Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 185/2023-JPSTB |
Relator: | CARLOS FERREIRA |
Descritores: | DIREITOS E DEVERES DE CONDÓMINOS |
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Data da sentença: | 10/25/2024 |
Julgado de Paz de : | SETÚBAL |
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 185/2023-JPSTB * Resumo da decisão: - Condena a parte Demandada a pagar à parte Demandante a quantia de €851,44. - Absolve a Demandada do restante peticionado. - Ambas as partes têm de pagar as custas no prazo de 3 dias úteis, cabendo a quantia de €21,70 à parte Demandante; e a quantia de €48,30 à parte Demandada. *** Sentença Parte Demandante: --- Condomínio do prédio sito na [...], n.º 12, [Cód. Postal-1] [...], entidade equiparada a pessoa coletiva com o NIPC [NIPC-1]. - Mandatário: Dr. [PES-1]. Advogado, com escritório na [...], n.º 11, 3.º Esq.º, [Cód. Postal-2] [...]. --- Parte Demandada: ---- [ORG-1], Lda, sociedade comercial com o número único de matrícula e pessoa coletiva [NIPC-2], com sede na [...], [Cód. Postal-3] Palmela. --- * Matéria: Direitos e deveres de condóminos, al. c), do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei dos Julgados de Paz (versão atualizada da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho). --- Objeto do litígio: Pagamento de prestações relativas a despesas e serviços de condomínio. --- * Relatório: --- O Demandante instaurou a presente ação, nos termos do requerimento inicial constante de fls. 4 a 7, que aqui se declara integralmente reproduzido, peticionando a condenação da Demandada a pagar-lhe a quantia global de €1.231,44, a título de quotas de condomínio vencidas e não pagas, acrescida da penalização aprovada em ata. --- Para tanto, alegou em síntese que, a parte Demandada deixou de contribuir para as despesas comuns do condomínio e acumulou dívida por falta de pagamento das quotas. --- Para além do montante respeitante ao pagamento do valor das quotas de condomínio vencidas e não pagas, a parte Demandada deve ser condenada na pena pecuniária aplicada nos termos da deliberação aprovada em assembleia dos condóminos. --- Concluiu pela procedência da ação, juntou documentos e procuração forense. ---- Regularmente citada, na pessoa do seu Legal Representante (fls. 283), a Demandada não contestou, não compareceu à audiência de julgamento, nem justificou a falta no prazo legal. - * Fundamentação – Matéria de Facto: --- Com interesse para a resolução da causa, ficou provado que: --- 1. Entre 26-05-2008 e 07-02-2022, a Demandada teve registada a seu favor a aquisição da fração autónoma designada pela letra “A”, correspondente à Subcave direita – armazém, do prédio constituído em propriedade horizontal, descrito na ficha [Nº Identificador-1], da 1.ª Conservatória do Registo Predial de [...], freguesia de [...] (S. Julião), sito na [...], n.º 12, em [...], 42 a 45; --- 2. A Demandada não pagou nas datas dos respetivos vencimentos, nem posteriormente, as quotas de condomínio, ordinárias e extraordinárias vencidas desde 01-05-2016 a 31-01-2022, as quais, totalizavam o montante de €851,44, fls. 25; --- 3. A mensalidade da quota ordinária de condomínio, incluindo comparticipação para o fundo comum de reserva, corresponde à quantia de €8,53, fls. 116; --- 4. Por deliberação constante da Ata 7/2016, datada de 21-06-2016 foi aprovada uma deliberação para execução de obras na fachada tardoz lateral do edifício, aprovada por maioria, cabendo à demandada o pagamento da quantia de €152,25, até 8 de setembro de 2016, fls. 57 a 75; --- 5. Por deliberação constante da Ata 8/2017, datada de 11-01-2017, foi aprovada uma deliberação para a realização de obras para remoção do gradeamento de ferro da entrada do edifício e repintura das fachadas do prédio bem como repintura das fachadas, aprovada por maioria, cabendo à demandada o pagamento da quantia de €161,77, até 8 de abril de 2017, cf., 76 a 107; 6. Por deliberação constante da Ata 12/2020 de 13-01-2020, foi aprovada uma deliberação para obras realização de obras para beneficiação do edifício (reparação e pintura da fachada frontal), aprovada por unanimidade, cabendo à demandada o pagamento da quantia de €64,71, fls. 108 a 144; --- 7. As quotas extraordinárias mencionadas nos números 4 a 6, supra, estão lançadas na listagem de valores em dívida de fls. 25 dos autos, que faz parte integrante da ata n.º 15/2023, datada de 17-01-2023, relativamente à posição contributiva da Demandada para o condomínio. --- 8. Na ata da assembleia dos condóminos mencionada no número 6, consta o seguinte: “Foi deliberado e aprovado por maioria dos presentes a imputação aos condóminos devedores, dos custos inerentes aos processos de cobrança coerciva. Foram informados os condóminos que todos os custos inerentes à cobrança judicial de prestações de condomínio vencidas e não pagas serão imputados aos condóminos devedores a título de penalização, sendo o montante mínimo a imputar a título de penalização a quantia de € 380,00. (…)”, idem; --- 9. Com a instauração da presente ação, o Demandante aplicou aos Demandados uma pena pecuniária no montante de €380,00. --- 10. As mensalidades da quota do condomínio vencem ao dia 8 de cada mês; --- ---*--- Motivação da Matéria de Facto: --- Nos termos do disposto no n.º 2, do art.º 58.º, da Lei dos Julgados de Paz, “Quando o demandado, tendo sido pessoal e regularmente citado, não comparecer no dia da audiência, não apresentar contestação escrita, nem justificar a falta no prazo de três dias, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor.” --- Atento à verificação cumulativa dos requisitos legais para a revelia operante da Demandada, ou seja, a falta de apresentação de contestação e a sua falta injustificada à audiência de julgamento, dou por confessados os factos articulados pelo Demandante no seu requerimento inicial. --- Deste modo, a fixação da matéria de facto dada como provada teve por base a confissão do Demandado e os documentos juntos aos autos, nomeadamente, as atas da assembleia dos condóminos, nas quais constam a deliberação com a eleição do administrador, e o montante da mensalidade respeitante à comparticipação da fração da Demandada para as despesas comuns; e a informação da conservatória do registo predial, na qual consta a inscrição do registo de direito de propriedade da fração identificada nos autos a favor da Demandada, e a posterior transmissão a terceiro. --- Consigna-se que, para apuramento da matéria de facto não foi considerado o teor do requerimento inicial com matéria tida por irrelevante, conclusiva ou de direito. -- ---*--- Fundamentação – Matéria de Direito: --- A relação material controvertida circunscreve-se ao incumprimento por parte da Demandada da obrigação de pagamento da sua quota-parte de contribuição para as despesas geradas pelo condomínio, e quais as consequências que derivam de tal facto. --- Sobre a obrigação de contribuir para os encargos do condomínio: --- A propriedade horizontal encontra-se regulada, designadamente, nos artigos. 1414.º e seguintes do Código Civil. --- Do regime legal da propriedade horizontal resulta que a posição de condómino confere direitos e obrigações, assentando na dicotomia existente entre o direito de usufruir das partes comuns do edifício e a obrigação de contribuir para as despesas comuns de manutenção, conservação e serviços de interesse comum, abreviadamente despesas comuns. --- A liquidação das despesas comuns advém, necessariamente, das receitas cobradas para esse efeito. Na categoria das receitas do condomínio avultam as quotas dos condóminos, ou seja, a quota-parte correspondente à contribuição de cada fração para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento dos serviços de interesse comum, enquadrando-se nessa categoria as quotas ordinárias e extraordinárias de condomínio, a pagar por cada condómino, em princípio, na proporção do valor das respetivas frações (cf., art.º 1424.º, n.º 1, do Código Civil). - A obrigação de contribuir para as despesas comuns, encontra-se estabelecida no art.º 1424.º, do Código Civil, o qual dispõe que, “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações”. --- Temos assim que, a obrigação de contribuir para as despesas comuns de manutenção e conservação do edifício, na proporção da respetiva fração autónoma face ao capital investido no edifício, é uma obrigação que decorre expressamente da letra da lei, a qual assume natureza pecuniária, nos termos do citado art.º 1424.º, do Código Civil. Pelo que, o incumprimento da referida obrigação torna o devedor responsável pelos prejuízos que daí possam resultar para o condomínio, nos termos gerais das obrigações (cf, art.º 798.º, do Código Civil). ----- O administrador do condomínio tem competências funcionais estabelecidas no art.º 1436.º, do Código Civil, cabendo-lhe a legitimidade material para agir em juízo no âmbito das suas competências (cf., art.º 1437.º, do Código Civil). --- Uma das funções do administrador do condomínio consiste em cobrar as receitas e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, conforme resulta das alíneas. d), e e), do art.º 1436.º, do Código Civil. ---- Aliás, resulta do disposto no n.º 2, do art.º 6.º, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de outubro, que o administrador tem o dever de instaurar a ação de cobrança contra o condómino que não liquide atempadamente as quantias respeitantes à sua quota-parte de contribuição para as despesas comuns. --- Sobre as quotas vencidas: --- Ficou provado que a Demandada não pagou nas respetivas datas de vencimento nem posteriormente, as mensalidades da quota de condomínio, ordinárias e extraordinárias, vencidas desde 01-05-2016 a 31-01-2022, tendo acumulado uma dívida no montante global de €851,44, conforme peticionado. --- Assim, é inequívoca a responsabilidade da Demandada relativamente à quantia de peticionada título de dívida vencida, pelo que, deve ser reconhecido o correspondente direito de crédito a favor do Demandante, e declarada a procedência da ação nesta parte do pedido. --- Sobre a aplicação da pena pecuniária no montante de €380,00: --- Ficou provado que, na instauração da presente ação o Demandante aplicou uma pena pecuniária à Demandada, no montante de €380,00. --- A possibilidade de aplicar a referida pena pecuniária consta da deliberação da assembleia dos condóminos, conforme ata junta aos autos, e é legalmente admissível, face ao disposto no art.º 1434.º, do Código Civil. --- A concreta aplicação da referida pena pecuniária à Demandada decorre do teor do requerimento inicial. --- Importa ter presente que uma coisa é a existência jurídica da norma sancionatória (que ocorreu desde que a deliberação foi aprovada pela assembleia dos condóminos); e outra coisa diferente é a decisão de aplicar a sanção prevista na mesma deliberação a um determinado condómino. --- Ora, a aplicação concreta de uma penalização é um ato jurídico próprio dos órgãos do condomínio, que necessita de ser exteriorizado por uma declaração, e portanto, não se presume. --- Deste modo, para que se possa considerar aplicada uma pena pecuniária a um determinado condómino, necessariamente, terá de haver uma manifestação de vontade posterior à deliberação que aprova a pena pecuniária, de modo a concretizar o ato de sancionar uma conduta nos termos previstos, seja o ato realizado, também, pela assembleia dos condóminos, ou pelo administrador.-- Temos assim que, muito embora se considere que existia uma deliberação da assembleia dos condóminos que aprovou a pena pecuniária antes da transmissão da fração a terceiro, a decisão (do administrador) de aplicação da penalização em causa nos autos apenas foi tomada no próprio requerimento inicial da presente ação (porque assim decorre da própria deliberação da assembleia dos condóminos), ou seja, numa data em que a Demandada já não estava investida na qualidade de condómina.--- Deste modo, a decisão de aplicar a sanção pecuniária não tem qualquer eficácia relativamente à Demandada, dado que, a partir do momento em que a propriedade sobre a fração autónoma identificada nos presentes autos foi transmitida a terceiro, a mesma deixou de estar vinculada às decisões do administrador posteriores à referida transmissão. --- Assim, a ação deverá improceder nesta parte do pedido. --- ---*--- Decisão: --- Atribuo à causa o valor de €1.231,44, por corresponder à quantia em dinheiro que o Demandante pretendia obter no momento da propositura da ação / que corresponde ao montante indicado no requerimento inicial, cf., normas conjugadas dos artigos 306.º, n.º 1; 297.º, n.º 1; e 299.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi, art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz. --- Pelo exposto e com os fundamentos acima invocados: --- Julgo a presente ação parcialmente procedente por parcialmente provada, e consequentemente, condeno a Demandada a pagar ao Demandante a quantia global de €851,44, respeitante ao valor de todas as quotas vencidas e não pagas entre 01-05-2016 e 31-01-2022. --- Mais decido absolver a Demandada do restante peticionado na presente ação. --- Custas: --- A taxa de justiça no montante de €70,00 (setenta euros), fica a cargo de ambas as partes na proporção do respetivo decaimento, que fixo em 69%, para a Demandada, e 31%, para a Demandante. --- Assim, a Demandada deverá proceder ao pagamento da quantia de €48,30. --- Por sua vez a Demandante deverá proceder ao pagamento da quantia de €21,70. --- * Os pagamentos deverão ser efetuados no prazo de três dias úteis, mediante liquidação das respetivas guias de pagamento (DUC), emitidas pela secretaria do Julgado de Paz.--- * Extraia as guias de pagamento (DUC), e notifique aos responsáveis pelo pagamento das custas juntamente com cópia da presente decisão. --- Após os três dias úteis do prazo legal, aplica-se uma sobretaxa no montante de €10,00 (dez euros), por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação, até ao máximo de €140,00 (cento e quarenta euros). --- O valor da sobretaxa aplicável acresce ao montante da taxa de justiça em dívida. --- * Após trânsito, verificando-se a falta de pagamento das custas, mesmo após o acréscimo da referida sobretaxa legal, conclua para emissão de certidão para efeitos de execução fiscal, a instaurar junto dos competentes serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), pelo valor das custas em dívida acrescidas da respetiva sobretaxa. * Registe. --- Notifique pessoalmente em sede de audiência de discussão e julgamento, nos termos do disposto no artigo 60.º, n.ºs 1 e 2, da Lei dos Julgados de Paz. --- Envie cópia da mesma aos intervenientes processuais que, eventualmente, faltarem na data agendada para a prolação da sentença, cf., artigo 46.º, n.º 3, da Lei dos Julgados de Paz. --- ---*--- Julgado de Paz de Setúbal, em 25 de outubro de 2024 O Juiz de Paz _________________________ Carlos Ferreira |