Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 89/2023–JPVFR |
Relator: | MARTA M. G. MESQUITA GUIMARÃES |
Descritores: | INDEMNIZAÇÃO PELO DANO PATRIMONIAL DA REPARAÇÃO DA SUA VIATURA SOFRIDO EM VIRTUDE DO ACIDENTE DE VIAÇÃO |
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Data da sentença: | 01/10/2024 |
Julgado de Paz de : | SANTA MARIA DA FEIRA |
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Decisão Texto Integral: | SENTENÇA Proc. n.º 89/2023 – JPVFR IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES Demandante: [PES-1], NIF [NIF-1], residente na [...], n.º 39, [Cód. Postal-1] [...], [...] Demandadas: [ORG-1] S.A., NIPC [NIPC-1], com sede na [...], n.º 242, [Cód. Postal-2] [...] (doravante designada 1.ª Demandada) e [ORG-2] – Companhia de Seguros S.A., NIPC [NIPC-2], com sede na [...], n.º 2, [Cód. Postal-3] [...] (doravante designada 2.ª Demandada) * OBJECTO DO LITÍGIOO Demandante intentou contra as Demandadas a presente acção enquadrável na alínea h) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei nº 78/2001 de 13 de Julho, peticionando a condenação destas i. no pagamento da quantia de € 4.756,28, IVA incluído, a título de indemnização pelo dano patrimonial da reparação da sua viatura, sofrido em virtude do acidente de viação, ii. no pagamento da quantia de € 20,00/dia, vezes 137 dias, o que totaliza o valor de € 2.740,00, a título de dano da privação do uso da viatura, iii. no pagamento da quantia de € 660,00, a título de despesas com transportes por estar privado da utilização da sua viatura, iv. no pagamento da quantia de € 750,00 + IVA, a título de honorários com a mandatária que patrocina a acção, v. no pagamento da quantia de € 35,00, a título de taxa de justiça da presente acção, vi. no pagamento de uma compensação de € 500,00, pelos transtornos e incómodos que sofreu por causa do acidente, e vii. no pagamento de juros de mora vincendos, à taxa legal, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento. Alegou, em suma, que no dia 06.07.2022, pelas 20.00 h, na [...], frente ao n.º 282, em [...], concelho de Santa Maria da Feira, ocorreu um acidente de viação, tendo sido intervenientes o seu veículo automóvel, de matrícula [ - - 1], conduzido pelo seu filho, [PES-2], seguro na 2.ª Demandada, o veículo automóvel de matrícula [ - - 2], propriedade e conduzido por [PES-3], seguro na 1.ª Demandada, e o veículo automóvel de matrícula [ - - 3]; o acidente deveu-se, em exclusivo, à conduta do condutor do veículo seguro na 1.ª Demandada, que, ao sair do estacionamento, em contramão, ocupou a faixa de rodagem contrária, na qual circulava o seu veículo, tendo embatido, em primeiro lugar, neste veículo e, num segundo momento, no veículo de matrícula [ - - 3]; em consequência do acidente, o seu veículo ficou imobilizado, tendo sofrido danos, que melhor elenca; participou à sua seguradora, a 2.ª Demandada, assim como o condutor do veículo de matrícula [ - - 2] participou à 1.ª Demandada; a 1.ª Demandada ordenou uma peritagem ao seu veículo, tendo o valor da reparação ascendido a € 7.088,33; posteriormente, o Demandante conseguiu um orçamento com valor de reparação mais baixo, portanto, € 4.756,28 (IVA incluído); em 22.07.2022, a 1.ª Demandada informou que considerava a perda total da viatura, pretendendo indemnizar pelo valor de € 2.980,00, condicionalmente; a 2.ª Demandada não formulou proposta de indemnização por considerar que o acidente se deveu, em exclusivo, ao condutor do veículo seguro na 1.ª Demandada; entretanto, a 1.ª Demandada considerou repartir a responsabilidade pelo acidente na proporção de 75% para o seu segurado e 25% para o condutor do veículo do Demandante, pelo que, pretendia indemnizar o Demandante no valor de € 2.142,20, o que o Demandante não aceitou; pretende ser ressarcido do valor necessário à reparação do veículo, que computa em € 4.756,28, dos danos da privação do uso do veículo no valor de € 2.740,00 (137 dias, desde o acidente até 15.11.2022, data em que a sua viatura ficou completamente reparada), das despesas que teve em transportes, no valor de € 660,00, do valor de € 750,00, acrescido de IVA, a título de honorários com mandatária, do valor de € 35,00, a título de taxa de justiça e do valor de € 500,00, a título de incómodos, cansaço e transtorno – cfr. fls. 1 e seguintes dos autos. * A 2.ª Demandada apresentou contestação, nos termos plasmados a fls. 34 e seguintes, tendo invocado a sua ilegitimidade, impugnado parte da factualidade alegada pelo Demandante, defendido que não é devido o pagamento de honorários de mandatário, nem de custas processuais, nem de compensação a título de danos morais; pugnou, a final, pela procedência da excepção invocada, com a sua absolvição da instância e, subsidiariamente, pela improcedência da acção.A 1.ª Demandada também apresentou contestação, nos termos plasmados a fls. 44 e seguintes, tendo impugnado parte da factualidade alegada pelo Demandante, alegado que este não demonstrou ser proprietário do veículo em causa – o que considera ser matéria de excepção –, que o sinistro em causa se deu por culpa exclusiva do condutor do veículo do Demandante, que, por circular a uma velocidade superior à permitida para o local (superior a 50 km/h), não conseguiu evitar o embate com o veículo por si seguro, na medida em que, ao necessitar de contornar veículos que se encontravam estacionados à sua direita, invadiu, parcialmente, a via de trânsito contrária ao seu sentido de marcha e pela qual circulava o veículo por si seguro; o veículo do Demandante ficou numa situação de perda total, pelo que, a ser reconhecida a responsabilidade exclusiva do condutor do veículo por si seguro, a indemnização devida ao Demandante, com vista à reparação do veículo, sempre seria de € 2.980,00; o Demandante não pode ser indemnizado, duplamente, a título de privação do uso do veículo, como pretende; os honorários a título de mandatário e a compensação por danos morais também não são devidos; pugnou, a final, pela procedência da excepção que alega ter invocado, com a sua absolvição do pedido e, subsidiariamente, pela improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido, com as demais consequências legais. Por despacho de fls. 76/77, e pelos motivos que daí constam e que ora se dão por integralmente reproduzidos, julgou-se verificada a invocada excepção de ilegitimidade passiva (após exercício do direito de contraditório pelo Demandante – cfr. despacho de fls. 67 e requerimento de fls. 70 e seguintes), pelo que, e em consequência, a 2.ª Demandada foi absolvida da instância. Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, com observância do legal formalismo consoante resulta das respectivas actas (cfr. fls. 121/122, 156/157 e 164/165). * O Julgado de Paz é competente em razão da matéria (cfr. artigo 9.º, n.º 1, alínea h) da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho), do território (cfr. artigo 12.º, n.º 2, da indicada Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho) e do valor que se fixa em € 9.578,58 (cfr. artigos 297.º, n.º 1, e 306.º, nºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil, doravante CPC, aplicáveis por via do disposto no artigo 63.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho ). Demandante e 1.ª Demandada gozam de personalidade e de capacidade judiciárias e são partes legítimas (cfr., ainda, e no que à legitimidade se reporta, o aludido despacho de fls. 76/77). * FACTOS PROVADOS COM RELEVÂNCIA PARA A DECISÃO DA CAUSAA. O Demandante é proprietário do veículo automóvel de matrícula [ - - 1], marca “Fiat”, modelo [Modelo-1], ligeiro de mercadorias, desde, pelo menos, 17.07.2017. B. Em 06.07.2022, cerca das 20.00 h, na [...], frente ao n.º 282, em [...], concelho de Santa Maria da Feira, ocorreu um acidente de viação, no qual foram intervenientes o veículo aludido no precedente facto, conduzido por [PES-2], o veículo de matrícula [ - - 2], marca “Seat”, modelo “[...]”, conduzido por [PES-4], e seguro na 1.ª Demandada, por via da apólice n.º [Nº Identificador-1], e o veículo de matrícula [ - - 3]. C. Estava bom tempo. D. O veículo aludido em A circulava na [...], no sentido norte/sul, atento o seu sentido de marcha, a velocidade superior a 50km/h. E. O veículo de matrícula [ - - 2] encontrava-se estacionado na [...], na berma da faixa de rodagem por onde circulava o veículo aludido em A, mas em contramão, portanto, estacionado no sentido sul/norte, tendo outra viatura estacionada à sua frente. F. O condutor do veículo de matrícula [- - 2], ao sair do estacionamento, fê-lo em contramão, ocupando a faixa de rodagem onde seguia a viatura aludida em A. G. O veículo de matrícula [ - - 2] embateu, primeiramente, com a sua lateral esquerda, na frente do lado esquerdo do veículo aludido em A, e, num segundo momento, na viatura de matrícula [ - - 3], que se encontrava estacionada em local devidamente sinalizado para o efeito existente na outra faixa de rodagem. H. O veículo de matrícula [- - 2] ficou imobilizado na faixa de rodagem contrária, e no sentido contrário ao que circulava a viatura aludida em A. I. Em resultado do acidente, o veículo aludido em A apresentou diversos danos na frente lateral esquerda e do lado esquerdo. J. À data do acidente suprarreferido, o veículo aludido em A encontrava-se seguro na 2.ª Demandada, tendo o Demandante lhe participado o acidente. K. A 1.ª Demandada abriu um processo, com o n.º [Nº Identificador-2] relativo ao acidente supra descrito, e ordenou uma peritagem ao veículo aludido em A, na oficina “[PES-5]”, tendo concluído que o valor de reparação ascendia a € 7.088,33, com IVA incluído. L. O Demandante conseguiu um outro orçamento para a reparação da viatura, na mesma oficina, no valor de € 4.756,28, com IVA incluído. M. Em 22.07.2022, a 1.ª Demandada considerou a perda total da viatura, propondo indemnização, condicional, ao Demandante, pelo valor de € 2.980,00. N. Por comunicação de 08.08.2022, a 1.ª Demandada informou o Demandante de que havia concluído que a forma de resolução mais adequada seria através de uma repartição de responsabilidade, na proporção de 75% - 25% favorável ao Demandante, por infração do disposto no n.º 1 do artigo 24.º do Código da Estrada no que se reporta ao veículo aludido em A e do n.º 1 do artigo 12.º do mesmo diploma legal no que se reporta ao veículo por si seguro, pelo que colocou à disposição do Demandante a importância de € 2.142,50, correspondente a 75% do valor da perda total da viatura (€ 3.350,00 * 75% = e 2.512,50 – salvado € 370,00 = € 2.142,50). O. Por comunicação de 27.09.2022, a 2.ª Demandada informou o Demandante de que havia concluído que a responsabilidade pertencia ao condutor do veículo de matrícula [- - 2], por infração do disposto no n.º 1 do artigo 12.º, 13.º e n.º 2 do artigo 14.º, todos do Código da Estrada, pelo que declinou a responsabilidade no acidente. P. À data do acidente, o veículo aludido em A apresentava 163.574 km. Q. O veículo aludido em A era utilizado, maioritariamente, pelo filho do Demandante, nas suas deslocações diárias, de trabalho e de lazer. R. A Viatura aludida em A foi reparada e entregue, ao Demandante, em 15.11.2022. S. Desde o acidente até 15.11.2022, o Demandante esteve privado de utilizar a sua viatura. T. Durante esse período, o filho do Demandante teve que se socorrer de serviços de táxi, tendo o Demandante pago, a tal título, o valor de € 660,00. * FACTOS NÃO PROVADOS COM RELEVÂNCIA PARA A DECISÃO DA CAUSA1. O condutor do veículo aludido em A seguia em velocidade moderada. 2. O veículo seguro na 1.ª Demandada circulava na [...], no sentido sul/norte. 3. Ao surgirem veículos estacionados do lado direito da via de trânsito em que circulava o veículo aludido em A, o condutor deste tentou contorná-los, invadindo, ainda que parcialmente, a via de trânsito em que circulava o veículo seguro na 1.ª Demandada. 4. Avistando o veículo seguro na 1.ª Demandada, o condutor do veículo aludido em A travou a fundo e tentou retomar a sua via de trânsito, mas não conseguiu imobilizar o veículo na distância livre e disponível à sua frente. 5. O ponto de embate dos veículos ocorreu na via de trânsito em que circulava o veículo seguro na 1.ª Demandada. 6. Antes do acidente, o veículo aludido em A encontrava-se em perfeito estado de conservação e com todas as inspeções e revisões efetuadas. 7. Atento o estado de conservação do veículo aludido em A, o seu valor venal, antes do acidente, era de € 3.350,00. 8. O Demandante poderia adquirir, no mercado, outro veículo que igualmente satisfizesse as suas necessidades e de características semelhantes ao veículo aludido em A, pelo valor de € 3.350,00. * FUNDAMENTAÇÃO FÁTICANos termos do disposto no artigo 60.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, as sentenças proferidas pelos Julgados de Paz devem conter “uma sucinta fundamentação”. Isto posto, cumpre referir que ao pronunciar-se pela forma acabada de enunciar quanto à matéria de facto em causa nos autos, o Tribunal firmou a sua convicção na análise crítica e conjugada que dos meios de prova fez. Assim, o facto A resultou provado por via do documento constante de fls. 105 (certificado de matrícula), junto pelo Demandante. O facto B resultou provado por admissão, em parte (no que se reporta à existência do contrato de seguro), conjugada com a participação de acidente junta, pelo Demandante, e constante de fls. 140 e seguintes, com as fotografias juntas, com o requerimento inicial, sob os documentos nºs 8 a 12 e, ainda, com o depoimento das testemunhas [PES-2], filho do Demandante e condutor do seu veículo interveniente no acidente, [PES-4], condutor do veículo seguro na 1.ª Demandada, e [PES-6], que, aquando do acidente, conduzia um veículo (“Mini”) que seguia à frente do veículo propriedade do Demandante. O facto C por via do depoimento das referidas testemunhas [PES-7] e [PES-8]. O facto D por via da aludida participação de acidente (em concreto, croqui, no qual se encontram, além do mais, assinalados os rastos de travagem do veículo propriedade do Demandante), conjugada com o documento n.º 1 junto com a contestação apresentada pela 1.ª Demandada (fotografia na qual são, igualmente, visíveis os rastos de travagem), com o depoimento da testemunha [PES-7], que afirmou, categoricamente, que, “no máximo dos máximos, seguia a 60 km/h”, com o depoimento da testemunha [PES-8], que disse que circulava à frente do “Fiat” (propriedade do Demandante), a cerca de 60 km/h, encontrando-se, o “Fiat”, a cerca de “meio carro”, “um carro” de distância do seu veículo. Acresce que – e como se não bastasse o depoimento da testemunha [PES-7] –, sempre o facto de os dois airbags do “Fiat” terem disparado (como é passível de ser visualizado nas fotografias do veículo juntas com o requerimento inicial) é demonstrativo de que o “Fiat” seguia acima dos 50 km/h. Estas testemunhas prestaram depoimentos espontâneos, pelo que, tal espontaneidade, aliada à sua razão de ciência (um deles condutor, interveniente no acidente, e o outro condutor de outro veículo que seguia na frente deste último), determinaram a credibilidade de tais depoimentos. O facto E por via do croqui da participação de acidente, conjugada com os depoimentos das referidas testemunhas [PES-7] e [PES-8], que foram unânimes em descrever onde se encontrava o veículo seguro na 1.ª Demandada, tendo, ambos, referido que, o veículo seguro na 1.ª Demandada se encontrava estacionado em contramão, na faixa de rodagem por onde circulava o veículo propriedade do Demandante, e que se encontrava estacionado de frente para um veículo de marca “Audi”, de cor preta. O facto F por via das já referidas fotografias dos veículos juntas aos autos, com o requerimento inicial, numa das quais é possível visualizar a zona dos danos no veículo seguro na 1.ª Demandada, portanto, no meio da lateral esquerda (cfr., em concreto, documento n.º 10 junto com o requerimento inicial), conjugado com o depoimento das testemunhas [PES-7] e [PES-8]. Acresce que, a testemunha [PES-3], o condutor do veículo seguro na 1.ª Demandada prestou um depoimento vago e hesitante, tendo dito, que se encontrava estacionado num local que não soube identificar – tendo, num primeiro momento, referido que era para motas, e depois, já disse que não sabia se era para motas ou não –, não sabendo identificar o sentido de marcha em que estava estacionado, tendo, ainda, e contudo, referido que o acidente se deu após sair do estacionamento, pois a declaração que prestou à autoridade policial e que consta da participação de acidente, no sentido de que se encontrava a circular na faixa de rodagem contrária à que seguia a viatura do Demandante, não era correta. Os factos G e H resultaram provados por via da participação de acidente – designadamente, croqui, no qual é assinalado o local do embate, indicado, à força policial, por ambos os condutores dos veículos “Fiat” e “Seat”, bem como o local de embate do “Seat” no outro veículo, o terceiro veículo interveniente no acidente (de matrícula [ - - 3]), e declarações, que daí constam, do proprietário deste último veículo –, conjugada com as já referidas fotografias juntas com o requerimento inicial, bem como com as imagens do local que constam de fls. 142 verso. O facto I por via das aludidas fotografias, conjugadas com o documento n.º 2 junto com a contestação apresentada pela 1.ª Demandada (“Boletim de Perda Total” e “Estimativa de Peritagem”). O facto J por admissão, conjugada com o documento n.º 4 junto com o requerimento inicial (comunicação da 2.ª Demandada, dirigida ao Demandante, a declinar o pagamento da indemnização). O facto K por admissão, conjugada com o documento n.º 1 junto com o requerimento inicial (“Estimativa de Peritagem”) e com o aludido documento n.º 2 junto com a contestação. O facto L por via do documento n.º 2 junto com o requerimento inicial (orçamento), conjugado com o depoimento da testemunha [PES-5] (responsável pela reparação do veículo “Fiat”), que confirmou esse orçamento. O facto M por via de admissão, conjugada com o documento n.º 3 junto com o requerimento inicial (comunicação). Os factos N, O e P por via dos documentos nºs 5 (comunicação), 4 (comunicação) e 1 (“Estimativa de Peritagem”), respetivamente, todos juntos com o requerimento inicial. O facto Q por via das declarações de parte prestadas pelo Demandante, conjugadas com o depoimento da testemunha [PES-7], tendo ambos afirmado que a viatura era usada, maioritariamente, por esta testemunha, em deslocações para o trabalho e em lazer. O facto R por via das declarações de parte prestadas pelo Demandante, conjugadas com o depoimento da referida testemunha [PES-9], que afirmou ter procedido à reparação do veículo. O facto S por presunção (cfr. artigos 349.º e 351.º do Código Civil, doravante CC): com efeito, se, em consequência do acidente, o veículo ficou impossibilitado de circular, conforme consta da “Estimativa de Peritagem”, da autoria da 1.ª Demandada, e junta como documento n.º 1 com o requerimento inicial, e o veículo apenas foi entregue ao Demandante, reparado, em 15.11.2022, o Demandante esteve privado do seu uso durante esse período. O facto T por via dos documentos nºs 14 e 15 juntos com o requerimento inicial (facturas-recibo de serviços de táxi), conjugados com as declarações de parte do Demandante e com o depoimento do seu filho, [PES-7]. Os factos não provados resultaram de ausência e/ou insuficiência de prova no sentido da sua demonstração. Concretizando: No que se reporta aos factos 1 a 5, tal factualidade só poderia resultar não provada em face dos factos provados D a H. Quanto ao facto 3, é certo que a testemunha [PES-7] afirmou que teve que se desviar de veículos estacionados do seu lado direito – o que determinou que tivesse que invadir a faixa de rodagem contrária, o que é corroborado pelas marcas de travagem constantes do documento n.º 1 junto com a contestação apresentada pela 1.ª Demandada –, mas o veículo “[ORG-3]” não se encontrava a circular quando o veículo “Fiat” se encontrava a realizar tal manobra de ultrapassagem dos veículos que se encontravam à sua direita. E, relativamente ao facto 4, a testemunha [PES-7] não conseguiu imobilizar o veículo, porque, desde logo, o veículo “[ORG-3]” atravessou-se à sua frente, após sair do estacionamento em contramão, conforme resultou provado – e não porque este seguia em andamento na faixa de rodagem contrária. Quanto ao facto 6, é certo que o Demandante, nas suas declarações de parte, referiu que o veículo se encontrava com as inspeções em dia e a circular na perfeição e a testemunha [PES-10] (mecânico do Demandante, há mais de 20 anos) também referiu que o veículo se encontrava bem estimado e em bom estado de conservação, porém, cremos que tal prova, por si só – isto é, desacompanhada, designadamente, de documentação comprovativa das alegadas inspeções e revisões – não é suficiente para dar como provada a factualidade em causa. Relativamente aos factos 7 e 8, para prova de tal factualidade, a 1.ª Demandada juntou aos autos, com a sua contestação, como documento n.º 3, anúncios de venda de veículos automóveis, que, não obstante serem da marca e modelo do veículo do Demandante, continham muitos mais kms do que os que o veículo do Demandante possuía (329.895 kms num caso, sendo publicitado o preço de venda de € 3.700,00, e 252.000 kms noutro, sendo publicitado o preço de venda de € 2.950,00, quando o veículo do Demandante possuía, à data do acidente, 163.574 kms, conforme resultou provado), pelo que, consideramos não ter sido feita prova da factualidade em causa. * DIREITOVisa o Demandante, com a presente acção, a condenação das Demandadas no pagamento de uma indemnização, por entender que o acidente em causa nos autos se ficou a dever a culpa exclusiva do condutor do veículo de matrícula [ - - 2], veículo, este, seguro na 1.ª Demandada. Da Responsabilidade dos intervenientes no alegado acidente: O artigo 483.º do CC determina que aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. Para que se conclua pela existência de responsabilidade civil por factos ilícitos é, então, necessário um comportamento humano dominável pela vontade; ilicitude, ou seja, a violação de direitos subjetivos absolutos ou normas que visem tutelar interesses privados; um nexo causal que una o facto ao lesante – a culpa (o juízo de censura ou reprovação que o direito faz ao lesante por este ter agido ilicitamente, quando podia e devia ter agido de outra forma) e outro que ligue o facto ao dano, de acordo com as regras normais de causalidade. Pode revestir duas formas: o dolo e a negligência ou mera culpa. Acresce que, nos termos do disposto no artigo 342.º, n.º 1, do CC, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado. Resultou provado, desde logo, que o condutor do veículo propriedade do Demandante seguia, na [...], no sentido norte/sul, a uma velocidade superior a 50 km/h – quando é sabido que, dentro das localidades, como era o caso, a velocidade máxima é de 50 km/h (cfr. artigos 1.º, alínea j) e 27.º, n.º 1, do Código da Estrada); mais resultou provado que o veículo de matrícula [ - - 2], seguro na 1.ª Demandada, encontrava-se estacionado na mesma [...], na berma da faixa de rodagem por onde circulava o veículo do Demandante, mas em contramão, portanto, estacionado no sentido sul/norte, e que, o seu condutor, ao sair do estacionamento, fê-lo em contramão, ocupando a faixa de rodagem onde seguia a viatura do Demandante, tendo embatido, primeiramente, com a sua lateral esquerda, na frente do lado esquerdo do veículo do Demandante, e, num segundo momento, numa outra viatura (de matrícula [ - - 3]) que se encontrava estacionada em local devidamente sinalizado para o efeito existente na outra faixa de rodagem. Em face do exposto, o acidente em causa nos autos ficou a dever-se quer à conduta do condutor do veículo propriedade do Demandante, que seguia em excesso de velocidade, quer à conduta do condutor do veículo seguro na 1.ª Demandada, que estacionou em contramão e iniciou a sua marcha invadindo a faixa de rodagem por onde seguia o veículo propriedade do Demandante, pelo que, o condutor do veículo propriedade do Demandante violou o disposto no artigo 24.º, n.º 1, do Código da Estrada, e o condutor do veículo seguro na 1.ª Demandada violou o disposto nos artigos 12.º, n.º 1, e 13.º, nºs 1 e 2, do Código da Estrada. Quanto à medida da culpa de ambos, considerando que a 1.ª Demandada, em sede extrajudicial, concluiu pela repartição de responsabilidades na proporção de 75% para o seu segurado e 25% para o condutor do veículo do Demandante – repartição, essa, que, em sede de alegações finais, veio, novamente, a aceitar –, entendemos, atenta a decisão da matéria de facto que se deixou exposta, adequada e razoável tal repartição, pelo que concluímos que o condutor do veículo seguro na 1.ª Demandada foi responsável pelo acidente na indicada proporção de 75%, e o condutor do veículo propriedade do Demandante foi responsável pelo acidente na indicada proporção de 25%. Dos Danos: Nos termos do disposto no artigo 562.º do CC, a obrigação de indemnizar visa, desde logo, a reconstituição da situação que existiria na esfera jurídica do lesado, no caso de não se ter verificado o evento que obriga à reparação. São assim, indemnizáveis, os danos de carácter patrimonial (quer os prejuízos emergentes, quer os lucros cessantes, sejam danos presentes ou futuros, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 564.º do CC) e os de carácter não patrimonial (estes apenas no caso de mereceram a tutela do direito, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 496.º do CC). Mais dispõe o artigo 566.º, n.º 1, do CC que a indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor. O Demandante, in casu, peticionou danos patrimoniais, especificamente os danos verificados no veículo, cuja reparação, segundo orçamento que conseguiu, se cifra em € 4.756,28, com IVA incluído, e os danos pela privação do uso do veículo, nos valores de € 2.740,00 (€ 20,00/dia x 137 dias) e de € 660,00 a título de despesas de transporte em que incorreu. Provou-se que, em resultado ao acidente, o veículo propriedade do Demandante sofreu diversos danos, na frente lateral esquerda e do lado esquerdo (cfr. facto provado I). Quanto ao valor necessário para a reparação do veículo: A 1.ª Demandada alegou que é aplicável, no caso, o disposto no artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto , porém, é entendimento da nossa Jurisprudência que o regime previsto nesse artigo “vale apenas para os procedimentos a adoptar pelas empresas de seguros na fixação de prazos com vista à regularização rápida de litígios e do estabelecimento de princípios base na gestão de sinistros com vista à apresentação de uma “proposta razoável”, mas já não na fase judicial, em que regem as regras e princípios gerais da responsabilidade civil e da obrigação de indemnização, podendo quando muito tais normativos considerarem-se como elementos de referência não vinculativos.” Portanto, o que rege é, assim, e em primeiro lugar, o disposto no citado artigo 566.º, n.º 1, do CC. Acresce que, a prova da excessiva onerosidade da reconstituição natural compete à 1.ª Demandada – nos termos do disposto no artigo 342.º, n.º 2, do CC. Atenta a decisão de facto que se deixou exposta, consideramos que a 1.ª Demandada não provou essa mesma excessiva onerosidade, desde logo porque não foi feita prova de que o valor venal do veículo do Demandante, antes do acidente, fosse de € 3.350,00, assim como não foi feita prova de que o Demandante pudesse adquirir, no mercado, outro veículo que satisfizesse as suas necessidades e de características semelhantes ao seu veículo, pelo indicado valor. Caberia à 1.ª Demandada alegar e provar que a reparação do dano com vista à reconstituição natural “lhe acarreta um encargo injustificável ou desajustado. A excessiva onerosidade e por referência ao previsto no artigo 566.º do Código Civil deverá ser aferida conforme tem vindo a ser jurisprudencialmente defendido, no caso concreto entre o interesse do lesado à total reparação do veículo (quando possível, como aconteceu nos autos, porque era o mesmo tecnicamente reparável) e o custo que tal representava. Só perante uma manifesta desproporção entre estes dois interesses se poderá entender justificado o afastamento da obrigação da reconstituição natural ou a reparação total da viatura.” Ora, o veículo do Demandante era tecnicamente reparável, tanto mais que foi reparado, por valor inferior ao valor orçamentado pela 1.ª Demandada (cfr. factos provados L e R), sendo que, no caso, não consideramos que ocorra uma manifesta desproporção entre o interesse do Demandante à reparação da viatura e o custo que tal representa. Realce-se que, e de acordo com o entendimento jurisprudencial que temos vindo a citar, “A indemnização pelo valor da reparação consubstancia uma forma de reconstituição natural a que o autor tem direito e que não é afastada por aquele ter procedido à reparação do veículo sinistrado. O dano existiu e impõe-se a sua reparação mediante a atribuição do valor necessário. Aliás, face à recusa da Ré recorrida em proceder à reparação, a atitude do autor recorrente em proceder à reparação do veículo sua propriedade, com material alternativo, permitindo-lhe um valor mais baixo, mostra-se perfeitamente compreensível e legítima, até para atenuar de outros danos pelos quais a ré recorrida podia ser responsável, nomeadamente ao nível da privação da viatura.”. Em face de todo o exposto, impõe-se a condenação da 1.ª Demandada no pagamento, ao Demandante, do valor de € 3.567,21 – correspondente a 75% do valor da reparação do veículo, portanto, de € 4.756,28. No que se reporta aos danos da privação do uso: Tendo em conta a orientação da Jurisprudência mais recente, o simples uso constitui uma vantagem patrimonial susceptível de avaliação pecuniária. “O lesado, durante o período da imobilização da viatura, ficou privado das utilidades que esta poderia proporcionar-lhe; e isto constitui um prejuízo, uma realidade de reflexos negativos no património do lesado, mesmo se, como é o caso, não se provou em concreto um aumento das despesas em razão da privação do seu uso.” “Mesmo não se tendo provado prejuízos efectivos, é possível determinar com o recurso à equidade, o valor dos danos da paralisação” . O Demandante peticiona, a este título, a quantia de € 2.740,00 (€ 20,00/dia x 137 dias), segundo avaliação que considera “justa e equitativa”, e de € 660,00 a título de despesas de transporte em que incorreu. Ora, o recurso à equidade só opera se, em concreto, não for possível apurar prejuízos efectivos incorridos, pelo lesado, como consequência da paralisação do veículo (cfr. artigo 566.º, n.º 3, do CC), sob pena de o lesado ser duplamente ressarcido do dano adveniente da privação do uso da viatura, o que, face aos mais elementares princípios que regem o nosso sistema jurídico, não é sustentável. Assim, e tendo resultado provado que o Demandante despendeu o valor de € 660,00 em despesas com serviços de táxi durante o período em que esteve privado do uso da sua viatura (cfr. factos provados S e T), impõe-se a condenação da 1.ª Demandada no pagamento, ao Demandante, do valor de € 495,00 – correspondente a 75% do indicado valor de € 660,00. O Demandante peticiona, ainda, a condenação no pagamento da quantia de € 750,00 + IVA, a título de honorários com a mandatária que patrocina a acção e no pagamento da quantia de € 35,00, a título de taxa de justiça da presente acção. Ora, como é entendimento jurisprudencial unânime, os honorários de advogado não se inserem na indemnização devida a título de responsabilidade civil extracontratual, na medida em que não consubstanciam danos direta e necessariamente decorrentes do facto ilícito culposo praticado. Destarte, não é a 1.ª Demandada responsável pelo pagamento da alegada quantia a título de honorários com mandatária. No que à taxa de justiça se reporta, rege o disposto na Portaria n.º 342/2019, de 1 de Outubro, aí se fixando que, por cada processo tramitado nos Julgados de Paz, as partes suportam o pagamento de uma taxa, efetuando-se o seu pagamento nos seguintes termos: a) quando seja alcançado acordo em sede de mediação, o demandante e o demandado efetuam, individualmente, o pagamento de uma taxa de (euro) 25; b) quando o processo prossegue por inexistência ou inutilidade do procedimento de mediação, a parte que o juiz declare vencida suporta o pagamento de uma taxa de (euro) 70, ou, em caso de decaimento parcial do pedido, de parte desse valor, na proporção que o juiz de paz fixar, sendo o remanescente pago pela outra parte (cfr. artigo 2.º, n.º 1). Assim, o Demandante não suportou qualquer valor a título de taxa de justiça, pelo que, nada lhe é devido, pela 1.ª Demandada, a esse título. Quanto ao pedido de condenação no pagamento de uma compensação de € 500,00, pelos transtornos e incómodos que sofreu por causa do acidente, cumpre referir que, nos termos do disposto no artigo 496.º, n.º 1, do CC, na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do Direito. Assim, os danos não patrimoniais só são passíveis de compensação se forem graves. Conforme entendimento da nossa Jurisprudência, “O que releva é que os danos sejam de tal gravidade que mereçam a tutela do direito, sendo irrelevante os incómodos e contrariedades, aborrecimentos, perdas de tempo e mesmo sofrimentos e desgostos que resultam de uma sensibilidade anómala” . Ora, embora o Demandante tenha sofrido transtornos e incómodos – o que, em face da factualidade dada como provada, não se nega –, os mesmos, por não assumirem gravidade, não merecem a tutela do Direito, pelo que não é a 1.ª Demandada responsável pelo pagamento de qualquer valor a título de danos não patrimoniais. Finalmente, o Demandante peticiona a condenação no pagamento de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento. Dispõe o artigo 804.º do CC que a simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor e que o devedor considera-se constituído em mora quando, por causa que lhe seja imputável, a prestação, ainda possível, não foi efectuada no tempo devido. Em face do exposto, vai a 1.ª Demandada condenada no pagamento de juros de mora, à taxa legal em vigor (cfr. Portaria n.º 291/2003, de 8 de Abril), desde a citação (ocorrida em 15.06.2023 – cfr. fls. 69) até efectivo e integral pagamento, sobre o valor global de € 4.062,21 (€ 3.567,21 + € 495,00), nos termos do disposto nos artigos 804.º, 805.º e 806.º do CC, os quais ascendem, na presente data, a € 93,04. * DECISÃOEm face do exposto e das disposições legais aplicáveis, julgo a presente acção parcialmente procedente, e, em consequência: a) Condeno a 1.ª Demandada a pagar, ao Demandante, o valor de € 4.062,21 (quatro mil, sessenta e dois euros e vinte e um cêntimos), acrescido de juros de mora, à taxa legal em vigor, desde a citação até efectivo e integral pagamento, os quais ascendem, na presente data, a € 93,04 (noventa e três euros e quatro cêntimos), e, b) Absolvo a 1.ª Demandada do demais contra ela peticionado. Custas a cargo do Demandante e da 1.ª Demandada, na proporção de 60% e de 40%, respetivamente. Registe e envie cópia da presente sentença aos faltosos. Santa Maria da Feira, 10 de janeiro de 2024 A Juíza de Paz, (Marta M. G. Mesquita Guimarães) Processado por computador (Artigo 18.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho). Revisto pela signatária. Julgado de Paz de Santa Maria da Feira |