Sentença de Julgado de Paz | |
Processo: | 324/2023-JPSTB |
Relator: | CARLOS FERREIRA |
Descritores: | PAGAMENTO DE PRESTAÇÕES RELATIVAS A DESPESAS E SERVIÇOS DE CONDOMÍNIO. |
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Data da sentença: | 05/28/2024 |
Julgado de Paz de : | SETÚBAL |
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Decisão Texto Integral: | Proc. n.º 324/2023-JPSTB Sentença Parte Demandante: --- ORGANIZAÇÃO 1 Condomínio do prédio sito na LOCALIZAÇÃO 1, 2910-705 Setúbal, entidade equiparada a pessoa coletiva com o NIPC xxxxxxxxx. --- Mandatário: Dr. PESSOA 1, Advogado, com escritório na LOCALIZAÇÃO 2, 2900-309 Setúbal. ---- Parte Demandada: --- ORGANIZAÇÃO 2, Lda., sociedade comercial com o número único de matrícula e pessoa coletiva xxxxxxxxx, com sede na Rua LOCALIZAÇÃO 3, 1150-182 Lisboa, legalmente representada por PESSOA 2, na qualidade de gerente.--- * Matéria: Direitos e deveres de condóminos, al. c), do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho, doravante designada por Lei dos Julgados de Paz. --- Objeto do litígio: Pagamento de prestações relativas a despesas e serviços de condomínio. --- * Relatório: --- O Demandante instaurou a presente ação, nos termos do requerimento inicial constante de fls. 4 a 7, que aqui se declara integralmente reproduzido peticionando a condenação da Demandada nas quotas de condomínio vencidas e não pagas, acrescidas de penalização regulamentar, na quantia global de €883,30 (oitocentos e oitenta e três euros e trinta cêntimos), bem como, das quotas vincendas na pendência da ação.-- Juntou procuração forense e documentos. --- Regularmente citada, a Demandada apresentou contestação de fls. 37 a 39, que aqui se declara reproduzida, alegando que nunca recebeu qualquer correspondência do Demandante, mas quando adquiriu a fração autónoma identificada nos presentes autos forneceu os contactos pessoais do seu gerente à empresa de administração do condomínio. --- A Demandada é uma empresa que desenvolve atividade no ramo imobiliário, e faz questão de não ter dívidas. --- Logo que teve conhecimento dos valores das quotas efetuou o respetivo pagamento dos montantes em atraso e antecipou o pagamento de quotas ainda não vencidas. --- Assim, recusa o pagamento da pena pecuniária. --- * Nos termos do art.º 60.º, n.º 1, al. c), da Lei n.º 78/2001, de 13/07, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31/07 (Lei dos Julgados de Paz), a sentença inclui uma sucinta fundamentação. --- * Fundamentação – Matéria de Facto: --- Com interesse para a resolução da causa, ficou provado que: - 1. Desde 09-01-2022, a Demandada tem registada a seu favor a aquisição da fração designada pela letra “T”, correspondente Loja 4, destinada a estabelecimento comercial, do prédio constituído em propriedade horizontal, sito na LOCALIZAÇÃO 1, 2910-705 Setúbal, descrito na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal, ficha n.º xxxx, da freguesia de Setúbal (S. Sebastião), cf. fls. 8 a 16;--- 2. Por deliberação da assembleia dos condóminos constante na ata n.º 71, da reunião da assembleia dos condóminos datada de 22 de fevereiro de 2019, ficou deliberado manter em vigor a mensalidade da quota de condomínio, correspondendo para a fração acima mencionada a quantia de €15,15, cf., fls. 17 a 30; --- 3. A Demandada não pagou nas respetivas datas de vencimento as quotas de condomínio vencidas em janeiro de 2022, e seguintes; --- 4. As quotas vencem ao dia 8 (oito) de cada mês, idem; --- 5. Até à entrada da ação venceram-se quotas não pagas, que totalizavam a quantia de €333,30; 6. Na ata da assembleia dos condóminos acima mencionada consta o seguinte: “Relativamente aos valores em dívida ao condomínio, foi também deliberado, por unanimidade, que se devem aplicar penas pecuniárias aos condóminos incumpridores, nos termos do art. 1434º, nº1, (in fine) e nº 2 do C.C., no montante de €550,00 (quinhentos e cinquenta euros). A aplicação destas penas terá efeitos imediatos e serão aplicadas a todos os casos (presentes e futuros) de dívidas ao condomínio, sempre que estas sejam superiores a 6 (seis) meses e/ou seja necessário recorrer à cobrança coerciva das mesmas.” fls. 17 a 30; --- 7. Com a entrada da presente ação o Demandante aplicou à Demandada uma pena pecuniária no montante de €550,00; --- 8. Em 27-12-2023, a Demandada efetuou o pagamento das quotas de condomínio ordinárias respeitantes aos anos de 2022; 2023; e 2024, conforme recibo de fls. 71. --- ---*--- Motivação da Matéria de Facto: --- A fixação da matéria de facto dada como provada teve por base os documentos juntos aos autos, nomeadamente, as atas da assembleia dos condóminos, nas quais constam a deliberação com a eleição do administrador; a aprovação do orçamento, mencionando que se mantém a mensalidade do condomínio, e bem assim, a pena pecuniária respeitante ao incumprimento.--- Foi ainda considerada a informação da conservatória do registo predial, na qual consta o registo da aquisição da fração identificada nos autos a favor da Demandada, e o teor do recibo de pagamento efetuado pela mesma. --- Consigna-se que, para apuramento da matéria de facto não foi considerado o teor dos articulados com matéria tida por irrelevante, conclusiva ou de direito. --- ---*--- Fundamentação – Matéria de Direito: --- A relação material controvertida circunscreve-se ao incumprimento por parte da Demandada, da obrigação de pagamento da sua quota-parte de contribuição para as despesas geradas pelo condomínio, e quais as consequências que derivam de tal facto. --- Na presente ação o Demandante vem pedir a condenação da Demandada a pagar-lhe a quantia de €883,30 (oitocentos e oitenta e três euros e trinta cêntimos), respeitante a quotas de condomínio vencidas e não pagas, acrescidas da penalização regulamentar. --- Mais peticionou, a condenação da Demandada no pagamento das quotas que se vencerem na pendência da ação. --- No decurso da ação a Demandada pagou as quotas até final de 2024. --- No entanto, a Demandante não prescindiu do valor respeitante à sanção pecuniária. --- Vejamos se lhe assiste razão: --- A propriedade horizontal encontra-se regulada, designadamente, nos artigos 1414.º, e seguintes, do Código Civil. --- Do regime legal da propriedade horizontal resulta que a posição de condómino confere direitos e obrigações, assentando na dicotomia existente entre o direito de usufruir das partes comuns do edifício e a obrigação de contribuir para as despesas comuns de manutenção, conservação e serviços de interesse comum, abreviadamente despesas comuns. --- A liquidação das despesas comuns advém, necessariamente, das receitas cobradas para esse efeito. Na categoria das receitas do condomínio avultam as quotas dos condóminos, ou seja, a sua quota-parte de contribuição para liquidação das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento dos serviços de interesse comum, enquadrando-se nessa categoria as quotas ordinárias e extraordinárias de condomínio, a pagar por cada condómino, em princípio, na proporção do valor das respetivas frações, relativamente ao capital investido no edifício (cf., art.º 1424.º, n.º 1, do Código Civil). --- A obrigação de contribuir para as despesas comuns encontra-se estabelecida no art.º 1424.º, n.º 1, do Código Civil, o qual dispõe que, “Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e relativas ao pagamento de serviços de interesse comum são da responsabilidade dos condóminos proprietários das frações no momento das respetivas deliberações, sendo por estes pagas em proporção do valor das suas frações”. --- Temos assim que, a obrigação de contribuir para as despesas comuns de manutenção e conservação do edifício, na proporção da respetiva fração autónoma face ao capital investido no edifício, é uma obrigação que decorre expressamente da letra da lei, a qual assume natureza pecuniária, nos termos do citado art.º 1424.º, do Código Civil. Pelo que, o incumprimento da referida obrigação torna o devedor responsável pelos prejuízos que daí possam resultar para o condomínio, nos termos gerais das obrigações (cfr., art.º 798.º, do Código Civil). --- O administrador do condomínio tem competências funcionais estabelecidas no art.º 1436.º, do Código Civil, cabendo-lhe a legitimidade material para agir em juízo no âmbito das suas competências (cf., art.º 1437.º, do Código Civil). --- Uma das funções do administrador do condomínio consiste em cobrar as receitas e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, conforme resulta das alíneas d), e f), do n.º 1, do art.º 1436.º, do Código Civil. --- Aliás, resulta do disposto no n.º 4, do art.º 6.º, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25/10, que o administrador tem o dever de instaurar a ação de cobrança contra o condómino que não liquide atempadamente as quantias respeitantes à sua quota-parte de contribuição para as despesas comuns. --- Ficou provado que, até à entrada da ação a Demandada não pagou atempadamente quotas que se venceram desde o janeiro de 2022, totalizando o montante de €333,30). --- Ora, o pagamento da contribuição para as despesas comuns constitui uma obrigação irrenunciável para os condóminos, no sentido em que, enquanto comproprietários das zonas comuns do edifício não se podem eximir do vínculo ou recusar-se ao cumprimento, total ou parcialmente. --- A falta de pagamento das mensalidades do condomínio nas respetivas datas de vencimento constitui o devedor em mora. --- No entanto, ficou provado que já na pendência da presente ação a Demandada procedeu ao pagamento das quotas em dívida, e antecipou o pagamento da totalidade das mensalidades respeitantes ao ano de 2024. --- Assim, a dívida respeitante às contribuições ordinárias ficou saldada. --- Pelo que, nada há a decidir sobre as quotas peticionadas, dado que, nesta parte, o objeto da ação ficou esgotado pelo pagamento. --- Relativamente às penalizações aplicadas pelo Demandante, cumpre dizer o seguinte: --- Nos termos do disposto no art.º 805.º, n.º 2, al. a), do Código Civil, há mora do devedor independentemente de interpelação, se a obrigação tiver prazo certo. --- Por outro lado, no âmbito da propriedade horizontal, vigora o disposto no art.º 1434.º do Código Civil, que permite à assembleia dos condóminos estabelecer a aplicação de penas pecuniárias para sancionar a inobservância das disposições legais do Código Civil, das deliberações da assembleia ou das decisões do administrador. --- Ora, no caso dos presentes autos a constituição da Demandada em mora decorre diretamente do prazo de vencimento da obrigação, isto é, o momento em que ocorre o facto pelo qual se torna exigível o pagamento de uma determinada mensalidade. --- Sendo as quotas mensais, e com vencimento ao dia oito de cada mês, conforme resulta da deliberação constante em ata, a obrigação tem prazo certo, pelo que, a constituição da Demandada em mora não está dependente de interpelação para o pagamento. --- Ficou provado que a assembleia do condomínio aprovou uma deliberação que prevê a aplicação de uma pena pecuniária, no montante de €550,00, para os condóminos incumpridores. --- Cumpre afirmar que o devedor cumpre a sua obrigação quando realiza a sua prestação integral e atempadamente, cf., art.º 406.º, n.º 1, do Código Civil. --- A aplicação concreta da referida pena pecuniária decorre do teor do requerimento inicial. — A pena pecuniária foi aplicada num momento em que a Demandada, na sua qualidade de condómina, tinha dívida acumulada resultante do não pagamento de mensalidades da quota nas respetivas datas de vencimento. --- A Demandada não pode alegar desconhecimento de uma obrigação que resulta diretamente da lei. Aliás, a Demandada alega que desenvolve a sua atividade no ramo imobiliário, e que tem os seus procedimentos direcionados para o cumprimento das obrigações dos condomínios com os quais se relaciona, por ser proprietária de várias frações em diversos edifícios constituídos em propriedade horizontal. --- Pelo que, é forçoso concluir que, bem sabendo que existe a obrigação de pagamento das mensalidades respeitantes às quotas ordinárias em causa na ação, a Demandada optou por não efetuar os respetivos pagamentos mensais de forma atempada, conformando-se com a situação de incumprimento, na expectativa de ser interpelada pelo Demandante, para só depois fazer o pagamento. --- Todavia, o condomínio não esta adstrito à obrigação de interpelar para o cumprimento, visto que a obrigação resulta do fracionamento da comparticipação anual em mensalidades com prazo certo, vencendo ao dia 8 de cada mês. --- É à Demandada que cabe o ónus de oferecer o pagamento de forma integral e dentro do prazo, e não o tendo feito, incorreu em mora. --- Estando a Demandada constituída em mora é lícito ao administrador do condomínio proceder à cobrança coerciva da dívida, e bem assim, aplicar a pena pecuniária prevista nas deliberações da assembleia dos condóminos. --- Pelo que, a aplicação da pena pecuniária é lícita e vinculativa. - Deste modo, a ação deve proceder nesta parte do pedido. --- ---*--- DECISÃO Atribuo à causa o valor de €883,30 (oitocentos e oitenta e três euros e trinta cêntimos), por corresponder à quantia em dinheiro que o Demandante pretendia obter no momento da propositura da ação, cf., normas conjugadas dos artigos 306.º, n.º 1; 297.º, n.º 2; e 299.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi, art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz. ---Pelo exposto e com os fundamentos acima invocados: --- Declaro saldada a dívida da Demandada relativamente a todas as quotas vencidas e quotas ordinárias vincendas até dezembro de 2024, inclusive. --- Condeno a Demandada a pagar ao Demandante a quantia de €550,00 respeitante à pena pecuniária aplicada, nos termos previstos pelas deliberações da assembleia do condomínio. Custas: --- Taxa de justiça no montante de €70,00 (setenta euros) a cargo da Demandada, por ter ficado vencida, nos termos da primeira parte, da al. b), do n.º 1, do art.º 2.º, da Portaria n.º 342/2019, de 1 de outubro. --- O pagamento deverá ser feito no prazo de três dias úteis, mediante liquidação da respetiva guia de pagamento (DUC), emitido pela secretaria do Julgado de Paz. --- * Extraia e notifique a guia de pagamento (DUC), ao responsável pelo pagamento das custas juntamente com cópia da presente decisão. --- Após os três dias úteis do prazo legal para o pagamento, aplica-se uma sobretaxa no montante de €10,00 (dez euros), por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação, até ao máximo de €140,00 (cento e quarenta euros). --- O valor da sobretaxa aplicável acresce ao montante da taxa de justiça em dívida. --- * Após trânsito, verificando-se a falta de pagamento das custas, mesmo após o acréscimo da referida sobretaxa legal, conclua para emissão de certidão para efeitos de execução fiscal, a instaurar junto dos competentes serviços da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), pelo valor das custas em dívida acrescidas da respetiva sobretaxa. ---- * Registe. --- Notifique pessoalmente em sede de audiência de discussão e julgamento, nos termos do disposto no artigo 60.º, n.ºs 1 e 2, da Lei dos Julgados de Paz. --- Envie cópia da presente decisão aos intervenientes processuais que faltaram à sessão, cf., artigo 46.º, n.º 3, da Lei dos Julgados de Paz. --- ---*--- Julgado de Paz de Setúbal, em 28 de maio de 2024 O Juiz de Paz _________________________ Carlos Ferreira |