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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0718/16.6BEAVR
Data do Acordão:11/10/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:IVA
DEDUÇÕES
REGULARIZAÇÃO
ACTIVO IMOBILIZADO
Sumário:I - O exercício do direito à dedução do I.V.A. consubstancia uma das principais características deste tributo, tudo em conformidade com o regime consagrado na Sexta Directiva de 1977 (directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17/05/1977), mais exactamente no seu artº.17, preceito que consagra as regras de exercício do direito à dedução do imposto, contemplando diversos requisitos objectivos e subjectivos do exercício do mesmo direito. O sistema comum do I.V.A. instituído pela Sexta Directiva (cfr.actual directiva 2006/112/CE do Conselho, 28/11/2006 - Directiva IVA) caracteriza-se pela existência de uma base de incidência uniforme, de regras comuns em matéria de incidência objectiva e subjectiva, isenções e valor tributável, pela harmonização de regimes especiais e pelo alargamento obrigatório da tributação ao estádio retalhista e à generalidade das prestações de serviços.
II - Especificamente, sobre a actividade de locação de bens imóveis, recorde-se que o princípio geral de tributação, consagrado no C.I.V.A., considera que a locação de bens imóveis é uma prestação de serviços sujeita a I.V.A., em resultado da conjugação do artº.1, nº.1, al.a), com o artº.4, nº.1, do mesmo diploma. No entanto, o próprio C.I.V.A. prevê derrogações ao princípio geral, entre as quais se encontra a prevista no artº.9, nº.29, que determina que a locação de bens imóveis se encontra isenta de I.V.A. (estamos perante uma isenção simples ou incompleta, a qual não confere direito à dedução de imposto, ou seja, sem crédito de imposto suportado a montante, em sede de operações internas), tudo na esteira do consignado no artº.13, da Sexta Directiva I.V.A. (cfr.directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17/5/1977).
III - O activo das empresas divide-se sempre entre o imobilizado, destinado a uso e fruição pela empresa e não a venda, e o activo permutável (ou circulante, na terminologia da lei), destinado, esse sim, a venda. Por outras palavras, os elementos do activo imobilizado (por contraposição ao activo circulante) são os recursos que uma empresa utiliza para realizar as suas operações (objecto social) e que não se destinam a venda no âmbito da sua actividade operacional.
IV - Nos termos do artº.24, nº.6, al.c), do C.I.V.A., deverá regularizar-se de uma só vez o I.V.A. deduzido, na proporção do número de anos do período de regularização ainda não decorridos (tudo em sede de período de vida útil dos imóveis em causa e para efeitos de reintegração ou amortização total do seu valor - cfr.decreto regulamentar 25/2009, de 14/09), considerando-se que os bens estão afectos a uma actividade não tributada, no caso de bens imóveis relativamente aos quais houve, inicialmente, lugar à dedução total ou parcial do imposto que onerou a respectiva construção, aquisição ou outras despesas de investimento com eles relacionadas, quando os imóveis passem a ser objecto de uma locação isenta, nos termos do artº.9, nº.29, do mesmo diploma.
(sumário da exclusiva responsabilidade do relator)
Nº Convencional:JSTA000P28484
Nº do Documento:SA2202111100718/16
Data de Entrada:10/30/2020
Recorrente:A.................., SA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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"A………………………, S.A.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. de Aveiro, constante a fls.81 a 86-verso do processo físico, a qual julgou improcedente a presente impugnação, pela sociedade recorrente intentada, tendo por objecto os actos de liquidação adicional e juros compensatórios de I.V.A., referentes ao período de 12/2010 e no montante total de € 42.391,97.
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.88 a 91-verso do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
1-O contrato de locação financeira constitui uma prestação de serviços;
2-No caso da recorrente, as despesas foram efectuadas em bens em locação financeira e consequentemente incorpóreos, na linguagem do imposto sobre o valor acrescentado, sobre prestações de serviços;
3-Neste sentido, uma vez que são sobre prestações de serviços, as rendas pagas pela recorrente, por todos, no valor tributável são incluídos as amortizações financeiras e os juros, cf. art.º 16º,nº2, alínea h), e art. 18º, nº5, ambos do CIVA;
4-Apenas seriam transmissão de bens imóveis, se existisse uma regra específica de assimilação, na incidência, dos contratos de locação financeira, no artº 3º do CIVA, tal como a título de exemplo, na locação-venda, o que não é o caso sub judice;
5-Inexiste norma legal que exija a regularização do IVA, deduzido em aquisição de bens e serviços, em bens imóveis, como locatários, em regime de locação financeira, nos termos do art.º 24º do CIVA;
6-Noutro sentido, os bens em locação financeira não faziam parte dos bens do imobilizado, do locatário e recorrente, em IVA, por não serem bens que lhe foram transmitidos;
7-Pelo que as deduções efetuadas pela recorrente e em causa nos autos não preenchem as condições, para regularizar o IVA nos termos e para os efeitos do art.º 24º do CIVA, consequentemente a sentença deve ser substituída em conformidade, por violar os nºs 5 e 6 do art.º 26º do CIVA.
Normas jurídicas violadas: 1º e ss do DL 149/95 de 24/06; 3º, 4º, 16º nº2 al. a), 18º n.º 5, 24º e 26º nº6 do CIVA.
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Não foram produzidas contra-alegações no âmbito da instância de recurso.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual termina pugnando pelo não provimento do recurso (cfr.fls.100 do processo físico).
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.103 do processo físico) vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.81-verso a 83 do processo físico):
1-Em 13/01/1993 foi efetuado o registo da constituição da sociedade “B……………….., Lda.”, com o nipc ………….., e sede na Rua ……., ……….., S. João da Madeira - pág. 6 do Relatório de fls. 4 do PA apenso;
2-Até final de 2009 a sociedade exerceu, em instalações próprias, a atividade têxtil para o setor automóvel - pág. 12 do Relatório de fls. 7 do PA apenso;
3-Em 31/12/2009 a referida sociedade alterou a forma e a firma para “A……………., SA” - pág. 7 do Relatório de fls. 4 do PA apenso;
4-No início de 2010 constituiu a sociedade “ C………………, SA”, nipc …………, para a qual transferiu todas as existências de matérias-primas e de produtos bem como todos os equipamentos para o exercício da atividade têxtil que antes era exercida por si, ficando apenas com os imóveis - pág. 12 do Relatório de fls. 7 do PA apenso;
5-Desde 2010, a agora impugnante (A………….., SA, antiga B…………., Lda., nipc …………) dedica-se à atividade de locação imobiliária, tendo arrendado os seus imóveis à sociedade “C…..…., SA”, nipc ……….., da qual recebe rendas - pág. 12 do Relatório de fls. 7 do PA apenso;
6-Nas faturas relativas ao arrendamento não foi liquidado IVA - pág. 12 do Relatório e anexo 3, de fls. 7 e 17 a 21 do PA apenso;
7-Ao abrigo das Ordens de Serviço nº OI201401374 e OI201401375, a AT levou a cabo uma ação inspetiva externa relativa à atividade da impugnante nos anos 2010 e 2012, com início em 4/06/2014 e termo em 2/07/2014, que culminou com o Relatório final de 29/07/2014, homologado pelo despacho de 31/07/2014 – fls. 1 e seguintes e 37 e 39 do PA apenso;
8-Nessa ação inspetiva a AT reconheceu que a atividade imobiliária exercida no ano 2010 se encontra isenta de IVA por força do artigo 9º, nº 29º, do CIVA - pág. 12 do Relatório de fls. 7 do PA apenso;
9-No Relatório da inspeção, a AT verificou que, antes de 2010, a impugnante tinha deduzido IVA (desde 2001), no montante total de € 168.252,97, relacionado com a aquisição ou construção e manutenção dos imóveis arrendados a partir de 2010, e considerou que, por força do artigo 24º, nº 5, 6 e 8, do CIVA, deveria ter havido lugar, na última declaração periódica de 2010, a uma regularização do IVA proporcional, nos termos do nº 3 do mesmo artigo, que não foi efetuada tempestivamente - pág. 13/14 do Relatório de fls. 7/8 do PA apenso;
10-Após apurar o coeficiente de regularização (0,55%), correspondente a 11 de 20 anos, a AT quantificou o IVA a regularizar a favor do Estado, em falta, no montante de € 130.427,34 - pág. 13/14 do Relatório e anexo 4, de fls. 7/8 e 22 a 27 do PA apenso;
11-Em 22/07/2014, no decorrer do direito de audição, a agora impugnante regularizou o IVA a favor do estado no montante de € 130.427,34 – fls. 30 a 36 do PA;
12-Incidindo sobre o valor de € 130.427,34, a AT efetuou a liquidação nº 140195562 relativa a juros compensatórios do IVA, relativa ao período de 2010.12, no montante de € 17.981,11, com data de pagamento voluntário até 31/10/2014 – anexo 1 da p.i. e da reclamação graciosa, de fls. 22 do processo físico e 60 do PA, respetivamente;
13-Em 3/10/2014, a agora impugnante deduziu reclamação graciosa contra a totalidade da liquidação de juros aludida no ponto anterior e contra a parte do imposto (IVA), no montante de € 34.410,86, considerado corrigido a mais na declaração periódica de dezembro de 2010 apresentada em 22/07/2014, e juntou cópias de faturas relativas a despesas efetuadas antes de 2010, onde constam descrições relativas a aquisição de “materiais”, “serviços prestados” “prumos” e “travessas”, “a transportar”, “instalação de rede ar comprimido”, “instalação elétrica de iluminação”, “instalação elétrica de força motriz, quadros elétricos, iluminação restante”, “conclusão do forn. e montagem da instalação elétrica iluminação normal e emergência, tomadas monofásicas e elétrico na fábrica”, “construção de vedação em painel sanduiche no interior da fábrica”, “cobertura metálica, caleira interior, chapéu em chapa pré-lacada branca sobre o muro, pintura do telhado dos escritórios”, “afinação de todas as janelas dos escritórios”, etc. – fls. 54 a 83 do PA;
14-Em 30/03/2015, pelo ofício nº 200 410, de 27/3/2015, a AT notificou a agora impugnante da decisão de indeferimento da reclamação graciosa – fls. 105 a 116 do PA;
15-Em 24/04/2015 a agora impugnante deduziu recurso hierárquico contra a decisão aludida no ponto anterior – fls. 117 e seguintes do PA;
16-Em 5/04/2016, pelo ofício nº 200 329, de 1/4/2016, a AT notificou a agora impugnante da decisão de indeferimento do recurso hierárquico – fls. 169 a 176 do PA;
17-Em 5/07/2016, pelo SITAF, foi apresentada a petição inicial da presente impugnação – fls. 1 e seguintes do processo físico.
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: "…Não há factos a considerar como não provados com relevância para a boa decisão da questão…".
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: "… O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao PA, que não foram impugnados, e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados – art.º 74º da LGT - também são corroborados pelos documentos juntos aos autos art.º 76º nº 1 da LGT e arts. 362º e ss do Código Civil (CC) – identificados em cada um dos factos descritos no probatório.
Os restantes factos alegados, se existem, não foram julgados provados ou não provados, em virtude de não ter sido produzida prova, por constituírem considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito ou não terem relevância para a decisão da causa…".
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou improcedente a presente impugnação, em consequência do que absolveu a Fazenda Pública do pedido e manteve os actos tributários objecto do processo, na parte impugnada (cfr.nºs.12 e 13 do probatório supra).
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Relembre-se que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal "ad quem", ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em síntese, que os bens em regime de locação não faziam parte do imobilizado da sociedade recorrente, em sede de I.V.A., por não serem bens que lhe foram transmitidos. Que não existe norma legal que exija a regularização do I.V.A., deduzido em aquisição de bens e serviços tendo por objecto imóveis, não sendo tal norma o artº.24, do C.I.V.A. Que as deduções efectuadas pela recorrente e em causa nos autos não preenchem as condições para regularizar o I.V.A. nos termos e para os efeitos do citado artº.24, do C.I.V.A., e, consequentemente, a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito (cfr.conclusões 1 a 7 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
O exercício do direito à dedução do I.V.A. consubstancia uma das principais características deste tributo, tudo em conformidade com o regime consagrado na Sexta Directiva de 1977 (directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17/05/1977), mais exactamente no seu artº.17, preceito que consagra as regras de exercício do direito à dedução do imposto, contemplando diversos requisitos objectivos e subjectivos do exercício do mesmo direito. O sistema comum do I.V.A. instituído pela Sexta Directiva (cfr.actual directiva 2006/112/CE do Conselho, 28/11/2006 - Directiva IVA) caracteriza-se pela existência de uma base de incidência uniforme, de regras comuns em matéria de incidência objectiva e subjectiva, isenções e valor tributável, pela harmonização de regimes especiais e pelo alargamento obrigatório da tributação ao estádio retalhista e à generalidade das prestações de serviços (cfr.Clotilde Celorico Palma, Introdução ao Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Cadernos do I.D.E.F.F., nº.1, 6ª.Edição, Almedina, 2020, pág.228 e seg.; Rui Manuel Pereira da Costa Bastos, O Direito à Dedução do IVA, Cadernos do I.D.E.F.F., nº.15, Almedina, 2014, pág.23 e seg.).
Especificamente, sobre a actividade de locação de bens imóveis, recorde-se que o princípio geral de tributação, consagrado no C.I.V.A., considera que a locação de bens imóveis é uma prestação de serviços sujeita a I.V.A., em resultado da conjugação do artº.1, nº.1, al.a), com o artº.4, nº.1, do mesmo diploma. No entanto, o próprio C.I.V.A. prevê derrogações ao princípio geral, entre as quais se encontra a prevista no artº.9, nº.29, que determina que a locação de bens imóveis se encontra isenta de I.V.A. (estamos perante uma isenção simples ou incompleta, a qual não confere direito à dedução de imposto, ou seja, sem crédito de imposto suportado a montante, em sede de operações internas), tudo na esteira do consignado no artº.13, da Sexta Directiva I.V.A. (cfr.directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17/5/1977). O contrato de locação de imóvel que se enquadra na norma sob exegese, independentemente da natureza jurídica do negócio e do estatuto do locador, consiste na colocação passiva do imóvel à disposição do locatário, em conformidade com o conceito de locação definido nos artºs.1022 e 1023, do C.Civil (a renda recebida pela cedência de espaço nu), assim constituindo uma actividade relativamente passiva ligada ao simples decurso do tempo e que não gera um valor acrescentado significativo (cfr.Clotilde Celorico Palma, ob.cit., pág.192 e seg.; Rui Manuel Pereira da Costa Bastos, ob.cit., pág.139 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, do exame da fundamentação dos actos tributários objecto do presente processo e constante do relatório dos Serviços de Inspecção Tributária (cfr.nºs.7 a 10 do probatório supra) deve concluir-se, antes de mais, que a A. Fiscal reconhece que, por a sociedade impugnante/recorrente ter alterado o seu objecto social a partir de 2010, passando a praticar exclusivamente a actividade imobiliária de locação abrangida pela isenção incompleta prevista no citado artº.9, nº.29, do C.I.V.A., se verificou a afectação desses bens (imóveis) a uma actividade sujeita e isenta de I.V.A., sem direito a dedução, por alteração do objecto nos termos do artº.24, nº.6, al.c), do mesmo diploma, na redacção aplicável ao caso dos autos, a resultante da revisão do articulado efectuada pelo dec.lei 102/2008, de 20/06.
Tais imóveis objecto de locação em 2010 faziam parte do imobilizado corpóreo da sociedade impugnante/recorrente até ao citado ano, assim implicando a regularização de I.V.A. a levar a efeito no último período do ano (Dezembro de 2010), tudo nos termos do artº.24, nºs.3, 5, 6 e 8, do C.I.V.A. (e afastando-se o regime previsto no artº.26, do C.I.V.A., norma que consagra a regularização de deduções relativas a imóveis que não foram utilizados em fins empresariais, portanto, que não pertencem ao activo imobilizado da empresa), e dado que nos encontramos perante um sujeito passivo misto, para efeitos de dedução de imposto (recorde-se que a sociedade impugnante, ainda de acordo com o relatório, em sede de I.V.A., se encontrava enquadrada no regime normal de periodicidade mensal - cfr.nº.9 do probatório).
Relembre-se que o activo das empresas se divide sempre entre o imobilizado, destinado a uso e fruição pela empresa e não a venda, e o activo permutável (ou circulante, na terminologia da lei), destinado, esse sim, a venda. Por outras palavras, os elementos do activo imobilizado (por contraposição ao activo circulante) são os recursos que uma empresa utiliza para realizar as suas operações (objecto social) e que não se destinam a venda no âmbito da sua actividade operacional (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/11/2020, rec.189/12.6BEPRT; Clotilde Celorico Palma e Outros, Código do IVA e RITI, Notas e Comentários, Almedina, 2014, pág.293, em anotação ao artº.24).
Assim, deve vincar-se, contrariamente ao defendido pela sociedade recorrente, que a correcção, em sede de I.V.A., levada a efeito pela A. Fiscal e fundante das liquidações impugnadas teve como pressuposto os imóveis em causa fazerem parte do activo imobilizado da empresa até 2010.
Avançando.
Nos termos do citado artº.24, nº.6, al.c), do C.I.V.A., deverá, igualmente, regularizar-se de uma só vez o I.V.A. deduzido, na proporção do número de anos do período de regularização ainda não decorridos (tudo em sede de período de vida útil dos imóveis em causa e para efeitos de reintegração ou amortização total do seu valor - cfr.decreto regulamentar 25/2009, de 14/09), considerando-se que os bens estão afectos a uma actividade não tributada, no caso de bens imóveis relativamente aos quais houve inicialmente lugar à dedução total ou parcial do imposto que onerou a respectiva construção, aquisição ou outras despesas de investimento com eles relacionadas, quando os imóveis passem a ser objecto de uma locação isenta, nos termos do artº.9, nº.29, do mesmo diploma (cfr.Clotilde Celorico Palma, ob.cit., pág.259 e seg.; Rui Manuel Pereira da Costa Bastos, ob.cit., pág.229 e seg.; Clotilde Celorico Palma e Outros, Código do IVA e RITI, Notas e Comentários, Almedina, 2014, pág.295 e seg., em anotação ao artº.24).
No caso "sub iudice", deve concluir-se que a A. Fiscal não pressupôs a existência de uma transmissão dos imóveis ocorrida no ano 2010, como fundamento da obrigação da regularização do I.V.A. deduzido nos anos anteriores e atento o disposto no artº.24, nºs.3, 5, 6 e 8, do C.I.V.A., contrariamente ao que parece defender a sociedade recorrente.
E não tendo a recorrente impugnado a matéria de facto estruturada pelo Tribunal "a quo", confirma-se a sentença recorrida quando refere que o I.V.A. mencionado nas facturas em causa nos autos, por se referirem às operações com os prédios relativamente às quais foi exercido o direito à dedução em anos anteriores a 2010, estão abrangidas pela correcção efectuada pela Fazenda Pública, a qual se mostra legal (cfr.nºs.7 a 10 do probatório supra).
Rematando, a sentença recorrida não padece do erro de julgamento de direito que lhe é imputado, nomeadamente, não violando o regime previsto nos artºs.24 e 26, do C.I.V.A.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DESTE SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se a sociedade recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 10 de Novembro de 2021. - Joaquim Manuel Charneca Condesso (relator) - Gustavo André Simões Lopes Courinha – Pedro Nuno Pinto Vergueiro.