Sentença de Julgado de Paz
Processo: 70/2022-JPCBR
Relator: CRISTINA EUSÉBIO
Descritores: CRISTINA EUSÉBIO
Data da sentença: 09/19/2024
Julgado de Paz de : COIMBRA
Decisão Texto Integral: Proc.º n.º 70/2022-JPCBR

SENTENÇA

RELATÓRIO:

[PES-1] E [PES-2] , identificadas a fls. 1 propuseram contra [ORG-1] LDA, [PES-3] E [PES-4], igualmente devidamente identificados nos autos, a presente ação declarativa de condenação, pedindo que estes fossem condenados a devolver-lhes a quantia de 600,00€ (seiscentos euros) quantia que lhes foi entregue para fornecimento e montagem de janelas e portas nas residências das demandantes.
Para tanto, alegaram os factos constantes do seu Requerimento Inicial de fls. 1 a 3, que se dá por reproduzido, e juntaram 4 documentos (fls. 4 a 12) que, igualmente, se dão por reproduzidos. –
Após várias tentativas de citação dos demandados, foi obtida a informação de que a empresa demandada teria sido declarada insolvente. Consultada a certidão permanente constatou-se que, de facto, por sentença de 30 de junho de 2022 a 1ª demandada foi declarada insolvente, tendo o processo sido declarado encerrado em 15.11.2022.
Por despacho de fls. 74 foi a instância declarada extinta quanto à primeira demandada.
O segundo e terceira demandados foram declarados ausentes, por impossibilidade de proceder à sua citação pessoal pelos meios ao dispor do Julgado de Paz, tendo sido nomeadas defensoras oficiosas para a sua representação, que foram regularmente citadas.
O demandado [PES-3] apresentou a sua contestação de fls 102 a 103 alegando que do requerimento inicial não se pode aferir da sua real intenção de incumprir o contrato celebrado, em face de se desconhecer o motivo da sua ausência.

A demandada [PES-4] não apresentou contestação.

TRAMITAÇÃO E SANEAMENTO
Na data designada para a realização da Audiência de Julgamento, esta realizou-se com cumprimento das formalidades legais conforme da respetiva ata melhor se alcança.
O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do território e do valor - que se fixa em 600,00€ – artºs 297º nº1 e 306º nº2, ambos do C. P. C.
A questão a decidir por este tribunal circunscreve-se ao incumprimento contratual por parte dos Demandados e a medida das respetivas responsabilidades.

FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Resultaram provados os seguintes factos:
1 – A empresa [ORG-2] Lda era uma sociedade comercial que se dedicava à serralharia civil, construção e obras públicas, tendo como único sócio e gerente o demandado [PES-3].
2 – As demandantes contactaram a referida empresa para a execução de diversos trabalhos em PVC nas respetivas habitações, na pessoa do 2º demandado.
3 – Na habitação da primeira demandante, os trabalhos consistiam na substituição de duas janelas de sótão, com estore interior;
4 – Na habitação da segunda demandante os trabalhos consistiam na criação de uma separação com portas de PVC e vidro entre a sala e a marquise.
5 – No dia 28 de novembro de 2020, o segundo demandado apresentou à 1ª demandante, o orçamento com a descrição dos trabalhos e respetivo valor – 600,00€, que esta aceitou. (doc. Fls. 6).
6 – Em 30 de novembro de 2020, a 1ª demandante entregou ao demandado a quantia de 300,00€ correspondente à adjudicação dos trabalhos, que deveriam ser concluídos 15 dias após a mesma.
7 – Por mensagem de texto, o demandado enviou o orçamento à 2ª demandante no valor de 650,00€, com prazo de entrega em 21 de março de 2021 ( cfr. fls.7).
8 – Para pagamento do valor de 300,00€ relativo á adjudicação dos trabalhos, o demandado solicitou a transferência do valor para o NIB 00100004213081000177, correspondente a uma conta titulada pela demandada [PES-4].( cfr. doc. Fls. 9 e 10).
9 – Em 12 de fevereiro de 2021, a demandante [PES-9] procedeu à transferência bancária do valor de 300,00€ como solicitado.
10 – As demandantes, por diversas vezes, ao longo dos anos de 2020 e 201, insistiram com o demandado, por telefone e mensagens escritas para executar os trabalhos contratados.
11- Os trabalhos constantes dos orçamentos não foram executados, nem foi restituído qualquer valor à demandantes, como solicitaram.
Não resultaram provados outros factos com interesse para a decisão da causa.

MOTIVAÇÃO
A matéria dada por provada resulta dos documentos juntos aos autos - que não foram impugnados - conjugados com as declarações das demandantes, que relataram de forma convincente as circunstâncias da contratação.
Mais referiram que entregaram ao demandado as quantias de 300,00€ cada uma na adjudicação dos trabalhos. A demandante Idalina entregou, em numerário a quantia de 300,00€ ao demandado e a demandante Liliana procedeu á transferência bancária para a conta da demandada, sabendo que esta vive maritalmente com o demandado e que têm dois filhos.

Os valores foram entregues aos demandados – em numerário e para conta pessoal - , sem que a empresa tenha emitido qualquer fatura ou recibo, pelo que os demandados fizeram seus aqueles montantes. – Não entrando no património social.

FUNDAMENTAÇÃO - MATÉRIA DE DIREITO
O contrato celebrado entre Demandantes e 1ªDemandada é uma modalidade do Contrato de Prestação de Serviços, na forma de Empreitada, previsto no Art.º 1207.º do Código Civil (CC), o qual dispõe que “Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.”
Sucede, porém, que a empresa contratada nunca procedeu a qualquer trabalho, incumprindo o contrato.
Por outro lado, os montantes adiantados pelas demandantes não integraram o património da empresa, tendo os demandados [PES-3] e [PES-4] feito seus aqueles montantes pagos em numerário e por transferência para a conta pessoal.
O art.º 473.º do C. Civil estabelece o princípio geral do enriquecimento sem causa, referindo no seu n.º 1: “Aquele que sem causa justificativa, enriquecer à custa de outrem é obrigado a restituir aquilo com que injustamente se locupletou.” Acrescenta o nº 2 deste artigo que a obrigação de restituir por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objeto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido em virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou.
As demandantes procederam ao pagamento das quantias em causa, na expectativa da celebração de um contrato com a empresa [ORG-3] Lda mas, na verdade entregaram as quantias ao demandados que as fizeram suas, sem que a empresa tenha feito qualquer trabalho ou emitido os competentes documentos contabilísticos que comprovassem que haviam integrado o respetivo património.
Assim, devem os demandados restituir os valores com os quais se locupletaram.

DECISÃO
Em face do exposto e das disposições legais aplicáveis, julga-se a presente ação procedente por provada e, em consequência, condenam-se os Demandados a, solidariamente, restituir às Demandantes a quantia de 600,00€(seiscentos euros), ou seja 300,00€ à demandante [PES-10] e 300,00€ à demandante [PES-11].

CUSTAS
Custas a cargo dos demandados, que por se tratarem de ausentes, representados por defensor oficioso, há lugar a isenção de custas, mantendo a harmonia do sistema com o disposto na alínea l), do n.º 1, do artigo 4.º, do RCJ, por força do artigo 63.º, da LJP que, interpretado de forma abrangente, remete para todo o processamento jurisdicional civilística, e não apenas para o código de processo civil (cf. artigos 9º e 10º do Código Civil e Deliberação nº 5/2011, de 8 de fevereiro de 2011 do Conselho dos Julgados de Paz).


Registe.

Nos termos do disposto no art. 60º n.º 3 da LJP notifique os Serviços do Ministério Publico.


Coimbra, 19 de setembro de 2024


A Juíza de Paz,



(Cristina Eusébio)