Acórdãos T CONFLITOS

Acórdão do Tribunal dos Conflitos
Processo:086423/24.9YIPRT.L1.S1
Data do Acordão:06/25/2025
Tribunal:CONFLITOS
Relator:NUNO GONÇALVES
Sumário:I - A empresa concessionária da gestão e exploração do serviço público de estacionamento nas vias municipais, mediante contrato de concessão de serviços públicos, nesse âmbito, atua em substituição da autarquia, munida dos poderes que a esta são legalmente atribuídos nesse domínio.
II - Compete aos tribunais da jurisdição administrativa conhecer da ação intentada pela empresa a que o Município concessionou a exploração do estacionamento de veículos em ZEDL, na qual requereu, em injunção, o pagamento por particular, da contraprestação/taxa devida pela utilização do referido estacionamento.
Nº Convencional:JSTA000P33986
Nº do Documento:SAC20250625086423
Recorrente:DATAREDE, S.A.
Recorrido 1:AA
Votação:UNANIMIDADE
Área Temática 1:*
Aditamento:
Texto Integral: Recurso
**

O Tribunal dos Conflitos, em julgamento de recurso acorda: ----------------------

**

a. Relatório:

Data Rede, S. A., em 27-06-2024 apresentou no Balcão Nacional de Injunções, injunção exigindo de: -----

- AA, com os sinais dos autos ----

o pagamento de € 2 781,77 (sendo € 2 669,00 de capital, € 36,27 de juros de mora vencidos e € 76,50 de taxa de justiça paga).

Para demonstrar a obrigação pecuniária de onde emerge a quantia reclamada alegou, em síntese, que no âmbito da sua atividade de concessionária da exploração e prestação de serviços de parqueamento automóvel colocou, em vários locais da cidade de Praia da Vitória, máquinas para pagamento de estacionamento em zonas de estacionamento tarifado de curta duração, com a indicação das condições de utilização e respetivas tarifas .

Que o Requerido, estacionou o seu veículo automóvel com a matrícula ..-MZ-.. nos vários parques que a requerente gere e explora naquela cidade, mas não efetuou o pagamento da tarifa devida pelo parqueamento.

O Requerido, notificado, deduziu oposição à injunção.

Em face do que foram os autos remetidos ao Tribunal judicial da comarca dos Açores.

Recebido o processo com distribuição ao Juízo de Competência Genérica de Praia da Vitória, para tramitação como ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, o tribunal, por sentença de 14.10.2024, julgou verificada a exceção dilatória da sua incompetência material para conhecer da causa e absolveu a requerida da instância.

Competência absoluta para a litígio que atribuiu aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal.

A Requerente não se conformando, apelou para a 2.ª instância.

Distribuído o recurso na Relação de Lisboa, a Exma. Desembargadora relatora, por decisão sumária julgou improcedente o recurso, confirmando a decisão impugnada.

A recorrente reclamou para a conferência.

O Tribunal da Relação do Lisboa, por acórdão de 8.04.2025, manteve a decisão singular reclamada.

A Requerente, inconformada, interpôs recurso para o Tribunal dos Conflitos, pugnando pela atribuição da competência para conhecer da causa ao juízo de competência genérica de Praia da Vitória.

O Recorrido, notificado, não respondeu ao recurso.

b. parecer do Ministério Público:

O Digno Procurador-Geral Adjunto na vista a que alude o art. 11.º, n.º 4, da Lei n.º 91/2019, de 4 de setembro, apoiando-se ena jurisprudência que cita, pronuncia-se pela improcedência do recurso e pela atribuição da competência material para a ação à jurisdição administrativa.

c. exame preliminar:

O recurso é o próprio - art. 101.º n.º 2 do CPC.

Está admitido.

Este Tribunal dos Conflitos é o competente para julgar o recurso no que respeita à questionada incompetência jurisdicional material do tribunal cível para conhecer da causa – art. 3.º alínea c) da Lei n.º 91/2019 de 4 de setembro.

Não existem questões processuais que devam conhecer-se previamente à apreciação do mérito e que pudessem impedir o prosseguimento do recurso para julgamento.

d. objeto do recurso:

Consiste em definir que jurisdição – comum ou administrativa – é compete, em razão da matéria, para conhecer da ação que a Requerente intentou contra o Requerido a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15 000,00.

4. Fundamentação:

a. da competência:

1. pressuposto:

A competência do tribunal é um pressuposto indispensável para que o juiz possa conhecer do mérito de uma causa.

Está pacificamente assente na doutrina e na jurisprudência1 que “a competência dos tribunais em razão da matéria afere-se em função da configuração da relação jurídica controvertida, isto é, em função dos termos em que é deduzida a pretensão do autor na petição inicial, incluindo os seus fundamentos (…)

A competência em razão da matéria é, assim, questão que se resolve em razão do modo como o autor estrutura a causa, e exprime a sua pretensão em juízo, não importando para o efeito averiguar quais deveriam ser os correctos termos dessa pretensão considerando a realidade fáctica efectivamente existente, nem o correcto entendimento sobre o regime jurídico aplicável …»].2.

E, em determinadas causas, afere-se ainda em função da natureza jurídica dos sujeitos processuais. Sendo questão “a resolver de acordo com a identidade das partes e com os termos da pretensão do autor (compreendidos aí os respetivos fundamentos), não importando averiguar quais deviam ser as partes e os termos dessa pretensão3.

2. fixação:

Nos termos da lei - art. 38.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013 -, “a competência fixa-se no momento em que a ação se propõe, sendo irrelevantes as modificações de facto que ocorram posteriormente, a não ser nos casos especialmente previstos na lei”.

Norma que o ETAF praticamente reproduz (“A competência dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal fixa-se no momento da propositura da causa, sendo irrelevantes as modificações de facto e de direito que ocorram posteriormente”.) Acrescentando o n.º 2 que Existindo, no mesmo processo, decisões divergentes sobre questão de competência, prevalece a do tribunal de hierarquia superior.”.

3. repartição:

Da arquitetura constitucional e do quadro orgânico, estatutário e adjetivo que a desenvolve, resulta que aos tribunais judiciais comuns está atribuída a denominada competência residual. Que, na expressão do legislador, se traduz no poder-dever de conhecer das “causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional”.

Resulta ainda que, na ordem dos tribunais judiciais comuns, aos juízos cíveis compete conhecer das causas que não estejam atribuídas a tribunais ou juízos “dotados de competência especializada”.

Assim, não cabendo uma causa na competência legal e especificamente atribuída a outro tribunal, será a mesma da competência residual do tribunal comum.

E que, na ordem dos tribunais administrativos e fiscais, a competência residual para “dirimir litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais” recai nos tribunais administrativos.

Os tribunais administrativos, “são os tribunais comuns em matéria administrativa, tendo «reserva de jurisdição nessa matéria, excepto nos casos em que, pontualmente, a lei atribua competência a outra jurisdição»4.

O âmbito da competência material dos tribunais administrativos e fFiscais encontra-se concretizada, essencialmente, no art. 4.º do ETAF, estabelecendo no n.º 1 alíneas e) e o) que lhes cabe, (no que para aqui poderia convocar-se) “a apreciação de litígios que tenham por objeto questões relativas a:--------

e) Validade de atos pré-contratuais e interpretação, validade e execução de contratos administrativos ou de quaisquer outros contratos celebrados nos termos da legislação sobre contratação pública, por pessoas coletivas de direito público ou outras entidades adjudicantes;

o) Relações jurídicas administrativas e fiscais que não digam respeito às matérias previstas nas alíneas anteriores. (…)”.

Consagrando esta última norma um “critério subsidiário e residual” atributivo da competência material à jurisdição administrativa e fiscal para conhecer de causas que tem por objeto matérias atinentes a relações jurídicas administrativas e fiscais que não lhe são atribuídas, especificamente, nem em legislação avulsa nem se incluem em qualquer das restantes alíneas do n.º 1 do artigo 4º do ETAF.

A repartição da competência material e, designadamente em razão da especialização, entre os tribunais da jurisdição administrativa de primeira instância está regulada no ETAF (maxime: nos arts. 44.º, 44.º-A, 49.º e 49.º-A).

ii. relações jurídicas administrativas:

Relação jurídica administrativa é a “relação jurídica de direito administrativo”, com exclusão, nomeadamente, das relações de direito privado em que intervém a administração. (…”)

É aquela que confere poderes de autoridade ou impõe restrições de interesse público à Administração perante os particulares ou que atribui direitos ou impõe deveres públicos aos particulares perante a administração”5

Considerando-se como tal para efeitos de delimitação da competência da jurisdição as “relações jurídicas públicas (seguindo um critério estatutário, que combina sujeitos, fins e meios) (…) em que um dos sujeitos, pelo menos, seja uma entidade pública ou uma entidade particular no exercício de um poder público, actuando com vista à realização de um interesse público legalmente definido6.

iii. natureza jurídica da Recorrente:

A Data Rede, S. A. é uma empresa privada que tem por objeto a exploração de áreas delimitadas do espaço público, devidamente sinalizadas, para estacionamento de veículos automóveis por períodos limitados.

A Câmara Municipal de Praia da Vitória, mediante contrato, concessionou à Requerente a gestão, exploração e fiscalização, em regime de concessão de serviço público, dos lugares de estacionamento tarifado de viaturas na via pública naquela cidade.

Estacionamento naquela localidade que era á data e continua a ser disciplinado pelo Regulamento n.º 207/2016 - Regulamento das Zonas de Estacionamento Tarifado na Cidade da Praia da Vitória -, aprovado por deliberação da Câmara Municipal da Praia da Vitória de 2 de fevereiro de 2016 e da Assembleia Municipal da Praia da Vitória de 12 de fevereiro de 2016, publicado no Diário da República, 2.ª série — N.º 40 — 26 de fevereiro de 2016 que, com alterações, continua em vigor.

Dispondo o artigo 4.º, n.º 1, estatui que a ocupação dos “lugares de estacionamento ficam sujeitos ao pagamento de tarifas cujos valores” têm sido anualmente fixados pela autarquia.

Estabelecendo no artigo 10.º que os utilizadores deverão “adquirir o título de estacionamento nos equipamentos destinados a esse efeito”, do qual “conste o seu período de validade”. Uma vez esgotado o período máximo de permanência no mesmo local deve o utente adquirir novo título ou retirar o veículo do espaço ocupado.

O Decreto-Lei n.º 81/2006, de 20 de abril que contém o regime relativo às condições de utilização dos parques e zonas de estacionamento, confere às câmaras municipais o poder de aprovar a localização de parques ou zonas de estacionamento na sua área territorial.

Estatuindo que “As condições de utilização e taxas devidas pelo estacionamento são aprovadas por regulamento municipal.”

E que “o estacionamento em parques e zonas de estacionamento pode ser condicionado ao pagamento de uma taxa e ter utilização limitada no tempo” – artigo 4.º n.º 2.

Nos termos da art.º 3.º da Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro que contém o regime geral das taxas das autarquias locais, “as taxas das autarquias locais são tributos que assentam na prestação concreta de um serviço público local, na utilização privada de bens do domínio público e privado das autarquias locais (…)”.

São criadas por regulamento aprovado pelo órgão deliberativo respetivo – art.º 8.º - que deve estabelecer as regras relativas à liquidação e cobrança.

Não sendo pagas tempestivamente vencem juros de mora e são cobradas coercivamente através de processo de execução fiscal, nos termos do CPPT – art.º 11.º.

g. apreciação:

1. pedido e causa de pedir:

No caso, pelo pedido e pela arquitetura da causa de pedir verifica-se que a Requerente exige da Requerida o pagamento da contraprestação devida pela utilização de estacionamentos do seu veículo automóvel em zonas de estacionamento tarifado que o Município de Praia da Vitória concessionou à Requerente mediante contrato de concessão de serviços públicos celebrado entre ambas. Em suma, exige o pagamento de quantia resultante de taxas unilateralmente fixadas e aprovadas pelo município nos termos do enquadramento legal aplicável.

A requerente, concessionária do serviço público de estacionamento nas vias municipais, nesse âmbito, atua em substituição da autarquia e munida dos poderes que a esta são legalmente atribuídos nessa área.

ii. a jurisprudência:

Versando sobre situação idêntica, o STJ no acórdão de 12/10/2010, tirado no processo n.º 1984/09.9TBPDL.L1.S17, sustentou que “No caso concreto sabemos que a A. é a concessionária de um serviço público, por via dos contratos de concessão que celebrou com o Município.

Assim, o direito da A. a cobrar determinado montante pela utilização dos parques de estacionamento de que é concessionária, advém-lhe de um contrato claramente administrativo que versa sobre questão do interesse público que o Município de (…) deliberou concessionar-lhe.

Essa importância corresponde a uma taxa fixada em Regulamento da Câmara Municipal e pode até ter carácter sancionatório, (…).

No fundo, a A. exerce determinadas funções de carácter e interesse público que pertencem às funções do Município, mas que este deliberou concessionar à A.

Consequentemente, a cobrança do crédito em causa nesta acção só é possível porque a recorrente está investida em poderes de autoridade, que se impõem aos particulares.

De contrário, jamais a A. podia cobrar, de quem quer que fosse, uma taxa pela ocupação temporária de um espaço público.

Portanto, embora a relação estabelecida entre a A. e os particulares que usam o espaço de estacionamento concessionado seja diferente do que existe entre a A. e o Município (…), o certo é que, (…) «os actos praticados pela recorrente não revestem a natureza de actos privados, susceptíveis de serem desenvolvidos por um qualquer particular, mas, ao invés, revestem-se de natureza pública, na medida em que são praticados no exercício de um poder público, isto é, na realização de funções públicas no domínio de actos de gestão pública», por isso que, «na relação jurídica que estabelece com o recorrido, surge investida de prorrogativas próprias de um sujeito público, revestido de jus imperii, podendo cobrar-lhe uma taxa pelo estacionamento nas zonas concessionadas ».

Ora o recorrido ao utilizar os parques de estacionamento sabe que está a utilizar um espaço público concessionado à A. e aceita as condições em que pode fazê-lo, ao menos tacitamente.

Mas, como se disse, essas condições são as que constam do Regulamento das Zonas de Estacionamento de Duração Limitada de (…), que é um Regulamento Municipal devidamente aprovado e publicitado, contendo, como é evidente, normas de direito público, que obrigam, quer a concessionária, quer os utentes dos parques de estacionamento concessionados.

Portanto o R., ao contratar com a A. a utilização dos espaços de estacionamento que a esta foram concessionados sabe que esse contrato ou acordo tácito está submetido a um regime substantivo de direito público. (…).

Daí que, para além do que acima se referiu quanto aos poderes exercidos pela A., na qualidade de concessionária de um serviço de natureza pública, o dito acordo ou contrato cabe perfeitamente no âmbito do disposto no Art. 4 f) do ETAF.

Tanto basta para concluir, como as instâncias, que o litígio que opõe as partes nesta acção deve ser dirimido pelo Tribunal Administrativo, que é o competente em razão da matéria.”.

No mesmo sentido, decidiu o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão de 25/10/2017, prolatado no processo n.º 0167/178, assim sumariado: -----

O requerimento de injunção para cobrança de taxas ou tarifas apresentado pelos concessionários municipais ao qual haja sido deduzida oposição, consubstancia-se, nos termos da lei, numa acção cujo conhecimento é da competência dos TAFs.”.

Como nota o Digno Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, “(…) a responsabilidade para definir o estacionamento de veículos nas vias públicas e demais lugares públicos é de natureza pública, constituindo atribuição das Câmaras (cfr. art.º 33º nº 1, al. rr) da Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro - Regime Jurídico das Autarquias Locais) podendo, em contrapartida, exigir dos utentes o pagamento de uma taxa previamente determinada.

A Câmara Municipal, por via do contrato de concessão em causa, transferiu para a concessionária o direito a gerir a atividade pública referente a essa matéria no seu próprio nome – neste sentido, Pedro Gonçalves in “A concessão de Serviços Públicos (uma aplicação da técnica concessória)”, Almedina, 1999, pag.108.

Por recurso aquele contrato, a Câmara, na prossecução de objetivos integrados no perímetro das suas atribuições no que tange ao estacionamento de veículos na via pública, passou a dispor da colaboração dos serviços da recorrente na perseguição daqueles interesses exclusivamente públicos ou coletivos postos por lei a seu cargo.

Donde, enquanto concessionária da exploração do estacionamento tarifado a recorrente prossegue fins de interesse público, estando, para tanto, munida dos necessários poderes de autoridade, motivo por que a relação em causa consubstancia uma relação jurídica administrativa/tributária, subsumível na al. o) do n.º 1 do art.º 4.º do ETAF (redação introduzida pelo DL 214-G/2015, de 02.10, entrado em vigor em 01.12.2015, cfr. art.º 15.º daquele diploma, como tal, aplicável à ação em análise, proposta em 2024).”.

Este Tribunal de Conflitos, por acórdãos de 8.05.2025, tirados nos processos 126592/24.4YIPRT.P1.S1, 118032/24.5YIPRT.L1. e 79534/24.2YIPRT.P1.S1, entendeu e decidiu, conforme aí sumariado que: --------------

“1. A concessionária do serviço público de estacionamento nas vias municipais, mediante contrato de concessão de serviços públicos, nesse âmbito, atua em substituição da autarquia e munida dos poderes que a esta são legalmente atribuídos nessa área.

2. Compete aos tribunais da jurisdição administrativa conhecer da ação que a empresa a que o Município adjudicou a gestão e exploração do estacionamento de veículos em ZEDL, requerendo de particular o pagamento a da contraprestação devida pela utilização do referido estacionamento.”79534/24.

E nos acórdãos de 8.05.2025, tirados nos processos 118584/24.YIPRT.L1.S1 e 42536/24.7YIPRT.E1.S1) entendeu e decidiu, conforme aí sumariado que: --------------

1. A concessionária da gestão e exploração do serviço público de estacionamento nas vias municipais, mediante contrato de concessão de serviços públicos, nesse âmbito, atua em substituição da autarquia, munida dos poderes que a esta são legalmente atribuídos nessa área.

2. As relações que estabelece com os utilizadores do estacionamento naquelas zonas consubstancia uma relação jurídica administrativa/tributária, subsumível ao disposto nas al.ªs e) e o) do n.º 1 do art.º 4.º do ETAF.

3. Compete aos tribunais da jurisdição administrativa conhecer da ação intentada pela empresa a que o Município adjudicou a gestão e exploração do estacionamento de veículos em ZEDL, requerendo de particular o pagamento da contraprestação devida pela utilização do referido estacionamento.

iii. relação jurídica administrativa/tributária:

No caso, como se expôs, a Câmara Municipal de Praia da Vitória, mediante contrato administrativo de concessão, transferiu para a concessionária, aqui Recorrente, a gestão, exploração e fiscalização do estacionamento tarifado daquele município

A Recorrente, enquanto concessionária da gestão e exploração do estacionamento tarifado de curta duração nas ruas da cidade da Praia da Vitória prossegue os fins de interesse público legalmente conferidos ao município, estando, para tanto, munida dos inerentes poderes de autoridade.

Em causa “está uma relação jurídica administrativa na medida em que se entende como tal aquela em que um dos sujeitos, pelo menos, seja uma entidade pública ou uma entidade particular no exercício de um poder público, actuando com vista à realização de um interesse público legalmente definido - neste sentido, ver Vieira de Andrade “in” “A Justiça Administrativa”, Lições, 2000, página 79.9

Destarte, as relações que estabelece com os utilizadores do estacionamento naquelas zonas consubstancia uma relação jurídica administrativa/tributária, subsumível ao disposto nas al.ªs e) e o) do n.º 1 do art.º 4.º do ETAF.

Por fim, note-se que não está em causa a prestação de um serviço público essencial, na aceção da Lei n.º 23/96, de 26 de julho (cfr. art. 1.º), subsumível à previsão da al. e) do n.º 4 do ETAF, aditada pela Lei n.º 114/2019 de 12 de setembro.

Pelo exposto e em concordância com a jurisprudência citada que se reitera, conclui-se que decidiram acertadamente as instâncias recorridas porque é aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscais - concretamente ao tribunal administrativo de Ponta Delgada – que compete, em razão da matéria, conhecer da ação que a Recorrente intentou para exigir do Recorrido o cumprimento da obrigação de pagar as tarifas devidas pelo estacionamento do seu veículo automóvel nas zonas de estacionamento de curta duração do município da Praia da Vitória.

e. Dispositivo:

Assim, o Tribunal dos Conflitos acorda em julgar improcedente o recurso, confirmando-se o acórdão recorrido, decidindo-se que materialmente competente para a ação intentada nos autos são, nos termos do no n.º 1 do artigo 1.º e al.ª o) do n.º 1 do artigo 4º do ETAF, os tribunais da jurisdição administrativa, concretamente o Tribunal administrativo e fiscal de Ponta Delgada.

*

Sem custas por não serem devidas – art. 5.º n.º 2, da Lei n.º 91/2019, de 04 de setembro.

*

Lisboa, 25 de junho, de 2025 . Nuno António Gonçalves (relator) - Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa.

*

1. Acórdão do Tribunal dos Conflitos, de 08/11/2018, processo n.º 020/18.

2. http://www.dgsi.pt/jcon.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/00026a026bf60a4e802583440035ed00

3. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1976, pag. 91.

4. Ac. do Tribunal dos Conflitos, de 08/11/2018, processo n.º 020/18 (onde se referência os ver Acórdãos do Tribunal Constitucional nº 508/94, de 14.07.94, e nº 347/97, de 29.04.97) http://www.dgsi.pt/jcon.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/00026a026bf60a4e802583440035ed00

5. Freitas do Amaral in “Direito Administrativo”, volume III, Lisboa, 1989, pág. 439.

6. José Carlos Vieira de Andrade in “A Justiça Administrativa”, 17.ª Edição, Almedina, 2019, pág. 49.

7. https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/a1ea491f78116be3802577e400564f3c?OpenDocument

8. https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/6c67162cbabbf751802581c9004391cc?OpenDocument&ExpandSection=1

9. Acórdão do STA citado.