Sentença de Julgado de Paz
Processo: 295/2024-JPSTB
Relator: CARLOS FERREIRA
Descritores: PAGAMENTO DE PRESTAÇÕES RELATIVAS A DESPESAS E SERVIÇOS DE CONDOMÍNIO
Data da sentença: 12/10/2024
Julgado de Paz de : SETÚBAL
Decisão Texto Integral:
Proc. n.º 295/2024-JPSTB

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Resumo da decisão:

- Condena a parte demandada a pagar à parte demandante a quantia de €5.145,56.

- A parte demandada tem custas a pagar na quantia de €70,00 no prazo de 3 dias úteis.


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Sentença


Parte Demandante: ---

Condomínio do [ORG-2], [Cód. Postal-1] [...], entidade equiparada a pessoa coletiva com o NIPC[NIPC-1]. ----

Representante Legal: [PES-1], com domicílio na [...], n.º 5, 5.º Dt. º, [Cód. Postal-1] [...]. ---

Mandatários: Dr. [PES-2], Advogado, e Dr. [PES-4], Advogado-estagiário, ambos com escritório no [...], n.º 148, 3.º L, [Cód. Postal-2] [...]. ---

Parte Demandada: ---

[PES-3], contribuinte fiscal número [NIF-1], residente na [...], n.º 5, 1.º Dt. º, [Cód. Postal-1] [...]. ---


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Matéria: Direitos e deveres de condóminos, al. c), do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho, doravante designada por Lei dos Julgados de Paz. ---

Objeto do litígio: Pagamento de prestações relativas a despesas e serviços de condomínio. ---


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Relatório: ---

O Demandante instaurou a presente ação, nos termos do requerimento inicial constante de fls. 4 a 8, que aqui se declara integralmente reproduzido, peticionando a condenação do Demandado nas quotas de condomínio vencidas e não pagas, acrescidas de penalização regulamentar, na quantia global de €5.155,52, bem como, das quotas vincendas na pendência da ação. --

Juntou procuração forense e documentos. ---

Regularmente citado, o Demandado não apresentou contestação, e estando regularmente notificado para o efeito, não compareceu à audiência de julgamento, nem justificou a sua falta no prazo legal. -


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Nos termos do art.º 60.º, n.º 1, al. c), da Lei n.º 78/2001, de 13/07, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31/07 (Lei dos Julgados de Paz), a sentença inclui uma sucinta fundamentação. ---

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Fundamentação – Matéria de Facto: ---

Com interesse para a resolução da causa, ficou provado que: ---

1. Desde 13-03-2019, o Demandado tem registada em seu nome a aquisição total da fração designada pela letra “C”, correspondente ao primeiro andar direito, destinado a habitação, do prédio constituído em propriedade horizontal, sito na [...], n.º 5, [Cód. Postal-1] [...], descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de [...], ficha n.º 80, da freguesia de [...] ([...]), cf. fls. 9 e10;---

2. O Demandado não pagou nas respetivas datas de vencimento, nem posteriormente, as quotas de condomínio vencidas em junho de 2019, e seguintes; ---

3. Até ao mês de fevereiro de 2024, a quota correspondia à mensalidade de €25,00; ---

4. Por deliberação da assembleia dos condóminos constante na ata n.º 1/2024, da reunião da assembleia dos condóminos datada de 03-04-2024, ficou deliberado alterar a mensalidade da quota de condomínio imputável a referida fração, para a quantia de €46,68, cf., fls. 18 a 40; ---

5. As quotas vencem ao dia 8 (oito) de cada mês, idem; ---

6. Até à entrada da ação venceram-se quotas não pagas, que totalizavam a quantia de €4.630,52; ---

7. Após a entrada da ação venceram-se as quotas correspondentes aos meses de outubro de 2024 a dezembro de 2024, inclusive, no montante de €46,68, cada. ---

8. Na ata da assembleia dos condóminos acima mencionada consta o seguinte: “Foi deliberado e aprovado por unanimidade dos presentes a aplicação de uma penalização, no valor mínimo de 525,00 (Quinhentos e vinte e cinco euros) aos condóminos incumpridores que apresentem quotizações de condomínio vencidas e não pagas” (sic), fls. 18 a 40; ---

9. Com a entrada da presente ação o Demandante aplicou ao Demandado uma pena pecuniária no montante de €525,00; ---

10. Na pendência da ação o Demandado efetuou os seguintes pagamentos: ---

a. Em 12-09-2024, €50,00, fls. 60; ---

b. Em 10-10-2024, €50,00, fls. 61; ---

c. Em 11-11-2024, €50,00. Fls. 62. ---


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Motivação da Matéria de Facto: ---

Nos termos do disposto no n.º 2, do art.º 58.º, da Lei dos Julgados de Paz, “Quando o demandado, tendo sido pessoal e regularmente citado, não comparecer no dia da audiência, não apresentar contestação escrita, nem justificar a falta no prazo de três dias, consideram-se confessados os factos articulados pelo autor.” ---

Atento à verificação cumulativa dos requisitos legais para a revelia operante do Demandado, ou seja, a falta de apresentação de contestação e a sua falta injustificada à audiência de julgamento, dou por confessados os factos articulados pelo Demandante no seu requerimento inicial. ---

Deste modo, a fixação da matéria de facto dada como provada teve por base a confissão do Demandado e os documentos juntos aos autos, nomeadamente, as atas da assembleia dos condóminos, nas quais constam a deliberação com a eleição do administrador; a aprovação do orçamento, mencionando a mensalidade do condomínio, e bem assim, a pena pecuniária respeitante ao incumprimento. ---

Foi ainda considerada a informação da conservatória do registo predial, na qual consta o registo da aquisição da fração identificada nos autos a favor do Demandado. ---

Consigna-se que, para apuramento da matéria de facto não foi considerado o teor do requerimento inicial com matéria tida por irrelevante, conclusiva ou de direito. ---


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Fundamentação – Matéria de Direito: ---

A relação material controvertida circunscreve-se ao incumprimento por parte do Demandado, da obrigação de pagamento da sua quota-parte de contribuição para as despesas geradas pelo condomínio, e quais as consequências que derivam de tal facto. ---

Vejamos se lhe assiste razão ao Demandante: ---

A propriedade horizontal encontra-se regulada, designadamente, nos artigos 1414.º, e seguintes, do Código Civil. ---

Do regime legal da propriedade horizontal resulta que a posição de condómino confere direitos e obrigações, assentando na dicotomia existente entre o direito de usufruir das partes comuns do edifício e a obrigação de contribuir para as despesas comuns de manutenção, conservação e serviços de interesse comum, abreviadamente despesas comuns. ---

A liquidação das despesas comuns advém, necessariamente, das receitas cobradas para esse efeito.

Na categoria das receitas do condomínio avultam as quotas dos condóminos, ou seja, a sua quota-parte de contribuição para liquidação das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento dos serviços de interesse comum, enquadrando-se nessa categoria as quotas ordinárias e extraordinárias de condomínio, a pagar por cada condómino, em princípio, na proporção do valor das respetivas frações, relativamente ao capital investido no edifício (cf., art.º 1424.º, n.º 1, do Código Civil). ---

A obrigação de contribuir para as despesas comuns encontra-se estabelecida no art.º 1424.º, n.º 1, do Código Civil, o qual dispõe que, “Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e relativas ao pagamento de serviços de interesse comum são da responsabilidade dos condóminos proprietários das frações no momento das respetivas deliberações, sendo por estes pagas em proporção do valor das suas frações”. ---

Temos assim que, a obrigação de contribuir para as despesas comuns de manutenção e conservação do edifício, na proporção da respetiva fração autónoma face ao capital investido no edifício, é uma obrigação que decorre expressamente da letra da lei, a qual assume natureza pecuniária, nos termos do citado art.º 1424.º, do Código Civil. Pelo que, o incumprimento da referida obrigação torna o devedor responsável pelos prejuízos que daí possam resultar para o condomínio, nos termos gerais das obrigações (cfr., art.º 798.º, do Código Civil).

O administrador do condomínio tem competências funcionais estabelecidas no art.º 1436.º, do Código Civil, cabendo-lhe a legitimidade material para agir em juízo no âmbito das suas competências (cf., art.º 1437.º, do Código Civil). ---

Uma das funções do administrador do condomínio consiste em cobrar as receitas e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, conforme resulta das alíneas d), e f), do n.º 1, do art.º 1436.º, do Código Civil. ---

Aliás, resulta do disposto no n.º 4, do art.º 6.º, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25/10, que o administrador tem o dever de instaurar a ação de cobrança contra o condómino que não liquide atempadamente as quantias respeitantes à sua quota-parte de contribuição para as despesas comuns. ---

Ficou provado que, até à entrada da ação, o Demandado não pagou atempadamente quotas que se venceram, acumulando dívida no montante global de €4.630,52. ---

Ora, o pagamento da contribuição para as despesas comuns constitui uma obrigação irrenunciável para os condóminos, no sentido em que, enquanto comproprietários das zonas comuns do edifício não se podem eximir do vínculo ou recusar-se ao cumprimento, total ou parcialmente. ---

Assim, é inequívoca a responsabilidade do Demandado relativamente à referida quantia, pelo que, a ação deverá proceder nesta parte do pedido. ---

O Demandante vem ainda peticionar as quotas vencidas no decurso da ação. ---

Por efeito do fracionamento da quota anual em prestações, com vencimento calendarizado, a referida obrigação de contribuir para as despesas comuns assume carácter periódico. ---

Deste modo, as quotas vencidas na pendência da ação correspondem a prestações futuras, cujo pagamento pode ser exigido nos termos do n.º 1, do art.º 557.º, Código de Processo Civil; ou seja, tratando-se de prestações periódicas, caso o devedor deixe de pagar, podem compreender-se no pedido, e na condenação, tanto as prestações já vencidas como as que se vencerem enquanto subsistir a obrigação. ---

Pelo que, deve proceder o pedido de condenação relativamente às quotas vencidas na pendência da presente ação, sendo exigível e devido o seu pagamento, uma vez que, a contribuição para as despesas comuns constitui uma obrigação legal, que o Demandado não desconhece, ou desconhecendo, está obrigado a conhecer, cf., art.º 1436.º, n.º 1, als. d) e f), do Código Civil. ---

Ficou provado que, durante a pendência da ação venceram-se quotas mensais correspondentes aos meses outubro a dezembro (dado que, a quota vence ao dia 8 de cada mês), na quantia mensal de €46,68, cada, que totalizam o montante de €140,04. ---

Pagamentos parciais efetuados na pendência da ação: ---

Ficou ainda provado que o Demandado efetuou pagamentos parciais do valor em dívida, que totalizam o montante de €150,00. ---

Assim, os referidos pagamentos devem ser considerados a crédito para apuramento do valor final do direito de crédito do Demandante. ---

Sendo assim, resulta da matéria provada que, o Demandado não pagou as quotas de condomínio, acumulando uma dívida que na presente data ascende ao montante de €4.620,56 (considerando a diferença entre débitos e créditos). ---

Pelo que, a ação deve ser declarada procedente nesta parte do pedido. ----

Relativamente às penalizações aplicadas pelo Demandante, cumpre dizer o seguinte: ---

Nos termos do disposto no art.º 805.º, n.º 2, al. a), do Código Civil, há mora do devedor independentemente de interpelação, se a obrigação tiver prazo certo. ---

Por outro lado, no âmbito da propriedade horizontal, vigora o disposto no art.º 1434.º do Código Civil, que permite à assembleia dos condóminos estabelecer a aplicação de penas pecuniárias para sancionar a inobservância das disposições legais do Código Civil, das deliberações da assembleia ou das decisões do administrador. ---

Ora, no caso dos presentes autos a constituição do Demandado em mora decorre diretamente do prazo de vencimento da obrigação, isto é, o momento em que ocorre o facto pelo qual se torna exigível o pagamento de uma determinada mensalidade. ---

Sendo as quotas mensais, e com vencimento ao dia oito de cada mês, conforme resulta da deliberação constante em ata, a obrigação tem prazo certo, pelo que a constituição do Demandado em mora não está dependente de interpelação para o pagamento. ---

Ficou provado que a assembleia dos condóminos aprovou uma deliberação que prevê a aplicação de uma pena pecuniária, no montante de €525,00, nas situações de incumprimento da obrigação do pagamento da mensalidade de condomínio. ---

A aplicação da referida pena pecuniária decorre do teor do requerimento inicial. ---

Deste modo, a ação deve proceder nesta parte do pedido. ---


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DECISÃO

Atribuo à causa o valor de €5.155,52, por corresponder à quantia em dinheiro que o Demandante pretendia obter no momento da propositura da ação, cf., normas conjugadas dos artigos 306.º, n.º 1; 297.º, n.º 2; e 299.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi, art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz. ---

Pelo exposto e com os fundamentos acima invocados: ---

Julgo a presente ação totalmente procedente, por provada, e consequentemente, condeno a Demandada a pagar ao Demandante a quantia global de € 5.145,56, que inclui todas as quotas vencidas e não pagas até ao mês dezembro de 2024, inclusive, e a pena pecuniária aplicada. -

Custas: ---

Taxa de justiça no montante de €70,00 (setenta euros) a cargo da parte Demandada, por ter ficado vencida, nos termos da primeira parte, da al. b), do n.º 1, do art.º 2.º, da Portaria n.º 342/2019, de 1 de outubro. -

O pagamento deverá ser feito no prazo de três dias úteis, mediante liquidação da respetiva guia de pagamento (DUC), emitido pela secretaria do Julgado de Paz. ---

Extraia e notifique a guia de pagamento (DUC), ao responsável pelo pagamento das custas juntamente com cópia da presente decisão. ---

Após os três dias úteis do prazo legal para o pagamento, aplica-se uma sobretaxa no montante de €10,00 (dez euros), por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação, até ao máximo de €140,00 (cento e quarenta euros). ---

O valor da sobretaxa aplicável acresce ao montante da taxa de justiça em dívida. ---

Após trânsito, verificando-se a falta de pagamento das custas, mesmo após o acréscimo da referida sobretaxa legal, conclua para emissão de certidão para efeitos de execução fiscal, a instaurar junto dos competentes serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), pelo valor das custas em dívida acrescidas da respetiva sobretaxa. ----


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Registe e notifique. ---

Julgado de Paz de Setúbal, em 10 de dezembro de 2024

O Juiz de Paz

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Carlos Ferreira