Sentença de Julgado de Paz
Processo: 7/2014-JP
Relator: IRIA PINTO
Descritores: ABATE DE ÁRVORES/ RESPONSABILIDADE CIVIL
Data da sentença: 09/19/2014
Julgado de Paz de : COIMBRA
Decisão Texto Integral: Sentença
Relatório
Os demandantes e esposa, melhor identificados a fls. 1 dos autos, intentaram em 10/01/2014, contra os demandados e, melhor identificados a fls. 1 dos autos, ação declarativa com vista a obter o ressarcimento de prejuízos relacionados com o corte de eucaliptos sua propriedade, formulando os seguintes pedidos:
Serem os demandados condenados a pagar aos demandantes a quantia de €2.173,21, acrescida de juros legais vencidos no valor de €48,21 e juros vincendos até efetivo e integral pagamento e custas do processo.
Tendo, para tanto, alegado os factos constantes do requerimento inicial, de folhas 1 a 4 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido. Juntaram 2 (dois) documentos. Em audiência juntaram 4 (quatro) fotografias.
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Regularmente citados os demandados (fls. 18 e 27), apresentaram a contestação, de fls. 31 a 34, que se dá por integralmente reproduzida, impugnando em suma os factos constantes do requerimento inicial. Juntaram 1 (um) documento.
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--- Não se realizou sessão de pré-mediação por falta de citação dos demandados em tempo útil.
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Realizou-se audiência de julgamento em 30/5/2014, 1/8/2014 e 27/8/2014 com observância das formalidades legais, como das respetivas Atas de fls. 74, 91/92 e 100 se infere.

Cumpre apreciar e decidir
O Julgado de Paz é competente, as partes têm personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas e não se verificam quaisquer outras exceções ou nulidades de que cumpra conhecer.
Fixo à causa o valor de €2.173,21 (dois mil cento e setenta e três euros e vinte e um cêntimos).
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Questão Prévia
--- Do peticionado chamamento de
Em contestação vieram os demandados expor acerca da posição processual de que deveria ser chamada aos autos como demandada.
Ora, não estando em causa uma situação de litisconsórcio necessário, não é admissível a intervenção (artigo 39º da Lei 78/2001, com a alteração da Lei 54/2013).
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Reunidos os pressupostos de estabilidade da instância, cumpre proferir sentença.
A alínea c) do nº 1 do artigo 60º da Lei nº 78/2001, de 13/7, alterada pela Lei 54/2013, 31/7, estatui que, nas sentenças proferidas, deve constar (entre outros) uma “sucinta fundamentação”.

Fundamentação da matéria de facto
Com interesse para a decisão da causa ficou provado que:
1 – Os demandantes são donos e legítimos possuidores de um terreno, na proporção de metade do prédio total.
2 – O terreno é composto por pinhal, sito em Gordões, na União de Freguesias de Souselas e Botão, em Coimbra.
3 – Os demandados dedicam-se à compra de árvores para depois revenderem a madeira.
4 – Naquele terreno existem eucaliptos, que se destinavam a ser vendidos.
5 – Os demandantes deslocam-se ao terreno anualmente para fazer limpeza do mato.
6 – Na última deslocação ao terreno, os demandantes observaram que nenhum eucalipto existia no seu terreno.
7 – Tendo ficado incomodados uma vez que pretendiam vender os eucaliptos.
8 – E tendo os demandantes diligenciado junto dos vizinhos, aperceberam-se que os demandados haviam visitado o terreno e demonstrado interesse em adquirir os eucaliptos, tendo procedido ao seu corte.
9 - Os demandantes interpelaram duas vezes os demandados, em 12 de junho de 2013 e em 26 de agosto de 2013, solicitando o pagamento dos eucaliptos.
10 – Acontece que, os demandados tinham sido contactados pela comproprietária do referido prédio rústico, (irmã da demandante mulher), para lhe adquirirem os eucaliptos que se encontravam na metade do mesmo.
11- Daí que os demandados acordaram os valores com a irmã da demandante, e procederam ao corte das árvores.
12 – Pelo que precederam a tal corte dos eucaliptos à vista de toda a gente, cumprindo com o pagamento do valor acordado com aquela, num total de €150,00.
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A matéria fáctica dada como provada resultou da audição das partes, dos factos admitidos, da prova testemunhal apresentada por demandantes, demandados e através de convocatória, além dos documentos juntos aos autos a fls. 5 a 8, 36, 70 a 74, em conjugação com as regras de experiência comum e critérios de normalidade que alicerçaram a convicção do tribunal.
Relativamente à prova testemunhal e no que concerne às testemunhas apresentadas pelos demandantes, embora com algum conhecimento dos factos em discussão, foram consideradas relativamente parciais e pouco objetivas, por outro lado, a testemunha dos demandados foi considerada credível e com conhecimento de parte dos factos em discussão, e, por sua vez, a testemunha convocada, foi considerada conhecedora dos factos em discussão, sendo o seu depoimento considerado relevante e imparcial, expondo que foi quem solicitou aos demandados o corte dos eucaliptos, devidamente identificados, da metade do seu terreno e que até ao seu corte terá passado um dado lapso de tempo.
--- Não se provaram quaisquer outros factos, com interesse para a decisão da causa, dada a sua insuficiência ou inexistência, nomeadamente não ficou provado em concreto o número, dimensão e valor dos eucaliptos cortados.
O Direito
Os demandantes intentaram a presente ação, peticionando a condenação dos demandados no ressarcimento de danos patrimoniais e não patrimoniais, alegando em sustentação desse pedido o corte indevido de eucaliptos por parte dos demandados.
A presente ação consubstancia-se no direito de propriedade, cujo conteúdo consta do artigo 1305º do Código Civil, que dispõe que o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites e restrições legais.
Os demandantes vêm assim expor a sua limitação ao direito de propriedade, no que concerne ao terreno identificado nos autos, peticionando indemnização por prejuízos patrimoniais e não patrimoniais, decorrentes de um corte indevido de eucaliptos, competindo-lhes nessa medida provar os factos constitutivos do direito que alegam, como dispõe o nº 1 do artigo 342º do Código Civil, por recair sobre eles o ónus de prova.
No caso dos autos e da prova produzida resulta que os demandados procederam ao corte dos eucaliptos pertencentes aos demandantes e plantados no seu terreno, apesar de terem sido informados pela proprietária () do terreno do lado (a outra metade do prédio total) de que os eucaliptos a serem cortados seriam os da sua parte, devidamente diferenciada, o que não veio a acontecer dado que existiu um lapso de tempo, relativamente longo, sem que os demandados viessem a proceder ao solicitado corte dos eucaliptos, tendo procedido ao pagamento da compra dos ditos eucaliptos à D., tal como foi entre eles convencionado.
Entretanto, os demandantes na visita anual ao seu terreno constataram o corte indevido dos eucaliptos sua pertença, bem como identificando os demandados como os autores de tal corte.
Pelo que, nos termos do artigo 562º do Código Civil, quem está obrigado a reparar/indemnizar um dano, deve reconstituir a situação que existiria na esfera jurídica do lesado, no caso de não se ter verificado o evento que obriga à reparação.
Dispõe ainda o artigo 566º, nº 1 que a indemnização é fixada em dinheiro sempre que a reconstituição natural não seja possível.
Assim, demonstrado o corte indevido dos eucaliptos da propriedade dos demandantes, sendo os autores do corte os demandados, aceitando-se que não tiveram em devida conta as instruções dadas para o corte dos eucaliptos que deveria ser levado a cabo no terreno do lado, são os demandados os responsáveis por tal corte indevido.
Ainda face à prova produzida, constata-se que os demandantes não fizeram prova do número concreto de eucaliptos cortados no seu terreno, nem da sua dimensão, nem do valor unitário de venda dos ditos eucaliptos.
Antes resultou provado que aquele preço de venda de eucaliptos é variável, nomeadamente se é vendido ao peso ou à unidade, e, sendo à unidade, o preço será em função do número, dimensão, altura e até considerando o grau de dificuldade no seu corte, nomeadamente em termos de acessibilidade e que no caso trazia alguma dificuldade, como se constatou.
Donde, provado o corte indevido de eucaliptos da propriedade dos demandantes e não sendo possível apurar, em concreto, quer o número de eucaliptos cortados, quer as medidas dos mesmos, em altura e largura, quer o valor dos mesmos, até porque resultou da prova que a dimensão dos eucaliptos cortados era variada, não podendo ser estabelecido o mesmo valor unitário para certo número de eucaliptos, há que fixar equitativamente o valor de prejuízos.
Pelo que, tendo ficado a dúvida sobre o valor exato dos prejuízos, fixa-se equitativamente, o valor global de €600,00, nos termos dos artigos 4º e 566º nº 3, ambos do Código Civil, pelo dano indemnizável pelo corte dos eucaliptos objeto dos autos.
Peticionam ainda os demandantes danos morais, dispondo quanto a estes o artigo 496º, nº 3 do Código Civil, que na fixação de indemnização deve atender-se aos danos que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito. Considera-se que incómodos e receios como os relatados nos autos pelos demandantes não são indemnizáveis, uma vez que se consideram vicissitudes que podem ocorrer a quem é proprietário. Pelo que se indefere o peticionado a titulo de danos não patrimoniais.
Pelo exposto, devem os demandantes ser ressarcidos pelos demandados, solidariamente (artigo 512º do Código Civil) do valor de €600,00, absolvendo-se, em consequência, os demandados do demais peticionado.
Peticionam ainda os demandantes juros à taxa legal de 4% até efetivo e integral pagamento.
E verificando-se um retardamento da prestação por causa imputável ao devedor, constitui-se este em mora e, consequentemente, na obrigação de reparar os danos causados ao credor, a ora demandante (artigo 804º do Código Civil). Tratando-se de obrigações pecuniárias, a indemnização corresponderá aos juros a contar do dia de constituição em mora (artigo 806º do Código Civil). Deste modo, têm os demandantes direito a receber juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4% (artigo 559º do Código Civil)), sobre o valor em divida de €600,00, desde a da última data de citação dos demandados - 6/2/2014 - até efetivo e integral pagamento.
Face ao acima exposto, procede parcialmente o peticionado.
Decisão
Em face do exposto, julgo a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, consequentemente, condeno solidariamente os demandados e a pagarem aos demandantes o valor de €600,00 (seiscentos euros), acrescidos de juros legais, indo no mais absolvidos.
Custas
Nos termos da Portaria nº 1456/2001, de 28 de dezembro, condeno demandantes e demandados, no pagamento de custas totais no valor total de €70,00 (setenta euros), na proporção de responsabilidade de 2/3 para os demandantes no valor de €46,00 (quarenta e seis euros) e de 1/3 de responsabilidade para os demandados no valor de €24,00 (vinte e quatro euros).
--- Pelo que tendo os demandantes pago a taxa de justiça de €35,00 (trinta e cinco euros), devem ainda proceder ao pagamento do valor restante de €11,00 (onze euros), no Julgado de Paz, no prazo de três dias úteis, a contar da notificação desta sentença, sob pena do pagamento de uma sobretaxa diária de €10,00 (dez euros) por cada dia atraso, comprovando o pagamento neste Julgado.
Por sua vez, tendo os demandados pago a taxa de justiça de €35,00, deve ser-lhes devolvido o valor de €11,00 (onze euros).
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A Sentença (processada em computador, revista e impressa pela signatária) foi proferida nos termos do artigo 60º, nº 1 da Lei nº 78/2001, alterada pela Lei 54/2013.
Notifique e Registe.

Julgado de Paz de Coimbra, 19 de setembro de 2014
A Juíza de Paz (em acumulação de serviço),
(Iria Pinto)