Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 63/2024-JPCNT |
Relator: | MARTA SANTOS |
Descritores: | IMOBILIÁRIA IMPROCEDENTE |
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Data da sentença: | 05/28/2024 |
Julgado de Paz de : | CANTANHEDE |
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Decisão Texto Integral: | Proc. 63/2024 – JPCNT SENTENÇA I.RELATÓRIO [PES-1] e [PES-2], casados entre si, portadores, respetivamente, do cartão de cidadão n.º [Id. Civil-1], válido até 20.07.2031, com o NIF [NIF-1], e cartão de cidadão n.º [Id. Civil-2], válido até 03.08.2031, e NIF [NIF-2], ambos residentes na [...], n.º 53, [...] 17, 1º-B, [Cód. Postal-1], em [...], vieram intentar a presente ação declarativa, com fundamento na alínea h) do n.º 1 do artigo 9.º da Lei dos Julgados de Paz, contra [ORG-1], LDA, sociedade comercial por quotas, portadora do NIPC [NIPC-1], com sede na [...], n.º 45, [...], [Cód. Postal-2], em [...], pedindo a condenação da demandada no pagamento da quantia de €3.204,93 (três mil duzentos e quatro euros e noventa e três cêntimos), correspondentes aos valores a apresentar no seguimento do aditamento ao contrato-promessa, e expressos nos emails juntos com o requerimento inicial sob os números 8 e 9, bem como os juros de mora legais, desde a data da propositura da ação até efetivo e integral pagamento. Para tanto, alegaram os factos constantes do requerimento inicial, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido. Para prova do por si alegado juntaram 11 (onze) documentos, que se dão por integralmente reproduzidos. A demandada apresentou contestação, cfr. fls. 43 e ss. Não se chegou a realizar a sessão de mediação porquanto a Demandada prescindiu da mesma, cfr. cota de fls. 72. Foi agendada e realizada a Audiência de Julgamento, na qual compareceram os Demandantes, a Legal Representante da Demandada, D. [PES-3] e o Ilustre Mandatário da Demandada. * QUESTÃO PRÉVIA:DA EXCEÇÃO DE ILEGITIMIDADE PROCESSUAL PASSIVA DA DEMANDADA Em sede de contestação veio a Demandada alegar a ilegitimidade passiva, alegando em síntese, que não é nem nunca foi parte contratual no aditamento em causa nos autos (artigos 21.º e 23.º da contestação – fls. 46v). Notificados os demandantes da contestação apresentada e convidados a responder à matéria de exceção, nada vieram dizer. CUMPRE APRECIAR E DECIDIR. A legitimidade das partes constitui um pressuposto processual de regularidade e validade da instância que o Tribunal deve verificar oficiosamente. A ilegitimidade de qualquer das partes constitui exceção dilatória que impede o conhecimento do mérito da causa e determina a absolvição da instância (cfr. artigos 576.º, n.º 2, 577.º, alínea e) e 578.º, todos do Código do Processo Civil, aplicáveis ex vi do artigo 63.º da Lei dos Julgados de Paz. Nos termos do artigo 30.º do Código do Processo Civil, as partes são legítimas quando têm interesse direto em demandar (legitimidade ativa) ou interesse direto em contradizer (legitimidade passiva). São considerados titulares de tais interesses para efeitos de legitimidade, aqueles que forem sujeitos da relação material em discussão que é invocada pelo Demandante, salvo indicação da lei em contrário. Analisado o requerimento inicial verifica-se que os Demandantes alegam que no dia 12 de julho de 2022 celebraram com a Demandada um contrato de mediação imobiliária, do qual veio a resultar ter a Demandada arranjado compradores para o imóvel objeto de tal contrato, tendo daí resultado a celebração do correspondente contrato promessa de compra e venda, ao qual houve posteriormente um aditamento motivado por despesas que os Demandantes tiveram devido ao facto de a celebração do contrato definitivo de compra e venda se ter atrasado por condicionalismos respeitantes aos promitentes compradores. Tal aditamento nunca veio a ser assinado pelos promitentes compradores, alegando os Demandantes, em suma, que a Demandada incumpriu com os seus deveres contratuais, porquanto não promoveu a assinatura do aditamento por parte dos promitentes compradores, nem lhes apresentou todas as despesas em que incorreram pelo tempo que tiveram de aguardar pela celebração da escritura (dois meses), entendendo assim que a Demandada é responsável pelo pagamento da quantia de €3.204,93 (três mil duzentos e quatro euros e noventa e três cêntimos). Atendendo à relação material controvertida, tal como é configurada pelos Demandantes e tendo em conta que a Demandada teve intervenção no negócio celebrado entre os Demandantes e os promitentes compradores, há que concluir que a Demandada é parte legítima na presente ação, porquanto tem interesse processual em contradizer. Assim, improcede a exceção de ilegitimidade processual passiva arguida pela Demandada. Vejamos adiante se o mesmo se poderá dizer da ilegitimidade processual substantiva da Demandada. * Verificam-se os pressupostos de regularidade da instância, já que:O Tribunal é competente em razão do objeto, do valor, da matéria e do território, nos termos do disposto no artigo 6.º, nº 1, 8.º, 9.º, n.º 1 al. h), 10.º e 12.º, n.º 1, todos da Lei dos Julgados de Paz. As partes gozam de personalidade e capacidade judiciárias e são legítimas. Não existem nulidades, exceções ou outras questões prévias a conhecer. Fixa-se o valor da ação em €3.204,93 (três mil duzentos e quatro euros e noventa e três cêntimos), cfr. artigos 296.º, n.º 1, 297.º, n.º 1, 299.º n.º 1 e 306.º n.º 1, todos do Código do Processo Civil, ex vi do artigo 63.º da Lei dos Julgados de Paz. * Reunidos os pressupostos de estabilidade da instância, cumpre proferir sentença, sendo que a alínea c) do n.º 1 do artigo 60.º da Lei dos Julgados de Paz, estatui que, nas sentenças proferidas, deve constar, entre outros, uma “sucinta fundamentação”.* II. FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTOFactos provados: Com relevo para a decisão da causa resultaram provados os seguintes factos: 1.No dia 2 de fevereiro do ano de 2022, os Demandantes celebraram com a Demandada, um contrato de mediação imobiliária, para venda do imóvel de que eram donos e legítimos possuidores, a saber uma moradia familiar T3 de rés-do-chão, primeiro andar, garagem, anexos e logradouro, com uma área aproximada de 484m2, localizada na Urbanização Vila D’Alva, [...] 18, em [...], com o artigo matricial urbano 3797, registada na Conservatória do Registo Predial de [...]sob o n.º 4666, da [ORG-2] e Pocariça, com a licença de utilização n.º 147/2022, emitida pela [ORG-3] em 07.08.2002. 2.No seguimento do contrato de mediação imobiliária referido em 1., a Demandada arranjou uns interessados na compra do identificado imóvel, os quais apresentaram uma proposta para aquisição do mesmo, a qual foi aceite pelos Demandantes. 3.Foi, assim, em 12.07.2022, assinado contrato-promessa de compra e venda, entre os Demandantes e os promitentes compradores, contrato esse que foi feito pela Demandada, em papel timbrado seu. 4.Pela Demandada foi transmitido aos Demandantes, que os promitentes-compradores necessitavam de mais algum tempo para assinarem a escritura, pois não o conseguiam fazer na data convencionada no contrato-promessa de compra e venda. 5.No dia 12 de dezembro de 2022, a Demandada remeteu e-mail aos Demandantes a informar que os compradores da casa tinham a sua situação desbloqueada e que finalmente conseguiram vender o apartamento deles no [...], mas dizendo que a promitente compradora mulher lhes tinha pedido o envio das despesas correspondentes aos dois meses da prestação da moradia. 6.No dia 16 de janeiro de 2022, os Demandantes remeteram e-mail à Demandada, a dar nota das despesas e correspondentes comprovativos, pelo atraso de dois meses na realização da escritura, no valor total de €3.024,93 (três mil e vinte e quatro euros e noventa e três cêntimos). 7.No dia 8 de março de 2023, os demandantes verificaram que os compradores haviam feito para a sua conta bancária, uma transferência no valor de €128,18 (cento e vinte e oito euros e dezoito cêntimos). 8.No dia 19 de fevereiro de 2023 e 20 de fevereiro de 2023, o Demandante marido efetuou uma transferência bancária no valor de €10.000,00 (dez mil euros) e outra de €5.682,50 (cinco mil seiscentos e oitenta e dois euros e cinquenta cêntimos) respetivamente, para o [ORG-4], Lda. para liquidação da Fatura FT M/161 de 13 de fevereiro de 2023 no valor de €15.682,50 (quinze mil seiscentos e oitenta e dois euros e cinquenta cêntimos), relativa à comissão de prestação dos serviços imobiliários conforme acordado. 9.A demandada é uma sociedade comercial por quotas que se dedica à atividade comercial de mediação imobiliária; compra e venda de bens imobiliários; administração de imóveis por contra de outrem; angariação e avaliação imobiliária; arrendamento de bens imobiliários; administração de condomínios; atividades de intermediação de crédito; atividades de mediação de seguros; atividades de acabamentos e remodelações na área da construção civil. 10.No exercício da sua atividade comercial, celebrou, em 2 de fevereiro de 2022, com os demandantes o contrato de mediação imobiliária n.º 372/2022, onde se obrigou, em regime de exclusividade, pelo período de nove (9) meses, a diligenciar no sentido de conseguir interessado na venda de um imóvel com as características melhor descritas em 10., pelo valor máximo de €263.000,00 (duzentos e sessenta e três mil euros), desenvolvendo para o efeito ações de promoção de recolha de informações sobre os potenciais compradores, bem como visitas ao imóvel com possíveis interessados. 11.O contrato de mediação imobiliária referido em 10. incidiu sobre a fração autónoma destinada a habitação referente a uma moradia unifamiliar T3, r/c, 1.º andar, garagem, anexos e logradouro, com uma área total aproximada de 484m2, localizada na Urbanização Vila D’Alva, Lote 18, [Cód. Postal-3] [...], com o artigo matricial urbano 3797, registado na Conservatória do Registo Predial de [...]sob o n.º 4666 e com a Licença de Utilização n.º 147/2022, emitida pela Câmara Municipal de [...] em 7 de agosto de 2022. 12.Nada mais ficou acordado no contrato quanto a eventuais obrigações acessórias da Demandada. 13.Posteriormente, foi celebrado, em 12 de julho de 2022, um Contrato de Promessa de Compra sobre o prédio objeto de mediação imobiliária, onde a Demandada interveio na qualidade de intermediária imobiliária e não como parte contratual do mesmo. 14.O aditamento ao contrato de promessa de compra e venda celebrado em 10 de novembro de 2022 do qual consta que “os PROMITENTES COMPRADORES se comprometiam a pagar aos PROMITENTES VENDEDORES, na data de assinatura da escritura pública de compra e venda, todas as despesas que os promitentes vendedores iriam ter com a moradia a partir dessa data” sendo que “o pagamento dessas despesas seria comprovado com documentação que os PROMITENTES VENDEDORES apresentariam na data de assinatura da escritura pública de compra e venda”, nunca chegou a ser assinado pelos promitentes vendedores. 15.O aditamento referido em 14. nunca foi assinado pela Demandada, que não é, nem nunca foi, parte contratual do mesmo. 16.O aditamento referido em 14. apenas previa expressamente obrigações para as suas partes contratuais e não para a agência imobiliária. 17.Os demandantes deveriam ter apresentado os comprovativos das despesas realizadas na data da escritura, situação que não se verificou. 18.Quem se obrigou a proceder ao pagamento das despesas aludidas em 17. foram os promitentes compradores e atuais proprietários do prédio e não a aqui Demandada. 19.A Demandada não assumiu qualquer obrigação que não fosse a de diligenciar pela venda da fração, que cumpriu integralmente. 20.Os demandantes não apresentaram os comprovativos das despesas na data da escritura do contrato prometido, nem enviaram os mesmos com a antecedência pretendida informalmente pelos promitentes compradores, ainda que solicitados, pelo menos, nas datas de 10.11.2022, 12.12.2022, 16.11.2022 e 08.12.2022. 21.Os demandantes estiveram pelo menos duas vezes antes da escritura pessoalmente com os compradores e nada fizeram ou disseram nesse sentido. 22.Os demandantes enviaram os comprovativos na data de 16.01.2023 (já muito próximo da data da escritura e da vinda para [...] dos promitentes compradores). 23.Ainda assim, a Demandada remeteu as despesas para os promitentes compradores em 20.01.2023 (antes da escritura de compra e venda) 24.Não tendo enviado as despesas para os promitentes compradores mais cedo porque os promitentes vendedores só lhe enviaram a comunicação em 16.01.2023 e os promitentes compradores apenas lhe enviaram um email para envio em 20.01.2023. 25.A Demandada sempre manteve contacto regular com os promitentes compradores, respondendo e ajudando em tudo o que fosse necessário. 26.O motivo do não pagamento das despesas por parte dos promitentes compradores foi indicado por mensagem à Demandada, nomeadamente: “Boa noite D. [PES-3], o aditamento do contrato que mencionou nunca foi assinado da nossa parte como ficamos à espera do valor das despesas. O valor só nos foi comunicado uma semana antes de irmos para [...]. No aditamento estava mencionado que no dia da escritura oficial, os vendedores teriam de nos apresentar as faturas das despesas, o que não foi feito no dia da escritura. Como o meu marido lhe disse ao telefone, nós estivemos com ele duas vezes antes da escritura, nunca mencionaram o pagamento das despesas e até disseram que se fosse preciso, podíamos deixar a eletricidade e a água em nome deles até voltarmos em abril caso não tivéssemos tido tempo de tratar tudo esta semana.” 27.A Demandada é alheia à formação de vontade de não pagamento das despesas, da não assinatura do aditamento contratual, não tendo assumido qualquer obrigação de pagamento de despesas. 28.A Demandada já havia transmitido aos Demandantes a posição a que alude 27. na data de 03.05.2023. * A convicção do Tribunal, relativamente à factualidade supra descrita, resultou da audição dos Demandantes ao abrigo do disposto no artigo 57.º, n.º 1 da Lei dos Julgados de Paz, da análise ponderada dos documentos juntos aos autos pelos Demandantes e pela Demandada, da prova por declarações de parte da Legal Representante da Demandada D. [PES-3] e da prova testemunhal apresentada pela Demandada, tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 607.º, nº 5 do Código do Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no artigo 63.º da Lei dos Julgados de Paz e no artigo 396.º do Código Civil.* Os factos 1 a 6 e 8 foram dados como assentes por acordo das partes.O facto 7 resultou provado do doc. 9 junto com o requerimento inicial. O facto 9 resultou provado do doc. 1 junto com a contestação. Os factos 10 e 11 resultaram provados do doc. 2 junto com a contestação. Os factos 12, 17, 21 e 27 resultaram provados por declarações de parte da Legal Representante da Demandada. O facto 13 resultou provado do doc. 3 junto com a contestação, por declarações de parte da Legal Representante da Demandada e pelo depoimento da testemunha [PES-5]. Os factos 14, 15, 16, 18 resultaram provados do doc. 4 junto com a contestação, por declarações de parte da Legal Representante da Demandada e pelo depoimento da testemunha [PES-5]. O facto 19 resultou provado por declarações de parte da Legal Representante da Demandada e pelo depoimento da testemunha [PES-5]. Os factos 20 e 22 a 26 e 28 resultaram provados pelos docs. 5 a 8 juntos com a contestação e por declarações de parte da Legal Representante da Demandada. * Os Demandantes confirmaram ter estado com os compradores na altura em que lhe entregaram as chaves da moradia para que lá pudessem pernoitar, tendo nessa ocasião explicado também como é que funcionavam os equipamentos.Em sede de declarações de parte a D. [PES-3] referiu que apenas ficou obrigada a publicitar a venda do imóvel dos Demandantes, que antes da celebração do contrato definitivo de compra e venda foi celebrado o contrato de promessa de compra e venda e que o aditamento a que aludem os autos foi feito porque os promitentes compradores não conseguiram vender o imóvel que tinham à venda no [...] dentro do prazo estipulado no contrato promessa de compra e venda para realização do contrato definitivo de compra e venda. Seriam os promitentes compradores a pagarem as despesas em dissídio nos autos aos promitentes vendedores, eram eles as partes e não a depoente. Os vendedores assinaram o aditamento, sendo que os compradores nunca o chegaram a fazer. Esclareceu que fez o aditamento e encetou diligências para que as despesas fossem pagas pelos compradores aos vendedores por ser o “canal de contacto” entre uns e outros, mas que não o fez ao abrigo de qualquer dever contratual. Disse que o aditamento foi enviado aos compradores, mas como os vendedores não chegaram a especificar as despesas, os compradores também não chegaram a assinar o aditamento. Tudo o que os vendedores lhe fizeram chegar referente às despesas, reencaminhou logo para os compradores (isto, cerca de três semanas antes da escritura), sendo que não obteve resposta nenhuma por parte dos compradores quanto às despesas. Confrontada com o aditamento ao contrato junto aos autos a fls. 59, confirmou o teor do mesmo, tendo esclarecido que esteve presente na data da escritura, mas não assistiu ao pagamento das despesas por parte dos compradores, nem à entrega dos comprovativos por parte dos vendedores, não se tendo falado de nada a esse respeito. Aquando do pagamento da comissão à imobiliária os Demandantes disseram que não iam pagar a comissão enquanto não tivessem o valor das despesas do seu lado, mas a imobiliária respondeu-lhes que não tinha nada a ver com isso, que o pagamento das despesas era da responsabilidade dos compradores, cfr. doc. 8 junto com a contestação, com o qual foi confrontada. Depois disso nunca mais foi interpelada pelos Demandantes, tendo sido surpreendida com a citação para esta ação. Depois da escritura ainda chegou a falar com os compradores para que estes pagassem as despesas aos vendedores, mas depois disso os compradores deixaram de lhe atender o telefone e não houve mais contacto. A compradora mulher referiu à depoente que houve contactos diretos com os Demandantes, que tinha estado com eles antes e depois da escritura. Confirmou ter recebido o doc. 5 (email) junto com a contestação duas semanas antes da escritura, tendo-o reencaminhado para os compradores. Esclareceu que a filha da [PES-12] (compradora), é a [PES-14] e que se comunicavam para aquele email porque a[PES-13] não tinha email, tendo sido o email referido no doc. 5 junto com a contestação o qual usou desde todo o início para se comunicar com os compradores. Tem conhecimento que a Jéssica vivia com os pais (compradores) e que os compradores tiveram conhecimento do teor daquele email. Confrontada com o doc. 7 junto aos autos com a contestação confirmou o teor do mesmo, concretizando que foi a depoente que enviou a mensagem de 20.01.2023 (a fls. 64vs), para a D. [PES-12] (compradora), depois de ter recebido a comunicação das despesas por parte dos Demandantes. Em resposta a esta mensagem, recebeu a mensagem de fls. 85v. já após a escritura (plasmada em 25. dos factos provados), resumindo, a [PES-14] disse-lhe que não tinham pago porque não lhe foram apresentadas as despesas. A testemunha da Demandada, [PES-5], disse ser mediador imobiliário na Demandada e que faz tudo, desde a angariação dos imóveis até à venda. Disse que o objetivo era vender o imóvel dos demandantes pelo preço estipulado, sendo que não esteve presente no momento do contrato de promessa de compra e venda e esclarecendo que os contratos de mediação imobiliária são feitos pela D. [PES-3]. Confrontado com o doc. 4 junto aos autos com a contestação (aditamento), confirmou ser aquele o documento e disse ter tido conhecimento do seu teor e que o aditamento foi enviado aos compradores, mas do que sabe o Demandante marido nunca facultou as despesas até à celebração do contrato definitivo de compra e venda. Sabe que as despesas foram facultadas à [PES-3], que as enviou aos clientes compradores. Disse que após o contrato promessa de compra e venda nunca mais esteve com as partes, só na visita inicial, onde estava a Demandante mulher. Depois do contrato promessa de compra e venda foi a [PES-3] a tratar de tudo, não teve mais nenhuma intervenção. A testemunha referiu que para complementar o aditamento teriam de ter sido facultadas atempadamente as despesas pedidas pelos compradores. * III. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICAOs Demandantes celebraram com a Demandada um contrato de mediação imobiliária onde esta se obrigou, cfr. Cláusula Primeira do aludido contrato (fls. 5 e 53 dos autos) “…a diligenciar no sentido de encontrar interessado na venda, de um imóvel com as características a seguir indicadas, pelo valor máximo mensal de €263.000,00 (duzentos e sessenta e três mil euros), desenvolvendo para o efeito, ações de promoção e recolha de informações sobre os potenciais compradores, bem como visitas ao imóvel com possíveis interessados.” É certo que na Cláusula Quinta do contrato, no seu n.º 1, se diz que “No âmbito do presente contrato, a Mediadora obriga-se a prestar os serviços conducentes à obtenção da documentação necessária à concretização do negócio visado pela mediação.”, mas tal documentação habitualmente reporta-se à caderneta predial, certidão permanente de registo predial, ficha técnica da habitação, etc., ou seja, documentos absolutamente necessários e indispensáveis à realização do contrato definitivo de compra e venda. No caso concreto, o regime aplicável é o previsto na Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro. Ora refere o artigo 2.º, n.º 1 da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, que “A atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis.” Por sua vez explicita-se no n.º 2 de tal preceito que a atividade de mediação imobiliária consubstancia-se também no “desenvolvimento das seguintes ações: a) Prospeção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes; b) Promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões.” Neste contrato uma das partes obriga-se a promover, de modo imparcial, a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à celebração de certo negócio, mediante retribuição - cfr. C. Lacerda Barata, Contrato de Mediação, em Estudos do [ORG-5], I, pág. 192. São assim elementos típicos deste contrato: a obrigação de aproximação de sujeitos; a atividade tendente à celebração do negócio; a imparcialidade; a ocasionalidade; e por fim a retribuição. O artigo 16.º da citada Lei estatui sobre alguns dos elementos do citado contrato. A atividade do mediador consiste essencialmente na prática de atos materiais, tendentes a favorecer o encontro de eventuais contraentes e a celebração do negócio em causa. Essa atividade tem, pois, carácter necessariamente pluridirecional, dirigindo-se a um resultado que envolve, pelo menos, duas pessoas. V. Lacerda Barata, Ob. Cit., pág. 193. Por outro lado, o mediador não age por conta do comitente, nem no interesse deste. A imparcialidade impõe ao mediador o dever de se comportar, perante os potenciais contraentes, em termos não discriminatórios e de modo a evitar danos para qualquer deles; nomeadamente deverá avisar ambas as partes quando conheça alguma circunstância, relativa ao negócio, capaz de influenciar a decisão de contratar (ou não). V. Lacerda Barata, Ob. Cit., pág. 198. Por este seu trabalho, em que consiste a respetiva prestação, o mediador tem direito a uma remuneração. Com efeito, o contrato aqui em causa é um contrato necessariamente oneroso. A propósito, o artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro, dispõe que: “1. A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.” Para além disso, caracteriza-se também este tipo de contrato por ser um “contrato aleatório, só dando azo à retribuição quando tenha êxito” - [PES-7], in “Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária Anotado”, 2015, Almedina, pág. 126 - “por força desta circunstância que coloca a remuneração na dependência da celebração do contrato visado o mediador corre um risco específico de não ser remunerado, mesmo tendo cumprido escrupulosamente a sua prestação. Daí a referida frequente classificação do contrato de mediação como aleatório (…)”. De facto, na concretização da obrigação do mediador, este pratica, por conta própria, vários atos materiais, que podem ser de publicitação do que se pretende vender, nomeadamente através de publicação de anúncios em jornais e revistas, páginas, sites, colocação de placas nos prédios/frações em venda, estabelecimento de contactos com clientes em carteira, organização de visitas, etc., visando a obtenção ou concretização do negócio em relação a determinado imóvel. Porém, só no momento da concretização do negócio com o interessado, exigindo-se ainda que seja perfeito, no sentido de eficaz, é que o mediador cumpre o fim precípuo da mediação, razão pela qual, em princípio, apenas nesse momento lhe assiste o direito à remuneração, ressalvadas as exceções previstas na última parte do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 19.º da citada Lei. Portanto, a remuneração do mediador, em princípio, está dependente duma condição essencial, também dita de condição suspensiva, que se traduz na realização do negócio objeto do contrato de mediação. E, nesse sentido, sempre se vem afirmando que, em geral, a lei exige que haja uma relação causal entre a atuação do mediador e a conclusão do contrato. Ora, da atividade que desenvolveu, a Demandada angariou interessados compradores e recebeu a comissão devida pelo seu trabalho por inteiro, como resulta da factualidade dada como provada. É inequívoco, em face da matéria de facto provada e perante o quadro jurídico aplicável in casu que o negócio se concretizou entre esses interessados, angariados pela Demandada [ORG-6], Lda., e os Demandantes, não sendo a Demandada parte contratual do mesmo. Contudo, passando a integrar a matéria de facto que ficou provada naquilo que fica exposto é desde logo patente que, ainda assim, a Demandada encetou todos os esforços que lhe foram possíveis para que as despesas devidas aos Demandantes pelos promitentes compradores lhes fossem pagas. Basta atentar ao teor dos emails e mensagens juntas aos autos com a contestação a fls. 62 e ss. E se os Demandantes quisessem, poderiam até ter descontado o valor de tais despesas ao valor de comissão pago à Demandada, mas não o fizeram. Ademais, os promitentes compradores fizeram uma transferência de €128,18 (cento e vinte e oito euros e dezoito cêntimos), para a conta dos Demandantes, o que demonstra que era da parte destes e com estes que deveria ter sido alcançado um entendimento cabal quanto ao montante e data para pagamento integral de todas as despesas suportadas pelos Demandantes. É certo que o aditamento redigido nunca chegou a ser assinado pelos promitentes compradores, mas também é certo que a Demandada encetou todos os esforços para que o fosse. A obrigação contratual da Demandada era a de diligenciar pela venda do prédio, o que foi integralmente cumprido, tanto mais que lhe foi paga a comissão devida por tal serviço na íntegra por banda dos aqui Demandantes, como já supra se referiu. A mediadora Demandada cumpriu de forma escrupulosa as obrigações decorrentes do contrato de mediação imobiliária, sendo que nenhuma responsabilidade lhe é de assacar no que toca a eventuais despesas suportadas pelos Demandantes pelo atraso na realização da escritura. Como refere [PES-7], Contrato de Mediação Imobiliária, in Datavenia, Revista Jurídica Digital, Ano 4, nº 06, pág. 96, “Estando acordada a remuneração no momento do contrato-promessa, aquela é devida com a celebração do dito, ainda que este não venha a ser cumprido e não venha a ser celebrado o contrato definitivo. Cumprir ou fazer cumprir o contrato-promessa está na disponibilidade dos respetivos contraentes; a mediadora é alheia ao assunto.” Ora, o mesmo se poderá do aditamento ao contrato de promessa, o qual não chegou a ser assinado pelos promitentes compradores, mesmo após os Demandantes terem estado com eles e até mesmo na ocasião da escritura, em que não se falou do assunto, nem foram apresentadas despesas nesse dia, tendo ainda assim anteriormente à escritura e até mesmo depois desta, a Demandada encetado esforços para que os promitentes compradores pagassem as despesas aos Demandantes. In casu, face à matéria de facto dada como provada e ao direito aplicável verifica-se a exceção perentória de ilegitimidade substantiva da Demandada que necessariamente conduzirá à absolvição do pedido. “I - Ao apuramento da legitimidade processual - pressuposto processual que se reporta à relação de interesse das partes com o objeto da ação e que, a verificar-se, conduz à absolvição da instância - releva, apenas, a consideração do concreto pedido e da respetiva causa de pedir, independentemente da prova dos factos que integram a última e do mérito da causa. A legitimidade processual afere-se pela titularidade da relação material controvertida tal como é configurada pelo Autor, na petição inicial, e é nestes termos que tem de ser apreciada. II - A legitimidade substancial ou substantiva respeita à efetividade da relação material. Prende-se com o concreto pedido e a causa de pedir que o fundamenta e, por isso, com o mérito da causa, sendo requisito da procedência do pedido. A verificação da ilegitimidade substantiva leva à absolvição do pedido. III - Apesar de a Autora ser dotada de legitimidade ativa, pressuposto processual já considerado, pacificamente, verificado, em termos tabelares, no despacho saneador, bem decidida se mostra a questão diversa, da falta de legitimidade substantiva, dada a manifesta falta do direito que pretende fazer valer e a manifesta inviabilidade das pretensões...” - Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 04/10/2021, proferido no âmbito do processo n.º 1910/20.4T8PNF.P1 da 5.ª secção. Assim sendo, e sem necessidade de mais considerações, terá a presente ação de improceder. * DO PEDIDO DE CONDENAÇÃO DOS DEMANDANTES COMO LITIGANTES DE MÁ FÉ POR PARTE DA DEMANDADA EM VALOR NÃO INFERIOR A €5.000,00.Veio a demandada pedir a condenação dos demandantes por evidente litigância de má fé, no pagamento de multa e indemnização, de valor não inferior a €5.000,00 (cinco mil euros). Invoca, para o efeito e sumariamente que os demandantes vêm deduzir factos cuja falta de fundamento não ignoram, visando apenas entorpecer a ação da justiça (artigo 542.º, n.º 2, als. a) e d) do Código do Processo Civil). CUMPRE APRECIAR E DECIDIR. Dispõem as alíneas a) e d) do artigo 542.º, n.º 2 do Código do Processo Civil o seguinte: “Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar. … d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.” Tal dispositivo pretende sancionar, a par da litigância dolosa, também a litigância temerária baseada em situações de erro grosseiro ou culpa grave, com o intuito de conseguir uma maior responsabilização das partes. Assim, estão incluídos nesta disposição legal quer os casos em que se resulte dos autos que o litigante tinha consciência de não ter razão, como também os casos de lide temerária, em que basta que fosse exigível ao litigante ter essa consciencialização. Ora, como é entendimento dominante da jurisprudência, a responsabilização e condenação da parte como litigante de má-fé só deverá ocorrer quando se demonstre nos autos, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu, conscientemente, com dolo ou negligência grave, de forma manifestamente reprovável, com vista a impedir ou a entorpecer a ação da justiça, ou, a deduzir pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar. “I – A má fé substancial verifica-se quando a atuação da parte se reconduz às práticas aludidas nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 542.º, do Código do Processo Civil, enquanto a má fé instrumental se encontra prevista nas alíneas. c) e d) do mesmo artigo; II – Em qualquer dessas situações nos encontramos perante uma intenção maliciosa ou uma negligência de tal modo grave ou grosseira que, aproximando-a da atuação dolosa, justifica um elevado grau de reprovação e idêntica reação punitiva. III - A condenação como litigante de má fé assenta num juízo de censura sobre um comportamento que se revela desconforme com um processo justo e leal, que constitui uma emanação do princípio do Estado de Direito.” - Ac. STJ de 12/11/2020, no Proc. 279/17.9T8MNC-A. G1. S1 da 7ª secção (cível). Daqui resulta que a parte deverá ser sancionada como litigante de má-fé somente quando o processo fornecer elementos seguros da conduta dolosa ou gravemente negligente, o que no caso concreto não se verificou, afigurando-se ao Tribunal que o comportamento dos demandantes não é indiciador de uma litigância manifestamente reprovável, que justifique a aplicação da sanção requerida. Isto porque o Tribunal se pôde aperceber que não dominam a área jurídica, sendo ainda certo que litigaram desacompanhados de Advogado. A litigância de má-fé não pode ser confundida com a manifesta improcedência da pretensão deduzida. Na verdade, a condenação de uma parte como litigante de má-fé consolida um autêntico juízo de censura sobre a sua atuação processual, face ao uso que possa ter feito de mecanismos legais postos ao seu dispor. A proibição da litigância de má-fé assenta, pois, num princípio de natureza puramente processual, não estando em causa violações de posições de direito substantivo, mas sim, e tão-somente, a ofensa a posições ou deveres processuais. Tudo ponderado, improcede o pedido de condenação dos Demandantes como litigantes de má fé por parte da Demandada. * IV. DECISÃOFace ao que antecede e às disposições legais aplicáveis, julgo a ação totalmente improcedente, por não provada e, por via disso: a) Absolvo a Demandada [PES-3] – Imobiliária, Lda. dos pedidos formulados pelos Demandantes [PES-1] e [PES-2]. b) Absolvo os Demandantes [PES-1] e [PES-2] quanto ao pedido de condenação como litigantes de má fé formulado pela Demandada [ORG-3] – Imobiliária, Lda. * As custas, no montante de €70,00 (setenta euros) serão a suportar pelos Demandantes, os quais deverão efetuar o pagamento num dos 3 dias subsequentes ao conhecimento da presente decisão, sob pena de incorrer numa sobretaxa de € 10,00 por cada dia de atraso no cumprimento dessa obrigação. (Artigo 527.º do Código de Processo Civil - aplicáveis ex vi do artigo 63.º da Lei dos Julgados de Paz - e artigo 2.º n.º 1 al. b) e n.º 3 e 3.º n.º 3 da Portaria n.º 342/2019, de 1 de outubro).* Registe e notifique.*** Cantanhede, 28 de maio de 2024A Juíza de Paz, Marta Santos Processado por meios informáticos e revisto pela signatária. Verso em branco. (art. 18º da LJP ) |