Sentença de Julgado de Paz
Processo: 98/2023-JPSTB
Relator: CARLOS FERREIRA
Descritores: SUBEMPREITADA DE CONSTRUÇÃO CIVIL – RESOLUÇÃO DO CONTRATO POR INCUMPRIMENTO DEFINITIVO.
Data da sentença: 05/17/2024
Julgado de Paz de : SETÚBAL
Decisão Texto Integral: 98/2023-JPSTB
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Sentença
Parte Demandante: ---
ORGANIZAÇÃO 1, Lda., sociedade comercial com o número único de matrícula e pessoa coletiva xxxx xxxx, com sede na LOCALIZAÇÃO 1 3060-522 Portunhos, legalmente representada por PESSOA 1. ----
Mandatários: Dr.ª PESSOA 2 , e Dr. PESSOA 3, Advogados ambos com escritório na Av. LOCALIZAÇÃO 2, 3000-177 Coimbra. -
Parte Demandada: ----
ORGANIZAÇÃO 2 -, Lda, sociedade comercial com o número único de matrícula e pessoa coletiva xxxx xxxx, com sede na Rua LOCALIZAÇÃO 3, 2910-061 Setúbal ---
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Matéria: Ações que respeitem a incumprimento contratual, exceto contrato de trabalho e arrendamento rural, al. i), do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho, doravante designada por Lei dos Julgados de Paz. ---
Objeto do litígio: Subempreitada de construção civil – resolução do contrato por incumprimento definitivo. ---
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Relatório: ---
A Demandante instaurou a presente ação, nos termos do requerimento inicial constante de fls. 4 a 8, que aqui se declara integralmente reproduzido peticionando a condenação da Demandada a pagar-lhe a quantia global de €2.197,14 (dois mil cento e noventa e sete euros e catorze cêntimos). ---
Para tanto, alegou em síntese que acordou com a Demandada a realização de trabalhos de construção civil, numa obra e decorrer na Rua LOCALIZAÇÃO 4, 2904-516, em Setúbal. -
A Demandante pagou a quantia de €2.197,14, para adjudicação dos trabalhos e princípio de pagamento do preço. ---
No entanto, a Demandada não iniciou os trabalhos, nem restituiu o valor que recebeu por conta do preço do serviço. ---
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A Demandada faltou injustificadamente à sessão de pré-mediação.
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Regularmente citada, a Demandada não apresentou contestação, e estando regularmente notificada para o efeito, não compareceu à audiência de julgamento, nem justificou a sua falta no prazo legal. -
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Nos termos do art.º 60.º, n.º 1, al. c), da Lei dos Julgados de Paz, a sentença inclui uma sucinta fundamentação. ---
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Fundamentação – Matéria de Facto: ---
Com interesse para a resolução da causa, tendo em conta as várias soluções jurídicas plausíveis, ficou provado que: ---
1. Ambas as partes dedicam-se, entre outras, à atividade profissional de trabalhos de construção civil, fls. 27 a 29; ---
2. No âmbito das respetivas atividades comerciais, a Demandante adjudicou trabalhos de construção civil à Demandada, a realizar numa obra a decorrer na Rua da Velha Alfândega, n.º 3 e 5, 2904-516, em Setúbal. ---
3. Em 30-09-2022, a Demandada emitiu a fatura n.º 043, no montante €2.789,64, fls. 13. --
4. Em 03-10-2022, a Demandante pagou a quantia de €2.789,64, para pagamento parcial do preço estipulado para o negócio, fls. 11. ---
5. Os trabalhos deveriam ter iniciado em 10-10-2023, e ficado concluídos em 14-10-2023; ---
6. A Demandada colocou material em obra, no valor global de €592,50, fls. 17; ---
7. No entanto, a Demandada não iniciou os trabalhos. ---
8. A Demandante interpelou a Demandada para a devolução do valor pago, fls. 17 a 19. ---
9. A Demandada não restituiu a quantia que recebeu por conta do preço do serviço. ---
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Motivação da Matéria de Facto: ---
Nos termos do disposto no n.º 2, do art.º 58.º, da Lei dos Julgados de Paz, “Quando o Demandado, tendo sido pessoal e regularmente citado, não comparecer no dia da audiência, não apresentar contestação escrita, nem justificar a falta no prazo de três dias, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor.” ---
Atento à verificação cumulativa dos requisitos legais para a revelia operante da Demandada, ou seja, a falta de apresentação de contestação e a sua falta injustificada à audiência de julgamento, dou por confessados os factos articulados pelo Demandante no seu requerimento inicial, os quais foram compaginados com os documentos juntos aos autos. ---
Deste modo, a fixação da matéria de facto dada como provada teve por base a confissão da Demandada e os documentos juntos aos autos. ---
Consigna-se que, para apuramento da matéria de facto não foi considerado o teor do requerimento inicial com matéria tida por irrelevante, conclusiva ou de direito. --
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Fundamentação – Matéria de Direito: ---
Os factos da causa remetem-nos para a matéria do contrato de empreitada, com vista à realização de trabalhos de construção civil. ---
Do pedido deduzido pela Demandante extrai-se a pretensão de obter a condenação da Demandada ao pagamento da quantia global €2.197,14, porque esta não realizou a prestação contratual nos termos a que estava obrigada. ---
Vejamos se lhe assiste razão, perspetivando dar resposta às questões acima enunciadas: ---
A noção de empreitada é legalmente estabelecida como, “o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço.” (cfr., art.º 1207.º, do Código Civil). –
Da empreitada derivam obrigações recíprocas e interdependentes para ambas as partes. Assim, com a celebração do contrato, nasce para o empreiteiro a obrigação de realizar a obra nas condições acordadas e sem vícios; e para o dono da obra, como contrapartida, nasce o dever de pagar integralmente o preço. ---
Por sua vez, nos termos do artigo 1213.º, do Código Civil, a subempreitada tem como pressupostos, a existência de um contrato prévio de empreitada, nos termos do qual o empreiteiro se vincula a realizar uma obra, e a celebração de um segundo negócio jurídico, por cujos termos o subempreiteiro se obriga, para com o empreiteiro, a realizar toda ou parte da mesma obra.---
Assim, a subempreitada está sempre subordinada a um contrato de empreitada pré-existente, em que o subempreiteiro se apresenta como um “empreiteiro do empreiteiro”, também adstrito a uma obrigação de resultado. ---
Deste modo, no contrato de subempreitada o empreiteiro torna-se dono da obra em relação ao subempreiteiro, devendo aplicar-se nas relações entre empreiteiro e subempreiteiro, em tudo o que não esteja expressamente previsto, o regime legal aplicável nas relações entre o dono da obra (aqui o empreiteiro) e o empreiteiro (no caso, o subempreiteiro. ---
Pelo facto de ambas as partes serem profissionais do setor da construção que atuaram no âmbito das respetivas atividades comerciais, na celebração de um contrato para trabalhos a realizar numa obra adjudicada à Demandante, o contrato enquadra-se no conceito de subempreitada, cf., artigo 1213.º, do Código Civil. ---
Pela matéria provada resulta que, entre a Demandante e a Demandada foi celebrado um contrato, de prestação de serviços, mais concretamente de subempreitada, mediante o qual a Demandada se obrigou à execução de determinados trabalhos de construção civil. ---
Estabelece o art.º 406.º, n.º 1, do Código Civil, que os contratos devem ser pontualmente cumpridos, e só podem modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei. ---
A lei determina que o devedor cumpre a sua obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado, a qual, salvo convenção em contrário, deverá ser realizada integralmente e não por partes (cf., artigos 762.º, e 763.º, ambos do Código Civil). ---
Por outro lado, no âmbito da responsabilidade contratual, como no caso dos autos, tem aplicabilidade o disposto no art.º 799.º, do Código Civil, que estabelece uma presunção legal de culpa do devedor, incumbindo-lhe provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua. ---
Ficou provado que a Demandada recebeu parte do preço destinado ao pagamento parcial do preço estipulado para o negócio, e que a Demandada não executou os trabalhos. ---
No caso dos autos, a Demandada não efetuou a sua prestação nos termos em que estava adstrita, por culpa que lhe é imputável (artigo 798.º do Código Civil), originando o incumprimento da obrigação, com a sua consequente responsabilidade. ---
Assim, a Demandada incumpriu definitivamente o contrato, com culpa sua. ---
Deste modo, cabe à Demandante a resolução do contrato por perda objetiva do interesse contratual. -
A resolução do contrato implica a restituição daquilo que foi prestado. ---
Ora, da matéria provada resulta que a Demandante realizou um pagamento na quantia de €2.789,64.
Ficou ainda provado que a Demandada colocou material em obra no valor correspondente à quantia de €592,50. ---
Assim, conforme peticionado, a restituição terá de corresponder ao valor pago em excesso pela Demandante, tendo sido confessada pela Demandada a quantia de €2.197,14. ---
Deste modo, a ação deve proceder na sua totalidade. ---
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Decisão: ---
Atribuo à causa o valor de €2.197,14 (dois mil cento e noventa e sete euros e catorze cêntimos), por corresponder à quantia em dinheiro que a Demandante pretendia obter no momento da propositura da ação, cf., normas conjugadas dos artigos 306.º, n.º 1; 297.º, n.º 1; e 299.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi, art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz. ---
Pelo exposto e com os fundamentos acima invocados: ---
Julgo a presente ação totalmente procedente, por provada, e consequentemente, condeno a Demandada a pagar ao Demandante a quantia global de €8.920,00 (oito mil novecentos e vinte euros). ---

Custas: ---
A taxa de justiça no montante de €70,00 (setenta euros) a cargo da Demandada, por ter ficado vencido, nos termos da primeira parte, da al. b), do n.º 1, do art.º 2.º, da Portaria n.º 342/2019, de 1 de outubro. ---
O pagamento deverá ser feito no prazo de três dias úteis, mediante liquidação da respetiva guia de pagamento (DUC), emitido pela secretaria do Julgado de Paz. ---
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Extraia e notifique a guia de pagamento (DUC), ao responsável pelo pagamento das custas juntamente com cópia da presente decisão. ---
Após os três dias úteis do prazo legal para o pagamento, aplica-se uma sobretaxa no montante de €10,00 (dez euros), por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação, até ao máximo de €140,00 (cento e quarenta euros). ---
O valor da sobretaxa aplicável acresce ao montante da taxa de justiça em dívida. ---
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Após trânsito, verificando-se a falta de pagamento das custas, mesmo após o acréscimo da referida sobretaxa legal, conclua para emissão de certidão para efeitos de execução fiscal, a instaurar junto dos competentes serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), pelo valor das custas em dívida acrescidas da respetiva sobretaxa. ----
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Registe. ---
Notifique pessoalmente em sede de audiência de discussão e julgamento, nos termos do disposto no artigo 60.º, n.ºs 1 e 2, da Lei dos Julgados de Paz. ---
Envie cópia da presente decisão aos intervenientes processuais que faltaram à sessão, cf., artigo 46.º, n.º 3, da Lei dos Julgados de Paz. ---
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Julgado de Paz de Setúbal, 17 de maio de 2024
O Juiz de Paz

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Carlos Ferreira