Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 116/2023–JPFNC |
Relator: | CELINA ALVENO |
Descritores: | INCUMPRIMENTO PELA DEMANDADA DAS SUAS OBRIGAÇÕES PARA COM O CONDOMÍNIO |
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Data da sentença: | 07/18/2024 |
Julgado de Paz de : | FUNCHAL |
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Decisão Texto Integral: | SENTENÇA Processo n.º 116/2023 – JPFNC I - IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES Demandante: Condomínio do [ORG-1], NIPC [NIPC-1], com sede na [...], [Cód. Postal-1] [...]. Demandada: [PES-1], NIF [NIF-1], residente na [...], n.º 174, Edf. [...], Bl. A, R/C, Porta B, [Cód. Postal-2] [...]. * II - RELATÓRIO O Demandante propôs contra a Demandada a presente ação declarativa enquadrada na alínea c) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001 de 13 de julho, na sua atual redação, pedindo a sua condenação: a) A título de capital, a quantia de € 5.229,59 (cinco mil duzentos e vinte e nove euros e cinquenta e nove cêntimos); b) A título de despesas com o processo, a quantia de € 455,00 (quatrocentos e cinquenta e cinco euros); c) A título de juros de mora, contabilizados à taxa aplicável de 4% à data da propositura da ação, a quantia de € 1.460,85 (mil quatrocentos e sessenta euros e oitenta e cinco cêntimos); e, d) Os Juros vincendos. Juntou: 11 documentos, procuração forense e substabelecimento. A Demandada foi citada pessoalmente (fls. 41). A Demandada compareceu à sessão de pré-mediação e de mediação, mas as partes não chegaram a acordo (cfr. fls. 70). A Demandada não compareceu às duas datas agendadas para a audiência de julgamento nem justificou a falta a nenhuma delas (cfr fls. 82 a fls. 83 e de fls. 91 a fls. 92). * Reaberta a audiência de julgamento em 19/06/2024 pelas 17h00 verificando-se que a Demandada não justificara a sua falta e a reiterava, foi ouvido o Demandante, representado pela sua Ilustre Mandatária e alegações finais pela Ilustre Mandatária do Demandante. * O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objeto, do território e do valor. O processo é próprio e não enferma de nulidades que o invalidem. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há exceções, nulidades ou questões prévias que cumpra conhecer. * III- VALOR DA AÇÃO Fixa-se em € 7.145,44 (sete mil cento e quarenta e cinco euros e quarenta e quatro cêntimos) o valor da presente causa (artigos 296.º, 297.º n.º 2, 299.º, 300.º e 306.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, na sua atual redação). * IV- OBJETO DO LITÍGIO Incumprimento pela Demandada das suas obrigações para com o condomínio que integra. Importa apreciar o incumprimento da Demandado relativamente ao pagamento das quotas de condomínio e, na negativa, as consequências daí resultantes. * V- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Assim e com relevância para a decisão da causa, e de acordo com a prova documental e testemunhal carreada para os autos, resultaram os seguintes: FACTOS PROVADOS: 1. A Demandada foi proprietária da fração BA e condómina do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal denominado “[ORG-1]”, registada na competente Conservatória do Registo Predial de [...], sob a descrição predial número [Nº Identificador-1], de [...]. (fls. 98). 2. A Demandada estava obrigada ao pagamento mensal de quotas ordinárias e/ou extraordinárias de condomínio. 3. A Demandada é devedora das quotas de condomínio ordinárias e extraordinárias desde maio de 2016 até fevereiro de 2022. 4. A Demandada foi interpelada para efetuar o pagamento das quotas de condomínio em atraso. 5. A Demandada é devedora de quotas de condomínio que perfazem o montante de € 5.229,59. 6. A Demandada é devedora de juros de mora que perfazem o montante de € 1.460,85. 7. O Demandante pagou € 350,00 a título de honorários jurídicos, para efeitos de instauração do presente processo. Consideram-se reproduzidos os documentos de fls. 102 a fls. 162. * VI – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Com base na matéria de facto provada, cumpre apreciar os factos e aplicar o direito. A presente ação funda-se no incumprimento de uma obrigação do condómino, enquadrando-se, em termos de competência material deste Tribunal, na al. c), do n.º 1, do artigo 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, na sua atual redação. O n.º 1 do artigo 1420.º do Código Civil, relativo à propriedade horizontal, define que condómino é o proprietário exclusivo da fração e comproprietário das partes comuns. É função do administrador de condomínio, entre outras, cobrar receitas e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, conforme previsto no artigo 1436.º, do Código Civil, enquadrando-se nessa categoria as quotas ordinárias e extraordinárias de condomínio, a pagar por cada condómino. Resulta da matéria de facto provada que, a Demandada foi até à instauração da presente ação única e legítima proprietária e possuidora da fração autónoma designada pela letra “BA”, pertencente ao prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, descrito supra. Decorre do n.º 1 do artigo 1424.º do Código Civil que os condóminos estão obrigados a concorrer para as despesas necessárias à gestão, fruição e conservação das partes comuns do edifício na proporção do valor das suas frações. Conforme se entendeu, entre outros, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (processo 6723/2008-6, em www.dgsi.pt) “os condóminos (…) têm a obrigação irrenunciável de comparticipar nos encargos decorrentes da conservação e fruição das partes comuns, bem como relativos ao pagamento de serviços de interesse comum, ou seja, não se podem escusar ou recusar o cumprimento desse dever jurídico, quer em termos totais como parciais.” No caso sub judice, os condóminos do prédio em causa deliberaram as contribuições devidas, a cargo da Demandada, nos termos dos orçamentos aprovados. Nos termos do disposto no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de outubro (na redação em vigor aquando dos factos), as deliberações devidamente consignadas em ata são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às frações. Resultou provado que, a Demandada não efetuou os pagamentos das parcelas que lhe eram devidas desde 2016 até à instauração da presente ação, em maio de 2023, nem veio demonstrar que a falta de cumprimento não procedeu de culpa sua ou invocar qualquer exceção que obstasse à apreciação do mérito da causa. Não foi alegado nem resultou provado qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do Demandante, nomeadamente que comprovasse que foi efetuado o pagamento – ainda que parcial - dos valores peticionados. Pelo exposto, deve a Demandada proceder ao pagamento das quotas, melhor discriminadas de fls. 160 a fls. 162, que se mostram em dívida, no montante € 5.229,59 (cinco mil duzentos e vinte e nove euros e cinquenta e nove cêntimos). * Peticiona ainda o Demandante a condenação da Demandada nos juros de mora vencidos e vincendos sobre as quotas em dívida calculados à taxa de 4% ao ano. Conforme resulta do artigo 805.º, n.º 1 do Código Civil o devedor fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para pagar. Por outro lado o n.º 2, alínea a) do mesmo diploma estabelece que há mora do devedor independentemente de interpelação, se a obrigação tiver prazo certo. Resulta dos factos provados que as quotas em dívida se venciam até ao dia 8 de cada mês a que o pagamento dissesse respeito. Estamos, pois, perante obrigações com prazo certo, pelo que serão devidos juros de mora desde a respetiva data de vencimento de cada uma das quotas mensais. Assim, o pedido de juros de mora vencidos até 18/05/2023, no valor de € 1.460,85 (mil quatrocentos e sessenta euros e oitenta e cinco cêntimos) tem necessariamente de proceder, acrescido dos juros vencidos e vincendos até integral e efetivo pagamento. * Requer finalmente o Demandante a condenação da Demandada em despesas com o processo, no valor de € 455,00 (quatrocentos e cinquenta e cinco euros). Quanto às despesas com o processo que de forma generalista são peticionadas, sempre se dirá que não foi junta aos autos prova de ter sido aprovada pelo Condomínio qualquer deliberação que aprove essa obrigação por parte do condómino incumpridor, nem da liquidação pelo Demandante das despesas peticionadas, nem tão pouco da nota discriminativa do cálculo que lhe esteve subjacente, não havendo desse modo prova de que efetivamente a quantia peticionada seja aquela que o Demandante tenha suportado ou venha a suportar a título de despesas, constituindo prova que lhe competia fazer (artigo 342.º, n.º 1 do Código Civil). Mesmo que se viesse a invocar tratar-se de despesas jurídicas, a verdade é que apesar de conveniente, neste Tribunal o patrocínio por Advogado, Advogado Estagiário ou Solicitador não é obrigatório, salvo nos casos previstos (artigo 38.º da Lei 78/2001 de 13 de julho, na sua atual redação). Porém, as partes podem valer-se desse patrocínio e fazer-se representar em juízo, sendo presumível que com isso tenham naturalmente custos. Atendendo a que por força do disposto no artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de Julho, na atual redação, o Código de Processo Civil é aplicável subsidiariamente nos Julgados de Paz, poderia ponderar-se enquadrar as despesas jurídicas peticionados no âmbito dos artigos 529.º n.º 4 e 533.º do Código de Processo Civil, onde se encontra previsto que as custas da parte vencedora são suportadas pela parte vencida, discriminando-se no n.º 2 deste ultimo normativo as despesas que se integram nas custas de parte e na alínea d) prevendo-se em concreto os honorários do Mandatário e as despesas por ele efetuadas. Sucede, porém, que os Julgados de Paz têm uma lei própria quanto a custas: a Portaria n.º 342/2019, de 1 de outubro, onde as custas correspondem a uma taxa fixa de € 70,00 por cada processo tramitado, não prevendo outro valor, nem custas de parte. E será nos termos da Portaria citada que as custas serão fixadas na presente sentença, não tendo aqui aplicação o Regulamento das Custas Processuais, determinando-se na própria sentença o seu pagamento, nos termos que se vieram a condenar e absolver, não existindo procuradoria. Relativamente aos € 35,00, a carta de interpelação entra no âmbito dos serviços jurídicos normais, prestados por Ilustre Mandatário; configurando quase sempre o preliminar de um processo em Tribunal. Por outro lado, teriam de ser tituladas por recibo de quitação que demonstrasse ter sido efetivamente essa a despesa suportada pelo Condomínio por esses serviços e que os mesmos estão autonomizados dos demais serviços. Ora, tendo em conta que a carta é enviada pelo mesmo Ilustre Mandatário/escritório de Mandatários, teria de ser ponderada, em que medida essa carta pode ser autonomizada dos demais honorários. Com efeito, se são reclamados honorários de € 350,00 sem qualquer discriminação e em simultâneo o valor de € 35,00 pela carta de interpelação, fica a dúvida sobre se não haverá também aqui duplicação de despesas, pelo que não poderemos considerar como provado e procedente este valor. Dito tudo isto, é certo que nos Julgados de Paz, não é obrigatória a constituição de mandatário, mas também nenhuma parte pode ser obrigada a prescindir de patrocínio destes profissionais. No caso concreto o Demandante está devidamente patrocinado, como aliás resulta de todos os autos, devidamente instruído pela Mandatária, que se deslocou ao julgado de paz para a audiência de julgamento e leitura de sentença. O nosso sistema jurídico, com a disposição “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que provavelmente não teriam ocorrido se não fosse a lesão” (artigo 563.º do Código Civil), acolheu a doutrina da causalidade adequada, segundo a qual, para que um facto seja causa de um dano, é necessário que, no plano naturalístico, ele seja uma condição sem a qual o dano não se teria verificado e, além disso, que, no plano geral e abstrato, ele seja causa adequada desse mesmo dano. Ora a contratação da mandatária do Demandante, e o pagamento dos seus honorários, é um prejuízo que o Demandante tem, por se ter visto obrigado a recorrer a este Julgado de Paz para fazer valer o seu direito, e consequentemente um prejuízo também a indemnizar. Pelo exposto, deve a Demandada pagar o montante de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros), a título de indemnização por danos patrimoniais. * VII - DECISÃO Nos termos e com os fundamentos invocados, julgo a presente ação parcialmente procedente, e em consequência condeno a Demandada no pagamento ao Condomínio da quantia global de € 7.040,44 (sete mil e quarenta euros e quarenta e quatro cêntimos), sendo € 5.229,59 (cinco mil duzentos e vinte e nove euros e cinquenta e nove cêntimos); a título de quotas de condomínio vencidas até maio de 2023 e de juros de mora vencidos, até 18/05/2023, no valor de € 1.460,85 (mil quatrocentos e sessenta euros e oitenta e cinco cêntimos), acrescida dos juros vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, até integral e efetivo pagamento, e ao pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais no valor de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros), absolvendo-a dos demais pedidos. * VIII – RESPONSABILIDADE POR CUSTAS As custas serão suportadas pelo Demandante e pela Demandada, em razão do decaimento na proporção de 6% e 94% respetivamente (Artigos 527.º, 607.º, n.º 6 do Código de Processo Civil - aplicáveis ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, na sua atual redação - e artigo 2.º da Portaria n.º 342/2019, de 1 de outubro), devendo o Demandante efetuar o pagamento de € 4,20 (quatro euros e vinte cêntimos) e o Demandado efetuar o pagamento de € 65,80 (sessenta e cinco euros e oitenta cêntimos), no prazo legal e sob cominação de não o fazendo virem a suportar uma sobretaxa de € 10,00 diária até ao limite de € 140,00 (cfr. Portaria 342/2019, de 1 de outubro). O prazo legal para proceder ao pagamento das custas é o mencionado na presente decisão, isto é, três dias úteis, pelo que, o prazo que vai indicado no Documento Único de Cobrança (DUC) é um prazo de validade desse documento, que permite o pagamento das custas fora do prazo legal. Assim, o facto de o pagamento ser efetuado com atraso não isenta o responsável do pagamento da sobretaxa, nos termos aplicáveis. Transitada em julgado a presente decisão sem que se mostre efetuado o pagamento das custas, emita-se a respetiva certidão para efeitos de execução por falta de pagamento de custas, e remeta-se aos Serviços da Autoridade Tributária, pelo valor das custas em dívida, acrescidas da respetiva sobretaxa, com o limite máximo previsto no art.º 3.º da citada Portaria. Registe e notifique e após trânsito em julgado, arquive. Funchal, 18 de julho de 2024. A Juíza de Paz _______________________________ Celina Alveno |