Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01670/15.0BELRS
Data do Acordão:07/13/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IMPOSTO DE SELO
NULIDADE DE ACÓRDÃO
Sumário:I - Em termos de omissão de pronúncia, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.
II - Tendo presente o teor do Acórdão proferido nos autos, resulta evidente que a Requerente não tem qualquer razão no que diz respeito à invocada nulidade do Acórdão, pois que, perante os elementos descritos, é manifesto que foi tomada posição inequívoca sobre o sujeito passivo de imposto em cada uma das situações analisadas, o que significa que, sem prejuízo da utilização porventura de uma metodologia diferente, o Tribunal nunca deixou de ter presente a matéria em apreço, optando por fazer o seu tratamento, de forma individualizada, considerando as particularidades de cada das situações identificadas no âmbito do recurso interposto pela Recorrente, o que equivale a dizer que, ao contrário do pretendido, foi ponderado o exposto pela ali Recorrente para defender a sua posição, sem subterfúgios e de forma cabal, como se retira da resposta dada, de forma assertiva, nos domínios apontados.
Nº Convencional:JSTA000P29716
Nº do Documento:SA22022071301670/15
Data de Entrada:11/03/2021
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:BANCO A....., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
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Processo n.º 1670/15.0BELRS (Recurso Jurisdicional - Arguição de Nulidade de Acórdão)



Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO
“Banco A……, S.A.”, devidamente identificado nos autos, notificado do Acórdão desta Secção do Contencioso Tributário, datado de 18-05-2022 e exarado a fls. 461 a 544 dos autos, vem arguir a nulidade do mesmo pelos fundamentos vertidos no requerimento de fls. 558-562, concluindo no sentido de ser concedido provimento ao presente requerimento de arguição de nulidade, com as devidas consequências legais.

Não houve resposta.

O Ministério Público junto deste Tribunal tomou posição no sentido do indeferimento do requerido.

Com dispensa de vistos, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.




2. ENQUADRAMENTO E APRECIAÇÃO DA PRETENSÃO

A Requerente vem arguir a nulidade do acórdão proferido por este Tribunal, por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 615º, aplicável ex vi artigo 666.º, n.º 1, ambos do CPC.

Para o efeito, a Requerente defende que no recurso interposto da sentença a quo, o Recorrente invocou que o Tribunal de primeira instância havia incorrido em erro de julgamento da matéria de direito na apreciação da legalidade (i) da correção no montante de € 303.902,41, respeitante a imposto sobre outras comissões - taxa de serviço do comerciante (TSC); e (ii) da correção no montante de € 31.635,19, respeitante a comissões cobradas pela avaliação de imóveis no âmbito de operações de crédito e, no que ora releva e em suma, o Recorrente principiou por invocar que o Tribunal a quo incorreu em erro na avaliação dos pressupostos jurídico-tributários da responsabilidade pelo encargo do imposto (cf. pp. 4 e 5 do recurso, conclusões 8.ª a 10.ª).

Com efeito, como se explicitou no recurso, a situação vertente configura um caso de substituição sem retenção, não sendo pois aplicável o regime legal vertido no artigo 28.º da Lei Geral Tributária (LGT) e, como demonstrou o Recorrente, o encargo do Imposto do Selo recai sobre os clientes a quem foram cobradas as comissões e não sobre o Recorrente, razão pela qual, o ao tributário sub judice deve ser anulado.

No entanto, compulsada a fundamentação do douto acórdão e salvo o devido respeito constata-se que esse douto Tribunal não se pronunciou sobre a questão referida nos artigos supra, o que, desde logo, no entender do Recorrente, configura nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º, aplicável ex vi artigo 666.º, n.º 1, ambos do CPC, na medida em que, ao deixar de se pronunciar sobre a invocada ilegalidade do ato tributário, esse venerando Tribunal incorreu em omissão de pronúncia, geradora de nulidade do acórdão, a qual se requer que seja suprida, com as demais consequências legais.

Que dizer?

O art. 615º nº 1 al. d) do C. Proc. Civil refere que é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, sendo que, nos termos do art. 684º nºs 1 e 2 do mesmo diploma legal quando for julgada procedente alguma das nulidades previstas nas alíneas c) e e) e na segunda parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º ou quando o acórdão se mostre lavrado contra o vencido, o Supremo Tribunal de Justiça supre a nulidade, declara em que sentido a decisão deve considerar-se modificada e conhece dos outros fundamentos do recurso e se proceder alguma das restantes nulidades do acórdão, manda-se baixar o processo, a fim de se fazer a reforma da decisão anulada, pelos mesmos juízes quando possível.
Por outro lado, segundo o disposto no artigo 125º nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é nula a sentença quando ocorra “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”, sendo que esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz, pelo artigo 660º nº 2 do Código de Processo Civil, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Assim, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.

Nesta sequência, como se refere no Acórdão deste Supremo Tribunal de 03-02-2021, Proc. nº 02194/14.9BEPRT, www.dgsi.pt, que “a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido (...) No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por um lado, "questões" e, por outro, "razões" ou "argumentos" para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das "questões") integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das "razões" ou "argumentos" invocados para concluir sobre as questões.”

A partir daqui, tendo presente o teor do Acórdão proferido nos autos, resulta evidente que a Requerente não tem qualquer razão no que diz respeito à invocada nulidade do Acórdão, pois quando se tem presente o exposto pela Requerente, é manifesto que não estamos perante qualquer omissão de pronúncia, pois que o acórdão proferido nos autos identificou a matéria a apreciar nos autos relacionada, nomeadamente, com o enquadramento fiscal da denominada Taxa de Serviço de Comerciante (TSC), sem olvidar a invocada inconstitucionalidade por violação dos artigos 103.º e 104.º da CRP, em especial dos princípios da capacidade contributiva e da coerência do sistema e ainda apreciar o enquadramento fiscal a dar às comissões de avaliação recebidas pelo Impugnante, no âmbito dos contratos de crédito à habitação, sendo que, em relação à primeira situação, ponderou, além do mais, que:

“…

"In casu", verificamos que a operação subjacente à TSC se enquadra na definição de comissão devida por prestação de serviços de pagamento, na medida em que estamos perante uma execução de operação de pagamento nos termos do artº.4, al.c), do citado dec.lei 317/2009, de 30/10, concretamente, na execução de operações de pagamento através de um cartão. Esta TSC visa, em particular, remunerar a execução da operação de pagamento em si em virtude da disponibilização daquele serviço, sendo esta operação de pagamento baseada num cartão e não em numerário, pressupondo por isso um intermediário financeiro, que é o prestador de serviços - neste caso, a sociedade recorrente. Não corresponde, assim, a qualquer valor devido em contrapartida de uma (alegada) cessão de créditos.
Face ao quadro normativo acabado de expor e ao probatório supra exarado, não subsistem dúvidas quanto à existência de uma prestação de serviços de pagamento no caso sob análise. E esta prestação de serviços de pagamento cabe, pois, dentro do conceito "Outras comissões e contraprestações por serviços financeiros", estando por conseguinte sujeita a I.Selo, mediante a aplicação da verba 17.3.4 da TGIS, na redacção em vigor em 2012, mais sendo irrelevante a alteração na norma introduzida pelo artº.153, da Lei 7-A/2016, de 30/03.
Atento o relatado, não vislumbra este Tribunal que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de direito (violação do regime previsto no artº.2, nº.1, al.c), do C.I.Selo, e na verba 17.3.4. da TGIS), pelo que se julga improcedente o presente esteio do recurso. …”.

Por outro lado, foi considerado que:
“…
verificando-se que as comissões de avaliação cobradas pelo ora Recorrente “Banco A……., S.A.” no âmbito de contratos de concessão de crédito à habitação, estão isentas do IVA, por força da relação de acessoriedade com a operação principal, nos termos do disposto na al. a) do nº 27 do art. 9º do CIVA, mas estão sujeitas a Imposto do Selo, de acordo com os números 1 e 2 do artigo 1.º do CIS, o que implica acompanhar a decisão recorrida quando refere que, tendo em conta a natureza das comissões de avaliação cobradas pelo impugnante aos seus clientes, não restam dúvidas que as mesmas estão sujeitas a Imposto do Selo nos termos do disposto nos números 1 e 2 do art.1.º, do CIS, sendo o Impugnante o sujeito passivo de imposto, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.2.º do CIS, sendo que a obrigação tributária nasce no momento da cobrança da comissão, de acordo com o disposto na h) do art. 5º do CIS e o valor tributável e a taxa a aplicar resultam da TGIS anexa ao código, em vigor no momento em que o imposto é devido, nos termos do art. 9º nº 1 e 22º do CIS e sancionar a conclusão exposto no sentido da legalidade da liquidação de imposto de selo, no que concerne à tributação das comissões de avaliação dos imóveis, no âmbito da actividade do Impugnante de concessão de crédito à habitação, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao recurso interposto pelo Recorrente “Banco A……….., S.A.”.

A partir daqui, perante os elementos descritos, é manifesto que foi tomada posição inequívoca sobre o sujeito passivo de imposto em cada uma das situações analisadas, o que significa que, sem prejuízo da utilização porventura de uma metodologia diferente, o Tribunal nunca deixou de ter presente a matéria em apreço, optando por fazer o seu tratamento, de forma individualizada, considerando as particularidades de cada das situações identificadas no âmbito do recurso interposto pela Recorrente “Banco A………, S.A.”, o que equivale a dizer que, ao contrário do pretendido, foi ponderado o exposto pela ali Recorrente para defender a sua posição, sem subterfúgios e de forma cabal, como se retira da resposta dada, de forma assertiva, nos domínios apontados.
Pelo exposto, e sem necessidade de outras considerações, é manifesto que não enferma o Acórdão em crise de vício que importe a sua nulidade, na vertente assinalada e que legitime, nessa sequência, a presente arguição de nulidade “sub judice” formulada pela ora Requerente que, assim, terá de ser desatendida.


3. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em indeferir a presente arguição de nulidade com referência ao Acórdão proferido nos autos.

Custas pela Requerente, fixando-se a taxa de justiça em 3 Uc.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 13 de Julho de 2022. - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos.