões da alegação da recorrente D… e da recorrente A... [...]” e julgou procedente o recurso subordinado, condenando a A... a adjudicar o dito Lote ... à C.... É esta decisão que agora está sob escrutínio por efeito dos recursos de revista interpostos pela D… e pela A... para se apurar o seguinte: - primeiro, se existe ou não erro de julgamento da decisão recorrida por errada interpretação e aplicação do direito na determinação de um erro manifesto no contexto do exercício dos poderes de avaliação (poderes discricionários) pelo júri do concurso no âmbito da apreciação do REQ-B4, ao qualificar a proposta apresentada pela D… como “em manifesta contradição com as regras do concurso a respeito da execução do contrato” e, por isso, como “tendo de ser excluída do concurso” – questão suscitada no recurso interposto pela D…; - segundo, se existe ou não um erro de julgamemto da decisão recorrida ao julgar procedente o recurso subordinado e condenar a A... a adjudicar o Lote ... à C... – questão suscitada nos dois recursos.
2.2. Quanto ao erro de julgamento a respeito do controlo do exercício do poder discricionário do júri na avaliação das propostas.
2.2.1. A Recorrente alega que o Tribunal a quo, ao manter o decidido pelo TAC de Lisboa, erra na aplicação das regras e princípios que disciplinam o controlo da actividade administrativa discricionária, acabando mesmo por se substituir a um juízo que é funcionalmente administrativo e, nessa medida, por produzir uma decisão que extrapola os poderes judicativos. Está em causa, no essencial, saber se as Instâncias podem afirmar que existe um erro grosseiro no juízo formulado pelo júri e homologado pela Entidade Demandante a respeito da verificação dos requisitos concursais (no caso, o requisito regulamentar por estar inscrito na alínea b do ponto REQ-B4 do CE) ao considerar que a proposta da D… cumpre os “controlos antiterrorismo, nomeadamente barreiras de protecção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado”, um juízo efectuada com base na foto apresentada, em que é visível a existência de uma cancela com barreiras horizontais (ponto 5 da matéria de facto) controlada por uma portaria para acesso ao edifício. No entender das Instâncias, este juízo consubstancia um erro grosseiro, por ser evidente que “as cancelas [são] um condicionamento sobejamente insuficiente para suster ataques terroristas por via rodoviária” e, por isso, a proposta teria de ter sido excluída, uma vez que não contempla “barreiras de protecção no acesso ao edifício que resistam à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado”, ou seja, por entender que as barreiras teriam de ter outro tipo de material e de “robustez”. A Recorrente D… não se conforma com a decisão e alega que as Instâncias extrapolaram a sua função e que não têm razão ao alegar que as conclusões decorrentes da inspecção ao local efectuada pelos elementos do júri não podem ser tomadas em consideração, sob pena de violação das regras e dos princípios do direito da concorrência. E tem razão. Vejamos. O requisito regulamentar relativo à “segurança do edifício onde é instalado o centro de dados” e cujo cumprimento dos requisitos concursais pela proposta apresentada pela D… está aqui em apreço não repousa sobre um conceito técnico de segurança antiterrorismo, nem sobre uma determinada tipologia técnica e material das barreiras exigidas, pois às empresas que se apresentaram ao concurso não foi exigido nenhum documento ou certificado técnico, nem um “projecto” subscrito por técnicos ou com elementos técnicos, apenas se exigia que comprovassem, por evidência com imagens, que o edifício dispunha de segurança contra aquele tipo de riscos, incluindo que dispusesse de barreiras protecção no acesso ao edifício que resistissem à tentativa de entrada forçada de um veículo pesado. Cumpre assentar duas premissas. A primeira, que estamos perante um requisito da “tipologia de segurança antiterrorismo do edifício” que é exigida aos proponentes e não perante uma exigência com características físicas expressas do tipo de defesa antiterrorismo que a barreira há-de ter no impedimento da entrada forçada do veículo pesado, o que neutraliza e torna irrazoável a argumentação em que repousa a tese das Instâncias para concluir que a proposta da D… teria de ser excluída nos termos do disposto no artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP, por o tipo de segurança do edifício que é apresentado naquela proposta não ser apto a travar fisicamente um embate de um veículo pesado. É que o que tem de resistir ao acto terrorista é o edifício e a zona onde está o equipamento sensível, não é a barreira. A segunda, que, inexistindo a respeito daquela exigência qualquer obrigação de certificação técnica ou de serviços técnicos de segurança quanto à tipologia da protecção antiterrorismo, o juízo sobre a adequação das propostas ao critério regulamentar fixado é um juízo de avaliação administrativa (discricionário) e, por isso, com especiais limitações funcionais à sua perscrutação no âmbito do poder de controlo ou fiscalização judicial. Assim, o poder de controlo jurisdicional a respeito da decisão de não rejeitar a proposta da D… com o fundamento de que a mesma se adequava ao teor do requisito previsto no caderno de encargos não pode assentar numa avaliação pelo Tribunal daquela adequação funcional segundo pressupostos ou características materiais não expressamente descritas nas peças processuais, pois o juízo de adequação aqui pressuposto é de mérito e de natureza administrativa. O juízo das Instâncias teria de ater-se à fiscalização da conformidade jurídica do juízo de avaliação funcional efectuado pelo júri do concurso e pela entidade adjudicante (perscrutado pelos princípios do direito administrativo). E, nesta medida, compreende-se que o mesmo não se ateve a estes limites. Primeiro, qualificou-o como erro grosseiro de avaliação, mas, nesta parte, é o juízo das Instâncias que incorre num erro sobre os pressupostos jurídicos, pois partiu do pressuposto (não indicado na documentação do concurso) de que uma certa tipologia de obstáculos físicos aptos a travar um veículo rodoviário constituía uma exigência do caderno de encargos com determinadas qualidades materiais e técnicas, quando aquela exigência se inscrevia no âmbito de um controlo antiterrorismo, em que a aptidão funcional das barreiras ficava sujeita a um juízo administrativo. Segundo, considerando que a “visita” pelos membros do júri aos edifícios contemplados nas propostas dos concorrentes constituía uma violação das regras procedimentais, pondo em causa o princípio da concorrência, ignorando que aquela visita era adequada à formação do juízo de avaliação sobre a “aptidão dos edifícios” em matéria de garantia do requisito dos controlos antiterrorismo, que, além do mais, não se limitavam à protecção contra embates de veículos pesados rodoviários – este era um requisito, mas não o único. Terceiro, desconsiderando a fundamentação apresentada pelo júri para sustentar a decisão e apresentando outra em que o Tribunal, substituindo-se à avaliação do júri, entendia dar como desadequada a funcionalidade das medidas (das barreiras) constantes da proposta da D… e, com esse fundamento, impor a exclusão da mesma ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, al. b) do CCP. Algo que não se pode manter. Efectivamente, como defende a Recorrente, não é correcta a decisão de considerar que houve um erro grosseiro do júri na avaliação da proposta da D… a respeito do requisito da existência de controlos antiterrorismo. A decisão do júri que sustenta o cumprimento pela proposta apresentada pela D… do requisito REQ-B4 não se afigura manifestamente errada quando, a partir das fotografias de um edifício no qual são visíveis restrições de acesso com barreiras, considera que essas barreiras são adequadas aos objectivos fixados no caderno de encargos a respeito da existência de medidas antiterrorismo. E no âmbito de um controlo fiscalizador não dispomos de elementos para sustentar a invalidade daquele juízo, pois é do senso comum que um edifício em relação ao qual não existe livre acesso a partir da via pública, sendo necessária uma identificação à entrada e o “levantamento de uma barreira”, é apto a cumprir a finalidade de assegurar um meio de protecção contra actos terroristas, cabendo à entidade administrativa apreciar se o nível de protecção deste “tipo de barreira” é adequado aos fins visados, incluindo possíveis entradas forçadas de veículos pesados, e fundamentar essa decisão. O que no caso também se verifica, pois a entidade administrativa sustenta que o nível de protecção é adequado e que, pelas características de localização do imóvel (pela sua vinculação situacional), ele cumpre totalmente a capacidade de “resistir a uma entrada forçada de um veículo pesado”, uma vez que não é verosímil que um tal tipo de veículo consiga abalroá-lo, mesmo com aquela tipologia de barreiras físicas, equiparando esta solução à de outras propostas que dispõem de outra tipologia de barreiras. Ora, tal é suficiente para que, em sede de controlo judicial, se tenha de ter por preenchido o cumprimento daquela exigência concursal e, consequentemente, revogar a decisão do TCA na parte em que, secundando a decisão do TAC, concluíra pela exclusão da proposta apresentada pela D… .
2.2.2. Ao revogar a decisão recorrida, na parte em que esta decidiu manter a exclusão da proposta da D…, há que revogar igualmente a decisão recorrida na parte respeitante à adjudicação do Lote ... à C.... Com efeito, mantendo-se a proposta da D… que fora ordenada em primeiro lugar, perde qualquer utilidade a apreciação da segunda questão formulada no recurso de revista apresentado pela D…, assim como a questão formulada no recurso interposto pela A... a respeito da conformidade jurídica de ordenar a adjudicação do Lote ... à C..., cuja proposta ficara ordenada em segundo lugar.
III – Decisão Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo em conceder provimento ao recurso da D…, revogar o acórdão recorrido e parcialmente a sentença do TAC de Lisboa, julgando improcedente a acção quanto à impugnação do acto de adjudicação do Lote ... à D…, considerando ainda prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas no recurso de revista interposto pela D…, bem como o recurso de revista interposto pela A.... |