Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 932/2011-JP |
Relator: | MARIA JUDITE MATIAS |
Descritores: | ENTREGA DE COISA MÓVEL |
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Data da sentença: | 06/08/2011 |
Julgado de Paz de : | LISBOA |
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Decisão Texto Integral: | Sentença (n.º 1, do art. 26º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho) Matéria: Entrega de coisa móvel (alínea b), do n.º 1, do art. 9º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho) Objecto: devolução dos documentos pertencentes ao condomínio. Valor da Acção: €250,00 (Duzentos e cinquenta euros) Demandante: A Demandado:B Do requerimento inicial: de fls. 1e 2. Em, síntese, alega a Administração do A que no âmbito da apreciação da proposta de prestação de serviços da demandada ao A, foram-lhe entregues os documentos correspondentes ao espólio deste; dado que o contrato não chegou a concretizar-se vem reclamar a devolução dos mesmos, cuja falta prejudica o normal funcionamento do condomínio, inexistindo qualquer motivo ou título para a retenção de tais documentos. Pedido: Pede que a demandada seja condenada a devolver ao condomínio a documentação que lhe foi entregue; e ainda no pagamento de €222,42 (Duzentos e vinte e dois euros e quarenta e dois cêntimos), referentes a honorários pelos serviços jurídicos prestados numa primeira tentativa de resolução desta lide, quantia acrescida de juros legais. Junta: 6 documentos. Contestação: a fls.22 e 23. A demandada apresentou contestação, na qual afirma que enviou à administração do condomínio a sua proposta de prestação de serviços; que a assembleia geral aprovou a sua proposta, o que lhe foi comunicado por correio eletrónico em 22 de Maio de 2009; que em 29 de Junho de 2009, pelas 21h, promoveu a assembleia geral de apresentação, na qual esclareceu todas as questões aí suscitadas; que providenciou a aquisição de um livro de actas com formatação específica para o condomínio em causa; que no dia 01 de Julho de 2009 os condóminos solicitaram os seus serviços para solucionar uma avaria na fechadura, os quais providenciou de imediato, sendo que quando o técnico chegou ao prédio alguns condóminos, de forma inusitada, impediram que este procedesse à reparação; o representante da demandada deslocou-se ao prédio no dia 03 de Julho de 2009, no sentido de esclarecer as razões que a impediam de aceder ao prédio, tendo sido recebido de forma agressiva e convidado a retirar-se do prédio; em Outubro de 2009 um condómino da demandante surgiu nas instalações da demandada a exigir a entrega dos livros; a demandada diz que os livros sempre estiveram à disposição da demandante contra o pagamento das seguintes verbas: a) €60,00 referente à deslocação do técnico para reparação da fechadura; b) €30,00 referente à aquisição do livro de actas; c) €180,00referente à prestação de administração do condomínio de Julho a Setembro de 2009; d) €540,00 referente aos serviços de administração que a demandada tinha como expectativa prestar, tendo-se preparado para proceder em conformidade. Resposta à reconvenção. O demandante respondeu à reconvenção a fls. 37 a 39. Tramitação: A mediação foi recusada pela Demandante. Audiência de Julgamento. Foi marcada audiência de julgamento para o dia 21 de Fevereiro de 2011, pelas 15h e 30m, sendo as partes devidamente notificadas para o efeito. A audiência decorreu conforme acta de fls. 44 e 45. Fundamentação fáctica. Com relevância para a decisão da causa dão-se por provados os seguintes factos: 1- O demandante é o actual administrador do A sito emLisboa, nomeado pela assembleia de condóminos realizada em 01 de Fevereiro de 2010; 2 – A demandada dedica-se à gestão de condomínios, 3 – A assembleia geral de condóminos aprovou a proposta de administração do condomínio apresentada pela demandada, cuja remuneração era de €50,00 mensais, a título de avença; 4 – A adjudicação foi comunicada à demandada em 22 de Maio de 2009; 5 – A demandada promoveu uma assembleia de condóminos que se realizou em 29 de Junho de 2009, na qual se apresentou aos condóminos como administradora do condomínio; 6 – A demandada detém a documentação correspondente ao espólio do A sito em Lisboa. 7 – Alguns condóminos entraram em conflito com a demandada Imorréis. 8 – A partir de determinada que não foi possível determinar, a demandada deixou de ir ao prédio. Igualmente com relevância para a decisão da causa, não se considera provado: 1 – Que a demandada tenha despendido a quantia de €30,00 com a elaboração do livro de actas; 2 – Que a demandada tenha despendido a quantia de €60,00 com a deslocação do técnico ao A sito em Lisboa. 3 – Que o responsável pela demandada se tenha deslocado ao prédio no dia 03 de Julho de 2009; A convicção deste tribunal resulta dos documentos juntos aos autos e dos depoimentos das partes proferidos em audiência, na medida em que nem uma parte nem outra apresentaram quaisquer outros meios de prova, que pudessem sustentar as afirmações decorrentes das respectivas peças processuais. Da reconvenção. Alega a demandada que, na sequência da sua contratação como administrador do A sito em Lisboa, providenciou a normal gestão do mesmo, nomeadamente providenciando o respectivo livro de actas e fazendo deslocar ao prédio um técnico para reparar a fechadura, reclamando o ressarcimento de despesas e o pagamento dos serviços conforme contratado, referente aos meses de Julho a Setembro de 2009 e ainda uma compensação pela frustração da expectativa da manutenção do contrato. Conforme estipula o n.º 1, do artigo 48.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, a reconvenção só é admitida, no âmbito dos processos da competência dos julgados de paz, nos estritos limites aí consignados, a saber: “quando o demandado se propõe obter a compensação ou tornar efectivo o direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida”. É o caso. O Direito. Está provado que a proposta de prestação de serviço apresentada pela demandada foi aprovada pela assembleia de condóminos e que a respectiva adjudicação lhe foi comunicada, em 22 de Maio de 2009. Sendo certo que, quanto à forma, o contrato de prestação de serviços não está subordinado a nenhuma regra especial, vigora em relação ao mesmo o princípio geral da liberdade de forma consagrado no artigo 219.º do Código Civil, diploma legal a que nos referiremos de ora em diante, se outra especificação não for feita. Acresce que, de acordo com estipulado no artigo 224.º, n.º 1, assim que a comunicação é feita à demandada a declaração torna-se eficaz, o mesmo é dizer que se estabeleceu entre as partes um contrato de prestação de serviços, figura prevista e regulada nos artigos 1154.º, e seguintes, do Código Civil. Deste contrato resultam direitos e obrigações para ambas as partes, a saber, para a demandada, no caso concreto, cumprir os termos da proposta aprovada pela assembleia de condóminos. Resulta mais, sendo que as funções a desempenhar são de “administração do condomínio”, há, para além destes, os direitos e obrigações que para o administrador decorrem diretamente da lei. E nesta matéria, há que atender às seguintes regras. Ao administrador cabe, entre outras, guardar e manter todos os documentos que digam respeito ao condomínio (cfr. Línea m), do artigo 1.436.º); o administrador mantém-se em funções até que seja eleito ou nomeado o seu sucesso. Deste modo, as normas que disciplinam o contrato de prestação de serviços, devem ser interpretadas em conformidade com as regras específicas das funções típicas da administração de condomínios. Assente supra que a legal caracterização do contrato em causa nos autos o enquadra no contrato de prestação de serviços, lembramos que a lei o regula nos artigos 1154.º e seguintes, sendo-lhe aplicável, em tudo quanto a lei não regule em especial, as disposições sobre o mandato (cfr. Art. 1156.º). O supra referido contrato é livremente revogável, nos termos do artigo 1170.º, sendo que, se estiver em causa prestação de serviços no interesse comum das partes, é exigível, na falta de acordo do interessado, a existência de justa causa. Quando tal não ocorra, embora a revogação seja licita, no caso de se tratar de contrato oneroso, há lugar a indemnização conforme previsto no artigo 1172.º. Resta saber qual das duas partes o resolveu. De acordo com os depoimentos das partes proferidos em audiência, ficou o tribunal convicto, pelo reciprocamente admitido pelas mesmas, que, efectivamente, alguns condóminos entraram em confronto com a demandada, sem ter ficado claro como, quando e quem. De resto, é o próprio demandante que afirma ter existido “um conjunto de problemas entre a Imorréis e alguns condóminos”. Também está provado que a demandada providenciou e acompanhou uma assembleia de condóminos. Contudo, não foi provado, nem alegado, que tais despesas tivessem incluídos no ponto 2 da proposta e por isso as despesas daí decorrentes cobertas pela avença. Deste modo, forçoso é considerar que as despesas não estão incluídas na avença. Porém, não logrou a demandada fazer prova das mesmas. Resultou também provado que a partir de determinada data que não foi possível determinar, a demandada não mais se deslocou ao prédio. E assim incumpriu a obrigação de visitar semanalmente o condomínio, conforme alínea i), do ponto 2, da proposta (a fls. 25 A). Deste modo, a invocação deste incumprimento, e eventualmente outros, atendendo aos termos da proposta em confronto com aquilo que foi ou não executado pela demandada, poderia ser considerado justa causa de revogação unilateral do contrato. Porém, tal não aconteceu. É que, a demandada foi contratada pelo condomínio, por decisão de adjudicação da proposta apresentada, por deliberação dos condóminos e só o condomínio, através de nova deliberação, tem legitimidade para revogar o contrato. Assim, quando o condómino C se apresentou nas instalações da demandada Imorréis, exigindo do seu administrador, D, a devolução da documentação, não tinha legitimidade para tanto e a recusa da entrega foi legitima. Assim, em boa verdade, a revogação do contrato com a Imorréis só operou com a nomeação de novo administrador, o que ocorreu na assembleia de condóminos de 01 de Fevereiro de 2010, nos termos previstos no artigo 1171.º, disposição esta concordante com a norma específica contida n.º 5, do artigo 1435.º, sendo devida, até lá, a avença contratada. Mau grado o condomínio ter fundamento para rescindir o contrato, a verdade é que não o fez. Do direito de retenção. De acordo com o estabelecido no artigo 754.º do Código Civil, o detentor de coisa que deva entregar, só goza do direito de retenção se o crédito que invoca como causa da retenção, resultar de despesas feitas por causa daquela coisa ou de danos provocados por essa coisa. Uma das razões invocadas pela demandada foi a despesa com o livro de atas. Trata-se, assim, de uma despesa feita por causa da coisa cuja entrega lhe é pedida. É quanto basta para preencher a referida previsão legal. Ou seja, o facto de a demandada não ter logrado fazer prova da despesa em causa, tal não impede que se considere legitima a retenção. Face ao supra exposto a retenção estava legitimada pela existência do contrato de prestação de serviços, improcedendo o pedido com as despesas relativas a advogado. Sempre se dirá, quanto a este ponto, que, mesmo que assim se não considerasse, também este pedido não podia proceder, por falta de nexo causal. Ou seja, o facto de alguém incumprir um contrato, ou se pretender sustentar incumprimento de um contrato, não é condição sine qua non para se consultar advogado, não era imperioso que o fizesse. Decisão. O Julgado de Paz é competente, não foram suscitadas quaisquer excepções ou nulidades de que cumpra conhecer. Em face do exposto, considero esta ação parcialmente procedente por parcialmente provada em consequência: 1 - Condeno a demandada a entregar ao demandante a documentação relativa ao A sito em Lisboa; 2 – Condeno o demandante a pagar à demandada a quantia de €350,00, relativos ao valor da avença mensal, dos meses de Julho de 2009 a Janeiro de 2010; Ficam ambas as partes absolvidas dos restantes pedidos. Custas. Custas em igual proporção já inteiramente satisfeitas. Notifique-se. Julgado de Paz de Lisboa, em 19 de Abril de 2011 A Juíza de Paz Maria Judite Matias Demandante: A Demandado: B DESPACHO A fls. 60 a 71 veio o demandante apresentar requerimento, expondo e requerendo o seguinte: Alega o demandante a sentença proferida a fls. 50 a 56, é nula por violar o disposto nas alíneas c) e e), do artigo 668.º, do CPC, em virtude de “haver oposição entre os fundamentos e a decisão e de o juiz ter condenado em quantidade superior ao pedido”, requerendo a reforma da sentença nos termos do artigo 669.º, n.º 2, alínea a), do CPC. Compulsados os autos sustentamos toda a fundamentação factual e enquadramento jurídico expendido na sentença posta em crise pelo ora reclamante, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos. Quanto à alegada violação do artigo 668.º, n.º 1, alínea e), do CPC, cumpre apreciar. Dos argumentos expendidos pelo reclamante, resulta que o mesmo não teve em linha de conta o pedido formulado na reconvenção, cujo teor consta da contestação de fls. 22 e 23, o qual se considera aqui integralmente reproduzido para os devidos efeitos. Por fim, cumpre ainda dizer que, o valor do pedido não tem que coincidir, necessariamente, com o valor atribuído à ação, nem aquele que é indicado pelo demandante, nem aquele que se obtém em virtude das regras decorrentes da reconvenção, que foi o caso dos autos. Não há , assim violação alguma do referido preceito legal, na medida em que o montante condenatório foi inferior ao montante peticionado em sede de reconvenção. Face ao supra exposto, indefiro as pretensões formuladas no requerimento objecto de apreço. Notifique-se. Julgado de Paz de Lisboa, em 08 de Junho de 2011 A Juíza de Paz Maria Judite Matias |