Sentença de Julgado de Paz
Processo: 571/2006-JP
Relator: MARIA DE ASCENÇÃO ARRIAGA
Descritores: ENCARGOS DE CONDOMÍNIO - PARTES COMUNS - TERRAÇOS
Data da sentença: 03/15/2007
Julgado de Paz de : LISBOA
Decisão Texto Integral: SENTENÇA

I- IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES E OBJECTO DO LITÍGIO
(1º) A, (2º) B, (3º) C, (4º) D e (5º) E, como Demandantes, vieram propor, nos termos que resultam do requerimento inicial aperfeiçoado a fls. 86 a 90 aproveitando os documentos antes juntos, contra (1) F, (2) G, (3) H, (4) I, (5) J, (6) K, (7) L, (8) M, (9) N, (10) e O, ora Demandados, todos melhor identificados nos autos, a presente acção, relativa a relações entre condóminos (alínea c) do nº 1 do artigo 9º da Lei 78/2001, de 13.Julho) pedindo a anulação da deliberação da Assembleia de Condóminos que determina que os Demandantes suportem encargos com partes comuns do prédio que não utilizam. Atribuem à acção o valor de € 1.880,19.
Alegam, em síntese, que são proprietários e comproprietários das fracções autónomas correspondentes às duas lojas sitas no prédio e que, no passado dia 12 de Julho de 2006, em Assembleia de Condóminos, a que corresponde a acta nº 50, foi deliberado que as lojas comparticipassem nas despesas de limpeza e conservação do vazado do prédio que serve de cobertura ao telhado das lojas, bem como, o encargo com o exaustor do prédio. O vazado do prédio serve exclusivamente a parte habitacional e o exaustor há muito que tem estado avariado.
Juntam 3 documentos (de fls. 5 a 28 ) e procurações forenses.
Regularmente citados, os Demandados, com excepção do 10º Demandado O, apresentaram, após aperfeiçoamento do requerimento inicial, nova contestação (fls. 136 a 138) aproveitando os documentos antes juntos (fls. 58 a 60). Alegaram, em resumo, que se o Demandantes não utilizam o vazado é porque não querem e que o mesmo constitui, na maioria, o telhado das fracções destes. Quanto ao exaustor, se houver alguma avaria esta será reparada, concluindo pela improcedência da acção
Juntam 3 documentos (de fls. 58 a 60). Protestam juntar procurações e 2 documentos.
Os Demandados recusaram a fase de mediação.
Foi marcada audiência de julgamento que foi adiada por não comparência do administrador do Condomínio, em representação dos condóminos Demandados. Justificada a falta, foi designada nova data e realizada a 1ª sessão de audiência de julgamento, com inquirição de testemunhas e na qual os Demandados juntaram aos autos os documentos de fls. 217 a 219, tendo os Demandantes sido notificados para juntarem aos autos certidão predial do imóvel da qual constasse o registo da constituição da propriedade horizontal, como tudo decorre da respectiva acta. A sessão foi interrompida para continuar, após junção do documento, com leitura de sentença, tendo sido designada a presente data.

Cumpre apreciar e decidir.

O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do território e do valor. Verificam-se os pressupostos processuais de regularidade e validade da instância, inexistindo questões prévias ou nulidades que obstem ao conhecimento do mérito da causa ou invalidem totalmente o processo.


II – FUNDAMENTAÇÃO
Em face da prova produzida, incluindo a documentação junta que se enuncia e, salvo expressa ressalva, dá por reproduzida, consideram-se provados os seguintes factos com interesse para a decisão da causa:
1. Os 1º, 2º, 3ª e 4º Demandantes são proprietários da fracção designada pela letra “IH”, correspondente à loja nº1 do rés-do-chão do prédio sito em Lisboa, descrito na 5ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº x (cfr. certidão de fls. 221 a 245);
2. O 5º Demandante é proprietário da fracção designada pela letra “II”, correspondente à loja nº2 do rés-do-chão do prédio sito em Lisboa, descrito na 5ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o nº x;
3. Os Demandantes foram convocados através da convocatória de fls. 5 dos autos para uma Assembleia de Condóminos, a realizar em 24 de Julho de 2006, pelas 21.00h, da qual consta a Ordem de Trabalhos cujos pontos 2 e 3 têm o seguinte teor :
“2 – Apresentação da análise da proposta apresentada pelas lojas do condomínio;
3- Eventual alteração da contribuição das lojas para as despesas do condomínio (ter em atenção os artigos 1424º e 1432º do Código Civil)”;
4. Em anexo à convocatória foi remetida aos Demandantes a documentação de fls. 6 a 10 dos autos, correspondente a mapas - com cálculos percentuais de utilização de partes comuns, tempos dispendidos na limpeza de cada espaço, custas respectivas, entre outros - e a um texto escrito intitulado “análise da proposta apresentada pelas lojas do condomínio”;
5. Na Assembleia de Condóminos de 24 de Julho de 2006, foi deliberado, relativamente ao 2º ponto da Ordem de Trabalhos “ A apresentação(da documentação referida no número anterior) foi efectuada detalhadamente, cálculo por cálculo, tendo sido aprovada por unanimidade” e
6. Quanto ao 3º ponto da Ordem de Trabalhos, “ … decidiu a Assembleia de Condóminos, por unanimidade, alterar, a partir do próximo dia 1 de Agosto, o valor a pagar pelos condóminos das lojas para 65,68% ( sessenta e cinco por cento vírgula sessenta e oito décimas) vezes o valor correspondente ao que resultaria para as respectivas permilagens…” ;
7. Os Demandantes não compareceram à Assembleia de Condóminos e receberam, depois, cópia da respectiva acta;
8. Os Demandantes haviam apresentado, na Assembleia de Condóminos realizada em 2 de Fevereiro de 2006, a proposta de fls. 27 na qual, em resumo, propunham que a comparticipação das lojas nas despesas de condomínio, incluindo as de conservação, fosse reduzida para 30% da respectiva permilagem e, também, excluídas de comparticipação nas despesas dos elevadores e condutas do lixo;
9. No cálculo da percentagem a atribuir aos Demandantes foi incluído o vazado do edifício, o qual serve de cobertura ao telhado das lojas, entendendo-se que estes condóminos, Demandantes, devem suportar o encargo com a respectiva limpeza e conservação;
10. As lojas não usam o vazado do prédio;
11. O exaustor do prédio, em cujas despesas os Demandantes comparticipam, está avariado;
12. O vazado do prédio é susceptível de utilização por qualquer condómino que possua a chave da porta que dá acesso ao interior do edifício;
13. Os contentores do lixo da parte habitacional do prédio encontram-se no vazado;
14. A Administração do Condomínio ainda não conseguiu apurar a avaria do exaustor.
Para considerar provados os factos juntos aos autos o tribunal fundou a sua convicção na análise que efectuou do teor dos documentos juntos aos autos, incluindo as fotografias que permitem localizar as lojas e o vazado em causa no contexto do edifício (fls. 58 a 60 e 216 a 218); em face das declarações das partes e, também, do depoimento das duas testemunhas. Apesar da primeira testemunha, P, ser filha de um dos proprietários da loja, afigurou-se que ambas as pessoas inquiridas responderam com verdade à matéria a que foram ouvidas.
Está em causa nos autos saber se os Demandantes devem, ou não, comparticipar nas despesas de limpeza e manutenção do vazado do prédio, pois que, relativamente à questão do exaustor, não tendo sido formulado qualquer pedido nada há a decidir.
O nº 1 do art.º 1424º do Código Civil, dispõe que " Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento dos serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções."
Contudo, tais despesas podem ser suportadas em partes iguais ou em proporção da respectiva fruição desde que assim se disponha no regulamento de condomínio aprovado nos termos legais (nº 2 do artigo citado). Para além disso, as despesas com as partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente alguns condóminos ficam a cargo dos que delas se servem ( nº 3 do mesmo preceito).
Sendo inequívoco que a zona em causa é comum ( artº 1421º, nº1 alínea c) do Código Civil) e não tendo sido invocado qualquer normativo do regulamento de condomínio, importa saber se estamos perante uma zona afecta ao uso exclusivo de alguns condóminos, concretamente, aos condóminos da parte habitacional.
Olhando para a factualidade assente temos que o vazado do prédio, corresponde, no essencial, a um terraço, erguendo-se a partir dele a área habitacional do prédio e situando-se, por baixo dele, as lojas dos Demandantes. O vazado é a cobertura, o telhado, das lojas.
A utilização que os condóminos habitacionais fazem do vazado é, apenas, a de nele colocarem os contentores do lixo, os quais não são utilizados pelas lojas embora o possam ser.
O acesso ao vazado só pode ser efectuado pelo interior do edifício, o que significa que é necessário entrar pela porta do prédio que serve a zona habitacional. Depois, dentro do edifício, o vazado é acedido através de uma porta situada nas escadas. O vazado não permite o acesso a qualquer fracção, efectuando-se o acesso às habitações pelas escadas ou elevadores.
Retira-se da certidão predial junta aos autos que a utilização do vazado não está afecta a qualquer fracção.
Perante o exposto não podemos concluir que o vazado é de utilização exclusiva dos condóminos da parte habitacional. Efectivamente, o vazado existe mas não é utilizado por ninguém, podendo sê-lo por todos. A única utilização que se apurou ser retirada do mesmo é, como se disse, a colocação dos contentores do lixo da parte habitacional do prédio o que é insuficiente para se concluir pela afectação ao uso exclusivo destes. Mas, mais importante, é que o terraço constitui a cobertura das lojas, o seu “telhado”, e estas beneficiam em larga medida da limpeza e asseio daquele, designadamente, dos ralos de escoamento de águas pluviais que, a acumularem-se, são susceptíveis de prejudicar as fracções dos Demandantes. O mesmo é dizer que o vazado é “utilizado”, quase exclusivamente, como cobertura das lojas. Note-se, ainda, que conforme decorre dos mapas e “relatório de análise” juntos aos autos e que sustentaram a deliberação em causa, o Condomínio calculou e deduziu à contribuição dos Demandantes, o valor da limpeza dos contentores.
E assim sendo, concluímos que a deliberação em causa não apresenta desconformidade com a lei nem qualquer ilegalidade que pudesse conduzir à declaração da sua nulidade ou à sua anulação pelo que não podem os Demandantes escusar-se, legitimamente, ao pagamento das despesas inerentes à limpeza do vazado, na medida da sua permilagem.

III – DECISÃO
Perante a fundamentação que antecede, incluindo as normas legais citadas, é a presente acção julgada improcedente não se anulando, em consequência, a deliberação que vem impugnada atenta a sua validade.
Declaro vencida, sendo responsável pelas custas do processo, a parte Demandante.
Custas do processo: €70,00.
Os Demandantes deverão efectuar o pagamento das custas de sua responsabilidade (€35,00) num dos três dias úteis subsequentes ao conhecimento da presente decisão, sob pena de incorrerem numa sobretaxa de €10,00 (dez euros) por cada dia de atraso no efectivo cumprimento dessa obrigação, conforme disposto nos números 8º e 10º da Portaria 1456/2001, de 28.12. Decorridos dez dias sobre o termo do prazo supra referido sem que se mostre efectuado o pagamento, será requerida a execução por custas aos Serviços do Ministério Púbico junto dos Juízos Cíveis de Lisboa, pelo valor então em dívida, que será de € 135,00 (cento e trinta e cinco euros).
Registe e notifique.
Julgado de Paz de Lisboa, 15 de Março de 2007
(Texto elaborado e revisto pela própria por meios informáticos)
A Juíza de Paz
Maria de Ascensão Arriaga