Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 521/2016-JP |
Relator: | MARIA JUDITE MATIIAS |
Descritores: | INCUMPRIMENTO CONTRATUAL - INCUMPRIMENTO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. |
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Data da sentença: | 04/11/2017 |
Julgado de Paz de : | LISBOA |
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Decisão Texto Integral: | Sentença (n.º 1, do art. 26º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013 de 31 de julho). Processo n.º521/2016-JP Matéria: Incumprimento contratual (alínea i) do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 54/2013 de 31 de julho) Objeto: Incumprimento contrato de prestação de serviços. Valor da ação: €4.712,50 (quatro mil, setecentos e doze euros e cinquenta cêntimos). Demandante: 1) A Lda, com sede na Rua x x, x, xxxx-xxx Lisboa. 2) B, residente na Rua x, Lote x-x Brejos de Azeitão. 3) C, residente na Rua x, Lote x, xxxx-xxx Brejos de Azeitão. Mandatário: Dr. ª D, com domicílio profissional em Rua x, lote x, xxxx-xxx Brejos de Azeitão. Demandados: 1) E, Lda., com sede na Estrada x, nº x, junto às instalações da x, xxxx-xxx Moita. Mandatário: Dra. F, advogada, com domicílio profissional na Rua x, n.º x, x andar, Sala x, xxxx – xxx Cartaxo. 2) G, com sede na Rua x, nº x, xxxx-xxx Lisboa. Mandatário: Dr. H, advogado, com domicílio profissional na Rua x, n.º x, x, xxxx – xxx Lisboa. Do requerimento inicial: Fls. 1 a 9. Pedido: Fls.9. Junta: 10 documentos e procuração forense. Contestação: Apresentada pela 1.ª demandada a fls. 62 a 83; Apresentada pela 2.ª demandada a fls. 118 a 123V. Tramitação: Foi realizada mediação não tendo as partes logrado obtenção de acordo suscetível de pôr fim ao litígio, pelo que foi marcada audiência de julgamento para o dia 15 de dezembro de 2016, pelas 10h, sendo as partes devidamente notificadas para o efeito. Audiência de Julgamento. A audiência decorreu conforme ata de fls. 203 a 205. *** Fundamentação fáctica. Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos: 1 – A primeira demandante teve como designação anterior “I Ld.ª”, alteração que adveio de contrato de cessão de quotas, operado em 22 de junho de 2015 (cfr. doc. 1, fls. 10 a 14, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); 2 – Antes da referida cessão de quotas a primeira demandante, então “I Ld.ª”, tinha como representantes legais a segunda e terceiro demandantes (cfr. doc. 1); 3 – Enquanto “I Ld.ª”, os então legais representantes contrataram os serviços da primeira demandada, na sequência de proposta de prestação de serviços por esta apresentada por e-mail de 15 de junho de 2012 (cfr. docs. 2, 3 e 4, fls. 15 a 34); 4 – De acordo com o contrato a primeira demandada obrigou-se a prestar os serviços descritos no ponto 8 do R.I., não impugnado, cujo teor se dá aqui por transcrito; 5 - Os honorários da primeira demandada foram acordados em 15 de junho de 2012, e fixados em €200,00 mensais (cfr. doc. 2, fls. 15, junto pela demandante); 6 – Em 28 de dezembro de 2012 a segunda e o terceiro demandantes solicitaram à primeira demandada que providenciasse junto da A.T. o inicio da atividade da primeira demandante (cfr. doc. 4, fls. 34 dos autos); 7 - A pedido da primeira demandante e segundo demandante, a primeira demandada prescindiu dos honorários até ao início da atividade, prolongando-se por todo o ano de 2013 (não contraditado pela parte demandante), 8 - No ano de 2014 o pagamento dos honorários mensais nunca foram atempados (confirmado pela testemunha J, funcionário da primeira demandada); 9 - A partir de junho de 2014 a primeira demandada deixou de ter qualquer contacto com a primeira demandante e segundo demandante (confirmado pela testemunha J, funcionário da primeira demandada); 10 - O funcionário da primeira demandada deslocou-se ao espaço comercial da então "I Ld.ª", na Rua x n.º x, em horário útil, mas não logrou qualquer contacto (afirmado pelo próprio, o funcionário J, em audiência e não contraditado); 11 - Após frustração das tentativas de contacto telefónico e pessoal, a primeira demandada, em 07 de julho de 2014, enviou à primeira demandante então “I Ld.ª”, uma carta registada com aviso de receção a interpelá-la para pagamento das avenças cuja dívida ascendia a €991,00, e ao mesmo tempo que informava que se não obtivessem resposta até ao dia 20 de julho de 2014, rescindiam o contrato de prestação de serviços que tinham com a empresa dando conhecimento à Ordem dos contestação, a fls. 86 e 87 dos autos); 12 – A primeira demandada rescindiu a sua prestação de serviços com a então “I Ld.ª”, e a TOC renunciou à nomeação como tal , renuncia confirmada no Portal da Autoridade Tributária e no sítio da então denominada Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, ambos em 21 de outubro de 2014 (cfr. docs. 4 e 5, fls. 90 a 93); 13 - No decurso do primeiro trimestre de 2015, os representantes da então "I Ld.ª", aqui segunda e terceiro demandantes, contactaram a primeira demandada, comunicando-lhe a intenção de vender as suas participações sociais em abril de 2015 para o que necessitavam de obter declarações de não dívida à Autoridade Tributária e à Segurança Social (confirmado em audiência pelos representantes da primeira demandada e pela testemunha J, em audiência e não contraditados); 14 - A primeira demandada relembrou que necessitava de documentação de suporte, em falta desde 2014, e estariam também em falta as obrigações fiscais e parafiscais a que a empresa estaria adstrita (confirmado em audiência pelos representantes da primeira demandada e pela testemunha J, em audiência e não contraditados); 15 - A primeira demandada dispôs-se a colaborar na regularização da empresa convicta de que lhe pagariam os honorários que estavam em dívida (confirmado em audiência pelo representante legal da primeira demandada); 16 – Em 30 de abril de 2015, a Autoridade Tributária certificou que a empresa "I Ld.ª", nada devia quer junto da A.T. quer junta das S.S. (cfr. docs. 5 e 6, a fls. 35 e 36, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); 17 - A primeira demandada apresentou a declaração mensal de remuneração da Segurança Social, relativa a julho de 2014, em 08 de agosto de 2014 (doc. de fls. 199, junto pela primeira demandada, cujo teor se da por integralmente reproduzido); 18 - A primeira demandada apresentou a declaração mensal de remuneração da Segurança Social, relativa a abril de 2015, em 24 de abril de 2015 (cfr. doc. de fls. 200, pela primeira demandada, cujo teor se dá por integralmente reproduzido); 19 - Em 30 de abril de 2015 a Autoridade Tributária declarou que a “I Ld.ª”, tinha a sua situação contributiva regularizada nada devendo à Fazenda Pública (cfr. doc. 5, fls. 35); 20 - Em 04 de maio de 2015 a Segurança Social declarou que a “I Ld.ª”, tinha a sua situação contributiva regularizada (cfr. doc. 6, fls. 36); Factos não provados. Consideram-se não provados os factos não consignados. Não corresponde à verdade o afirmado no ponto 17 do r.i. face ao doc. de fls. 199, junto pela primeira demandada, não impugnado, do qual resulta que a declaração mensal de remuneração da Segurança Social, relativa a julho de 2014, foi entregue em 08 de agosto de 2014, e não em 24 de cabril de 2015, conforme decorre ponto 17 dos factos provados. Motivação. A convicção do tribunal fundou-se nos autos, nos documentos apresentados e referidos nos respetivos factos, complementados pelos esclarecimentos das partes que se tiveram em consideração ao abrigo do princípio da aquisição processual e nos depoimentos das testemunhas apresentadas, referidos nos respetivos factos. Do Direito. A primeira demandante alega que, na sequência de uma proposta de prestação de serviços correspondentes ao teor do anexo então também enviado e junto aos autos como doc. 3, a fls. 16 e segs.,que lhe foi enviada, por e-mail, pela primeira demandada, em 15 de junho de 2012, e da sua aceitação, declarada também por e-mail, em 28 de dezembro de 2012, foi celebrado um contrato de prestação de serviços de contabilidade. No e-mail de 28 de dezembro de 2012, no qual o terceiro demandante pedia que fosse declarado o início de atividade, junto da Autoridade Tributária, doravante AT, com data de 02 de janeiro de 2013, alega que, em data que não especificaram, decidiram ceder as suas quotas, o que ocorreu em 22 de junho de 2015, sendo confrontados com a existência de processos em contencioso junto da SS; mais alegam que tais processos deram origem ao pagamento de coimas elevadas, processos relativos a entrega extemporânea das declarações de retenção para a SS, concretizando: Que, as declarações referentes aos meses de julho, agosto, setembro outubro, novembro e dezembro de 2014 e janeiro, fevereiro e março de 2015, que deveriam ter sido entregues até ao dia 10 do mês seguinte, só o foram em 24 de abril de 2015; e as declarações referentes aos meses de abril e maio de 2015 só foram entregues em 10 de julho de 2015, e a declaração de junho de 2015 só foi entregue em 07 de outubro de 2015, computando o prejuízo resultante de coimas pagas ou a pagar, na eventualidade de serem aplicadas, em €4.712,50. A primeira demandada alega na contestação que apresentou a fls. 62 e segs., que prestou serviços pro bono até ao início da declaração de atividade, e que, mau grado os demandantes se terem obrigado a pagar uma avença no montante de €200,00 mensais, prescindiu dos honorários durante todo o ano de 2013; que no ano de 2014, até junho nunca recebeu os honorários atempadamente e que a partir de junho deixou de receber quer os honorários quer qualquer contacto com os então representantes da demandante e ora segunda e terceiro demandantes; mais diz que, revelando-se infrutíferos todos os contactos telefónicos feitos pelos funcionários, fizeram os mesmos deslocações ao espaço comercial que a primeira demandante possuía na Rua x, n.º x, em Lisboa, contactos que visavam não só o recebimento dos honorários bem como os elementos necessários ao cumprimento dos deveres contratuais; diz ainda que, face à impossibilidade de contacto com a primeira demandada e seus então representantes legais, aqui segunda e terceiro demandantes, facto que punha em causa a continuação da prestação de serviços, decidiu remeter a primeira missiva dirigida à demandante, em 07 de julho de 2014, informando a sua intenção de cessação do contrato de prestação de serviços e a renúncia do TOC, caso não obtivesse qualquer contacto até 20 de julho de 2014, cuja devolução originou um segundo envio em 24 de julho de 2014, e que apresentou ainda a declaração relativa ao mês de julho de 2014 em 08 de agosto de 2014, ou seja, atempadamente (conforme logrou provar com o documento de fls. 199); conclui dizendo que, face ao silêncio dos demandantes, decidiu rescindir o contrato de prestação de serviços e renunciou à sua ação como TOC, renúncia que foi aceite em 21 de outubro de 2014. Porém, no decurso do primeiro trimestre de 2015, após dez meses de ausência e silêncio, foi contactada pelos segunda e terceiro demandantes que lhe comunicaram a intenção de cessão de quotas, tendo a primeira demandada informado que havia obrigações fiscais declarativas a cumprir, nomeadamente declarações de remunerações à SS. Face à situação, embora tivesse rescindido o contrato, a demandada prontificou-se a enviar as declarações mensais de remuneração de Segurança Social em falta até abril de 2015, efetivamente todas enviadas a 24 de abril de 2015, o que permitiu obter as referidas declarações de não dívida supra referidas, conforme pontos 11 a 15 dos factos provados. Mais disse (e logrou provar) que a declaração mensal de remuneração da Segurança Social, relativa a julho de 2014 foi entregue atempadamente em 08 de agosto de 2014 (fls. 199), e que a declaração mensal de remuneração da Segurança Social, relativa a abril de 2015 foi entregue em 24 de abril de 2015 (cfr. doc. de fls. 200), sendo que nem uma nem outra dão lugar à aplicação de quaisquer coimas. Vejamos. Entre demandante e demandada foi celebrado um contrato de prestação de serviços de contabilidade, sendo a primeira demandada, na sua qualidade de TOC, responsável em termos técnicos, quer pela sociedade demandada quer pela contabilidade da demandante. Este contrato rege-se pelas normas do contrato de mandato, disciplinado nos artigos 1154.º e seguintes do Código Civil, e em especial pelas normas decorrentes da , Lei n.º 139/2015, de 7 de setembro, que transformou a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas em Ordem dos Contabilistas Certificados, e alterou o respetivo Estatuto, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 452/99, de 5 de novembro, em conformidade com a Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais. Com particular ingresse para o caso em apreço, relativamente à disciplina do contrato de prestação de serviços de contabilidade e a relação jurídica emergente da celebração do mesmo, dispõe o Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados no Capítulo IX, sob epígrafe Direitos e deveres, no seu artigo 69.º: 1 - Os contabilistas certificados têm, relativamente a quem prestam serviços, os seguintes direitos: a) Obter todos os documentos, informações e demais elementos de que necessitem para o exercício das suas funções; b) (....); c) (...), d) Receber pontualmente os salários ou honorários a que tenham direito. Decorre deste normativo que a entidade a quem é prestado o serviço tem o dever de entregar pontualmente toda a documentação necessária para a elaboração da contabilidade, confirmar, por escrito, qualquer instrução que o contabilista certificado considere necessário, assegurar que todas as operações estão devidamente suportadas, pagar pontualmente todos os honorários e disponibilizar todos os meios necessários à boa prossecução das funções do Contabilista Certificado. O não cumprimento destes pressupostos, e nomeadamente a não prestação de toda a informação e colaboração necessárias, confere ao Contabilista Certificado o direito à recusa de assinatura das declarações fiscais, desresponsabilizando-o das consequências que daí possam advir, nomeadamente o não cumprimento dos prazos legais, e aplicação de coimas (vide art.º 12 n.ºs 2 a 4 do Código Deontológico). Ora, no caso em apreço, foi o que ocorreu. Ou seja, o contabilista Certificado, primeira demandada, esteve dez meses sem obter dos representantes legais da então sociedade “I Ld.ª”, qualquer elemento que lhe permitisse apresentar as declarações à Segurança Social. Tanto que, mau grado já ter comunicado a sua renúncia à AT e no sitio da então denominada Ordem dos técnicos Oficiais de Contas, ambos em 21 de outubro de 2014, quando, no primeiro trimestre de 2015, o representante legal da empresa deu finalmente "sinal de vida", a primeira demandada providenciou de imediato as entregas em falta (por falta de elementos que a empresa não lhe proporcionou), tendo obtido, em 30 de abril e 4 de maio, declaração de não dívida por parte da Segurança Social e da Autoridade Tributária, conforme pontos 12 a 20 dos factos provados. Deste modo, sem necessidade de outros considerandos, que mais havia, não têm as demandantes razão alguma na pretensão que formulam. É que, não podiam ignorar que não tinham disponibilizado à primeira demandada os elementos necessários para que esta pudesse proceder à apresentação das referidas declarações, assumindo nos presentes autos uma posição que resvala para a litigância de má fé. Quanto às exceções invocadas pela segunda demandada, embora procedentes, consideramos inútil a pronúncia sobre as mesmas, a qual, face ao supra exposto, resulta prejudicada. Decisão. Em face do exposto, considero a presente ação improcedente por não provada e em consequência ficam as demandadas absolvidas do pedido. Custas. Nos termos da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro, alterada nos seus n.ºs 6.º e 10.º pela Portaria n. 209/2005, de 24 de Fevereiro, considero a vencida a parte demandante, pelo que deve proceder ao pagamento da quantia de €35,00, correspondentes à segunda parcela, no prazo de três dias úteis, sob pena do pagamento de uma sobretaxa de €10,00 por cada dia de atraso. Cumpra-se o disposto no n.º 9 da referida portaria em relação às demandadas. Julgado de Paz de Lisboa, em 11 de abril de 2017 A Juíza de Paz Maria Judite Matias |