Sentença de Julgado de Paz | ||
| Processo: | 1051/2008-JP | |
| Relator: | MARTA NOGUEIRA | |
| Descritores: | INCUMPRIMENTO CONTRATUAL | |
| Data da sentença: | 03/05/2009 | |
| Julgado de Paz de : | LISBOA | |
| Decisão Texto Integral: | SENTENÇA I – IDENTIFICAÇÃO DAS PARTES E OBJECTO DO LITÍGIO R, Demandante, veio propor contra M, Lda. e C, S.A., Demandadas, ambas melhor identificadas nos presentes autos, a presente acção respeitante a incumprimento contratual, excepto contrato de trabalho e arrendamento rural (alínea i) do nº1 do art. 9º da Lei 78/2001, de 13 de Julho), pedindo a anulação do contrato celebrado com as Demandadas, por violação do dever de informação e por o Demandante os ter celebrado com base em erro, ou, caso assim se não entenda, que sejam considerados resolvidos os contratos com as Demandadas, por incumprimento contratual. Alega, em síntese, que no início de Abril de 2008, teve conhecimento da existência da 1ª Demandada, através de um folheto deixado na sua caixa de correio, tendo preenchido e destacado uma parte desse folheto, solicitando mais informações sobre um plano de saúde familiar, o qual era publicitado no respectivo folheto. Passada cerca de uma semana, foi contactado por um “Técnico de Informação Médica” da M, tendo ficado agendada uma deslocação a sua casa. No dia agendado, o técnico J deslocou-se a casa do Demandante, tendo, nessa data, sido celebrado um contrato com a M, Lda. e com a C, S.A. O objecto do referido contrato consiste num Plano de Assistência Médica e Dentária, tendo como beneficiários, para além do Demandante, a sua esposa e a sua filha. A duração do contrato é de 60 meses e o valor é de € 2.340,00 (dois mil trezentos e quarenta euros), que foram pagos à 1ª Demandada com recurso a um financiamento bancário obtido junto da 2ª Demandada. Alega ainda o Demandante que lhe foi dito pelo referido Técnico que as consultas médicas, no plano de saúde contratado, teriam um valor de cerca de € 12,50 (doze euros e cinquenta cêntimos). Por outro lado, afirma ainda que lhe foi dito pelo mesmo Técnico que poderia cancelar os contratos quando quisesse. A questão do cancelamento foi colocada, segundo o Demandante, diversas vezes, uma vez que a sua esposa estava desempregada na altura. O Demandante afirma que o Técnico da M não os informou de que dispunham de um prazo de 14 dias para, livremente, anular os contratos, dizendo-lhes que o podiam fazer a qualquer momento. No dia 15 de Julho de 2008 dirigiu-se ao Oculista de x, o qual se encontra numa listagem de empresas com quem a M tem acordo, no pressuposto de que beneficiaria de um desconto de 20%, o que não veio a conseguir uma vez que, alegadamente, ninguém no Oculista tinha conhecimento de quem era a M e, consequentemente, que existia um acordo entre ambos. O Demandante adquiriu as lentes, sem ter beneficiado de qualquer desconto. O Demandante só recebeu a listagem das empresas que têm acordos com a M passadas 3 ou 4 semanas sobre a celebração dos contratos, tendo sido nessa data também que teve conhecimento do preço das consultas de clínica geral, as quais tinham um preço de € 37,50 (trinta e sete euros e cinquenta cêntimos), ao invés de € 12,50 (doze euros e cinquenta cêntimos), que lhes tinha sido dito pelo Técnico da Demandada. O Demandante se soubesse que só dispunha de 14 dias para anular o contrato ou que as consultas de clínica geral eram de € 37,50 (trinta e sete euros e cinquenta cêntimos) cada nunca teria celebrado os contratos que celebrou com as Demandadas. O Demandante cancelou os pagamentos à 2ª Demandada no dia 28 de Julho de 2008, tendo ainda pago a quantia de € 158,32 (cento e cinquenta e oito euros e trinta e dois cêntimos), correspondente a 4 prestações mensais de € 39,58 (trinta e nove euros e cinquenta e oito cêntimos) cada. Juntou 8 documentos. As Demandadas foram regularmente citadas. A 1ª Demandada apresentou contestação junta aos autos a fls. 43 e segs. e a 2ª Demandada apresentou contestação junta aos autos a fls. 25 e segs. Vem a M, Lda. aceitar o alegado nos arts. 1 a 11º do requerimento inicial, mas negando que a contratação dos serviços da Demandada M tenha laborado em erro. Alega como facto que o Técnico da M, de acordo com a lei, explicou ao Demandante qual o objecto do contrato, âmbito de coberturas, qual a forma de proceder à resolução do contrato (carta registada), qual o prazo (14 dias a contar da data da assinatura do contrato, a quem ser dirigida a carta (M) e para onde poderia fazê-lo (sede da M), e que o Demandante só assinou o contrato depois de todas as explicações dadas pelo Técnico da Demandada M, tendo-o feito em total e perfeita consciência, obrigando-se nos seus precisos termos, conhecendo de imediato todos os serviços e médicos do guia da Demandada e respectivos custos. A 1ª Demandada impugna o alegado nos arts. 12 a 14, 16, 17, 21, 24, 25, 27 a 32 e desconhece, e por isso também impugna, o alegado o alegado nos arts. 15, 18, 22 e 23, uma vez que são factos que não são do seu conhecimento pessoal. A 2ª Demandada contesta, impugnando os arts. 1º, 2º, 3º, 4º, 5º e 6º 1ª parte, 12º, 14º, 15º, 18º, 19º, 20º, 21º, 22º, 24º, 25º, 29º, 30º e 32º do requerimento inicial por desconhecimento e aceitando o vertido nos arts. 6º 2ª parte, 7º, 8º, 9º, 10º, 11º e 23º, este último apenas a tão só o que resulta da análise do doc. 6 junto com o requerimento. Impugna ainda o alegado nos arts. 13º, 16º, 17º, 27º e 31º do requerimento inicial porquanto nunca poderia o funcionário da 1ª Demandada informar o Demandante que o mesmo poderia, a qualquer momento, anular os contratos, pois assim não corresponde à verdade e que, na data da celebração dos contratos foram dadas ao Demandante, através do funcionário da 1ª Demandada, todas as informações e esclarecimentos atinentes aos contratos de prestação de serviços e de crédito. Impugna ainda o alegado nos arts. 26º e 28º do requerimento inicial porquanto da análise do doc. 7 junto com o requerimento se verifica que os honorários fixos por consulta, para a rede S é de € 37,50, e bem assim o alegado no art. 34º. Alega ainda que em 10 de Abril de 2008 foi celebrado um contrato de prestação de serviços de saúde entre o Demandante e a 1ª Demandada, a que foi atribuído o n.º 18971, tendo o valor do preço do contrato ascendido a € 2.340,00 (dois mil trezentos e quarenta euros) e que, para pagamento desse preço, o Demandante celebrou um contrato de crédito com a 2ª Demandada, ao qual foi atribuído o n.º x. O valor do crédito concedido seria reembolsado à 2ª Demandada em 60 (sessenta) prestações mensais e sucessivas, no valor de € 39, 58 (trinta e nove euros e cinquenta e oito cêntimos) cada uma, a pagar por débito directo na conta x. Alega ainda que o Demandante teve uma intervenção activa em todo o processo negocial, porquanto não só facultou as informações pessoais necessárias à outorga dos contratos, como também facultou documentação pessoal, necessária para comprovação da sua situação pessoal e financeira, nomeadamente cópias do Bilhete de Identidade e de Contribuinte, caderneta bancária comprovativa do NIB da conta onde iriam ser debitadas as prestações mensais, recibo da G, comprovativo de morada e recibo de remunerações, comprovativo dos rendimentos anuais do Demandante. Alega ainda que o Demandante apenas coloca em causa os serviços contratados com a 1ª Demandada e não o crédito celebrado com a 2ª Demandada. A 1ª Demandada não juntou documentos. A 2ª Demandada juntou 4 (quatro) documentos. Foi agendada sessão de pré-mediação para o dia 04.12.2008, a qual não se realizou devido à falta das Demandadas, as quais não justificaram a sua falta no prazo legal estabelecido, tendo sido agendada audiência de julgamento para o dia 03.02.2009, pelas 16h30m. Realizou-se audiência de julgamento com inquirição de duas testemunhas e na qual a 2ª Demandada apresentou substabelecimento, tendo sido observadas as formalidades legais aplicáveis como da respectiva acta decorre. A audiência interrompida para continuar com leitura de sentença. Foi designada, para tanto, a presente data e as partes notificadas. Cumpre apreciar e decidir. O Julgado de Paz é competente em razão da matéria, do território e do valor. Verificam-se os pressupostos processuais de regularidade e validade da instância, inexistindo, questões prévias ou nulidades que invalidem totalmente o processo e obstem ao conhecimento do mérito da causa. II – FUNDAMENTAÇÃO Da análise da prova produzida, incluindo os documentos juntos aos autos, que se indicam e dão por reproduzidos, consideram-se provados os seguintes factos com interesse para a decisão da causa: A) No início de Abril de 2008, o Demandante teve conhecimento da existência da 1ª Demandada, através de um folheto que foi deixado na sua caixa de correio, o qual preencheu, tendo destacado uma parte desse folheto, solicitando mais informações sobre um plano de saúde familiar, publicitado nesse dito folheto; B) Passada cerca de uma semana, o Demandante foi contactado por um “Técnico de Informação Médica” da M, tendo ficado agendada uma ida a casa do Demandante; C) No dia agendado, o Técnico J foi a casa do Demandante; D) Local onde o Demandante viria a subscrever um contrato com a 1ª Demandada (M) e, bem assim, com a 2ª Demandada (C); E) O contrato tem por objecto um Plano de Assistência Médica e Dentário; F) Os beneficiários do referido contrato são, além do Demandante, a sua esposa, CP, e a filha de ambos, LP; G) O contrato tem a duração de 60 (sessenta) meses e um valor de € 2.340,00 (dois mil trezentos e quarenta euros); H) Este valor foi pago pelo Demandante à 1ª Demandada com recurso a um financiamento à C, a ora 2ª Demandada; I) O crédito concedido seria reembolsado em sessenta prestações, mensais e sucessivas no valor de € 39,58 cada; J) O pagamento das prestações mensais e sucessivas seria efectuado mediante o sistema de débito directo na conta do Demandante, pertencente à x; K) O crédito concedido pela 2ª Demandada ao Demandante foi utilizado para pagar directamente à 1ª Demandada; L) A esposa do Demandante estava na altura desempregada; M) A 15 de Julho de 2008 o Demandante dirigiu-se ao Oculista de x para comprar umas lentes; N) O Oculista supra referido consta da listagem de empresas que, aparentemente, têm acordo com a M, cfr. Doc. 5 junto aos autos com o requerimento inicial; O) O que conferiria ao Demandante um desconto de 20%, Doc. 5 junto aos autos com o requerimento inicial; P) No Oculista de x ninguém tinha conhecimento de quem era a M, nem de que o Oculista tinha um acordo com a mesma; Q) O Demandante adquiriu três lentes pelo preço de € 100,00 (cem euros); R) O Demandante recebeu os cartões da M e a listagem com as empresas que, aparentemente, têm um protocolo com a M, passadas 3 ou 4 semanas sobre a celebração dos contratos; S) O anexo I à listagem supra referida refere que o preço das consultas de clínica geral é de € 37,50 (trinta e sete euros e cinquenta cêntimos); T) No dia 01.07.2008 o Demandante cancelou os pagamentos à 2ª Demandada, tendo apenas pago a quantia de € 79,16 (setenta e nove euros e dezasseis cêntimos); U) A 1ª Demandada presta serviços no âmbito da saúde, incluindo descontos em consultas prestadas por diversos médicos o que decorre do teor do seu verso; V) O Demandante apresentou uma reclamação junto do Centro de Informação Autárquico ao Consumidor, em 09.09.2008, a qual foi remetida à 2ª Demandada, cfr. Doc. 3 junto à contestação desta; W) Por carta datada de 13.10.2008, a 2ª Demandada C respondeu à reclamação apresentada pelo Demandante, informando-o que não tinha conhecimento que este tinha procedido à sua resolução dentro do prazo legal dos 14 dias sobre a celebração do mesmo; X) O Demandante assinou o contrato auto-copiativo e pré-impresso, da autoria da 2ª Demandada C, que corresponde a um contrato de crédito, no valor de € 2.340,00; Y) Da mesma forma foi assinada uma proposta de adesão ao seguro de protecção ao crédito, cfr. Doc. 3 junto com o requerimento inicial; Z) O contrato de crédito foi preenchido com base nas informações e documentos facultados pela Demandante. Com interesse para a decisão da causa não ficaram provados os seguintes factos: 1. O técnico da 1ª Demandada, M, tenha explicado criteriosamente o objecto do contrato, âmbito de coberturas e forma de proceder à sua resolução – através de carta registada, dirigida à M e no prazo de 14 dias a contar da assinatura – após o que a Demandante o assinou; 2. Quando assinou o contrato a Demandante conheceu de imediato todos os serviços e médicos do guia da Demandada e respectivos custos; 3. Que o técnico da 1ª Demandada tenha informado o Demandante de que o preço das consultas de clínica geral era de € 37,50; 4. Que o técnico da 1ª Demandada tenha informado o Demandante que este deveria, previamente a qualquer compra ou marcação de exame médico, confirmar junto da linha de apoio a clientes da M se determinado prestador continuava fazendo parte da rede de garantias, ou qual poderia (em substituição) prestar o mesmo serviço; Motivação dos factos provados e não provados O tribunal fundou a sua convicção, quanto aos factos provados, na documentação junta aos autos, nas declarações das partes que puderam ser ouvidas e, bem assim, na prova testemunhal prestada pelas duas testemunhas oferecidas, respectivamente pela Demandante e pela 2ª Demandada. Afigurando-se, embora, que todas depuseram com verdade à matéria a que responderam, certo é que, apenas a testemunha apresentada pelo Demandante, sua mulher, interveio na explicação e celebração dos contratos dos autos, tendo o seu depoimento sido valorado em conformidade com esse facto. Apesar dessa circunstância o Tribunal crê que o seu depoimento foi realizado com verdade e com isenção. Relativamente aos factos não provados, a ausência de convicção sobre a sua veracidade resulta da absoluta inexistência de prova ou da sua insuficiência, tendo também em consideração o facto de não ter estado presente o funcionária da 1ª Demandada que contratou com o Demandante. Da Apreciação dos Factos e Aplicação do Direito Decorre da matéria provada que, em 10.04.2008, o Demandante e 1ª Demandada celebraram um contrato de prestação de serviços de saúde, consubstanciado num Plano de Assistência Médica e Dentária, nos termos do qual o Demandante e os beneficiários que o mesmo indicar têm direito aos benefícios constantes do contrato. O contrato de prestação de serviço vem previsto no artigo 1154.º do Código Civil, onde se refere que “Contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.” Decorre ainda da matéria provada que entre o Demandante e 2ª Demandada foi celebrado um contrato de mútuo, com vista a financiar o contrato de prestação de serviço, o qual vem definido no artigo 1142.º do Código Civil, onde se refere que “Mútuo é o contrato pela qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade.” Aos referidos contratos é aplicável o regime dos contratos celebrados à distância, nos termos do n.º 1 do artigo 13º do Decreto-Lei n.º 143/2001, de 26 de Abril, bem como o regime das cláusulas contratuais gerais, como decorre dos artigos 1º e 2º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro. Este tipo de contratos caracteriza-se por uma “agressividade comercial” que afasta a igualdade e lealdade na contratação (essencial nas relações de consumo como decorre do n.º1 do art. 9º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho – Lei de Defesa do Consumidor) e tende a destruir o equilíbrio e a razoabilidade contratuais. De tal modo que, em regra, são iguais as situações em que os interessados / consumidores sustentam perante o tribunal a sua pretensão à anulação ou declaração de nulidade dos contratos: sujeição a grande pressão e em reuniões muito longas pelos vendedores; deslocações imediatas a casa dos entrevistados, possíveis contratantes, com pedido e reprodução (fotocópia) imediata de documentos destes; muitas facilidades na prestação dos serviços; muitos benefícios; possibilidade de denúncia do contrato em caso de insatisfação sem explicar o prazo para o efeito ou confundindo-o com o prazo de garantia dos bens; insuficiência, e mesmo ausência, de informação sobre o contrato de crédito; falta de identificação da entidade financeira e dos custos do empréstimo; pedido de várias assinaturas sem que os contratantes possam perceber bem o que assinam, como sucede com as livranças em branco. Decorre ainda da matéria provada que o Demandante não obteve informação sobre o modo de resolução do contrato celebrado com a 1ª Demandada. Assim, não ficou provado que o Demandante foi devidamente informado relativamente ao procedimento a adoptar, caso entendesse resolver o contrato. A 1ª Demandada violou o dever de informação previsto nos artigos 6.º do Decreto-lei n.º 446/85, de 25 de Outubro e artigo 8.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, pois não ficou provado que o Demandante tenha tido conhecimento efectivo do procedimento adoptado para resolver o contrato, pois aquele conhecimento efectivo pressupõe que, previamente, as cláusulas sejam lidas e explicadas, apesar de elas constarem do verso do contrato. Neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01.02.2000, proc. 99B877, www.dgsi.pt “I – Posto que as cláusulas contratuais gerais não são fruto da livre negociação desenvolvida entre as partes, já que estão elaboradas de antemão e são objecto de simples subscrição ou aceitação pelo lado da parte a quem são propostas, a lei prescreve diversas cautelas tendentes a assegurar o seu efectivo conhecimento por essa parte e a defendê-la da sua irreflexão, natural em tais circunstâncias. II – Estas cautelas dos artigos 5.º e 6.º do DL 446/85, de 25 de Outubro, onde se faz recair sobre o proponente o dever de comunicação do teor das cláusulas, o dever de informação sobre os aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique, e o dever de prestar todos os esclarecimentos razoáveis solicitados. III Esse dever de comunicação tem duas vertentes: por um lado, o proponente deve comunicar na íntegra à outra parte as cláusulas contratuais gerais de que se sirva (artigo 5.º, n.º 1), por outro lado, ao fazer esta comunicação, deve realizá-la de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência (artigo 5.º, n.º 2); querendo-se estimular o proponente a bem cumprir esse dever, o n.º 3 desse artigo faz recair sobre ele o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva. IV – O comando contido na alínea a) do artigo 8.º desse DL, ao prescrever a exclusão das cláusulas não comunicadas nos termos do artigo 5.º, tem que ser entendido – atenta a referida norma sobre o ónus da prova – como prescrevendo a exclusão das cláusulas em relação às quais se não prove terem sido comunicadas”. A junção dos docs. 2 e 3 com o Requerimento Inicial e doc. 1 junto com a Contestação da 2ª Demandada não provam que o Demandante obteve toda a informação, apesar de declaração nesse sentido, pois o que ficou provado foi que o Demandante, tal como assinou o contrato, assinou toda a documentação que a 1ª Demandada lhe apresentou para assinar, não bastando para este tribunal, tendo presente a ratio das normas que fundamentam o direito à informação, um documento que se declare que teve conhecimento. Nos referidos documentos não se prova que todas as cláusulas foram lidas e explicadas ao Demandante. Ou seja, a prova de que foi respeitado o direito à informação, pressupõe a prova dos factos que consubstanciam o cumprimento da obrigação de informação por parte da 1ª Demandada, o que não se verificou no âmbito deste processo, cabendo o ónus da prova, nos termos legais, às Demandadas. Nestes autos, não foi feita prova, por qualquer uma das Demandadas, de que essa obrigação de informação foi cumprida, o que era seu ónus. Para mais, a informação constante do referido contrato é confusa. Senão vejamos: Nas alíneas c) e d) das Condições Gerais o presente contrato é denominado “protocolo de acordo”; O contraente é também denominado “titular”, “beneficiário” e “aderente” – alíneas a), d), e), f), g), h), i), j), k), l), m), n), o) das Condições Gerais; Acresce que qualquer contraente poderá ficar confuso com a leitura das alíneas k) e l), podendo, eventualmente, considerar que ambas tratam da mesma questão, ou seja da anulação do referido contrato. Se, por um lado, na 1ª das alíneas se estabelece que “O aderente poderá anular o presente contrato por carta registada com aviso de recepção para os serviços centrais da M até 14 dias após a assinatura do mesmo” (sublinhado nosso), por outro lado, na alínea imediatamente a seguir, a alínea l), estabelece que “A efectividade do aderente mantém-se e renova-se automaticamente por iguais períodos do presente contrato e definidos no anverso do mesmo enquanto não for denunciada por qualquer das partes. Esta denúncia tem que obrigatoriamente verificar-se por carta registada, até 30 dias antes do término do contrato, enviada para os serviços centrais da M.” Temos, portanto, que o Demandante não foi claramente informado do direito de revogação do contrato de prestação de serviços e, menos ainda, o foi relativamente ao contrato de crédito que tem uma cláusula revogatória onde se estabelece um prazo de 7 dias para tal efeito. A tudo se soma que as Demandadas não lograram provar que tenha sido entregue ao Demandante, na data da celebração do presente contrato, a listagem junta pelo Demandante sob o Doc. 5 e, bem assim, a Tabela de preços e descontos praticado no Plano de Assistência Médica Familiar M, junta também pelo Demandante sob o Doc. 7, o que lhes competia. De salientar que a Tabela de Preços anteriormente referida estabelece os preços e descontos convencionados para a anuidade de 2006, quando o contrato foi celebrado e a 10.04.2008, o que poderá, por si só, ilustrar o alegado pelo Demandante quanto a não ter sido informado do real preço das consultas de clínica geral!!! Assim, as cláusulas quanto à resolução do contrato consideram-se excluídas dos referidos contratos, nos termos do art. 8º do regime das cláusulas contratuais gerais – “Consideram-se excluídas dos contratos singulares: … b) As cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde que não seja de esperar o seu conhecimento efectivo;” As mencionadas cláusulas prevêem o prazo e o modo de exercer o mencionado direito. Em face da falta de informação, as cláusulas são excluídas dos contratos objecto destes autos e não são oponíveis ao aderente, o ora Demandante. Além disso, nos termos do n.º 1 do art. 329º do Código Civil, considera-se como não tendo ainda iniciado a contagem do prazo de resolução por violação do direito de informação, pois ninguém pode exercer um direito que desconhece e que o legislador impõe o dever de informar, como é o caso. Assim, em face da interposição da presente acção onde se pede que os contratos sejam declarados nulos o que se traduz no mesmo efeito útil que decorre da resolução do contrato, consideram-se resolvidos os contratos de prestação de serviço e de mútuo celebrados entre Demandante e Demandadas. Não considerando o legislador, em sede de diploma de cláusulas contratuais gerais, que o consumidor foi informado, por coerência lógica e sistemática, apenas se pode considerar que o consumidor não foi informado, nos termos do art. 18º n.º 2 do Decreto – Lei n.º 143/2001, de 26 de Abril. O Demandante tem direito a resolver o contrato, na medida em que o mesmo foi celebrado no âmbito do n.º 1 do art. 13º do Decreto – Lei n.º 143/2001, de 26 de Abril, pois é um facto que o Demandante preencheu e destacou uma parte do folheto deixado na sua caixa do correio e solicitou mais informações, à 1ª Demandada, sobre um plano de saúde familiar que nele vinha publicitado, configurando-se, assim, a existência de um contrato ao domicílio. E, neste contexto dos contratos ao domicílio e outros equiparados, o Demandante pode resolver o contrato nos termos do art.18º n.º 1 do mesmo diploma legal, onde se refere que “O consumidor pode resolver o contrato no prazo de 14 dias, a contar da data da sua assinatura ou até 14 dias ulteriores à entrega dos bens, se esta for posterior àquela data.” Nos presentes autos, ficou provado que a 1ª Demandada não cumpriu a obrigação de informação, portanto, o referido prazo ainda não se iniciou, podendo o Demandante resolver o contrato, nos termos do art. 18º n.º 1 do Decreto – Lei n.º 143/2001, de 26 de Abril. Quanto ao contrato de crédito, nos termos do art. 19º n.º 3 do Decreto – Lei n.º 143/2001, de 26 de Abril “Sempre que o preço do bem for total ou parcialmente coberto por um crédito concedido pelo fornecedor ou por um terceiro com base num acordo celebrado entre este e o fornecedor, o contrato de crédito é automática e simultaneamente tido por resolvido, sem direito a indemnização, se o consumidor exercer o seu direito de resolução em conformidade com o disposto no artigo 18.º, n.º 1.” Ora, o referido contrato de mútuo foi assinado pela Demandante no momento da celebração do contrato de prestação de serviço, onde foi exigido à Demandante, pela 1ª Demandada, um conjunto de elementos com base num protocolo celebrado entre as Demandadas, como confirmou uma das testemunhas, bem como tendo presente outros elementos, nomeadamente o envio de impressos da C à outra Demandada e instruções para o seu preenchimento, o que, por si só, revela um prévio acordo entre as Demandadas. IV – DECISÃO Por tudo o exposto julgo procedente por provada a presente acção e, em consequência, declaro nulos os contratos de prestação de serviços e de crédito objecto dos presentes autos, condenando as Demandadas a devolverem à Demandante as quantias por esta entregues em execução desses contratos, nos termos do art. 289º do Código Civil. Assim, devem as Demandadas restituir ao Demandante o valor que deste, respectivamente, receberam, sendo certo que este nada recebeu de qualquer uma das Demandadas, cabendo a estas, parceiras comerciais, acertar a forma de devolução do preço do contrato de prestação de serviços / contrato de crédito. Custas: Declaro parte vencida as Demandadas as quais são responsáveis pelas custas do processo no valor de €70. Verificando-se que cada uma das Demandadas pagou € 35,00 com a apresentação da sua contestação, encontram-se as custas satisfeitas. Cumpra-se o disposto no n.º 9 da Portaria n.º 1456/2001, de 28 de Dezembro em relação ao Demandante. Registe e notifique. Julgado de Paz de Lisboa, 5 de Março de 2009 A Juíza de Paz Marta Nogueira
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