Acórdão do Tribunal dos Conflitos | |
Processo: | 017/10 |
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Data do Acordão: | 11/09/2010 |
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Tribunal: | CONFLITOS |
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Relator: | ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA |
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Descritores: | TARIFA DE DISPONIBILIDADE COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS FISCAIS CONCESSIONÁRIO SERVIÇOS MUNICIPALIZADOS REDE DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA ABASTECIMENTO DOMICILIÁRIO SANEAMENTO BÁSICO EMPRESA CONCESSIONÁRIA |
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Sumário: | Compete aos tribunais tributários o conhecimento de acção em que se pretende o reconhecimento da inadmissibilidade da cobrança de consumos mínimos, denominados como tarifa de disponibilidade, por parte de empresa concessionária da exploração e gestão dos serviços públicos municipais de abastecimento de água e de saneamento. |
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Nº Convencional: | JSTA00066681 |
Nº do Documento: | SAC20101109017 |
Data de Entrada: | 07/01/2010 |
Recorrente: | A... NO CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO ENTRE O 3º JUÍZO CÍVEL DO TRIBUNAL JUDICIAL DE GONDOMAR E OS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS |
Recorrido 1: | * |
Votação: | UNANIMIDADE |
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Meio Processual: | REC PRE CONFLITO. |
Objecto: | AC RP. |
Decisão: | NEGA PROVIMENTO. / DECL COMPETENTE TRIBUNAL TRIBUTÁRIO. |
Área Temática 1: | DIR FISC - TAXA.. |
Área Temática 2: | DIR JUDIC - ORG COMP TRIB. |
Legislação Nacional: | CPC96 ART66 ART107 N2. LOFTJ03 ART18 N1. CONST97 ART211 N1 ART212 N3. ETAF02 ART1 N1 ART4 N1 D ART49 N1 C. DL 379/93 DE 1993/11/05 ART6 ART13 N2. DL 194/2009 DE 2009/08/20 ART80. DL 18/2008 DE 2008/01/29 NA REDACÇÃO DO DL 287/2009 DE 2009/10/02 ART407 N2. |
Jurisprudência Nacional: | AC CONFLITOS PROC14/06 DE 2006/09/26. |
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Aditamento: | ![]() |
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Texto Integral: | 1. 1.1. Condomínio do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Rua …, n.º …, …, … e …, representado pelo seu administrador, A…, propôs, no Tribunal Judicial de Gondomar, acção declarativa, na forma sumária, contra B…, SA, pedindo a condenação desta a: “a) Pagar-lhe uma indemnização no valor de 1.733,67€, correspondente aos consumos mínimos ilegais cobrados ao autor, se outra mais elevada não se vier a apurar no decurso da acção, acrescida de juros vincendos desde a data da citação até efectivo e integral pagamento; b) Retirar do prédio os contadores totalizadores nele instalados, ou, em alternativa, abster-se de cobrar ao autor a respectiva tarifa de disponibilidade, por a mesma constituir um consumo mínimo”. Para o efeito, articulou que: “[…] 2º A ré é a empresa concessionária da exploração e gestão dos serviços públicos municipais de abastecimento de água e de saneamento do município de Gondomar. 3º Desde pelo menos o ano de 2004, que a ré tem instalado no condomínio do ora autor, dois contadores totalizadores do consumo de água por si fornecida, um com o nº …, correspondente à entrada 290, e outro com o número …, correspondente à entrada 286 […]. 4º Estes contadores, têm apenas como função contar a água total dos consumos efectuados pelas partes comuns do edifício e por cada uma das 18 fracções autónomas que o compõem, que será ainda contada por outros contadores de menor calibre. […] 11º Em Março de 2006, a administração do autor, solicitou junto da ré, via postal, a anulação da tarifa de disponibilidade dos contadores totalizadores, que nesta sua missiva os identificou pelos números de cliente dos referidos contadores – … e … […]. […] 14º Foram então levadas a cabo de algumas reuniões entre autor e a ré, mas esta nunca alterou a sua posição, pugnado sempre pela manutenção dos contadores e aplicação da respectiva taxa de disponibilidade. […] 24º Contudo, ainda assim, a ré imputa ao autor uma tarifa de disponibilidade dos contadores totalizadores, não tendo qualquer suporte legal ou contratual, para o fazer. […] 30º Na sequência do acima exposto, e das facturas que o autor conseguiu reunir (desde o ano de 2006 ao ano de 2008) referentes aos contadores totalizadores e excessos de consumo a ré cobrou ilegalmente o valor de 1.733,67€, entre taxas de disponibilidade dos contadores totalizadores e excessos de consumos […]. […] 38º Ora a tarifa de disponibilidade dos contadores totalizadores instalados no prédio autor pela ré, não é mais do que um consumo mínimo. […] 40º Assim, a ré, ao cobrar o valor referido no artigo 30º da presente petição, adoptou uma conduta que bem sabia ser reprovável, violando ilicitamente uma disposição legal destinada a proteger o interesse do autor, pelo que fica aquela obrigada a indemnizar este, pelos danos causados […]”. 1.2. A Ré contestou e suscitou, desde logo, a incompetência absoluta do Tribunal, por entender que o pedido formulado radica em actos por si praticados no exercício de poderes administrativos, sendo competente a jurisdição administrativa. 1.3. O Autor replicou, opondo-se à excepção. 1.4. No saneador, foi proferido despacho a julgar procedente a excepção de incompetência absoluta arguida pela Ré, e foi esta absolvida da instância. 1.5. O Autor não se conformou com a decisão, e dela interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto. 1.6. Por acórdão daquele Tribunal, de fls. 162-169, foi negado provimento ao recurso. 1.7. De novo discordou o autor, apresentando recurso, em cujas alegações concluiu, na parte que não se reporta à questão da admissibilidade: “ […] E. O recorrente, tanto na P.l. como no recurso, não questiona nunca o tarifário aprovado pelo Município de Gondomar, pretendendo apenas que o Tribunal se pronuncie quanto à admissibilidade da cobrança de consumos mínimos, denominados como tarifa de disponibilidade, previstos e proibidos pela Lei 12/2008 de 11 de Fevereiro, bem como a instalação de contadores totalizadores, actos praticados pela recorrida na qualidade de entidade gestora. F. E deduz esta pretensão porque, tal tarifa é cobrada no decurso da execução de um contrato de fornecimento de água estabelecido entre o recorrente e a recorrida ainda que vá para além dos termos do contrato pois: G. Na verdade, a tarifa de disponibilidade, tal como o nome indica, não mede consumos efectuados e será sempre cobrada independentemente destes. H. Ora os consumos mínimos são proibidos. (Cfr. Artigo 8° n.º 1 da Lei 12/2008 de 11 de Fevereiro. I. Nos termos do artigo 13° da Lei 12/2008 de 11 de Fevereiro, é nula qualquer convenção ou disposição que exclua os direitos atribuídos aos utentes por essa mesma Lei. J. Logo a tarifa de disponibilidade, ainda que se entenda integrada no contrato de fornecimento de água celebrado entre o recorrente e recorrida, será sempre nula, nos termos do disposto no artigo 294° do Código Civil. K. Neste sentido, resulta do disposto no n° 3 do artigo no artigo 66° do Decreto-Lei n°194/2009 de 20 de Agosto que, a instalação de contadores totalizadores só poderá ocorrer no caso de existir um contrato de fornecimento de água, mas cuja instalação não depende de prévia negociação, sendo um acto discricionário da entidade gestora (aqui a recorrida). L. Resulta também da mesma norma que, o Município de Gondomar, enquanto entidade titular e concedente do serviço de fornecimento de água à recorrida, não é sequer chamada a pronunciar-se na questão de colocação de contadores totalizadores, pelo que, não se trata de um acto praticado ao abrigo de poderes públicos de autoridade. M. Por outro lado, a recorrida além de não ser uma pessoa colectiva de direito público, também não visa a satisfação de necessidades colectivas públicas, mas sim o exercício de uma actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartir, pelos sócios, os lucros resultantes dessa actividade (Cfr. Artigo 980º do Código Civil). N. Os utentes finais contratam os serviços de fornecimento de água apenas para a satisfação de uma necessidade própria. O. Pelo que, não se encontram reunidos os requisitos para que se conclua que estamos perante um contrato administrativo nas relações jurídicas que se estabelecem entre o recorrente e a recorrida no âmbito do fornecimento de água. P. Assim, sendo a recorrida uma pessoa colectiva de direito privado, a competência para apreciação do presente litígio não cabe aos Tribunais Administrativos e Fiscais, que se limita a apreciar a responsabilidade civil extracontratual, apenas, das pessoas colectivas de direito público, isto, independentemente da qualificação jurídica que se queira atribuir a esta questão (responsabilidade contratual ou extracontratual) - (Cfr. Alíneas g) e h), do n° 1 do artigo 4° do ETAF). Q. No exercício da sua actividade de fornecedora de um serviço público essencial (água), a recorrida encontra-se sujeita ao regime estatuído pela Lei 12/2008 de 26 de Fevereiro, diploma legal que configura a actividade desenvolvida pela recorrida como uma actividade de direito privado, despida de qualquer poder administrativo. R. Também em alteração ao nº 4 do artigo 10º da Lei 12/2008, de 26 de Fevereiro (que regula a actividade da recorrida), se faz referência à injunção, processo restrito para o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos civis ou comerciais. S. Consequentemente, violou o douto acórdão recorrido os artigos 209° e 211° da Constituição da República Portuguesa (CRP), o artigo 18° n°1, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, a Lei n.º 105/2003 de 10 de Dezembro (LOFTJ) e o artigo 66° do CPC”. 1.9. Não foram apresentadas contra-alegações. 1.10. Neste Tribunal, a EMMP emitiu o seguinte parecer: “Em nosso entender o presente recurso para este Tribunal dos Conflitos não merece provimento. Conforme ensina o Prof. Manuel de Andrade, a competência do tribunal “afere-se pelo quid disputatum, em antítese com aquilo que será mais tarde o quid decisum” (in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, p. 91). Por sua vez, o Tribunal dos Conflitos e o STA têm reiteradamente afirmado que a competência em razão da matéria se afere em função dos termos em que a acção é proposta — cfr, a título de exemplo, os acórdãos do T. Conflitos de 91.01.31 (AD 361) e de 2007.05.17 (proc. n° 5/07), e, os acórdãos do STA de 93.05.13 (proc. n°31478), de 96.05.28 (proc. n°39911), de 99.03.03 (proc. n° 40222), de 99.03.23 (proc. n° 43973), de 99.10.13 (proc. n° 44068) e de 2000.09.26 (proc. n°46024). Neste caso, Atentos os termos em que a acção é instaurada, julgamos ser de concluir que a competência para dela conhecer pertence aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, concretamente aos tribunais administrativos. O Autor, Condomínio do prédio sito na R. …, n°s …, …, … e …, em Gondomar, através da acção, pretende que a Ré, B…, SA, seja condenada a: - Pagar ao Autor uma indemnização no valor de 1.733,67 euros, correspondente aos consumos mínimos ilegais cobrados ao Autor, se outra mais elevada não se vier a apurar no decurso da acção, acrescida de juros vincendos desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, e, a - Retirar do prédio os contadores totalizadores nele instalados, ou, em alternativa, abster-se de cobrar ao autor a respectiva tarifa de disponibilidade. Funda este pedido na ilegal manutenção no prédio de dois contadores totalizadores, cuja existência, sem qualquer justificação, permitiu a cobrança indevida do referido montante de 1.733,67 euros. A Ré, conforme é afirmado na petição e resulta dos autos é a empresa concessionária para a exploração e gestão dos serviços públicos municipais de abastecimento de água e de saneamento do município de Gondomar, por força de contrato celebrado entre a mesma e este último. Os municípios dispõem de atribuições no domínio do ambiente e saneamento básico, sendo da competência dos seus órgãos, nesta área, a gestão de equipamentos e a realização de investimentos no concernente a: sistemas municipais de abastecimento de água, sistemas municipais de drenagem e tratamento de águas residuais urbanas e sistemas municipais de limpeza pública e de recolha e tratamento de resíduos sólidos urbanos — art° 13°, n° 1, alínea 1) e art° 26°, n°1, alíneas a), b) e c), da Lei n° 159/99, de 14.09. É o DL n° 379/93, de 05.11, que estabelece o regime de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais e municipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público, de recolha, tratamento e rejeição de efluentes e de recolha e tratamento de resíduos sólidos, prevendo-se aí que tal se possa fazer em regime de concessão. Nos termos do art° 13°, n°2, deste diploma, respeitante aos “sistemas municipais”, “a concessionária, precedendo aprovação pelo concedente, tem direito a fixar, liquidar e cobrar uma taxa aos utentes, bem como a estabelecer o regime de utilização, e está autorizada a recorrer ao regime legal da expropriação, nos termos do Código das Expropriações, bem como aos regimes de empreitada de obras públicas e de fornecimento contínuo”. Não há dúvida, pelo que se vem expondo, de que, no caso em análise, a Ré, enquanto concessionária para a prestação dos referidos serviços, prossegue fins de interesse público, estando, para tanto, munida de poderes de autoridade legalmente previstos. Isto permite-nos dar como certo que subjacente à questão em controvérsia existe uma relação jurídica administrativa, tendo-se presente de que, tal como lembra Vieira de Andrade, “se têm de considerar relações jurídicas públicas (seguindo um critério estatutário, que combina sujeitos, fins e meios) aquelas em que um dos sujeitos, pelo menos, seja uma entidade pública ou uma entidade particular no exercício de um poder público, actuando com vista à realização de um interesse público legalmente definido”. Parece-nos, assim, poder-se concluir que a matéria em causa na presente acção cai no âmbito dos litígios a que alude o art° 1°, n° 1, do ETAF e que, por essa via, são competentes para a sua apreciação os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, concretamente os tribunais administrativos, independentemente da sua inclusão, ou não, no âmbito do art° 4.º, n° 1, alínea d), deste diploma, tendo-se em conta que as enumerações deste n° 1 são meramente exemplificativas. Com fundamento nas razões expostas emitimos parecer no sentido do improvimento do presente recurso”. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. 2 2.1. Conforme o artigo 107.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o objecto do presente recurso é a fixação do “tribunal competente” para julgar a acção que o Autor, ora Recorrente, propôs contra a Ré, B… SA. O Autor pede a condenação da Ré em indemnização correspondente ao valor dos consumos mínimos que por ela lhe foram cobrados, bem como a retirada dos contadores totalizadores pela Ré ou, em alternativa, seja decretada a suspensão da tarifa de disponibilidade por a mesma constituir um consumo mínimo, sustentando, no essencial a ilegalidade de tais cobranças a ilegalidade. Para a determinação da jurisdição e, depois, do tribunal competente dentro dessa jurisdição, devemos ater-nos à forma como o autor configura a acção. Vejamos. 2.2. Nos termos do artigo 211.º, n.º 1, da Constituição da República, naturalmente secundado pela lei ordinária, os tribunais judiciais “são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais (cf. arts 66.° do CPC e 18.°, n.º 1, da Lei n.º 3/99 - LOFTJ, de 13 de Janeiro). E de acordo com o artigo 212°, n.º 3, ainda da CRP, “compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”. Preceitua, por seu lado, o artigo 1.º, n.º 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, que “Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para a administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”. E o artigo 4.º, n.º 1, do mesmo ETAF, enuncia o âmbito da jurisdição administrativa e fiscal através de enumerações, definindo a título exemplificativo, pela positiva, os litígios nela incluídos. Cumpre indagar se o conhecimento da presente acção se encontra cometido aos tribunais judiciais, conforme sustenta o recorrente ou, antes, aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, como foi decidido pelo acórdão sob recurso. 2.3. Afirmou-se no Acórdão deste Tribunal de 26/09/06, Processo n.º 14/06, que a generalidade das alíneas do artigo 4.º, n.º 1, do ETAF visa a concretização positiva do conceito de matriz constitucional, litígios emergentes de relações jurídicas administrativas. É esse o caso, como também expressamente se referiu naquele aresto, da respectiva alínea d), que aqui importa particularmente ter em atenção, nos termos da qual compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objecto a fiscalização da legalidade das normas e demais actos jurídicos praticados por sujeitos privados, designadamente concessionários, no exercício de poderes administrativos. 2.4. Apreciando o pedido e causa de pedir, o acórdão recorrido destacou, em termos que se julgam adequados: “Alega, em suma, o recorrente que o réu, concessionário do serviço público de água, deve retirar do condomínio em causa os sobreditos contadores totalizadores (por ausência de estruturas físicas que os justifiquem) ou abster-se de cobrar a sobredita taxa de disponibilidade que considera equivalente a um consumo mínimo não admissível legalmente (pede o pagamento do que já despendeu com água e taxa em questão ao longo de vários anos. […] No caso em apreço, o recorrente questiona, designadamente, a legalidade do pagamento da referida tarifa de disponibilidade (de natureza regulamentar) que foi fixada pela entidade pública concedente (município) como contrapartida do serviço de distribuição de água e ao abrigo de normas de direito administrativo (só o município a podia fixar ao abrigo das suas competências)”. E concluiu: “Consequentemente, como não se está perante um litígio de direito privado relativo a uma relação contratual de fornecimento de água mas se questiona, além do mais, um tarifário aprovado ao abrigo de poderes públicos de autoridade e inserido na satisfação de necessidades colectivas é competente para dirimir o presente conflito o tribunal administrativo […]”. 2.5. Das conclusões das alegações do recorrente verifica-se que grande parte delas releva da discussão sobre o mérito da causa, discussão que é exterior ao âmbito do presente recurso. O que se deve sublinhar é que não há discordância entre o acórdão recorrido e o recorrente quanto à delimitação do problema base da acção. É o recorrente que, afinal, reafirma nas suas conclusões: “E. O recorrente, tanto na P.l. como no recurso, não questiona nunca o tarifário aprovado pelo Município de Gondomar, pretendendo apenas que o Tribunal se pronuncie quanto à admissibilidade da cobrança de consumos mínimos, denominados como tarifa de disponibilidade, previstos e proibidos pela Lei 12/2008 de 11 de Fevereiro, bem como a instalação de contadores totalizadores, actos praticados pela recorrida na qualidade de entidade gestora”. Ora, não existe a aparente diferença que a primeira parte desta conclusão poderia fazer crer. É que acórdão recorrido também não entendeu que o autor discutisse o tarifário geral. O que observou é, que tal como o recorrente vem agora sublinhar, estava e está em causa um tarifário, a tarifa de disponibilidade, no quadro do serviço de distribuição de água, por concessionária, ao abrigo de normas de direito administrativo, para a satisfação de necessidades colectivas. A questão de saber se se enquadra adequadamente no tarifário aprovado pelo Município o tarifário que o concessionário está efectivamente a aplicar ao recorrente é, essa, sim, questão já do mérito. Para a determinação do tribunal competente interessa é saber o que se encontra pedido e seu fundamento. Assim, como se disse, a questão base em discussão é, conforme afinal reconhece e reitera o recorrente nas suas alegações, a da “admissibilidade da cobrança de consumos mínimos, denominados como tarifa de disponibilidade”. 4. A fim de subsumir a acção sob apreciação ao exposto importa efectuar, em primeiro lugar, a caracterização do contrato de concessão de exploração e gestão dos serviços públicos e municipais de abastecimento de água e saneamento, celebrado entre as B… S.A e a Câmara Municipal de Gondomar em 30 de Outubro de 2001. 4.1. De acordo com o disposto no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 379/93, de 5 de Novembro, a exploração e a gestão dos sistemas da gestão dos sistemas municipais pode ser directamente efectuada pelos respectivos municípios e associações de municípios ou atribuída, em regime de concessão, a entidade pública ou privada de natureza empresarial, bem como a associação de utilizadores (note-se que não interessa, aqui, entrar em linha de conta com a revogação operada pelo Decreto-Lei n.º 194/2009, de 20 de Agosto, atento o diferimento de aplicação por três anos, nos termos do seu artigo 80.º). Por outro lado, o artigo 407.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de Janeiro, republicado pelo Decreto-Lei n.º 278/2009, de 2 de Outubro, dispõe que se entende por concessão de serviço público o contrato pelo qual o co-contratante se obriga a gerir, em nome próprio e sob a sua responsabilidade, uma actividade de serviço público, durante um determinado período, sendo remunerado pelos resultados financeiros dessa gestão ou, directamente, pelo contraente publico. Nesta qualidade, a concessionária, precedendo aprovação pelo concedente, tem direito a fixar, liquidar e cobrar uma taxa aos utentes (cfr. artigo 13.º, n.º 2, do DL n.º 379/93). 4.2. Em face dos preceitos acima invocados, pode-se concluir que o contrato celebrado entre as B… S.A e a Câmara Municipal de Gondomar é um contrato administrativo de concessão; por sua vez, no mesmo quadro, e da matéria expressamente alegada pelo Autor, designadamente no artigo 2.º da petição (“A ré é a empresa concessionária da exploração e gestão dos serviços públicos municipais de abastecimento de água e de saneamento do município de Gondomar”) e aceite pela ré na sua contestação (artigo 6.º), pode concluir-se, para o âmbito do presente recurso, que as B… S.A ao fixar liquidar e cobrar tarifas ou taxas aos particulares no quadro da sua actividade de concessionária está a agir no exercício de poderes administrativos. E assim, seja directamente por integração na previsão específica do artigo 4.º, n.º 1, d), seja, como refere a Digna Magistrada do Ministério Público, pela sua indiscutível integração na previsão geral do artigo 1.º, n.º 1, do ETAF, o conhecimento da presente acção está cometido aos tribunais administrativos e fiscais, assim se afastando esse conhecimento da categoria dos tribunais judiciais. 5. Importa agora, determinar, no seio da categorias dos tribunais administrativos e fiscais, qual o concretamente competente para a acção. Este litígio, na sua essência, resulta da exigência, imposta autoritariamente pela Ré (ora Recorrida), da tarifa de disponibilidade relativa ao contador totalizador, como contrapartida do serviço prestado. A questão suscitada sobre a necessidade da aplicação desta tarifa a este tipo de contadores reveste uma natureza fiscal entendendo-se como tal, “todas as que emergem da resolução autoritária que imponha aos cidadãos o pagamento de qualquer prestação pecuniária com vista à obtenção de receitas destinadas à satisfação de encargos públicos do Estado e demais entidades públicas, bem como o conjunto de relações jurídicas que surjam em virtude do exercício de tais funções ou que com elas estejam objectivamente conexas” (do Acórdão deste Tribunal de 26/09/2006, Processo n.º 14/06). Pode, assim, concluir-se que a jurisdição competente para conhecer do litígio em apreciação é a jurisdição dos tribunais administrativos e fiscais, através dos tribunais tributários, atento o disposto no artigo 49°, n.º 1, alínea c), do ETAF. 6. Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso e declaram-se competentes para conhecer a presente acção os tribunais tributários. Sem custas. Lisboa, 9 de Novembro de 2010. – Alberto Augusto Andrade de Oliveira (relator) – José Adriano Machado Souto de Moura – António Bento São Pedro – António Alberto Moreira Alves Velho – Rosendo Dias José – Camilo Moreira Camilo. |