Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 259/2022–JPFNC |
Relator: | CELINA ALVENO |
Descritores: | RESPONSABILIDADE CIVIL – ACIDENTE DE VIAÇÃO |
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Data da sentença: | 11/13/2024 |
Julgado de Paz de : | FUNCHAL |
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Decisão Texto Integral: | SENTENÇA Processo n.º 259/2022 – JPFNC I - IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES Demandante: [PES-1], NIF [NIF-1], com domicílio na [...], n.º 755, casa A, [Cód. Postal-1] Funchal. Demandada: [ORG-1] S.A., NIPC [NIPC-1] com sede na [...], n.º 242, [Cód. Postal-2] [...]. II - RELATÓRIO O Demandante instaurou contra a Demandada a presente ação declarativa enquadrada na alínea h) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 78/2001 de 13 de julho, na sua atual redação (LJP), pedindo a condenação da Demandada a assumir a responsabilidade do seu segurado e, nessa senda, a mesma condenada no pagamento da reparação dos danos da viatura do Demandante já apurados no valor de € 6.986,23; condenada ao pagamento de uma indemnização pelo dano quanto à privação do uso da viatura, calculado à taxa diária de € 10,00, perfazendo € 2.020,00, desde 02/08/2021 até à data em que o veículo se encontrou em condições de circulação, a 19/02/2022; condenada no pagamento de uma indemnização pelos danos não patrimoniais no valor de € 1.000,00, acrescidas dos juros à taxa legal de 4%, vencidos e vincendos desde a data da citação até integral pagamento, custas, demais encargos e procuradoria. Juntou: 7 documentos e procuração forense. Não aceitou submeter o litígio à mediação (cfr. fls. 8). * A Demandada foi citada e contestou (fls. 22 e de fls. 23 a fls. 49). * As partes e Ilustres Mandatários foram notificados da audiência de julgamento. Foram efetuadas várias tentativas de conciliação, com o esforço necessário e na medida adequada, para explorar todas as possibilidades de acordo, nos termos do n.º 1 do art.º 26º da LJP, contudo a mesma não se revelou possível. * Foram ouvidas as partes, nos termos do disposto no artigo 57.º da LJP, e realizada a audiência de julgamento, com observância do formalismo legal, como resulta das atas, tendo as partes exposto as suas posições perante os factos objeto do litígio, tendo sido ouvido o Demandante, em declarações de parte, testemunhas e alegações finais pelos Ilustres Mandatários das partes. * O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do objeto, do território e do valor. O processo é próprio e não enferma de nulidades que o invalidem. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não há exceções, nulidades ou questões prévias que cumpra conhecer. III- VALOR DA AÇÃO Fixa-se em € 10.006,23 (dez mil e seis euros e vinte e três cêntimos), o valor da presente causa (artigos 296.º, 297.º n.º 2, 299.º, 300.º e 306.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 63.º da LJP). IV- OBJETO DO LITÍGIO Responsabilidade civil – acidente de viação A questão que se controverte, consiste em saber se a Demandada deve ser responsabilizada pelo pagamento da quantia exigida a título dos danos patrimoniais e não patrimoniais, decorrentes do acidente de viação descrito nos autos. V- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Assim e com relevância para a decisão da causa, e de acordo com as declarações do Demandante, da Demandada, das testemunhas e da prova documental carreada para os autos, resultaram os seguintes: FACTOS PROVADOS: 1. O Demandante é proprietário do automóvel ligeiro, de mercadorias, Ford Ranger, com a matrícula [- - 1], de 1999. 2. No dia 2 de agosto de 2021, por volta das 8 horas, o veículo supra referenciado era conduzido pelo Demandante, no sentido sul-norte, da [...], artéria sem separador e com dois sentidos de marcha, freguesia de [...], concelho do Funchal. 3. O Demandante, confrontado com veículos estacionados à direita, no seu sentido de marcha, sinalizou a manobra de contorno de obstáculo e prosseguiu a subida, quando foi embatido pelo veículo de marca [Marca-1], matrícula [- - 2], conduzido por [PES-2] e propriedade de [PES-3]. 4. O embate provocou danos no vértice anterior direito e parte frontal direita do veículo do Demandante. 5. O Demandante circulava a cerca de 30/40 Km/H. 6. O limite de velocidade permitido para o local é de 50 Km/h. 7. Aquando do embate, o condutor do veículo de marca [Marca-1] preparava-se para ocupar a faixa de rodagem onde circulava o Demandante, sem tomar as devidas precauções para realizar aquela manobra, tendo o seu campo de visão totalmente obstruído, não tendo efetuado qualquer sinalização luminosa ou sonora antes de realizar a manobra de retomar a marcha. 8. Do relatório de peritagem elaborado pela Demandada, resultaram danos no capot do veículo do Demandante, no farol frontal direito completo, no farol pisca frontal direito completo, friso aba guarda frontal direito, grelha frontal, guarda lama e resguardo frontal direito, painel frente completo, para-choques faixa frontal, central e lateral, alinhamento, pintura e com respetiva mão-de-obra, perfaz a quantia de € 2.243,83 (dois mil duzentos e quarenta e três euros e oitenta e três cêntimos), com IVA. 9. Do relatório consta que o veículo foi dado como não apto para circular. 10. Em outubro de 2021 a Demandada comunicou que não aceitaria a responsabilidade do acidente, não propondo qualquer valor indemnizatório, nem procedendo à reparação do veículo. 11. A seguradora do Demandante não assumiu a responsabilidade do seu segurado pelos danos causados no Renault, na sequência deste acidente. 12. O Demandante teve incómodos pela privação da sua viatura, alteração de rotinas e constrangimentos no planeamento do seu fim-de-semana. 13. O Demandante teve um susto com o embate e sofreu desgaste emocional. Consideram-se reproduzidos os documentos de fls. 10 a fls. 19 e de fls. 31 (verso a fls. 48). * Motivação da matéria fática: O Tribunal formou a sua convicção com base no conjunto da prova produzida, cotejada com as regras da experiência, tendo considerado os elementos documentais juntos pelo Demandante e pela Demandada, que aqui se dão por reproduzidos e integrados, conjugados com as declarações da parte e das testemunhas, inquiridas em sede de audiência de julgamento. Nos termos do n.º 2, do art.º 574.º, do CPC, aplicável ex vi, art.º 63.º, da LJP, consideram-se admitidos por acordo os factos constantes nos números 2, 4, 8, 9 e 10. Considera-se provado, resultante das alegações e declarações da Demandante os factos respeitantes aos números 1, 2, 3, 5, 6, 7, 12 e 13, conjugado com a prova documental junta aos autos. A restante matéria resulta provada pela análise crítica de todas as provas que foram dadas a conhecer em sede de audiência, o que foi ponderado de acordo com as regras da experiência e no âmbito da prova global produzida de modo a não existir contradições entre os documentos e a prova testemunhal. Durante a audiência procedeu-se à audição de testemunhas. O depoimento da testemunha [PES-4], na qualidade de bate chapas que participou na peritagem do veículo do Demandante, foi efetuado de forma idónea, credível e isenta, tendo confirmado o relatório de peritagem de fls. 15 a fls. 16 dos autos e explicado em suma que a viatura não podia circular, após o acidente; que não tinha conhecimento sobre a situação mecânica da viatura; que os danos que estavam à vista foram peritados; que o Ford em questão é uma viatura de força e pouca velocidade; que os danos foram na parte da frente; que não foi detetado que o radiador estivesse amolgado. O depoimento da testemunha [PES-5], na qualidade de rececionista na [ORG-2], Lda., foi efetuado de forma idónea e credível, tendo explicado em suma que, elaborou o orçamento para a reparação do motor da viatura do Demandante, constante na fls. 18 dos autos; que o motor gripou por falta de água; que o orçamento é de dezembro de 2021; que não sabe quando é que o Demandante teve o acidente mas que lhe foi dito que o carro tinha tido um acidente; que foi necessário pedir peças que demoraram cerca de 15 a 20 dias a chegar e que só depois é que o orçamento para a reparação foi efetuado; que o veículo do Demandante chegou à oficina de reboque; que o diagnóstico demorou cerca de 15 dias a um mês a ser efetuado; que quando o orçamento foi efetuado em dezembro o veículo já estava na oficina à cerca de um mês; que o dano no radiador estava visível e que terá sido esse dano a causar a perda de água e por sua vez a avaria no motor; que o preço do radiador não se encontra no orçamento porque foi fornecido pelo Demandante e não pela oficina; que o veículo foi reparado. O depoimento da testemunha [PES-2], na qualidade de condutor interveniente no acidente, foi efetuado de forma idónea e credível, tendo explicado em suma que, quando iniciou a manobra não conseguiu ver a viatura do Demandante porque estavam carros estacionados; que o Renault que conduzia encontrava-se estacionado e quando ia sair, ia descer e não viu o Ford conduzido pelo Demandante porque estavam carros mal estacionados a tapar a sua visibilidade; que se tivesse visto o carro conduzido pelo Demandante não teria iniciado a marcha; que o Renault que estava a conduzir pertencia à sua irmã; que os danos no Renault foram no para-choques; que teve que pagar os danos no Renault porque a seguradora do Demandante não assumiu a responsabilidade do seu segurado pelo acidente. O depoimento da testemunha [PES-6], na qualidade de passageira do Renault interveniente no acidente, foi efetuado de forma idónea e credível, tendo explicado em suma que, estava a olhar para baixo quando sentiu o embate; que ia descer; que é normal estarem carros mal estacionados naquele local; que aquele local não tem linha amarela; que é preciso ter muito cuidado. O depoimento da testemunha [PES-7], na qualidade de perito averiguador, foi efetuado de forma idónea e credível, confirmou as fotos e o relatório e fotos de fls. 36 a fls. 48; tendo explicado em suma que, fez diligências referentes ao acidente; que o acidente aconteceu num local sem sinalização e por isso aplica-se a regra geral do Código da Estrada; que o Ford envolvido no acidente é uma viatura resistente; que os danos causados por este acidente foram apenas na chapa do Ford; que o Ford não podia circular após o acidente; que quando há sobreaquecimento, perda de água surge um aviso no painel; que tendo em conta a dinâmica do acidente e o tipo de veículo resistente não é normal que este acidente causasse algum problema no radiador. * O depoimento da testemunha [PES-4] foi determinante para formar convicção sobre os factos 4, 5, 8 e 9. O depoimento da testemunha [PES-5] foi determinante para formar convicção sobre os factos 1 O depoimento da testemunha [PES-2] foi determinante para formar convicção sobre os factos 11. O depoimento da testemunha [PES-7] foi determinante para formar convicção sobre os factos 1, 2, 4, 8, 9 e 10. A prova testemunhal foi considerada idónea, credível e isenta no seu conjunto. * Considerou o Tribunal o teor dos documentos de fls. 10 a fls. 12 e de fls. 36 a fls. 39, para prova dos factos 1 e 2; de fls. 12 e de fls. 14 para prova do facto 3; de fls. 15 e de fls. 40 para prova do facto 4; de fls. 11 para prova do facto 6; de fls. 12 para prova do facto 7; de fls. 15 a fls. 16 e de fls. 42 (verso) a fls. 48) para prova dos factos 8 e 9; e, de fls. 17 para prova do facto 10. * Em suma, a fixação da matéria dada como provada resultou dos factos admitidos e do teor dos supra referenciados documentos juntos aos autos, além das declarações da parte e da prova testemunhal, o que devidamente conjugado com regras de experiência comum e critérios de razoabilidade, alicerçou a convicção do Tribunal. As declarações de parte do Demandante em relação à dinâmica do acidente foram claras, coerentes, objetivas, esclarecedoras e consistentes, logrando convencer o Tribunal da sua veracidade. * FACTOS NÃO PROVADOS: 1 – Em consequência do embate do dia 2 de dezembro de 2021 o radiador ficou danificado, causando danos no motor. 2 – O veículo do Demandante em causa nos presentes autos é imprescindível para o quotidiano do Demandante, sendo o seu veículo de trabalho e principal transporte, essencial para a atividade da sua empresa de fornecimentos e comercialização de equipamento hoteleiro com assistência pós-venda. 3 – O Demandante utiliza a viatura nas deslocações para contacto com clientes e fornecedores, fornecimento e elaboração de trabalhos de montagem e desmontagem de equipamentos hoteleiros e assistência técnica de serviço pós-venda. 4 – O condutor do veículo segurado da Demandada ao efetuar a manobra de mudança de direção à esquerda, para seguir em sentido descendente, já tinha percorrido 8,8 metros quando se deu o embate. Não se provaram quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa, dada a inexistência ou a insuficiência de prova nesse sentido. Os factos não provados resultam, portanto da ausência de elementos que permitam formar convicção positiva sobre os mesmos. Consigna-se que, para apuramento da matéria de facto não foi considerado o teor dos articulados com matéria tida por irrelevante, conclusiva ou de direito. * VI – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO A questão a resolver é daquelas que, se houvesse maior espírito de compreensão e tolerância, teria sido resolvida pela via conciliatória. Aliás, dúvidas não temos que a mediação e/ou conciliação teria sido o meio ideal, útil, e único de, no caso em apreço, se conseguir conciliar as partes e, inclusivamente, solucionar o litígio. Contudo, uma vez que as partes não perfilharam esse caminho há que apreciá-la sob o prisma da legalidade. Debruçando-nos, assim, nesse prisma, sobre o caso em juízo, com base na matéria de facto provada, cumpre apreciar os factos e aplicar o direito. * Visa o Demandante, com a presente ação, a condenação da Demandada a assumir a responsabilidade do seu segurado e, nessa senda, a mesma condenada no pagamento da reparação dos danos da viatura do Demandante já apurados no valor de € 6.986,23; condenada ao pagamento de uma indemnização pelo dano quanto à privação do uso da viatura, calculado à taxa diária de € 10,00, perfazendo € 2.020,00, desde 02/08/2021 até à data em que o veículo se encontrou em condições de circulação, a 19/02/2022; condenada no pagamento de uma indemnização pelos danos não patrimoniais no valor de € 1.000,00., acrescidas dos juros à taxa legal de 4%, vencidos e vincendos desde a data da citação até integral pagamento, custas, demais encargos e procuradoria., por entender que o acidente em causa nos autos se ficou a dever a culpa exclusiva do condutor do veículo com a matrícula [ - - 2], veículo este seguro na Demandada. * Da Responsabilidade dos intervenientes no acidente: O artigo 483.º do Código Civil (CC) determina que aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. Para que se conclua pela existência de responsabilidade civil por factos ilícitos é, então, necessário um comportamento humano dominável pela vontade; ilicitude, ou seja, a violação de direitos subjetivos absolutos ou normas que visem tutelar interesses privados; um nexo causal que una o facto ao lesante – a culpa (o juízo de censura ou reprovação que o direito faz ao lesante por este ter agido ilicitamente, quando podia e devia ter agido de outra forma) e outro que ligue o facto ao dano, de acordo com as regras normais de causalidade. Pode revestir duas formas: o dolo e a negligência ou mera culpa. Foi dado como provado que o acidente em apreço nos autos se deveu à conduta culposa do condutor do veículo seguro na Demandada, o qual, ocupou a faixa de rodagem onde circulava o Demandante, sem tomar as devidas precauções para realizar aquela manobra, tendo o seu campo de visão totalmente obstruído, não fazendo qualquer sinalização luminosa ou sonora antes de realizar a manobra, enquanto o Demandante confrontado com veículos estacionados à direita, no seu sentido de marcha, sinalizou a manobra de contorno de obstáculo e prosseguia a subida. Face à matéria provada, há que concluir que a responsabilidade do acidente em apreço se deve exclusivamente à conduta do condutor do veículo com a matrícula [ - - 2], com culpa efetiva, o qual violou o disposto nos artigos 12.º, n.º 1 do Código da Estrada (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de maio, na redação em vigor aquando dos factos), violação, essa, que foi causa adequada para a ocorrência do acidente. Conclui-se pois, estarem preenchidos todos os pressupostos (supra mencionados) do nascimento da obrigação de indemnizar por responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos por parte do condutor do veículo com a matrícula [ - - 2], sendo que o proprietário de tal veículo havia transferido a sua responsabilidade civil, por danos emergentes da sua circulação, para a Demandada, pelo que é sobre esta que recai a obrigação de indemnizar a Demandante pelos danos provocados pelo acidente. * Dos Danos: Está assente que o veículo sofreu os danos orçamentados no relatório de peritagem, identificado de fls. 15 a fls. 16 e de fls. 43 (verso) a fls. 48. Os referidos danos constituem danos emergentes do acidente ocorrido, tendo o Demandante o direito a ser indemnizado pelos mesmos, em virtude da culpa exclusiva atribuída pela ocorrência do acidente ao condutor do Renault. A regra vigente na responsabilidade civil é a da reparação integral dos danos resultantes do facto ilícito, nos termos dos artigos 562º e 566º do CC. Assim sendo, tem o Demandante direito de ser indemnizado, a título de custos com a reparação do seu veículo. O Demandante, in casu, peticionou danos patrimoniais, especificamente os danos verificados no veículo, constantes do relatório de avaliação dos danos, cuja reparação se cifra em € 2.243,83 (com IVA). Não ficou provado que os danos alegados no radiador que terão alegadamente causado o dano no motor, foram consequência do acidente visado nos presentes autos. Provou-se que o veículo propriedade da Demandante sofreu danos, cujo relatório de avaliação dos danos concluiu ser reparável pelo valor de € 1.839,19 (sem IVA), € 2.243,83 (com IVA). Mais se deu como provado que, na sequência do acidente, o veículo propriedade do Demandante ficou impossibilitado de circular, tendo o Demandante procedido à sua reparação; mas que continuou a circular com a viatura e que só após a avaria no motor é que esta ficou imobilizada, avaria essa que não foi possível imputar ao acidente dos presentes autos. Deste modo, este Tribunal tem forçosamente de condenar a Demandada apenas na reparação dos danos cujo nexo de causalidade e imputação resultam demonstrados pelo Demandante. Contudo, o Demandante não evidenciou ter sido este o custo suportado por si para a reparação do seu veículo. Assim, nenhum valor a título de IVA poderá ser a Demandada condenada, uma vez que não está provado que este valor foi liquidado e suportado pelo Demandante, o que se conclui face à ausência de fatura-recibo que o comprove. Deste modo, este Tribunal tem forçosamente de reconhecer o direito do Demandante à reparação dos danos cujo nexo de causalidade e imputação resultou demonstrar, sem que a Demandada conseguisse abalar. Não sendo possível a reconstituição natural, uma vez que o Demandante já procedeu à reparação da viatura, será a indemnização fixada em dinheiro (artigo 566.º, n.º 1 do Código Civil). Tem assim o Demandante direito a título de danos patrimoniais, à indemnização de € 1.839,19 (mil oitocentos e trinta e nove euros e dezanove cêntimos). * Quanto à privação do uso pela imobilização do veículo sinistrado: Vem o Demandante peticionar a este título a importância de € 2.020,00 (dois mil e vinte euros). Quanto à peticionada indemnização por privação do uso do veículo, o Demandante alegou que teve incómodos pela privação da sua viatura, alteração de rotinas e constrangimentos no planeamento do seu fim-de-semana. Para além de ter ficado provado que o Demandante continuou a circular com a viatura, após o acidente e que esta apenas ficou imobilizada na sequência de danos no motor que não foram possível imputar ao acidente dos presentes autos, a jurisprudência nem sempre tem sido uniforme relativamente a esta questão, entendendo uns que a indemnização pela privação do uso de um veículo depende da prova de um dano concreto, ou seja, da demonstração de prejuízos decorrentes diretamente da não utilização do bem, sustentando outros que a simples privação do uso, por si só, constitui um dano indemnizável, independentemente da utilização que dele se faça, ou não, durante o período da privação. Nos presentes autos, e tendo em conta as circunstâncias, a obrigação de indemnizar pressupõe a existência de um dano real, concreto, efetivo – artigos 563.º e 564.º, n.º 2, do Código Civil - pelo que não basta demonstrar-se a simples privação, é necessário, ainda, que o lesado alegue e prove que a privação da coisa lhe acarretou prejuízo, ou seja, que seria por ele utilizada durante o período da privação (cfr. neste sentido o Ac. do STJ de 3/5/2011, processo n.º 2618/08.06TBOVR.P1, in www.dgsi.pt/jstj). Assim, competia ao Demandante, nos termos do n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil provar o prejuízo que teria pela impossibilidade de uso do seu bem durante esse período, prejuízo que, a ser provado, a Demandada tinha a obrigação de ressarcir. Contudo, o Demandante não o logrou provar, já que não foi apresentada qualquer prova nesse sentido, pelo que o peticionado neste âmbito terá de ser julgado improcedente. * Pede o Demandante a condenação da Demandada no pagamento de indemnização no montante de € 1.000,00 (mil euros) a título de danos morais sofridos em consequência do acidente de viação referenciados nos autos. Quanto aos danos não patrimoniais prescrevem os artigos 483.º e 496.º, do CC, que os mesmos, considerando a sua gravidade, merecem a tutela do direito. Estes danos – não patrimoniais, ou morais – são "prejuízos (como as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio, de reputação, de descanso, os complexos de ordem estética) que, sendo insuscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização" (A. Varela, Das Obrigações, pág. 623). De harmonia com o disposto no n.º 1 do artigo 496.°, do CC, "na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito", acrescentando o seu n.º 3 que "O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494.° (…)" ou seja, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado, aos padrões da indemnização geralmente adaptados na jurisprudência, às flutuações do valor da moeda, etc. De onde resulta que, no caso dos danos não patrimoniais, a indemnização reveste uma natureza acentuadamente mista: "por um lado, visa reparar, de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada, por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente " (A. Varela, ob. cit., pág. 630). Assim, o montante da indemnização deve ser proporcionado à gravidade do dano, calculado segundo critérios de equidade e tendo em conta as circunstâncias concretas do caso. Refere-se o Demandante a danos morais, os quais, sendo insuscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem-estar, a liberdade, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização, e que, de harmonia com o disposto do artigo 496.º, n.º 1 do CC, "na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito". Porém, prescreve o artigo 5.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que “Às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas”. O Demandante não identificou nem alegou factos concretos que permitissem a este Tribunal concluir pela existência de um dano moral do Demandante. Tendo em consideração os factos supra alegados, é nosso entendimento que os danos morais invocados pelo Demandante “não assumem suficiente gravidade que devam merecer a tutela do Direito”, pelo que o peticionado a este título terá necessariamente de improceder. VII - DECISÃO Nos termos e com os fundamentos invocados, julgo a presente ação parcialmente procedente por provada, e em consequência, condeno a Demandada a pagar ao Demandante, a importância de € 1.839,19 (mil oitocentos e trinta e nove euros e dezanove cêntimos), absolvendo-a do restante montante peticionado. VIII – RESPONSABILIDADE POR CUSTAS As custas serão suportadas pelo Demandante e pela Demandada, na proporção de 18% e 82% respetivamente (Artigos 527.º, 607.º, n.º 6 do Código de Processo Civil - aplicáveis ex vi artigo 63.º da Lei 78/2001, de 13 de julho, na sua atual redação - e artigo 2.º da Portaria n.º 342/2019, de 1 de outubro), devendo o Demandante efetuar o pagamento de € 57,40 (cinquenta e sete euros e quarenta cêntimos) e a Demandada efetuar o pagamento de € 12,60 (doze euros e sessenta cêntimos) num dos três dias úteis subsequentes ao conhecimento da presente decisão, incorrendo cada uma das partes numa sobretaxa de € 10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no cumprimento dessa obrigação, até um máximo de € 140,00 (cfr. Portaria 342/2019, de 1 de outubro). O prazo legal para proceder ao pagamento das custas é o mencionado na presente decisão, isto é, três dias úteis, pelo que, o prazo que vai indicado no Documento Único de Cobrança (DUC) é um prazo de validade desse documento, que permite o pagamento das custas fora do prazo legal. Assim, o facto de o pagamento ser efetuado com atraso não isenta o responsável do pagamento da sobretaxa, nos termos aplicáveis. Transitada em julgado a presente decisão sem que se mostre efetuado o pagamento das custas, emita-se a respetiva certidão para efeitos de execução por falta de pagamento de custas, e remeta-se aos Serviços da Autoridade Tributária, pelo valor das custas em dívida, acrescidas da respetiva sobretaxa, com o limite máximo previsto no art.º 3.º da citada Portaria. Registe e notifique e após trânsito em julgado, arquive. Funchal, 13 de novembro de 2024. A Juíza de Paz ____________________________ Celina Alveno |