Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0113/19.5BCLSB
Data do Acordão:02/04/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MARIA BENEDITA URBANO
Descritores:REFORMA DE ACÓRDÃO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P27138
Nº do Documento:SA1202102040113/19
Data de Entrada:10/15/2020
Recorrente:FEDERAÇÃO PORTUGUESA DE FUTEBOL
Recorrido 1:A..........
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

I – RELATÓRIO

1. A………., devidamente identificado nos autos, vem apresentar reclamação, a “ser apreciada em conferência”, do acórdão de 03.12.2020 proferido por esta Secção de Contencioso Administrativo do STA. Para fundar a sua pretensão, convoca os artigos 616.º, n.º 2, al. a) e b), 666.º e 685.º, aplicáveis ex vi do artigo 1.º do CPTA.

2. Alega o aqui reclamante, de forma genérica, que a decisão recorrida é “verdadeiramente injusta” e “desfasada da realidade material, e atual, dos factos, perigando assim a correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto”.
De forma concreta, argumenta que a decisão recorrida “incorreu em errada qualificação jurídica dos factos, sem olvidar os documentos e outros elementos de prova que só por si implicam decisão diversa da recorrida”.
A final formula o seguinte pedido:

Nestes termos, e nos melhores de direito, requer-se a V. Exas, que se dignem, em função dos elementos supra expostos, a permitir a reclamação para a conferência, reformando a decisão reclamada na parte aqui impugnada, mais ordenando a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do disposto no artigo 277º, al. e), do CPC, ex vi 1 do CPTA, assim se fazendo a costumada e boa JUSTIÇA”.

3. A aqui reclamada começa por dar conta de que não se aplica aqui a figura da “reclamação para a conferência”. Acresce a isso que, dados os preceitos convocados, o que o reclamante pretende verdadeiramente é uma reforma do acórdão. Conclui no sentido de que não se verifica nenhuma das situações que servem de fundamento a um pedido de reforma de sentença – sem deixar de salientar que “O Reclamante vem juntar, nesta sede, extemporaneamente, alegações e documentos, documentos esses que não constam do processo e que, obviamente, não estiveram na base da decisão” –, daí pugnando pelo indeferimento da reclamação.

Cumpre apreciar e decidir. Antes apenas duas decisões prévias.
Atendendo a que o pedido formulado se sustenta no preceito do CPC relativo à reforma da sentença, será o mesmo entendido como um pedido de reforma e não como uma reclamação, menos ainda como uma reclamação para a conferência.
As alegações do reclamante não terão sido inicialmente inseridas no SITAF. Compulsados os autos, verifica-se que as mesmas foram apresentadas em tempo e foram notificadas à outra parte, pelo que são admitidas.

4. Comecemos por uma sintética apresentação da tese do reclamante e dos argumentos em que funda esta, erradamente qualificada, reclamação para a conferência.

1) O ora reclamante apenas queria ser reintegrado;
2) Este tribunal, no acórdão de que se reclama, disse ser impossível essa reintegração;
3) A FPF, ora reclamada, através do Comunicado Oficial n.º 58 do Conselho de Arbitragem da FPF, datado de 04.09.2020, reintegrou o reclamante na lista de árbitros de categoria C1;
4) Trata-se, aquele último, de acto administrativo que revogou implicitamente a deliberação de 28.07.2018 “que impediu a reintegração do reclamante”;
5) O STA errou porque negligenciou “a revogação implícita do ato administrativo impugnado”;
6) Em virtude dessa revogação implícita, deve a instância ser extinta por inutilidade superveniente da lide, sendo que, com a reintegração, foi reconstituída a situação actual hipotética;
7) O acórdão reclamado deve ser alterado com vista a proceder à correcta qualificação jurídica dos factos e à adequada interpretação e aplicação do direito.

Atentemos em algumas das alegações constantes do seu arrazoado argumentativo:

O aqui reclamante apenas pugnou pela reintegração e “até vê agora a sua posição jurídica reforçada, isto porque na presente época desportiva o Conselho de Arbitragem da FPF procedeu à REINTEGRAÇÃO do reclamante na Categoria C1 da arbitragem. E não o fez à condição, ou com caráter temporário, ou por efeitos da avaliação da atuação do reclamante, enquanto árbitro desportivo, na época desportiva 2019/2020.

O texto do Acórdão do STA, aqui reclamado, é lapidar no sentido de considerar que não seria possível reintegrar o reclamante na categoria C1 da Arbitragem.
(…)
Não obstante, surgiu uma questão pertinente, que radica do facto do reclamante já ter sido efetivamente reintegrado.

Essa reintegração demonstra que nada é impossível, e demonstra que o mais justo, coerente e pacífico é o restabelecimento da situação que o reclamante tinha à data do ato ilegal, com a reconstituição da situação que o mesmo teria se o ato não tivesse sido praticado.

Foi isso que a FPF, por livre e espontânea vontade, fez.

De facto, conforme Comunicado N.º 58, com data de 04/09/2020, o Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol comunicou a instituição da Lista de Árbitros C1 de futebol para a época 2020/2021 – Cfr. Doc. 1.

De acordo com essa lista, foi o árbitro, aqui reclamante, A…………, reintegrado no quadro C1 da Federação Portuguesa de Futebol. – Doc. 1”.

Mais informa o reclamante que, na sequência da dita reintegração, foi chamado a realizar provas físicas, acções de reciclagem e aperfeiçoamento, exames médicos, enviou registo de interesses, etc., tendo já arbitrado jogos da presente época desportiva como árbitro C1.

Sendo certo que, não obstante o Acórdão proferido pelo STA, regularmente notificado à Federação Portuguesa de Futebol, já foi o aqui requerente notificado, a 8 de Dezembro de 2020, para mais sessões de formação. – Doc. 7.

Posto isto:

O que verificamos, na verdade, é que com a reintegração do árbitro, a própria reclamada Federação Portuguesa de Futebol veio proceder à revogação, ainda que implícita, do ato administrativo consubstanciado na deliberação de 28 de Julho de 2018.

Repita-se que a deliberação do CA da FPF, de 28 de Julho de 2018, é o tal ato administrativo que deu causa aos presentes autos e que impediu a reintegração do reclamante, na medida em que a Lista de Árbitros C1 de futebol colocava de fora o árbitro A………..

Ilegalidade que foi sanada com a publicação do Comunicado Oficial N.º 58, com data de 04/09/2020. – Cfr. Doc. 1.

Nestes termos, é patente a sucessão de atos administrativos e que culminaram na reintegração do reclamante na categoria C! da Arbitragem.

Atos esses que contrariam materialmente e substancialmente o decidido no âmbito do Acórdão do STA.

Ora, no caso concreto, entende o reclamante que a Administração errou substancialmente quando decidiu não o reintegrar.

Sucede, porém, que, como se viu, o procedimento administrativo, por impulsão do mesmo autor do ato administrativo impugnado, haveria de prosseguir os seus termos para a reintegração real e efetiva do reclamante na principal categoria de arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol, reintegração esta já executada, a qual até já culminou com a nomeação e realização de jogos”.

Houve “uma verdadeira revogação, isto porque o CA da FCP praticou um novo ato administrativo corrigindo e sanando um erro contido em ato anterior, o qual não era, nem é, de cálculo nem de escrita e que não podia ser detetado pela análise da própria declaração ou das circunstâncias que a rodearam” e foram praticados actos administrativos que “contrariam completamente a deliberação da CA da FPF e o próprio Acórdão do STA”.

Mais adiante reafirmou que “o CA da FPF alterou o conteúdo do ato administrativo anterior”.

Mais adiante, “À luz de toda esta principiologia, o que se passou no caso concreto, é que o procedimento administrativo que culminou na reintegração do reclamante, com a deliberação de 28 de Julho de 2018, foi afinal alterado”.

Neste enquadramento, tal como a recorrente sempre alegou, a própria veio reconhecer que a correta interpretação do artigo 173.º do CPTA é aquela que nos diz que a anulação da deliberação do CA da FPF é possível, ficando destruídos os efeitos do ato por imposição do artigo 165º, n.º 2 do CPA e ficando automaticamente reconstituída «a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado», a que se refere o artigo 173º, n.º 1 do CPTA”.

Ficando ainda comprovado que não existia, como não existe, qualquer obstáculo que perturbe o funcionamento da arbitragem por ser reintegrado um árbitro”.

Mais, se o STA entendeu que ordenar judicialmente a reintegração do reclamante seria imiscuir-se no poder discricionário da Administração, então agora já não subsistem razões para que se mantenha esse entendimento, pois a Administração já reintegrou o reclamante…
Se o reclamante foi reintegrado, já não existe, como aliás nunca existiu, qualquer situação de impossibilidade absoluta de executar a pretensão do Reclamante”.

Assim, errou ao STA ao decidir como decidiu, negligenciando a revogação implícita do ato administrativo impugnado, e já supra melhor descrita.

Por sequela, tendo ocorrido a revogação implícita do ato administrativo impugnado, deve a presente instância ser extinta por inutilidade superveniente da lide, isto porque se atingiu o objetivo ou efeito útil pretendido com a propositura da ação”.

Ou seja, a instância extingue-se por inutilidade superveniente da lide, quando uma ocorrência processual torna a instância desnecessária.
E parece claro que o exemplo mais flagrante de inutilidade superveniente da lide ocorre quando o fim pretendido com a demanda é alcançado na pendência da causa”.

Sucede, porém, que com os atos administrativos entretanto prolatados pela própria reclamada, os quais já foram devidamente identificados supra, foram suprimidos ou revogados implicitamente os efeitos negativos da deliberação do Conselho de Arbitragem da FPF de 28.7.2018 e, assim, foi reconstituída a situação atual hipotética, procedendo o Conselho de Arbitragem da FPF à reintegração do reclamante na categoria C1 (primeira categoria de árbitros), categoria na qual o mesmo sempre estaria integrado se não tivesse sido proferida tal deliberação da qual resultou a sua despromoção”.
Ou seja, se o interesse do reclamante com a presente lide era o da reintegração, então ele deixou de subsistir a partir do momento em que a Administração, por força do seu poder administrativo, e através da revogação implícita do ato anterior, decidiu reintegrá-lo”.

O Acórdão reclamado deve ser alterado no sentido de proceder à correta qualificação jurídica dos factos e adequada interpretação e aplicação do direito ao caso concreto”.

4. A tese do reclamante, que sustenta o peticionado, assenta numa premissa materializada em duas deturpações da realidade tão gritantes que raiam a violação, por parte daquele, do dever de boa fé processual e do princípio da cooperação com vista à obtenção, “com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio” (arts. 7.º e 8.º do CPC aplicáveis ex vi do artigo 1.º).
Em primeiro lugar, o reclamante argumenta que sempre quis apenas a sua reintegração e não, v.g., a obtenção de nova classificação. Efectivamente, o ora reclamante reconheceu que já não era possível obter nova classificação, pelo que pretendia continuar, na época desportiva de 2018/2019, com a categoria de árbitro C1 (ou, o que leva ao mesmo, pretendia não ser despromovido ou descer de categoria) – categoria com que arbitrou na época desportiva de 2017/2018, em virtude da sua prestação na época desportiva anterior (a de 2016/2017). E é isto que o reclamante convenientemente omite: ao recorrer aos tribunais, o ora reclamante pretendia não ser despromovido da categoria de árbitro C1 e manter essa categoria para a época desportiva de 2018/2019 – e não para época desportiva de 2020/2021 ou para todo o sempre. Atentemos, por exemplo:
(i) Nos pedidos formulados no recurso para o TAD: “c) Não sendo possível praticar um ato ilegal que determine a baixa de categoria, o recorrente permanece na categoria em que se encontrava”;
(ii) Na conclusão 13.ª das suas alegações de recurso para o TCAS:
“13º Por sua vez, e pelos fundamentos que já se acharam transcritos no presente recurso, o entendimento sufragado maioritariamente pelo Colégio Arbitral do TAD foi o de que existe uma "uma situação de impossibilidade absoluta" que obsta à satisfação da pretensão do demandante de integração nos quadros de árbitro assistentes da categoria AAC1 para a época desportiva de 2018/2019”.
(iii) Na fundamentação do acórdão do TCAS:

“Por outro lado, é também possível satisfazer o interesse que o Recorrente pretende ver assegurado, que é não baixar de categoria.

Com efeito, como ressalta da petição de recurso, ao contrário do que se inferiu no acórdão, o Recorrente não está preocupado em obter determinada classificação com base num critério legal, ou ser classificado por um critério alternativo atempadamente divulgado, que ele próprio afirma não existir, mas sim não baixar de categoria. O que o Recorrente pretende, no essencial, é «a completa execução do decidido, desde logo determinando que requerente é Árbitro C1», como expressamente refere na petição, identificando o acto que impugna como sendo o que «não integra o recorrente nos quadros de árbitros da categoria C1 para a época desportiva 2018/2019»”.

(iv) Nas contra-alegações para o STA:
“51ª Com efeito, a classificação do recorrido relativa à época de 2017/2018 não se pode efetuar de forma válida, face ao vício que está na origem da invalidade da deliberação do Conselho de Arbitragem da FPF de 28.7.2018 (o critério classificativo criado pelo Conselho de Arbitragem não foi publicitado a tempo, isto é, antes da realização dos jogos) – ou seja, não se pode voltar atrás no tempo e fazer a divulgação atempada do critério classificativo –, mas o recorrido poderá ser avaliado após ser reintegrado, conforme explicitado no parágrafo anterior, razão pela qual é possível executar a decisão judicial que viesse a anular a referida deliberação de 28.7.2018, isto é, não se verifica qualquer impossibilidade absoluta na execução dessa decisão judicial”.
60ª Por conseguinte, como não há limite legal quanto ao número de árbitros da categoria em causa, inexiste qualquer obstáculo a que tal se concretize. Assim ficando o número de árbitros ampliado em relação à época anterior, por terem ocorrido igualmente subidas de categoria”.
“71ª De facto, como se disse supra, ainda no ano/época 2018/2019 já existiram reintegrações com a época em curso, isto porque nesta época 2018/2019, existindo árbitros que tinham título jurídico de outra categoria e foram integrados em outra categoria (Doc. 8, junto com a p.i. de recurso no TAD).
72ª Assim, a recorrente volta a isolar a situação do Recorrido face à dos demais árbitros, quando, na realidade, as situações têm todas de ser encaradas conjuntamente. Isto porque a razão pela qual foi anulada a classificação atribuída ao Recorrido afeta também os outros árbitros”.

Em segundo lugar, afirma o reclamante que com o já citado Comunicado Oficial n.º 58 do Conselho de Arbitragem da FPF, através do qual se comunicou a constituição da lista de Árbitros C1 para a época desportiva 2020/2021, a FPF ‘reintegrou’ o árbitro, tal como este pretendia, omitindo o facto de que a atribuição de uma determinada categoria tem que ver com a avaliação ou classificação do árbitro na época anterior. Ou seja, uma coisa é a categoria obtida para a época de 2018/2019 na sequência da avaliação/classificação na época desportiva 2017/2018 (conjugada com um número limitado de vagas na categoria em causa), e outra coisa é categoria obtida para a época de 2020/2021 na sequência da avaliação/classificação na época desportiva 2019/2020. Ora, o reclamante sustenta que com essa lista dos árbitros de categoria C1 para época de 2020/2021 a reclamada corrigiu o conteúdo do acto administrativo impugnado, o que não corresponde minimamente à verdade. Em suma, o reclamante não foi reintegrado na categoria C1 em virtude do reconhecimento de um erro, o árbitro foi incluído na lista de árbitros C1 para a época desportiva de 2020/2021, certamente em função da sua classificação na época anterior. Não houve qualquer reintegração em virtude de um erro cometido anteriormente como abusivamente o reclamante pretende insinuar.

Não se bastando com isto, o reclamante, para fundar a sua pretensão de reforma da decisão reclamada com base em erro na qualificação jurídica dos factos e existência de documentos que imporiam decisão contrária, envereda numa sucessão de afirmações erradas, insustentadas e insustentáveis do ponto de vista jurídico que se passam a assinalar
O reclamante refere o Comunicado Oficial n.º 58 do CA da FPF – que, faz questão de sublinhar, data de 04.09.2020 (data anterior à da prolação do acórdão da formação preliminar) – para sustentar a sua tese da revogação implícita do acto impugnado, revogação implícita essa que o acórdão reclamado não considerou, daí, a errada qualificação jurídica dos factos ou, em todo o caso, a errada interpretação e aplicação do direito. Deixando de parte questões processuais relacionadas com a forma como foram trazidos aos autos os documentos que acompanham a presente ‘reclamação para a conferência’, sempre caberia saber como a alegada errada qualificação jurídica dos factos por parte da decisão recorrida se pode apoiar em documentos de que este tribunal não tinha conhecimento – documentos que, como se verá seguidamente, não relevam para a boa decisão da causa.
Assim, no que mais releva para a decisão, pelos motivos já expostos, é por demais óbvio que o já citado Comunicado Oficial n.º 58, que se reporta a uma determinada realidade fáctico-jurídica, não revoga, nem implícita nem expressamente, “o acto administrativo consubstanciado na deliberação impugnada” que se reporta a outra realidade fáctico-jurídica. E nem sana qualquer ilegalidade. Nem o procedimento administrativo que culminou na dita deliberação “haveria de prosseguir os seus termos para a reintegração real e efetiva do reclamante”. Nem o Conselho de Arbitragem da FPF “alterou o conteúdo do ato administrativo anterior”. Nem o mencionado procedimento foi “afinal alterado”. Quanto a estas últimas afirmações, se é certo que podem existir procedimentos complexos, não é este certamente o caso, nem o reclamante convoca qualquer figura jurídica para sustentar esta sua invocação de um procedimento que culminou com a deliberação impugnada de 2018, mas que ulteriormente, em 2020, segue os seus termos para corrigir um erro de conteúdo. Quanto à questão da suposta invalidação da deliberação de 2018, começaríamos por sublinhar que a ilegalidade do acto é fundamento de anulação, e não de revogação do acto. Acresce a isso que aanulação é um acto através do qual se pretende destruir os efeitos de um acto anterior, mas com fundamento na sua ilegalidade, ou, pelo menos, num vício que o torna ilegítimo e, por isso, inválido”. Mesmo a convocação da figura da ‘revogação’ – “é um acto que se dirige a fazer cessar os efeitos de outro acto, por se entender que não é conveniente para o interesse público manter esses efeitos produzidos anteriormente” (cfr. JC Vieira de Andrade, Lições de Direito Administrativo, Coimbra, 2015, p. 237) – não é idónea para sustentar a posição do reclamante. Em qualquer dos casos, e pelos motivos já expostos, não secomo o Comunicado Oficial n.º 58 possa ser visto como um acto administrativo que corrigiu a deliberação impugnada.
Como também é por demais óbvio que, com a inclusão do reclamante na lista dos árbitros de categoria C1 para a época desportiva de 2020/2021, não fica reconstituída a situação actual hipotética (art. 562.º do Código Civil), pois esta, a ter-se imposto, reportar-se-ia à época de 2018/2019, a única que estava em causa nos presentes autos (ou seja, seria, nessa época de 2018/2019, manter-se na categoria C1, não tendo sido, portanto, dela despromovido). Como certamente o reclamante sabe, com a inclusão na lista para a época de 2020/2021 o árbitro A………… não passou a ter a categoria de árbitro C1 por referência à época desportiva de 2018/2019, que era, no fundo, o que pretendia. A inclusão do referido árbitro na lista para a época de 2020/2021 constitui consequência da sua prestação como árbitro e correspondente classificação na época desportiva de 2019/2020.

5. Aqui chegados, não se verificando nenhuma situação de revogação tácita nem qualquer reconstituição da situação actual hipotética – nem, concomitantemente, o alegado erro na qualificação jurídica dos factos –, cai por terra o pedido de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, o que nos dispensa de apreciar a questão de saber, pressuposta no pedido do reclamante, se é possível declarar uma tal extinção da instância quando já se encontra esgotado o poder jurisdicional do juiz, nos termos do artigo 613.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.º do CPTA (art. 608.º, n.º 2, do CPTA).

III – DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo em indeferir a reclamação aqui apresentada, e, em consequência, em manter o acórdão reclamado.

Custas pelo reclamante.

Lisboa, 04.02.2021


A presente decisão foi adoptada por unanimidade pelas Senhoras Conselheiras Maria Benedita Urbano (Relatora), Suzana Tavares da Silva e Cristina Gallego dos Santos, e vai assinada apenas pela Relatora, com o assentimento (voto de conformidade) dos Senhores Conselheiros adjuntos, de harmonia com o disposto no artigo 15-A (Recolha de assinaturas dos juízes participantes em tribunal colectivo) do DL n.º 10-A/2020, de 13.03 – preceito introduzido pelo DL n.º 20/2020, de 01.05.