Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 57/2017-JP |
Relator: | JOANA SAMPAIO |
Descritores: | CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MANDATO |
![]() | ![]() |
Data da sentença: | 10/27/2017 |
Julgado de Paz de : | SERTÃ |
![]() | ![]() |
Decisão Texto Integral: | SENTENÇA I. RELATÓRIO: AA, Advogado, melhor identificado a fls. 1 dos autos, intentou contra BB, LDA., CC, DD, EE, melhor identificados fls. 1, a presente ação declarativa destinada a efetivar o cumprimento de obrigações, pedindo a condenação dos demandados, solidariamente, a pagar-lhe a quantia de € 2.572,45 (dois mil quinhentos e setenta e dois euros e quarenta e cinco cêntimos), acrescidas das quantias referentes à retenção na fonte (IRS) e dos juros de mora vencidos e vincendos desde 30.07.2015 até ao efetivo e integral pagamento, relativa a prestação de serviços de Advocacia. Para tanto, alegou os factos constantes do Requerimento Inicial de fls. 1 e 2, que aqui se dá por reproduzido. Os demandados foram regularmente citados, cfr. fls. 17. 18, 19 e 20 dos autos. Foi designado o dia 04-10-2017, pelas 11h15m para realização da audiência de julgamento, na qual compareceu o demandante que procedeu à junção de quatro documentos e requereu a retificação do requerimento inicial, o qual, a seu ver, continha um lapso de escrita na indicação dos valores peticionados, uma vez que indicou os valores líquidos sem a referência aos valores a título de retenção na fonte (IRS). Requereu a retificação do artigo 4º do Requerimento inicial de forma a constar que os honorários “no processo nº 000/00.9TBFVN, foram fixados em 2.250,00 € (dois mil duzentos e cinquenta euros) acrescidos de IVA à taxa de 23%, que importa 517.50 € (quinhentos e dezassete euros cinquenta cêntimos), incidindo sobre tal montante a retenção de 25%, no valor de 562.50 € (quinhentos e sessenta e dois euros e cinquenta cêntimos). Pelo que toca à despesa de honorários nesta ação devem os Demandados pagar o valor de 2.205.00 € (dois mil duzentos e cinco euros) ao Demandante e suportar a retenção de 562.50 € (quinhentos e sessenta e dois euros e cinquenta cêntimos). No que toca ao processo xx/20xx – Julgado de Paz da Sertã, os honorários foram fixados em 250.00 € (duzentos e cinquenta euros) mais IVA à taxa 23%, devendo os Demandados suportar a retenção de 25% sobre tal montante e pagar ao Demandante o valor líquido de 245.00 € (duzentos e quarenta e cinco euros)”, bem como do pedido descrito na al. a) de forma a constar “pagar ao demandante a quantia líquida de € 2.562,45 (dois mil quinhentos e sessenta e dois euros e quarenta e cinco cêntimos) e ainda suportar o pagamento das quantias de retenção na fonte referidas no artigo 4º”. Os demandados faltaram à audiência de julgamento e não justificaram a sua falta no prazo legal, apesar de notificados para o efeito, e da junção dos documentos e do requerimento de aperfeiçoamento, não se tendo pronunciado. II. SANEAMENTO DO PROCESSO: Verificam-se os pressupostos de regularidade da instância, já que: O Tribunal é competente em razão do objeto, do valor, da matéria e do território nos termos do disposto nos artigos 6º nº 1, 8º, 9º nº 1 al. a), 10º e 12º nº 1, da Lei nº 78/2001, de 13 de julho, e 774º do Código Civil. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não existem nulidades, exceções ou outras questões prévias a conhecer, para além do requerimento de retificação do requerimento inicial supra exposto, o qual apreciamos de seguida. Como supra se expôs, o demandante requereu a retificação do pedido pelo facto de ter sido peticionado o valor líquido a pagar pelos demandados, não se fazendo referência ao montante referente a retenção na fonte de IRS (25%) a que o Demandante está sujeito. Cumprido o contraditório, os demandados optaram por nada dizer. Sem delongas, é admitida a retificação requerida, por se tratar de mera omissão de escrita do cálculo que foi efetuado pelo demandante para achar o valor peticionado, dele não resultando qualquer alteração ao valor peticionado, como infra se explicará (artigo 43º da Lei 78/2001, de 13 de julho, na redação que lhe foi dada pela Lei nº 54/2013, de 31 de julho, e artigos 590º e 3º e 4º do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 63º da referida Lei nº 7872001). Fixa-se o valor da ação em €2.572,45 (dois mil quinhentos e setenta e dois euros e quarenta e cinco cêntimos), de acordo com a indicação do Demandante. III. FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA: Dispõe o art. 58º n.º 2 da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, que «Quando o demandado, tendo sido pessoal e regularmente citado, não comparecer, não apresentar contestação escrita, nem justificar a falta no prazo de três dias, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor.» Foi precisamente o caso dos presentes autos. Assim, consideram-se provados (por confissão) e relevantes para o exame e decisão da causa os seguintes os factos: 1 – O demandante é advogado e usa o nome abreviado de AA, encontrando-se inscrito na Ordem dos Advogados com a Cédula Profissional n.º 0000C; 2 – O demandante prestou serviços de advocacia à primeira demandada, a solicitação dos 2º, 3º e 4º demandados; 3 – O demandante patrocinou a 1ª demandada, a solicitação do 2º demandado no âmbito do Processo n.º 000/00.9TBFVN e proc. 00/2000 - JP, tendo a 1ª demandada emitido ao demandante procuração para o efeito, assinada pelo 2º demandado; 4 – Os honorários e despesas referentes ao Processo n.º 000/00.9TBFVN foram fixados em €2.250,00 (dois mil duzentos e cinquenta euros) acrescidos de IVA à taxa de 23%, que importa €517.50 (quinhentos e dezassete euros cinquenta cêntimos), incidindo sobre tal montante a retenção de 25%, no valor de €562.50 (quinhentos e sessenta e dois euros e cinquenta cêntimos); 5 – Os honorários e despesas referentes ao Processo nº 00/2000 – JP foram fixados no valor global de €250.00 (duzentos e cinquenta euros) mais IVA à taxa 23%, incidindo sobre tal montante a retenção de 25%, o que corresponde ao valor líquido de €245.00 (duzentos e quarenta e cinco euros); 6 – A nota de despesas e honorários foi remetida por carta à 1ª demandada no dia 30.07.2015; 7- A conta de despesas e honorários não foi objeto de qualquer reclamação; 8 – Os serviços prestados perfazem um total em dívida líquido de €2.450,00 (dois mil quatrocentos e cinquenta euros); 9 - Os atos de assistência, aconselhamento jurídico e patrocínio judicial foram praticados pelo demandante na qualidade de advogado e no exercício das inerentes competências; 10 – À data de 13.03.2017, a demandada deve ao demandante a quantia de €2.572,45 (dois mil quinhentos e setenta e dois euros e quarenta e cinco cêntimos). A convicção probatória do tribunal ficou a dever-se à confissão por parte dos demandados, operada pela ausência de contestação escrita e falta, injustificada, à Audiência de Julgamento, considerando-se provados todos os factos alegados pelo demandante. IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA As questões a decidir por este Tribunal circunscrevem-se à caracterização do contrato celebrado entre o demandante e o (s) demandado (s), às obrigações e direitos daí decorrentes, à solidariedade, bem como às consequências de um eventual incumprimento dessas obrigações. Por efeito da confissão, resultou dos autos que o demandante, no exercício da sua profissão de Advogado, prestou atos de assistência, aconselhamento jurídico e patrocínio judiciário no interesse da sociedade comercial demandada, nomeadamente no âmbito dos Processos n.º 000/00.9TBFVN e proc. 00/2000 - JP. Mais resultou provado que o demandante, findos os serviços prestados, emitiu a conta de despesas e honorários, no valor global líquido de €2.450,00 (dois mil quatrocentos e cinquenta euros). Antes de mais, analisemos a questão da responsabilidade (solidária) dos demandados, BB, LDA., CC, DD, EE. Desde logo porque não alegada, não ficou provada qual a relação entre a 1ª demandada e os 2º, 3º e 4º demandados. Resulta dos factos dados como provados (nº 2 e 3), que o demandante prestou serviços de advocacia à primeira demandada, a solicitação dos 2º, 3º e 4º demandados; patrocinou a 1ª demandada, a solicitação do 2º demandado no âmbito do Processo n.º 000/00.9TBFVN e proc. 00/2012 - JP, tendo a 1ª demandada emitido ao demandante procuração para o efeito, assinada pelo 2º demandado. Resulta daqui que os serviços prestados pelo demandante foram à sociedade comercial demandada, nada tendo resultado, nem alegado, relativamente a prestação de serviços aos 2º, 3º e 4º demandados. Oficiosamente consultada a certidão permanente da sociedade comercial demandada, BB, LDA., que consta dos autos, verificamos que os 2º, 3º e 4º demandados são todos sócios e gerentes daquela sociedade comercial. O gerente é a figura que, nas sociedades por quotas, exerce a função representativa da sociedade, vinculando-a perante terceiros nos negócios que realize em nome daquela (artigos 252º nº 1 e 260º do Código das Sociedades Comerciais). O contrato celebrado no caso concreto configura um contrato de prestação de serviços, na modalidade de mandato judicial, cujo regime se encontra previsto nos artigos 1154.º e 1157.º e seguintes do Código Civil (CC). O mandato não exige que seja demonstrado por escrito, mas no caso concreto verifica-se que a demandada emitiu uma procuração ao demandante, assinada pelo 2º demandado. Não tendo o demandante juntado aos autos a referida procuração, e resumindo a nossa apreciação à alegação dada como provada, resulta que o 2º demandado assinou a referida procuração exclusivamente em representação da sociedade demandada, na qualidade de seu sócio gerente. Os 2º, 3º e 4º demandados seriam aqui obrigados se tivessem agido/contratado os serviços do demandante em nome pessoal, ou, se tivessem contratado por si e em representação da sociedade. Na última hipótese, os demandados seriam mandantes e responsáveis solidários pelas obrigações derivadas do contrato de mandato que assumissem (artigo 513º do Código Civil). De igual modo, não resulta que os 2º, 3º e 4º demandados tenham declarado, enquanto pessoas autónomas e não em nome da sociedade da qual são sócios gerentes, a sua vontade de prestar fiança. Não tendo o demandante alegado factos que sustentassem a assunção por aqueles demandados do contrato de mandato e das obrigações inerentes, nem que tenham individualmente, assumido em seu nome qualquer obrigação, mormente de prestarem fiança (artigos 627º e 628º nº 1 do Código Civil), resta-nos concluir pela improcedência do pedido relativamente ao 2º, 3º e 4º demandados, não podendo ser-lhe exigido o valor peticionado. Temos, portanto, que o contrato de mandato celebrado foi entre o demandante e a 1ª demandada, a sociedade comercial BB, LDA.. O mandato consiste na assunção da obrigação de praticar atos jurídicos por conta de outro (art.º 1157 do C.C.), presumindo a lei que se trate de um contrato oneroso, por ser inserido nos atos que o mandatário pratique por profissão (art.º 1158, n.º1, 2ª parte do C.C.). Estabelece o mesmo diploma, nos termos do artigo 1167.º, alíneas b) e c), que o mandante está obrigado a pagar ao mandatário a retribuição que ao caso competir, bem como, a reembolsá-lo das despesas efetuadas. Por sua vez, compete ao mandatário praticar os atos compreendidos no mandato segundo as instruções dadas pelo mandante e no fim do serviço realizado deve prestar contas e comunicar as razões pelas quais possa não ter executado (art.º 1161 do C.C.). Estamos, portanto, face a um contrato bilateral, do qual emergem direitos e obrigações para ambas as partes. Nada resulta nos presentes autos que indicie que o demandante não cumpriu com as suas obrigações decorrentes do contrato que celebrou. Antes resulta, pelo contrário e por ausência de qualquer reclamação aos serviços prestados ou pelo desinteresse demonstrado na falta de participação nos presentes autos, que foi a demandada que não cumpriu com a obrigação que sobre ela impendia de pagamento dos honorários que lhe foram fixados e que a eles se vinculou, não tendo alegado qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito invocado pelo demandante (cfr. art. 342º n.º 2 CC). Nos termos do artigo 762º CC o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado e o contrato deverá ser pontualmente cumprido por ambos os contraentes (cfr. art. 406º do mesmo Código). Nestes termos, forçoso é concluir que a 1ª demandada, a sociedade comercial BB, Lda., deve ao demandante a quantia que este peticiona, pelo que deve ser condenada no seu integral pagamento. Mais se acrescenta que, a quantia referida inclui o montante legal de IVA, como declara o demandante. Trata-se de um imposto sobre o consumo, o qual em última "ratio" incide sobre o consumidor final, passando a entidade que presta o serviço a ser a credora, na medida em que é ela que deve cobrar e proceder à sua entrega ao Estado. De facto o imposto integra-se no preço, no momento em que se presta o serviço (art.º 37º, n.º1 do CIVA), por isso a importância do imposto a liquidar deve ser adicionada ao valor da fatura, e como tal ficou a demandada obrigada ao pagamento deste imposto na quantia global de 650€ (€517,50 + €132,50). No que respeita à retenção na fonte de IRS, trata-se de um mecanismo instituído pelo sistema fiscal português mediante o qual a entidade pagadora está obrigada a reter uma parte do rendimento e a entregá-la à Autoridade Tributária em nome do prestador do serviço. No caso, o demandante está sujeito a uma retenção de IRS à taxa de 25%. No cálculo do valor a pagar pelos demandados, o demandante, e bem, ao valor fixado a título de honorários somou o valor do IVA (23% do capital) e deduziu o valor referente à retenção de IRS (25% do montante do capital). Assim, a demandada terá de proceder ao pagamento ao demandante da quantia líquida, devendo proceder à entrega ao Estado do valor referente à retenção na fonte de IRS. No que respeita aos juros, representam um crédito pecuniário, determinado em função do tempo em que se encontrou privado do capital. No caso em apreço funcionam como uma reparação, pelo não cumprimento tempestivo de uma obrigação pecuniária (art.º 806, n.º1 do C.C.). Estes são devidos após a constituição em mora do devedor. No presente caso como se trata de uma obrigação sem prazo fixo para cumprir, o devedor constituiu-se em mora após ter sido interpelado, judicial ou extrajudicialmente, para cumprir (art.º 805, n.º1 do C.C.). Foi provado que a devedora foi interpelada por meio de carta enviada a 30/07/2015, por isso são devidos os juros desde aí até que efetue o pagamento integral desta obrigação, como requerido, sendo que, até 13/03/2017 venceram-se juros correspondentes à quantia de €122,45, calculada pelo demandante. V- DECISÃO: Nestes termos, julgo a presente ação parcialmente procedente e provada e, por via disso, condeno a Demandada BB, LDA. a pagar ao Demandante a quantia de €2.572.45 (dois mil quinhentos e setenta e dois euros e quarenta e cinco cêntimos), dos quais €122,45 são referentes a juros moratórios calculados pelo Demandante até ao dia 13-03-2017. Mais condeno a Demandada a pagar ao Demandante os juros de mora vincendos calculados sobre o capital em dívida, à taxa legal aplicável de 4% (Portaria 291/2003, de 08 de abril), desde 14.03.2017 até ao efetivo e integral pagamento. Relativamente aos Demandados CC, DD, EE vão os mesmos absolvidos do pedido. Custas: atentas as razões da procedência parcial, entende-se não haver decaimento para efeito de custas, que serão suportadas pela demandada BB, LDA. na totalidade, no valor de € 70,00 (setenta euros) - (artigo 8º da Portaria 1456/2001, de 28 de dezembro). Registe e notifique. Sertã, 27 de outubro de 2017 A Juiz de Paz (em substituição) (Joana Sampaio) |