Sentença de Julgado de Paz
Processo: 309/2023-JPSTB
Relator: CARLOS FERREIRA
Descritores: PAGAMENTO DE PRESTAÇÕES RELATIVAS A DESPESAS E SERVIÇOS DE CONDOMÍNIO
Data da sentença: 05/27/2024
Julgado de Paz de : SETÚBAL
Decisão Texto Integral:
Proc. n.º 309/2023-JPSTB

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Resumo da decisão:

- Condena a parte demandada a pagar à parte demandante a quantia de €663,00.

- A parte demandada está isenta de custas, por ter sido declarada ausente em parte incerta.


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Sentença


Parte Demandante: ---

Condomínio do [ORG-1], [Cód. Postal-1] [...], entidade equiparada a pessoa coletiva com o NIPC [NIPC-1], com domicílio na [...], n.º 5, 1.º A e 2.º B, [Cód. Postal-1] [...]. ---

Mandatários: Dr.ª [PES-1], e Dr. [PES-2], Advogados, ambos com o escritório na [...], n.º 11, 3.º Esq.º, [Cód. Postal-2] [...]. ---

Parte Demandada: ----

[PES-3] (AUSENTE), contribuinte fiscal número [NIF-1] com a última morada conhecida na [...], n.º 5, r/c B, [Cód. Postal-1] [...]. ---

Defensora Oficiosa: Dr.ª [PES-4], Advogada, com escritório na [...], n.º 39, 2.º, [Cód. Postal-3] [...]. ---


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Matéria: Direitos e deveres de condóminos, al. c), do n.º 1, do art.º 9.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, alterada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho, doravante designada por Lei dos Julgados de Paz. ---

Objeto do litígio: Pagamento de prestações relativas a despesas e serviços de condomínio. ---


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Relatório: ---

O Demandante instaurou a presente ação, nos termos do requerimento inicial constante de fls. 4 a 7, que aqui se declara integralmente reproduzido, peticionando a condenação da Demandada a pagar-lhe a quantia global de €805,50, a título quotas ordinárias e penalização regulamentar, acrescida das quotas ordinárias vincendas. ----

Para tanto, alegou, em síntese que, a Demandada é proprietária da fração autónoma designada pela letra “H”, correspondente ao rés-do-chão B, destinado a habitação, do prédio constituído em propriedade horizontal, sito na [...], n.º 5, [Cód. Postal-1] [...]. ---

A Demandada não pagou as quotas de condomínio, ordinárias e extraordinárias, no montante global de €425,50. ---

O Demandante aplicou à Demandada uma pena pecuniária no montante de €380,00. ---

Concluiu pela procedência da ação, juntou documentos e procuração forense. ----

Mostrando-se frustrada a citação da Demandada, determinou-se o seguimento do regime processual civil referente aos ausentes, nos termos do n.º 2, do art.º 38.º, da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho, com a redação dada pela Lei n.º 54/2013, de 31 de julho (Lei dos Julgados de Paz), com o pedido de nomeação de Defensor Oficioso à Demandada ausente, uma vez que não há Ministério Público junto dos Julgados de Paz (cf., artigos 21.º e 23.º, do Código de Processo Civil). ---

Citada a Ilustre Defensora Oficiosa nomeada à Demandada, a mesma não contestou. ---


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Nos termos do art.º 60.º, n.º 1, al. c), da Lei dos Julgados de Paz, a sentença inclui uma sucinta fundamentação. ---

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Fundamentação – Matéria de Facto: ---

Com interesse para a resolução da causa, ficou provado que: ---

1. Desde 31-10-20219, a Demandada tem registada a seu favor a aquisição da fração autónoma designada pela letra “H”, correspondente ao rés-do-chão B, do prédio constituído em propriedade horizontal, descrito na ficha [Nº Identificador-1], da 2.ª Conservatória do Registo Predial de [...], freguesia de [...] (S. Sebastião), sito na [...] n.º 5, [Cód. Postal-1] [...], fls. 29 a 36;---

2. A Demandada deixou de pagar as quotas de condomínio desde outubro de 2021; ---

3. Até à entrada da ação, a Demandada acumulou quotas vencidas e não pagas, no montante global de €425,50; ---

4. Por deliberação tomada na assembleia dos condóminos constante da “ata número onze/dois mil e vinte e dois”, datada de 06-12-2022, a mensalidade da quota ordinária manteve-se na quantia de €17,50, fls. 8 a 27; ---

5. As quotas vencem ao dia 8 de cada mês, idem; ---

6. Na ata da referida assembleia dos condóminos, consta o seguinte: “Foi deliberado por unanimidade dos presentes que todos os custos inerentes à cobrança judicial das prestações de condomínio vencidas e não pagas serão imputados aos condóminos devedores a título de penalização, sendo o montante mínimo a imputar a título de penalização a quantia de €380. (…)”, idem; ---

7. Em 24-10-2023, o Demandante aplicou à Demandada uma pena pecuniária no montante de €380,00. ---

8. De novembro de 2023 a julho de 2024, inclusive, venceram-se as mensalidades da quota ordinária, no montante de €17,50, cada, fls. 8 a 27; ---

9. Na pendência da ação a Demandada efetuou dois pagamentos, respetivamente em 28-02-2024, e 02-05-2024, que totalizam a quantia de €300,00 (cf. documentos junto em audiência de julgamento).


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Motivação da Matéria de Facto: ---

Tendo em conta o regime processual determinado para os ausentes não é aplicável o ónus de impugnação, conforme previsto no n.º 4, do art.º 490.º, do Código de Processo Civil, aplicável por força do art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz, pelo que, incumbe ao Demandante o ónus da prova sobre os factos alegados, nos termos do n.º 1, do art.º 342.º, do Código Civil.---

Não foi apresentada prova testemunhal. ---

Assim, a fixação da matéria de facto dada como provada teve por base os documentos juntos aos autos, nomeadamente, a ata da assembleia dos condóminos, na qual consta a deliberação com a eleição do administrador; a aprovação do orçamento, mencionando que se mantém a mensalidade do condomínio, e bem assim, a pena pecuniária respeitante ao incumprimento.---

O montante da mensalidade respeitante à comparticipação da fração da Demandada para as despesas comuns, resulta das referidas deliberações, e do documento complementar às mesmas, com a listagem do valor em dívida, junto e admitido em audiência de julgamento, após contraditório, o qual não foi considerado no valor indicado, por falta de junção da ata respeitante à alteração do valor da mensalidade no ano de 2024. ---

Foi ainda considerada a informação da conservatória do registo predial, na qual consta o registo da aquisição da fração identificada nos autos a favor da Demandada. ---

Consigna-se que, para apuramento da matéria de facto não foi considerado o teor do requerimento inicial com matéria tida por irrelevante, conclusiva ou de direito. --


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Fundamentação – Matéria de Direito: ---

A relação material controvertida circunscreve-se ao incumprimento por parte da Demandada da obrigação de pagamento da sua quota-parte de contribuição para as despesas geradas pelo condomínio, e quais as consequências que derivam de tal facto. ---

Na presente ação, o Demandante vem pedir a condenação da Demandada a pagar-lhe a quantia global, de €805,50, a título quotas vencidas e não pagas, e penalização regulamentar, acrescida das quotas ordinárias vincendas. ---

Vejamos se lhe assiste razão: ---

Sobre a obrigação de contribuir para os encargos do condomínio: ---

A propriedade horizontal encontra-se regulada, designadamente, nos artigos. 1414.º e seguintes do Código Civil. ---

Do regime legal da propriedade horizontal resulta que a posição de condómino confere direitos e obrigações, assentando na dicotomia existente entre o direito de usufruir das partes comuns do edifício e a obrigação de contribuir para as despesas comuns de manutenção, conservação e serviços de interesse comum, abreviadamente despesas comuns. ---

A liquidação das despesas comuns advém, necessariamente, das receitas cobradas para esse efeito.

Na categoria das receitas do condomínio avultam as quotas dos condóminos, ou seja, a quota-parte correspondente à contribuição de cada fração para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento dos serviços de interesse comum, enquadrando-se nessa categoria as quotas ordinárias e extraordinárias de condomínio, a pagar por cada condómino, em princípio, na proporção do valor das respetivas frações (cf., art.º 1424.º, n.º 1, do Código Civil). -

A obrigação de contribuir para as despesas comuns, encontra-se estabelecida no art.º 1424.º, do Código Civil, o qual dispõe que, “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas frações”. ---

Temos assim que, a obrigação de contribuir para as despesas comuns de manutenção e conservação do edifício, na proporção da respetiva fração autónoma face ao capital investido no edifício, é uma obrigação que decorre expressamente da letra da lei, a qual assume natureza pecuniária, nos termos do citado art.º 1424.º, do Código Civil. Pelo que, o incumprimento da referida obrigação torna o devedor responsável pelos prejuízos que daí possam resultar para o condomínio, nos termos gerais das obrigações (cf, art.º 798.º, do Código Civil). -----

O administrador do condomínio tem competências funcionais estabelecidas no art.º 1436.º, do Código Civil, cabendo-lhe a legitimidade material para agir em juízo no âmbito das suas competências (cf., art.º 1437.º, do Código Civil). ---

Uma das funções do administrador do condomínio consiste em cobrar as receitas e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, conforme resulta das alíneas. d), e e), do art.º 1436.º, do Código Civil. ----

Aliás, resulta do disposto no n.º 4, do art.º 6.º, do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25/10 (na atual redação), que o administrador tem o dever de instaurar a ação de cobrança contra o condómino que não liquide atempadamente as quantias respeitantes à sua quota-parte de contribuição para as despesas comuns. ---

Sobre a falta de pagamento das quotas: ---

Ficou provado que a Demandada não pagou nas respetivas datas de vencimento nem posteriormente, as mensalidades da quota de condomínio vencidas desde o parcial de outubro de 2021 acumulando dívida, até ao presente, sendo exigível o acréscimo das quotas vincendas nos termos do disposto no art.º 557.º, n.º 1, do Código de Processo Civil. ---

Assim, é inequívoca a responsabilidade da Demandada relativamente à quantia de peticionada, pelo que, deve ser reconhecido o correspondente direito de crédito no montante de €425,50, a favor do Demandante. ---

O Demandante vem ainda peticionar as quotas vencidas no decurso da ação. ---

No que respeita à prova da titularidade da fração, cumpre afirmar que, à data da instauração da ação o Demandante juntou informação predial da fração autónoma identificada nos presentes autos, emitida em 20-10-2023, ou seja, poucos dias antes da entrada do requerimento inicial. ---

Assim, o documento estava válido, e não foi alegado qualquer facto concreto que coloque em questão a titularidade da referida fração pela Demandada. ---

Por efeito do fracionamento da quota anual em prestações, com vencimento calendarizado, a referida obrigação de contribuir para as despesas comuns assume carácter periódico. ---

Deste modo, as quotas vencidas na pendência da ação correspondem a prestações futuras, cujo pagamento pode ser exigido nos termos do n.º 1, do art.º 557.º, Código de Processo Civil; ou seja, tratando-se de prestações periódicas, caso o devedor deixe de pagar, podem compreender-se no pedido, e na condenação, tanto as prestações já vencidas como as que se vencerem enquanto subsistir a obrigação. ---

Pelo que, deve proceder o pedido de condenação relativamente às quotas vencidas na pendência da presente ação, sendo exigível e devido o seu pagamento, uma vez que, a contribuição para as despesas comuns constitui uma obrigação legal, que a Demandada não desconhece, ou desconhecendo, está obrigada a conhecer [cf., art.º 1436.º, n.º 1, als. d), e f), do Código Civil]. ---

Ficou provado que, durante a pendência da ação venceram-se quotas mensais correspondentes aos meses novembro de 2023, até julho de 2024 (dado que, a quota vence ao dia 8 de cada mês), na quantia mensal de €17,50, cada, que totalizam o montante de €157,50 (cento e cinquenta e sete euros e cinquenta cêntimos). ---

Por outro lado, ficou provado que, na pendência da ação a Demandada efetuou pagamentos que totalizam a quantia de €300,00, que devem ser considerados para abatimento ao valor em dívida. --

Sendo assim, resulta da matéria provada que, a Demandada não pagou as quotas, nas respetivas datas de vencimento, nem posteriormente, acumulando uma dívida por falta de pagamento de quotas que na presente data ascende ao montante de €283,00 (duzentos e oitenta e três euros). ---

Pelo que, a ação deve ser declarada procedente nesta parte do pedido. ----

Sobre a aplicação da pena pecuniária no montante de €380,00: ---

Ficou provado que, na instauração da presente ação o Demandante aplicou uma pena pecuniária à Demandada, no montante de €380,00. ---

A referida pena pecuniária consta da deliberação da assembleia dos condóminos, conforme ata junta aos autos, e é legalmente admissível e vinculativa, face ao disposto no art.º 1434.º, do Código Civil.

Assim, a ação deve ser declarada procedente nesta parte do pedido. ---


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Decisão: ---

Atribuo à causa o valor de €805,50 (oitocentos e cinco euros e cinquenta cêntimos), por corresponder à quantia em dinheiro que o Demandante pretendia obter no momento da propositura da ação, cf., normas conjugadas dos artigos 306.º, n.º 1; 297.º, n.º 1; e 299.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi, art.º 63.º, da Lei dos Julgados de Paz. ---

Pelo exposto e com os fundamentos acima invocados: ---

Julgo a presente ação totalmente procedente, por provada, e consequentemente, condeno a Demandada a pagar ao Demandante a quantia global de €663,00 (seiscentos e sessenta e três euros), a título quotas de condomínio em dívida e penalização regulamentar, vencidas até julho de 2024, inclusive. ---

Custas: ---

Nos processos tramitados em Julgado de Paz, a taxa de justiça correspondente ao montante de €70,00 (setenta euros), a liquidar pela parte declarada vencida, a título de custas da ação, cf. al. b), do n.º 1, do art.º 2.º, da Portaria 342/2019, de 01/10. ---

Face ao disposto na redação atualizada da alínea l), do n.º 1, do art.º 4.º, do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, relativo à isenção dos ausentes, não há lugar à emissão de DUC. ---

Registe. ---

Notifique pessoalmente em sede de audiência de discussão e julgamento, nos termos do disposto no artigo 60.º, n.ºs 1 e 2, da Lei dos Julgados de Paz. ---


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Notifique o Ministério Público junto dos Juízos Cíveis do Tribunal da Comarca de Setúbal (cf., n.º 3, do art.º 60.º da Lei dos Julgados de Paz). ---

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Julgado de Paz de Setúbal, em 27 de maio de 2025

O Juiz de Paz

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Carlos Ferreira