Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0749/15.3BEAVR
Data do Acordão:11/08/2023
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
Sumário:I - O recurso de revista excepcional previsto no art. 285.º do CPPT não corresponde à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, funcionando apenas como uma “válvula de segurança” do sistema, pelo que só é admissível se estivermos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, ou se a admissão deste recurso for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, incumbindo ao recorrente alegar e demonstrar os requisitos da admissibilidade do recurso, sob pena de não admissão do recurso.
II - Porque o recurso de revista excepcional está sujeito às regras gerais dos recursos – entre as quais a de que os recursos não se destinam –, também nele não pode ser conhecida questão que não foi suscitada nem conhecida pelas instâncias.
III - Não pode conhecer-se em sede de revista de questão que seja apresentada à revelia do concretamente decidido pelo tribunal central administrativo, designadamente ignorando os fundamentos por que o acórdão recorrido decidiu em determinado sentido.
IV - O juízo efectuado pelo tribunal central administrativo quanto à dispensa da produção de um qualquer meio de prova com fundamento na sua desnecessidade ou impertinência (e, note-se bem, não na sua inadmissibilidade) não é sindicável em sede de revista, pois tal juízo não se insere em nenhuma das hipóteses em que o n.º 4 do art. 285.º do CPPT concede poderes ao Supremo Tribunal Administrativo em matéria de facto.
Nº Convencional:JSTA000P31545
Nº do Documento:SA2202311080749/15
Recorrente:A... - UNIPESSOAL, LDA.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 749/15.3BEAVR
Recorrente: “A..., Unipessoal, Lda.”
Recorrida: Administração Tributária e Aduaneira (AT)

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada, inconformada com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 25 de Maio de 2023 – que negou provimento ao recurso por ela interposto da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra as liquidações adicionais de IVA que lhe foram efectuadas relativamente a diversos períodos dos anos de 2011 a 2014 –, dele interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no art. 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), com conclusões do seguinte teor:

«1) A Recorrente, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo TAF de Aveiro que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida das liquidações de IVA referentes ao 4.º trimestre de 2011, com o n.º ...92, aos 1.º, 2.º, 3.º e 4.º trimestres do ano de 2012, com os n.ºs ...08, ...09, ...10 e ...11, respectivamente, ao 1.º trimestre de 2013, com o n.º ...45, e do 1.º trimestre de 2014, com o n.º ...71, no montante global de 200.328,30 €, acrescidas de juros compensatórios no valor total de 20.734,29 €.

2) No que agora importa para o pretendido recurso de revista pretende-se que o STA analise se sim ou não, a fundamentação do despacho interlocutório impugnado permite a dispensa da prova testemunhal arrolada pelas partes, e porque o acórdão agora recorrido, considerou que aquele questionado despacho interlocutório transitou em julgado.

3) Acontece que, nos presentes autos, ao longo dos anos foram proferidos quatro despachos interlocutórios a informar as partes e o MP de que se aguardava data para a inquirição admitida.

4) Ora, é pois incompreensível e crê-se que sem fundamento que em face de tais despachos proferidos e emitidos em primeiro lugar depois de as partes indicarem os factos sobre os quais pretendiam que incidisse a prova testemunhal, esgotaram o poder jurisdicional do tribunal.

5) Ou seja, esses despachos transitados em julgado não podiam posteriormente ser revogados relativamente a tal matéria por contradizerem os mesmos proferidos em primeiro lugar e que fizeram, repete-se, previamente ao mesmo, caso julgado formal dentro do processo (artigo 613.º n.ºs 1 e 3 e 620.º do CPC).

6) Assim sendo, crê-se que se impõe como se alegou no acórdão, a revogação do último despacho proferido por violar o caso julgado formado pelo primeiro despacho (confirmado pelos três que se seguiram) que admitiu a inquirição das testemunhas arroladas, e anular todo o processado subsequente por se traduzir na prática de actos não permitidos e cuja prática é susceptível de influir na decisão da causa, neste caso, a decisão de mérito sem a prévia produção testemunhas (artigo 195.º, n.º 1 do CPC).

7) Ora, tal significa, que a excepção dilatória de caso julgado formal, não foi respeitada nem apreciada pelo acórdão proferido e sendo que nos termos do artigo 578.º do CPC, o tribunal deveria conhece-la pois até, porque nos termos dos artigos 620.º, 621.º e 625.º, do mesmo código do CPC, prevalece o proferido em primeiro lugar.

8) Foi por isso, que se alegou no recurso interposto esta desconformidade e não respeito pelos primeiros despachos proferidos nos presentes autos que de resto foi acompanhada pelo aludido parecer do MP.

9) O Tribunal a quo, ao não permitir a audição das testemunhas arroladas pela aqui recorrente, violou frontalmente as normas contidas nos arts. 115.º e 118.º do CPPT e art. 392.º do Código Civil.

10) Deve, em conformidade, a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que, ordena a remessa à instância inferior, por forma a que seja concedida à recorrente a oportunidade de produzir prova.

11) Conforme decorre dos autos, o Tribunal a quo proferiu despacho de natureza interlocutória, considerando que não existe matéria de facto controvertida com relevância para a decisão da causa, atenta a causa de pedir e face à posição das partes expressa nos articulados pelas mesmas apresentados bem como aos documentos constantes dos autos, dispensou a realização da inquirição das testemunhas arroladas (cfr. art. 13.º e 114.º do CPPT).

12) Como bem refere o parecer do MP era e continua a ser esse o despacho interlocutório a quo que errou sobre a não realização da diligência de inquirição de testemunhas requeridas pela impugnante/recorrente na sua petição inicial de impugnação.

13) De notar, que o processo entrou em Juízo no ano de 2015, e dos autos constata-se que foram proferidos vários despachos em resposta ao MP de que os autos aguardavam diligência de marcação de testemunhas, despachos esses proferidos respectivamente em 23/01/2018, 14/04/2020, 19/01/2021 e 17/02/2021.

14) O despacho interlocutório de 26/09/2022 (fls. 180 SITAF), ocorreu depois desses 4 despachos anteriores no sentido inverso.

15) Ora, se na verdade como refere o acórdão do TCA Norte se está na presença de um despacho que transitou em julgado, a verdade, é que já mais foram revogados os despachos proferidos anteriormente e supra identificados, e pois assim, o que sobressai é uma ofensa desses despachos interlocutórios aos aludidos despachos que transitaram em julgado também anteriormente.

16) Esta matéria, pois, é da competência do Supremo Tribunal Administrativo, e daí o presente recurso por tal manifesta contradição.

17) Dir-se-á que, a entender-se da forma como o acórdão recorrido decidiu, constata-se uma violação do princípio da imparcialidade e boa-fé processual, imparcialidade e legalidade que devem determinar a revogação da decisão proferida no acórdão em causa, pois dessa forma jamais a impugnante poderia defender-se perante a AT, ficando em manifesta inferioridade processual, tanto mais que como também é óbvio as testemunhas arroladas são as emitentes das facturas em causa, e que jamais a impugnante pode contraditar o que consta no relatório inspectivo, e foi por isso que o questionou, impugnando.

18) Como bem refere o acórdão do STA de 05/04/2000, no âmbito do processo n.º 024713: “No processo judicial tributário vigora o princípio do inquisitório, o que significa que o Sr. Juiz não pode, como também deve realizar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade.
Deste modo, tendo sido sugerida a realização de uma diligência, o Sr. Juiz só não deve fazer, se a considerar inútil ou dilatória em despacho devidamente fundamentado”.

19) Não deixa também de ser curioso como bem demonstra os autos que ambas as partes indicaram testemunhas, e o que motivou o despacho de fls. (…)
Finda a fase dos articulados, cumpriria proceder à marcação da diligência de inquirição de testemunhas.
Porém, não se vislumbram factos que careçam da produção de prova testemunhal, com relevância para a decisão da presente causa, uma vez que a alegação da Impugnante se concentra na falta de recolha de indícios suficientes pela administração tributária, pelo cumprimento das formalidades legais das facturas e pela asserção da veracidade das operações realizadas exclusivamente com base documental.
Todavia, as partes arrolaram testemunhas.
Assim, para melhor aferir da necessidade da produção de prova testemunhal, ao abrigo do princípio da colaboração, previsto no artigo 7.º, n.º 1 do CPC, notifique as partes para, no prazo de 10 (dez) dias, indicarem nos presentes autos, por referência aos artigos das respectivas peças processuais, a que factos pretendem inquirir as testemunhas arroladas.”
E tanto mais, que as partes (Impugnante e AT respectivamente) vieram indicar quais os artigos das suas peças processuais (PI e Contestação, respectivamente), para os quais pretendiam proceder à audição das testemunhas.
Porém, face à posição firmada nos autos pelas partes, está igualmente em causa matéria de facto controvertida – e atinente à demonstração dos pressupostos factuais de que depende a determinação da matéria tributável por correcções aritméticas.
Acresce que a específica natureza do contencioso tributário em causa – mormente no que tange à determinação da matéria colectável por correcções aritméticas – não apenas recomenda, mas impõe, a realização de todas as diligências probatórias quer da ora Recorrente, quer por parte da própria AT que também indicou como testemunha o Inspector Tributário que elaborou o relatório ora posto em causa.
A inquirição das testemunhas da impugnante/recorrente se afigura da maior relevância não apenas para prova dos factos alegados pela mesma, mas igualmente para contraprova dos factos invocados pela AT.
A inquirição das testemunhas constitui outro contributo relevante para a descoberta da verdade não apenas como meio principal de prova, mas, igualmente, como meio complementar – mormente da prova documental.
Vale isto por dizer que a inquirição de testemunhas apenas deverá ser afastada quando seja evidente a sua desnecessidade face à natureza das correcções e as várias soluções plausíveis do litígio – o que não é de todo o caso.

20) Ou seja, tendo em conta a questão suscitada, que se crê relevante para a boa decisão nos termos do n.º 1 do artigo 150.º do CPTA “pode haver recurso excepcional de revista para o Supremo Tribunal Administrativo (STA) das decisões do Tribunal Central Administrativo (TCA) proferidas em 2.ª instância quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.

21) O artigo 150.º do CPTA admite recurso de revista tendo em vista a violação da lei substantiva e processual, e pois assim, crê-se que é admissível o recurso interposto.

22) Dir-se-á ainda, e na sequência do alegado, que em face do despacho interlocutório ora questionado, se tornou necessário a junção da cópia da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, e que apenas se tornou necessário a junção da referida decisão proferida porquanto, não ocorreu a citada inquirição de testemunhas, e pois tal decisão é relevante e somente se tornou necessária até em face do trânsito em julgado demonstrar agora documentalmente tal documento (sentença com nota de trânsito em julgado do TAF Loulé), que ao invés do constante do relatório inspectivo que a impugnante tinha e os Tribunais Fiscais reconheceram actividade comercial, e pois lhe era também legítimo em face da decisão proferida de apresentar prova documental de que tinha actividade reconhecida pelos Tribunais Fiscais e assim sendo, teria a especial relevância a junção por esse motivo e nessa data da citada do aludido processo, onde estão equacionados e decididos factos que contrariam aquele relatório inspectivo.

23) Ou seja, a conclusão ficou por um injusto e crê-se indevido despacho interlocutório que a impugnante ficou prejudicada na sua defesa e como bem diz o parecer do MP deve ser revogado o despacho judicial interlocutório de 26/09/2022 (fls. 180 SITAF) e consequentemente anulado todos os actos subsequentes com ele incompatíveis.

24) Em face do sugerido no ponto anterior, deve ser julgado prejudicado o reconhecimento dos demais fundamentos do recurso interposto relativamente à sentença recorrida.

25) Aliás, conforme entendimento vertido mo acórdão proferido a 14/10/2022 pelo Tribunal Central Administrativo Norte no âmbito do processo n.º 1477/21.6BEPRT (in www.dgsi.pt)
1. Tendo sido lavrado nos autos um primeiro despacho a convidar as partes a indicarem os factos sobre os quais pretendem que incida a prova testemunhas requerida e depois um outro a designar data para a produção da prova testemunhas, ficou esgotado o poder jurisdicional do tribunal quanto à necessidade de serem inquiridas testemunhas, no sentido positivo.
2. Transitado este despacho em julgado, não podia, posteriormente, tal matéria ser objecto de novo despacho que contradiz o despacho proferido em primeiro lugar e que fez caso julgado formal dentro do processo a determinar a passagem para a fase da decisão final com dispensa da audiência de julgamento, para inquirição de testemunhas, face ao disposto nos artigos 613.º, n.ºs 1 e 3. e 620.º, ambos do Código do Processo Civil.
3. Nesta situação impõe-se revogar o segundo despacho por violar o caso julgado formado pelo primeiro despacho e anular todo o processado subsequente por se traduzir na prática de actos não permitidos e cuja prática é susceptível de influir na decisão da causa, neste caso, a decisão de mérito sem prévia produção de prova testemunhal, artigo 195.º n.º 1 do CPC”.

26) Consequentemente, ordenar a remessa do processo ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, a fim de se proceder à diligência instrutória requerida (inquirição das testemunhas da Impugnante e AT) e outras consideradas adequadas conforme indicado supra, e, após os autos prosseguirem os ulteriores termos se a isso mais obstar.

Deve pois conceder-se provimento ao presente Recurso de revista excecional, e em consequência, revogando-se a decisão do Tribunal Central Administrativo Norte, por omissão e contradição de caso julgado entre os despachos interlocutórios primeiramente proferidos e o derradeiro que indeferiu a prova testemunhal arrolada por ambas as partes, por ter ficado esgotado o poder jurisdicional do tribunal quanto à necessidade de serem inquiridas tais testemunhas, e porque aqueles despachos primeiramente proferidos fizeram caso julgado formal dentro do processo, nos termos no disposto nos artigos 613.º, n.ºs 1 e 3 e 620.º, ambos do Código Processo Civil, e pois nesta situação impõe-se revogar o último despacho interlocutório neste âmbito, por violar o caso julgado formado pelos primeiros despachos e devendo-se anular todo o processado subsequente, por se traduzir na prática de actos não permitidos e cuja prática é susceptível de influir na decisão da causa, neste caso, a decisão de mérito sem a prévia produção de prova testemunhal, atento o disposto no artigo 195.º, n.º 1 do Código de Processo Civil».

1.2 A Recorrida não apresentou contra-alegações

1.3 Dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido de que «a questão da junção de cópia da sentença não é sequer recorrível, e quanto à questão da dispensa da prova testemunhal, além do mais, não consubstancia relevância jurídica ou social, que se revista de importância fundamental, nem é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, pelo que não de verificando qualquer uma dessas condições de admissibilidade, o presente recurso de revista excepcional deve ser julgado inadmissível (CPPT, art. 285.º, n.º 6)».
Isto, após referir os termos do recurso e os pressupostos de admissibilidade da revista, com a seguinte fundamentação: «[…]
4. A alegação e, bem assim, as conclusões formuladas pela ora Rcte. são deveras prolixas e de difícil apreensão.
Em qualquer caso, se bem as entendemos, estão em causa duas “questões” (que, na verdade, como veremos, nem se podem dizer decisões do douto acórdão recorrido).
5. Assim, pela primeira, o ora Rcte. Pretende «que o STA analise se sim ou não, a fundamentação do despacho interlocutório impugnado permite a dispensa da prova testemunhal arrolada pelas partes, e porque o acórdão agora recorrido, considerou que aquele questionado despacho interlocutório transitou em julgado.».
E depois, pela segunda, parece propugnar a «junção da cópia da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (…pois…) somente se tornou necessária até em face do trânsito em julgado demonstrar agora documentalmente tal documento (sentença com nota de trânsito em julgado do TAF Loulé)».

b) Junção de cópia da sentença

6. Começando por esta segunda, podemos já desatender, in limine, a mesma.
Com efeito, o douto acórdão recorrido não contém qualquer pronúncia sobre a dita “junção da cópia da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (sentença com nota de trânsito em julgado do TAF Loulé)”.
Sendo este meio processual um recurso, pressupõe, por definição, a existência de um gravame, uma prévia decisão, cuja reapreciação, eventualmente, venha a propiciar a respectiva revogação, assim se reverter à situação prévia à sua emanação.
Não é o caso, manifestamente.
7. Com efeito, como vimos, o douto acórdão recorrido não emitiu qualquer pronúncia sobre a matéria da “junção da cópia da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé (sentença com nota de trânsito em julgado do TAF Loulé),”, seja positiva (ordenar a junção), seja negativa (denegar a junção).
Por conseguinte, concluímos que tal ponto não pode integrar, por definição, o objecto do presente recurso de revista excepcional (sem prejuízo de ulteriormente lhe fazermos alguma referência incidental).
8. Fica assim para consideração apenas uma questão, aquela primeira, ou seja, “que o STA analise se sim ou não, a fundamentação do despacho interlocutório impugnado permite a dispensa da prova testemunhal arrolada pelas partes”.

c) Dispensa da prova testemunhal

9. A este respeito, porém, as teses da ora Rcte. incorrem em diversos equívocos, nomeadamente a má compreensão do tema dos pressupostos de admissibilidade deste recurso de revista excecional, que convém expor.
10. Primeiramente, à parte de uma referência singular e descritiva na conclusão 20), a ora Rcte. jamais dá observância ao ónus processual (ainda que este seja eventualmente apenas imperfeito ou prima facie) de aduzir argumentos dos quais se conclua que a questão de saber “se a fundamentação do despacho interlocutório impugnado permite a dispensa da prova testemunhal arrolada pelas partes” (e, aliás, o mesmo de poderia dizer do ponto relativo à junção do documento) é uma instância de qualquer um dos dois conceitos jurídicos imprecisos que, ou um ou outro, são condição de admissibilidade do presente recurso de revista excepcional: (1) a relevância jurídica ou social, que se revista de importância fundamental; ou (2) ser claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
E, na verdade, face ao perfil do caso concreto em apreço, não há aqui relevância jurídica ou social, que revista de importância fundamental (é uma questão casuística, confinada ao caso dos autos, por sua natureza discricionária é impassível de generalização; do ponto de vista da sua solução jurídica é um caso simples e não um caso difícil; não desencadeou controvérsia pública, que imponha uma suprema reponderação do caso).
Por outra parte, a questão não é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito (pois não se indicia no caso um erro judiciário, menos ainda evidente, não há controvérsia jurisprudencial, ao está de harmonia com a melhor jurisprudência suprema, como veremos).
11. A falta de comprovação no caso de qualquer um destes dois pressupostos de admissibilidade do presente recurso de revista excepcional, em princípio, dispensaria outras considerações, mas a bem da boa administração da justiça convirá ainda desfazer alguns equívocos em que incorre a alegação.
Com efeito, convém referir que o caso não traz à colação, por impertinente, o instituto do caso julgado formal.
12. Na verdade, a decisão judicial de deferir ou indeferir o pedido de inquirição de testemunhas é tomada no uso de um poder discricionário judicial, na medida em que redunda em outorgar ao juiz uma alternativa de decisões (no caso, realizar ou não a inquirição das testemunhas), qualquer delas legítima, que resolverá segundo o seu prudente arbítrio e em ordem à consecução da finalidade processual em causa (averiguação da verdade quanto às afirmações de facto dos “emitentes das facturas questionadas e consideradas falsas”).
Assim, na medida em que não vem invocado o ilegal exercício – no caso apenas será concebível, em abstracto, a invocação de desvio de poder – dessa discricionariedade judicial, a decisão é insusceptível de recurso e, como tal, não pode ser apreciada neste recurso de revista excepcional (CPC, art. 630.º, n.º 1, in fine).
13. Este entendimento, aliás, pode ser abonado pela doutrina constante do douto Acórdão do STA – 2.ª secção, proc.º n.º 0946/16, de 14 de Setembro de 2016, tirado à luz do preceituado no n.º 1 do artigo 99.º (Princípio do inquisitório e direitos e deveres de colaboração processual) da LGT – havendo também a ponderar o n.º 1 do artigo 13.º (Poderes do juiz) do CPPT – na linha de jurisprudência assente sobre o tema: «(…) a lei não prescreve que deve haver sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção; pelo que, não havendo essa imposição legal, se o juiz dispensa a produção de prova não se pode dizer que foi preterida uma formalidade legal geradora de nulidade processual. O que não obsta a que a omissão de diligências de prova, quando existam factos controvertidos que possam relevar para a decisão da causa, possa afectar o julgamento da matéria de facto, acarretando a anulação da sentença por défice instrutório com vista a obter o devido apuramento dos factos.» 1 [1 a]
14. Vista a questão de outro ponto de vista, que também foi discernido na aludida doutrina jurisprudencial, ainda se dirá que, no fundo, com o pedido agora em causa a ora Rcte. demonstra à saciedade o seu inconformismo perante a decisão de facto constante do douto acórdão recorrido, do TCA Norte, de 25 de Maio de 2023 (e, logicamente, da douta sentença do TAF de Aveiro).
15. Porém a tal pretensão, de controverter a fixação da matéria de facto, se opõe, inelutavelmente, e em consonância justamente com a sua função de meio de revista, o n.º 4 do preceito agora em causa: “O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista (…)”.».

1.4 Preliminar e sumariamente, cumpre apreciar e decidir da admissibilidade do recurso, nos termos do disposto no n.º 6 do art. 285.º do CPPT.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO

2.1.1 Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos tribunais centrais administrativos não são susceptíveis de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo; mas, excepcionalmente e como decorre do n.º 1 do art. 285.º do CPPT, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: i) quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental, ou ii) quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste Supremo Tribunal tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei n.ºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar naqueles precisos termos.

2.1.2 Como a jurisprudência também tem vindo a salientar, incumbe ao recorrente alegar e demonstrar essa excepcionalidade, que a questão que coloca ao Supremo Tribunal Administrativo assume uma relevância jurídica ou social de importância fundamental ou que o recurso é claramente necessário para uma melhor aplicação do direito. Ou seja, em ordem à admissão do recurso de revista, a lei não se satisfaz com a invocação da existência de erro de julgamento no acórdão recorrido, devendo o recorrente alegar e demonstrar que se verificam os referidos requisitos de admissibilidade da revista [cf. art. 144.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) e art. 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, subsidiariamente aplicáveis).

2.1.3 Na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória – nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema» (Cf., por todos, o acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 2 de Abril de 2014, proferido no processo n.º 1853/13, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/aa70d808c531e1d580257cb3003b66fc.).

2.1.4 Cumpre também ter presente que, em sede de recurso excepcional de revista e nos termos do disposto no n.º 4 do art. 285.º do CPPT, as questões de facto, designadamente o erro na apreciação da prova e na fixação dos factos, estão arredadas do âmbito do recurso, a menos que haja «ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova».

2.2 O CASO SUB JUDICE

2.2.1 O recurso vem interposto do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte que, negando provimento ao recurso interposto pela ora Recorrente, manteve a sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra as liquidações adicionais de IVA identificadas nos autos.
Se bem interpretamos as alegações de recurso, a discordância da Recorrente com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte ora recorrido assenta em três pontos, que podemos resumir nos seguintes termos:

i) o despacho por que o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro dispensou a inquirição das testemunhas viola o caso julgado formal formado pelo anterior despacho (cfr. arts. 613.º, n.ºs 1 e 3 e 620.º do CPC) em que informou o Ministério Público de que o processo aguardava marcação da inquirição de testemunhas (bem como os três despachos que se lhe seguiram, proferidos ao longo de três anos, de idêntico teor), pelo que se impõe revogá-lo;

ii) o acórdão recorrido fez errado julgamento quando não decidiu no sentido de que o mesmo despacho viola os princípios da imparcialidade e da boa-fé processual e o disposto nos arts. 115.º e 118.º do CPPT e no art. 392.º do Código Civil (CC), bem como a possibilidade de a ora Recorrente contradizer a fundamentação dos actos impugnados, à qual a inquirição das testemunhas se mostra indispensável, motivos que também impõem a sua revogação;

iii) o Tribunal Central Administrativo Norte errou ao recusar a junção aos autos do documento (sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé proferida no processo 64/18.0BELLE), apresentado com as alegações de recurso, violando o disposto nos arts. 425.º e 651.º do CPC.

Sustenta a Recorrente, em ordem à demonstração da admissibilidade da revista, o seguinte:
«Crê-se pois que a questão suscitada, relativamente aos despachos interlocutórios constituem uma violação da lei substantiva e processual, tal como vem elencado nesse parecer do M.P. no n.º 2 do artigo 150.º do CPTA, e bem também dos requisitos tendo em conta a importância processual, até porque estes despachos interlocutórios de não admitir a audição das testemunhas arroladas deve ser tido na devida conta pelo Supremo Tribunal de Justiça e daí se crê também existir o necessário fundamento no n.º 1 do aludido artigo 150.º do CPTA.
Bem como também a demais questão vertida, de saber se sim ou não, em face do derradeiro despacho interlocutório nos presentes autos, a parte que não pôde, pois, exercer, o que se crê ser seu direito de inquirição de testemunhas, se não justifica a junção de uma certidão de sentença proferida em 30.11.2018 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé no âmbito do processo n.º 64/18.0BELLE, em que são impugnantes AA e outros, transitada em julgado em 13.12.2018, com vista a demonstrar que a impugnante tem actividade comercial.
São estes pois os fundamentos que crê serem da competência do Supremo Tribunal Administrativo no recurso agora interposto […]».
Passemos, pois, à apreciação dos requisitos de admissibilidade do recurso, no exame preliminar e sumário que nos compete (cfr. n.º 6 do art. 285.º do CPPT).

2.2.2 Antes do mais, diremos que é manifestamente insuficiente a alegação aduzida pela Recorrente em ordem à demonstração dos requisitos da admissibilidade da revista que, como deixámos já dito, assume carácter excepcional.
Para o efeito, não basta que a Recorrente tenha invocado os erros de julgamento do acórdão recorrido e, depois, conclusivamente, afirmar que estão verificados os fundamentos dos n.ºs 1 e 2 do art. 150.º do CPTA, como fez. Impunha-se-lhe também que tivesse concretizado por que se verificam esses fundamentos, pois é ao recorrente que compete alegar e demonstrar que se verificam os requisitos de admissibilidade da revista.
Não o tendo feito, a revista não pode ser admitida.

2.2.3 Acresce que, no que respeita à primeira questão suscitada pela Recorrente – que se refere à violação em que teria incorrido o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, ao dispensar a produção da prova testemunhal, do caso julgado formal formado pelos anteriores despachos por que ordenou que o Ministério Público junto dos tribunais judiciais fosse informado, como solicitara, de que o processo aguardava a designação de data para a inquirição das testemunhas – não podemos perder de vista que se trata de questão que a Recorrente não suscitou perante o Tribunal Central Administrativo Norte e que esse Tribunal também não apreciou, como resulta da leitura das alegações do recurso que aí apresentou e da leitura do acórdão recorrido.
Recorde-se que os recursos jurisdicionais – e a revista não é excepção – não servem para conhecer questões novas, de questões que anteriormente não tenham sido apreciadas pelas instâncias.
Ora, nunca antes das alegações do recurso ora sob apreciação a Recorrente suscitou no processo a questão da violação do caso julgado formal pelo despacho que dispensou a produção da prova testemunhal.
O que, sem prejuízo do que deixámos dito no ponto anterior, sempre significaria que o recurso nunca poderia ser admitido relativamente à primeira questão enunciada pela Recorrente.
Por outro lado, afigura-se-nos que não será viável a tese de que os despachos por que no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro se ordenou a informação ao Ministério Público junto dos tribunais judiciais, como por este solicitado, de que os autos aguardavam a marcação de data para a inquirição (proferidos em 20 de Janeiro de 2018, em 14 de Abril de 2020, em 19 de Janeiro 2021 e em 17 de Fevereiro de 2021, cfr. fls. 114, 133, 138 e 142, respectivamente) formaram caso julgado formal quanto à admissibilidade da prova testemunhal.
Estes despachos, contrariamente ao que parece pretender fazer crer a Recorrente (que afirma que, pelos mesmos, se «admitiu a inquirição das testemunhas arroladas»), não se pronunciaram sobre a admissibilidade da prova testemunhal, nem foram notificados às partes (nem o deveriam ter sido), antes se limitaram a dar a conhecer à entidade de investigação criminal em que fase se encontrava o processo (tendo, ademais, salientado que nem sequer havia sido dado conhecimento de causa para a tramitação prioritária da impugnação judicial, tramitação que apenas veio a ser ordenada por despacho de 1 de Julho de 2022, a fls. 155, nos termos do nos termos do disposto no art. 47.º, n.º 2, do Regime Geral das Infracções Tributárias, depois de o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro ter oficiosamente indagado da existência de motivo para a atribuição da natureza prioritária ao processo).
Significa isto que aqueles despachos não tomaram posição sobre a admissibilidade da prova testemunhal, não podendo servir como fundamento para a invocado violação do caso julgado formal.
Note-se também que não há qualquer identidade entre a situação sub judice e aquela a que se refere o invocado acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 14 de Outubro de 2022, proferido no processo com o n.º 1477/21.6BEPRT (Disponível em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/-/3a3ad2bc1b1067e4802588fd003ae856.), pois nesse processo, depois de convite às partes para indicarem os factos sobre os quais pretendem que incida a prova testemunhal requerida, foi proferido despacho que designou data para a inquirição de testemunhas e foi depois do trânsito desse despacho que foi proferido um outro a dispensar a produção da prova testemunhal.
Afigura-se-nos, pois, ser manifesto que a Recorrente coloca esta primeira questão em termos que não são autorizados pela tramitação processual realmente verificada, o que também justificaria a não admissão da revista quanto à mesma.

2.2.3 Quanto à segunda questão suscitada pela Recorrente, e sempre sem prejuízo do que ficou dito em 2.2.1, diremos também que a alegação ora aduzida se alheia dos motivos por que o Tribunal Central Administrativo Norte entendeu não poder conhecer do erro de julgamento no despacho que dispensou a inquirição das testemunhas arroladas, qual seja o trânsito em julgado desse despacho que, tendo sido notificado à Impugnante, ora Recorrente, não foi objecto de recurso tempestivamente interposto.
Lido o acórdão recorrido, verifica-se que nele se deixou dito o seguinte:
«Consta dos autos um despacho proferido pelo MM Juiz, em 26.09.2022 no qual considera não existir matéria de facto controvertida com relevância para a decisão da causa, atenta a causa de pedir e face à posição das partes expressas nos articulados, bem como dos documentos constantes dos autos, tendo dispensado a inquirição das testemunhas arroladas.
A Recorrente conformou-se com o despacho e apresentou alegações nos termos do art. 120.º do CPPT. Deste despacho não foi interposto recurso pelo que o mesmo transitou em julgado».
Ou seja, o acórdão recorrido recusou sindicar o referido despacho com o fundamento de que o mesmo se encontrava a coberto do caso julgado. Não tendo sido atacado o acórdão quanto a esse fundamento, nunca aqui poderia sindicar-se o aí assim decidido.
Também por esse motivo, a revista não poderia ser admitida quanto a esta questão.

2.2.4 Finalmente, quanto à terceira questão – a da recusa da junção aos autos do documento (sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé proferida no processo 64/18.0BELLE), apresentado com as alegações de recurso –, sempre sem prejuízo do que deixámos dito em 2.2.1, diremos ainda que o juízo sobre a pertinência ou necessidade da junção de prova (e, note-se bem, não na inadmissibilidade do meio de prova) não é sindicável em sede de revista, pois não pode subsumir-se a nenhuma das situações em que o n.º 4 do art. 285.º do CPPT concede a este Supremo Tribunal, em sede de revista excepcional, a faculdade da apreciar questões em sede de matéria de facto.
Também por isso, a revista nunca poderia ser admitida quanto a esta questão.

2.3 CONCLUSÕES

Por tudo quanto deixámos dito, a revista não pode ser admitida e, preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - O recurso de revista excepcional previsto no art. 285.º do CPPT não corresponde à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, funcionando apenas como uma “válvula de segurança” do sistema, pelo que só é admissível se estivermos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, ou se a admissão deste recurso for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, incumbindo ao recorrente alegar e demonstrar os requisitos da admissibilidade do recurso, sob pena de não admissão do recurso.

II - Porque o recurso de revista excepcional está sujeito às regras gerais dos recursos – entre as quais a de que os recursos não se destinam –, também nele não pode ser conhecida questão que não foi suscitada nem conhecida pelas instâncias.

III - Não pode conhecer-se em sede de revista de questão que seja apresentada à revelia do concretamente decidido pelo tribunal central administrativo, designadamente ignorando os fundamentos por que o acórdão recorrido decidiu em determinado sentido.

IV - O juízo efectuado pelo tribunal central administrativo quanto à dispensa da produção de um qualquer meio de prova com fundamento na sua desnecessidade ou impertinência (e, note-se bem, não na sua inadmissibilidade) não é sindicável em sede de revista, pois tal juízo não se insere em nenhuma das hipóteses em que o n.º 4 do art. 285.º do CPPT concede poderes ao Supremo Tribunal Administrativo em matéria de facto.


* * *

3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência da formação prevista no n.º 6 do art. 285.º do CPPT, em não admitir o presente recurso.

Custas pela Recorrente.

*
Após o trânsito em julgado, satisfaça o solicitado pelo ofício de fls. 499.
*
Lisboa, 8 de Novembro de 2023. – Francisco Rothes (relator) – Isabel Marques da Silva – Aragão Seia.